Dia das Crianças: como a ideiainfância mudou ao longo do tempo:

Criançasescola no Rio, sentadassuas cadeiras, olham para câmera

Crédito, Arquivo Nacional

Legenda da foto, Criançasescola no Rio,1958: segundo pesquisadores, instituições do Estado Moderno delimitaram o espaço destinado à infância

Em outras palavras, era como se não valesse a pena investir tanto esforço e afeto às crianças, diante da incertezasua própria sobrevivência.

Pule Matérias recomendadas e continue lendo
Matérias recomendadas
de :Temos os melhores relatórios de previsão, você está convidado a participar

ento Lightweight Bounce proporciona conforto e flexibilidade para mantê-lo energizado

ando você adiciona quilômetros à sua corrida diária. A sola 🌟 borracha longa

Medusa was a character in the 1981 film, Clash of the Titans. Special-effects creator Ray Harryhausen used stop motion animation to depict the battle with Medusa.
In Greece, a stewardess is murdered by a masked maniac. Suspicion falls on a drunken American playboy (George Hamilton) and a murderous gangster (Cameron Mitchell).

casas de apostas desportivas

industrial, Hugli; Bangalore -Tamil Nadu região Indústria e Gujarat Regionalindestrial

Chotanagpur No indústria). área empresarial na cidade emChotang pur 💴 a

Fim do Matérias recomendadas

“O conceitoinfância foi atribuído ao historiador Ariès. No entanto, outros pesquisadores, como [o historiador americano] Peter Stearns, emobra A Infância [de 2006], questionam tal ideia”, afirma à BBC News Brasil a pedagoga Maria Angela Barbato Carneiro, professora na Pontifícia Universidade CatólicaSão Paulo (PUC-SP).

Ela afirma que, se “o conceitoinfância está relacionado ao papel que a criança ocupa na sociedade” e não há registros sobre isso anteriores ao historiador francês, “atribui-se a ele os primeiros estudos sobre ela”.

“Na sociedade medieval […] o sentimento da infância não existia — o que não quer dizer que as crianças fossem negligenciadas, abandonadas ou desprezadas”, diz Ariès, no livro. “O sentimento da infância não significa o mesmo que afeição pelas crianças: corresponde à consciência da particularidade infantil, essa particularidade que distingue essencialmente a criança do adulto, mesmo jovem. Essa consciência não existia.”

MeninobalançopraçaBotafogo, no Rio,1966

Crédito, Arquivo Nacional

Legenda da foto, BalançopraçaBotafogo, no Rio,1966

Na arte

Pule Que História! e continue lendo
Que História!

A 3ª temporada com histórias reais incríveis

Episódios

Fim do Que História!

“Até por volta do século 12, a arte medieval desconhecia a infância ou não tentava representá-la. É difícil crer que essa ausência se devesse à incompetência ou à faltahabilidade. É mais provável que não houvesse lugar para a infância nesse mundo”, pontua Ariès.

Ele observa que as crianças eram pintadas com deformações, como se fossem réplicas menoresadultos. E cita uma ilustração que constaevangeliário feito por volta do ano 1000, no Sacro-Império Romano Germânico.

“O tema é a cena do Evangelhoque Jesus pede que se deixe vir a ele as criancinhas […]. Ora, o miniaturista agrupoutornoJesus oito verdadeiros homens, sem nenhuma das características da infância: eles foram simplesmente reproduzidos numa escala menor. Apenas seu tamanho os distingue dos adultos.”

Descrevendo outra obra, Ariès lembra que “o pintor não hesitavadar à nudez das crianças, nos raríssimos casosque era exposta, a musculatura do adulto: assim, no livrosalmosSão LuísLeyde, datado do fim do século 12 ou do início do 13, Ismael, pouco depoisseu nascimento, tem os músculos abdominais e peitoraisum homem.”

Ele defende que essa ideia da infância como um período próprio da vida havia se perdido com a romanização do mundo, na Idade Média. E só seria recuperada com o fim dessa fase histórica.

A partir do século 13, ele nota o reaparecimentofiguras infantis, mas ainda ligadas ao religioso — ou seja, não crianças exatamente, mas anjos,que “os artistas sublinhariam com afetação os traços redondos e graciosos — e um tanto efeminados — dos meninos mal saídos da infância”. “Já estamos longe dos adultosescala reduzida […]”, comenta.

O historiador notou que a criança só começa a protagonizar retratos já no século 15, mas ainda assim com trajesadulto.

Em efígies funerárias, a situação encontrada pelo pesquisador foi ainda mais tardia: remonta ao século 16 a presençaimagens alusivas a crianças mortas. “Ninguém pensavaconservar o retratouma criança que tivesse sobrevivido e se tornado adulta ou que tivesse morrido pequena”, explica ele. “No primeiro caso, a infância era apenas uma fase sem importância, que não fazia sentido fixar na lembrança; no segundo, o da criança morta, não se considerava que essa coisinha desaparecida tão cedo fosse dignalembrança: havia tantas crianças, cuja sobrevivência era tão problemática.”

“O sentimentoque se faziam várias crianças para conservar apenas algumas era e durante muito tempo permaneceu muito forte”, afirma. Ele se baseourelatos que traziam histórias como auma mulher, no século 17, que estava nervosa por dar à luz ao sexto filho e era consolada por uma vizinha que lhe lembrava: “antes que eles te possam causar muitos problemas, tu terás perdido a metade”.

“As pessoas não se podiam apegar muito a algo que era considerado uma perda eventual”, diz Ariès.

Ele conta que muitas famílias optavam, inclusive, por retardaralguns anos o batismo dos filhos. E isto fazia com que não houvesse a necessidade dos ritos cristãos do enterro. “Consta que durante muito tempo se conservou no País Basco o hábitoenterrarcasa, no jardim, a criança morta sem batismo”, aponta ele. “[…] será que simplesmente as crianças mortas muito cedo eram enterradasqualquer lugar, como hoje se enterra um animal doméstico, um gato ou um cachorro?”.

Havia então quem ainda entendesse as crianças como um ser marginal, que ainda não haviam se inserido completamente na vida. Por esse entendimento, bastava a criança superar esses primeiros anos, cuja sobrevivência era mais difícil, para logo ser considerada parte do mundo dos adultos.

‘As Meninas’,Velázquez

Crédito, Domínio Público

Legenda da foto, Crianças como miniadultos: quadro ‘As Meninas’,Velázquez, é um exemplo trazido pela pedagoga Maria Angela Carneiro

Sexualidade

Outro ponto curioso abordado pelo historiador francês diz respeito à sexualidade — ou como esta era tratadarelação às crianças. Para isso, ele utiliza como fonte o diário do médicoHenrique 4º (1553-1610), rei da França, especialmente as anotações sobre fatos corriqueiros do filho do monarca, o futuro rei Luís 13 (1601-1643).

Quando o menino tinha menos1 anovida, o médico escreveu: “Ele dá gargalhadas quandoama lhe sacode o pênis com a ponta dos dedos”. E, mais tarde, relata que Luís passa a exibir seu órgão sexual sempre que avista um criado.

“Muito alegre, ele manda que todos lhe beijem o pênis”, relatou o médico, quando o herdeiro tinha 1 anoidade. Alguns meses depois, quando ficou arranjado seu futuro casamento com a infanta da Espanha, ele passaria a colocar a mãoseu pênis sempre que os adultos lhe perguntavam “onde está o benzinho da infanta?”.

A julgar pelos relatos, todas essas brincadeirascunho sexual eram encaradas com naturalidade, nunca com reprovação. Aos quatro anos, conforme o diário, ele já havia aprendido, na teoria, como ocorria o ato sexual.

Espaço da infância

Crianças brincam no Jardim do Méier, no Rio,foto1970

Crédito, Arquivo Nacional

Legenda da foto, Crianças brincam no Jardim do Méier, no Rio,foto1970

Mas Ariès nota que a partir do século 16 é possível verificar um movimentoinclusão da criança, sem respeitar suas diferenças, ao mundo dos adultos. Primeiro, como um divertimento. O filósofo Montaigne (1533-1592) escreveu, sobre o gosto pelo pitoresco e a graça dos pequeninos, que com eles era possível se divertir “para nosso passatempo, assim como nos divertimos com os macacos”.

“Esse sentimento podia muito bem se acomodar à indiferença com relação à personalidade essencial e definitiva da criança, a alma imortal”, diz Ariès.

O historiador nota que a partir do século 17 a criança começa a protagonizar retratosfamília. Na mesma época, a infância passa a ser entendida como uma fase da vida.

Essa definição vai ficando mais intensa à medida que a sociedade moderna se organiza. As rotinastrabalho, dentro do contexto industrial, acabam por criar uma divisão mais clara entre o espaço das crianças — ainda muito novas, impossibilitadas ao trabalho — e o espaço dos adultos — no qual, claro, estavam incluídas as crianças um pouco mais velhas, que também trabalhavam.

E a educação escolar começa a tomar a forma como a conhecemos — são nas escolas que as crianças têm seu espaço e, cada vez mais, passam a ser tratadas com o respeito devido à infância.

“Não saberia dizer se o conceitoinfância acompanhou o próprio conceitoensino como entendemos hoje mas,fato, sempre foi um processo que envolveu ensino e aprendizagem”, comenta a professora Carneiro. “A escolarização assume um papel importante a partir da Reforma Protestante, quando surgem as escolas da igreja onde poderiam aprender a ler a Bíblia, porque antes eram privilégio da elite e da igreja.”

Ela lembra, contudo, que as crianças, “de fato tiveram seu lugar” no mundo a partir da Declaração dos Direitos da Criança, documento criado pela Organização nas Nações Unidas (ONU)1959. “É algo bastante recente e, mesmo assim, pouco respeitado”, diz.

Doutoreducação, arte e história da cultura e professor na Universidade Presbiteriana Mackenzie, Ítalo Francisco Curcio concorda com a ideiaque “o conceitoinfância, como assimilamos hoje”, tenha surgido com a modernidade, “não por coincidência, paralelamente ao novo modeloprodução, surgido com a chamada primeira Revolução Industrial”.

“Até então […], o ser humano era visto e entendido socialmente num modelodois segmentos, o do ‘pré-adulto’, ou criança; e o do adulto”, diz ele, à BBC News Brasil. “Mais precisamos, o segmento antes da capacidadeprocriação e o segmento a partir da capacidadeprocriação”.

Crianças brincamdança das cadeiras,evento no Rio,1970

Crédito, Arquivo Nacional

Legenda da foto, Crianças brincamdança das cadeiras,evento no Rio,1970

Curcio sintetiza: embora o conceitoinfância existisse,forma subliminar, desde a origem da humanidade, “somente a partir do fim do século 17 ele é efetivamente assimilado como uma fase do desenvolvimento da pessoa humana”.

“Mais precisamente, a partir do século 18, especialmente no meio cristão, passou-se a ver o ser humano, nos seus primeiros 10 anosvida, como um tempocrescimento não somente físico mas também intelectual, cultural e espiritual”, afirma ele.

A historiadora da educação e psicóloga Maria Cristina SoaresGouvêa, professora na Universidade FederalMinas Gerais (UFMG) também situa a era moderna como o marco do surgimento da ideiainfância. “Veio mais ou menos com as mudanças advindas do que a gente chamamodernidade”, diz ela, à BBC News Brasil.

Isto porque a fundação do Estado moderno implicou na “necessidadeconstruçãouma ordem social ligada ao Estado,que sujeitos não obedecessem mais apenas a disputas entre nobres”. Segundo ela, como era preciso desenvolver indivíduos “capazescontrolar a si mesmos” dentro dos princípios da “civilidade”, o momento para essa formação passou a ser a infância.

“Na virada do século 16 surge uma sérietratados, manuaisconduta,educação moral, tudo ensinando como educar os filhos ainda no ambiente doméstico. Ao mesmo tempo, se expandem as escolas, ainda restritas às elites”, afirma a psicóloga. “A escola dá nova visibilidade à criança, cuja formação passa a ser entendida como função do Estado.”

É quando gradualmente começa a existir um momento determinadoque a criança “não é produtiva” porque “todo o investimento é voltado paraescolarização”. “A criança, inicialmente8 a 12 anos, ganha uma nova função social: a funçãoaluno inserido na escola. Este é o modeloinfância que se constitui com a decadência do modelo da sociedade medieval”, diz ela.

Desfilebonecas ocorrido no centro do Rio1962

Crédito, Arquivo Nacional

Legenda da foto, Desfilebonecas ocorrido no centro do Rio1962

Legado e controvérsias

Gouvêa lembra que o principal mérito da obraAriès está no papelfundamentar o conceitoinfância.

“Ele entendia que havia [no passado] uma indiferençarelação às crianças, um sentimentoindistinção entre infância e idade adulta. E uma certa indiferença afetiva, ligada à alta mortalidade e às condiçõesvida”, comenta ela. “Para ele, as crianças eram tratadas como pequenos adultos.”

Gouvêa acrescenta que “as pesquisas dele foram muito importantes porque ele foi o primeiro a trazer visibilidade para a história e para as ciências sociais acerca da questão da infância”. “A infância até então era entendida como tema restrito à psicologia e à pedagogia ou à pediatria. Ele trouxe a ideia da infância e o sujeito criança para o interior do campo história. Ele historicizou a noção contemporânea que temos da infância.”

Se o pioneirismoAriès é amplamente reconhecido, também não faltam críticas ao seu modoteorizar a questão.

A psicóloga Gouvêa lembra que a pesquisa do francês foi “muito original” na utilizaçãolápides, pinturasépoca, cartas e tudo o mais que ele foi levantando, “já que a criança não aparecia claramente nos discursos oficiais, então ele foi procurando traços do infantil nas produções culturais”.

Por outro lado, isto limitou seu alcance. “Ao pesquisar pinturas, ele só teve acesso a crianças nobres da Idade Média e não a criança concreta. E essa criança nobre era retratada como um pequeno adulto porque, historiadores da época vão dizer, naquela época a pintura não retratava o sujeito, mas a posição social”, diz a professora. “Era preciso então retratar o herdeiro do trono, por exemplo, daí essa posição do adulto.”

Meninas jogam ludo,foto1975

Crédito, Arquivo Nacional

Legenda da foto, Meninas jogam ludo,foto1975

Outra hipótese aventada por ela éque, naquele tempoque as telas precisavamuma observação do artista, “a criança não apareceria porque era difícil retratá-las, difícil que ela ficasse parada por horas”.

“E pesquisas posteriores já mostraram que, mesmo com a alta taxamortalidade, isso não significaria que os pais tratassem os filhos com indiferença. Há cartasque eles expressavam a tristeza pela perda dos filhos, o vínculo afetivo, etc.”, diz Gouvêa.

Carneiro lembra ainda que a “ausênciaquaisquer tiposrepresentação referente às crianças” era menos por um entendimento do papel delas e mais “porque elas viviam pouco, morriam cedo”. “Imagine os povos nômades carregando os pequenos”, exemplifica. “A sobrevivência era difícil para os adultos devido às adversidades, imagine para as crianças.”

O historiador Stearns, por exemplo, defende que a parca documentação sobre crianças do passado é decorrente do fatoque as descrições das mesmas dependiam do pontovista dos adultos. “Na minha opinião, a infância sempre existiu, mas não temos dados suficientes para estudá-la melhor nos diferentes contextos e épocas”, completa a professora.

“Se por um lado, foram poucos os dados encontrados sobre as crianças,algumas sociedades elas trabalhavam ajudando os adultos e participandoritosiniciação”, comenta a professora Carneiro.

Ela ressalta, contudo, que o Ariès precisa ser entendido “dentrouma sociedade ocidental europeia” e, deste pontovista, considerando a época analisada, “ele está correto”. “Não podemos falar o mesmosociedades sul-africanas ou indígenas sul-americanos, porque as realidades eram outras”, afirma Carneiro.

A psicóloga Gouvêa acrescenta ainda que é preciso termente a diferença entre criança e infância. O primeiro termo é carregadouniversalidade: significa sujeitopouca idade. “Já infância é uma construção social que age sobre esses sujeitos. Ou seja: a criança é criadaacordo com o modelo socialinfânciasua sociedade,sua cultura”, contextualiza.

Etimologicamente, a palavra infância vem do latim, da combinaçãoum prefixonegação com um substantivo que significa “falante”. “Infância poderia ser entendia literalmente como ‘alguém sem fala’, ou que não sabe falar. Sem confundir, porém, com o significadomudo. Entende-se por mudo quem não consegue falar, o que é diferentenão saber falar”, define Curcio.