Por que a solidão virou uma das grandes preocupaçõesbet366saúde do século 21:bet366
Mas essa é apenas uma entre diversas iniciativas relacionadas ao assunto que foram anunciadas nos últimos anos. Os governosbet366Reino Unido e Japão, por exemplo, criaram “Ministérios da Solidão”bet3662018 e 2021, respectivamente.
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Já o médico Vivek Murthy, o atual US Surgeon General — uma das principais autoridadesbet366saúde dos Estados Unidos —, declaroubet366maio deste ano que se sentir só equivale a fumar 15 cigarros ao diabet366termosbet366prejuízos à saúde.
Mas por que a solidão ganhou tantos holofotes recentemente?
'É impossível ser feliz sozinho'
Uma toneladabet366cocaína, três brasileiros inocentes e a busca por um suspeito inglês
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Fim do Novo podcast investigativo: A Raposa
Uma das principais dificuldades quando pensamos no impacto da solidão estábet366definir exatamente o que é esse incômodo.
“O sentimentobet366solidão é uma experiência individual. Não basta estar isolado, afinal muitas pessoas que estão sozinhas não se sentem necessariamente solitárias. E, na contramão, tem gente que está no meiobet366outros indivíduos, mas isso não é garantia que elas se sintam conectadas”, reflete o psiquiatra Lucas Spanemberg, pesquisador do Instituto do Cérebro da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS).
“A solidão é uma sensaçãobet366desconexão,bet366não pertencimento a um grupo social, que traz implicações emocionais e comportamentais — e isso está relacionado a uma sériebet366desfechos negativos do pontobet366vista da saúde mental e física”, complementa ele.
Essa relação entre solidão e prejuízos ao corpo e à mente está bem documentada numa sériebet366pesquisas.
Uma delas, feitabet3662010 na Universidade Brigham Young, dos Estados Unidos, revelou que indivíduos com relações sociais fortes têm 50% mais chancebet366sobreviver por mais tempobet366comparação àqueles que interagem menos com o meio onde vivem.
E a necessidadebet366manter essa conexão está praticamente inscrita na origembet366nossa espécie, como explica Spanemberg.
“Os seres humanos foram programados geneticamente para viverbet366sociedade e integrar grupos. Durante os primeiros anosbet366vida, somos muito frágeis e indefesos, portanto precisamosbet366um núcleo coeso capazbet366proteger a prole”, diz o médico, que também atua no Hospital São Lucas,bet366Porto Alegre.
“E essa coesão social forma famílias, grupos, sociedades, países…”, lista ele.
O especialista também chama a atenção para um acompanhamentobet366centenasbet366indivíduos realizado pela Universidade Harvard, nos EUA, há 80 anos.
“Os autores desse levantamento observaram que o fator mais importante para sentir-se feliz no final da vida não era sucesso financeiro, emprego dos sonhos, fama ou dinheiro, mas, sim, coesão social”, diz Spanemberg.
“A grande variável associada à sensaçãobet366felicidade foi justamente ter relações importantes e significativas ao longo da vida”, completa ele.
'Solidão é lava, que cobre tudo'
A enfermeira Juliana Teixeira Antunes, do Instituto Federal do Nortebet366Minas Gerais,bet366Januária, destaca que durante muito tempo a solidão esteve relacionada aos mais velhos, como se fosse um fenômeno que ocorresse apenas nessa faixa etária.
De fato, os idosos podem se sentir desconectados com maior frequência e geralmente apresentam mais dificuldade para se adaptar e acompanhar as novidades.
A mortebet366familiares e amigos da mesma geração deixa mais sozinho quem fica, explicam os profissionaisbet366saúde ouvidos pela BBC News Brasil.
“Mas hoje nós identificamos a solidãobet366qualquer fase da vida”, observa ela.
Durante o trabalhobet366mestrado, Antunes decidiu estudar como esse incômodo afeta os adolescentes brasileiros.
“Esse é um momentobet366vida caracterizado pelo convívio social, pela criaçãobet366vínculos ebet366relações”, caracteriza a pesquisadora. “Mas, infelizmente, hojebet366dia a solidão afeta um número considerávelbet366jovens.”
No levantamento, que usou inquéritos epidemiológicos nacionaisbet3662015, 15,5% dos adolescentes entrevistados relataram que se sentiam solitários “na maioria das vezes” ou “sempre”.
“Um dos fatores que parece contribuir para esse cenário é a violência familiar, as agressões e o autoritarismo dos pais”, lista Antunes.
“Por outro lado, a prevalênciabet366solidão era baixa entre os jovens que relataram hábitos mais constantes, como fazer refeiçõesbet366família com frequência, ou ter o apoiobet366pais que se preocupam e conversam com eles”, detalha ela.
'A solidão é fera, a solidão devora'
Mas por que a solidão virou um assunto urgentebet366saúde pública nos últimos anos?
Para a psicóloga clínica Dorli Kamkhagi, do Laboratóriobet366Neurociências do Institutobet366Psiquiatria da Universidadebet366São Paulo (IPq-USP), há vários fatores que contribuem para este cenário.
“Acabamosbet366sairbet366uma pandemiabet366covid-19,bet366que havia a necessidadebet366isolamento social, por exemplo”, contextualiza. “Mas agora não estamos mais na crise sanitária e, mesmo assim, algumas pessoas não querem mais frequentar lugares ou fazer encontros presenciais.”
“Mas é totalmente diferente sentir o toque, ver as coisas, andar no parque…”, reflete ela.
Em outras palavras, a necessidadebet366ficarbet366casa para evitar o coronavírus fez com que muitos encontrassem nesse ambiente uma zonabet366conforto, da qual não querem sair agora.
Antunes destaca que, aos poucos, a solidão gera outros sentimentos negativos.
“Com o passar do tempo, surge o medo, a angústia, o sofrimento…”, diz.
O editorial do The Lancet aponta que a solidão é “um produtobet366como as sociedades e o mundo ao redorbet366nós estão organizados”.
Alguns autores chegam a citar que muitas cidades são construídas com basebet366“ambientes solitarizantes”.
“Nosso ambiente físico, ditado pelo planejamento urbano, pode impedir a conexão social se não permitir interações e engajamento”, diz o texto.
Os autores ainda destacam outros ingredientes que contribuem para esse contexto.
“O usobet366redes sociais, com as promessasbet366aproximar as pessoas, tem sido associado a um aumento da sensaçãobet366desconexão social”, lembram eles.
“Austeridade, pobreza, racismo e xenofobia também causam desigualdade e sentimentosbet366exclusão. As tendências sociais para o individualismo,bet366detrimento do coletivismo e do sentimentobet366pertencimento, elevam o riscobet366experimentar sentimentosbet366solidão.”
'Agora é horabet366sair da cápsula'
Mas será que é possível identificar a solidão e interferir antes que ela provoque prejuízos à saúde?
Para Kamkhagi, o desafio estábet366saber diferenciar solitude (estar só voluntariamente) e solidão.
“Reservar momentos para ficar sozinho é importante e saudável”, diz a psicóloga.
“O problema é quando você fica o tempo todo desligado do resto do mundo e começa a desaprender os códigos e as condutas das relações sociais”, complementa ela.
“Na solidão, o isolamento não está mais a serviçobet366uma experiênciabet366bem-estar, como uma leitura ou o contato com a natureza, mas passa a apresentar padrões prejudiciais, como ficar apenasbet366casa, abusarbet366álcool e outras drogas e se desconectar do restante da vida”, concorda Spanemberg.
O psiquiatra acrescenta que a solidão geralmente acontece juntobet366descuidos com a própria saúde e a aparência, perdabet366autocuidado e irritabilidade nos momentosbet366que é necessário ter contato com o outro.
Em alguns casos, a própria pessoa consegue identificar esses sinaisbet366alarme —bet366outros, é necessário o auxíliobet366um familiar ou colega próximo, que pode observar padrões e prejuízos na vida da pessoa solitária.
Diagnosticado o problema, é possível lançar mãobet366algumas intervenções e cuidados que previnem a evoluçãobet366um isolamento social voluntário para algo ainda mais grave, como quadrosbet366ansiedade e depressão.
“Pode ser necessário realizar uma avaliação ou um acompanhamento psicológico ou psiquiátrico”, sugere Spanemberg.
Aos poucos, com o auxíliobet366um profissionalbet366saúde, é possível retomar as atividades sociais e o vínculo com a comunidade.
“Podemos começar devagar, com uma caminhada leve no parque, ou o enviobet366uma mensagem a um amigo para perguntar como ele está e dizer que está com saudades”, exemplifica Kamkhagi.
“Essas pequenas atitudes permitem reabrir o campo dos relacionamentos e lidar melhor com a solidão”, conclui a psicóloga.