Veneza City: a ocupaçãoboom casinovenezuelanosboom casinoáreaboom casinopreservação na periferiaboom casinoSão Paulo:boom casino

Legenda do vídeo, Venezuelanos no Brasil: a ocupação que surgiuboom casinoáreaboom casinopreservação na periferiaboom casinoSP

Segundo o governo federal, 510 mil venezuelanos vivem atualmente no Brasil, sendo 5,2 mil na cidadeboom casinoSão Paulo. O Brasil foi o terceiro país que mais recebeu migrantes venezuelanos na América Latina, atrás apenas da Colômbia e do Peru.

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A ocupação foi construídaboom casino2021boom casinouma áreaboom casinopreservação ambiental que pertence à Prefeitura, e deve passar por uma reintegraçãoboom casinoposseboom casinobreve, segundo a gestão do prefeito Ricardo Nunes (MDB).

Candidato à reeleição, Nunes (MDB) prometeu transformar o terrenoboom casinoum parque. Para isso, os imigrantes venezuelanos, que hoje vivemboom casinosituaçãoboom casinovulnerabilidade social, terãoboom casinodeixar suas casas.

Eles se sustentamboom casinobenefícios sociais e pequenos bicos, como costura, faxina ou mesmo da vendaboom casinoprodutos nos semáforos. Também recebem doaçõesboom casinoalimentos dos moradores do bairro. Água e energia elétrica só chegam aos barracos por meioboom casinogambiarras.

Vista aérea dos barracosboom casinoVeneza City

Crédito, Felix Lima

Legenda da foto, Veneza City, cujo terreno pertence à Prefeituraboom casinoSão Paulo, tem 40 barracos
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Porém, mesmoboom casinosituação precária, o assentamento se tornou um pontoboom casinoestabilidade para os imigrantes após uma jornada pela América do Sul.

É o casoboom casinoMaria Jose Pabón,boom casino33 anos. Nascida e criadaboom casinoMaracay, cidade no norte da Venezuela, ela conta ter decidido deixar o país há sete anos, quando passou um dia inteiro na fila para comprar farinha — e não conseguiu.

"Um dia você comia. Outro dia, não. Eu via a cara da minha família,boom casinotristeza e com fome. Fome é uma dor que não tem preço", diz.

Ela deixou seu filho na Venezuela com parentes e tenta enviar dinheiro para a família mensalmente — valor que arrecada com pequenos bicos e benefícios sociais. Ela não vê o filho há sete anos.

"O que mais queria era tê-lo aqui comigo. E dar tudo: estudo, comida, educação, tudo que não tem lá. Sinto meu coração apertadinho, um sentimento que toda mãe deve sentir, que é não ter o seu filho ao seu lado por muito tempo", diz.

Depoisboom casinosair da Venezuela, Maria passou pela Colômbia e pelo Peru antesboom casinoentrar no Brasil pelo Acre,boom casinocarona.

"Na Colômbia eu vendia balinhas no semáforo, porque lá na Colômbia não havia um trabalho digno. Havia trabalho sim, mas o salário não era o que pagavam a um colombiano", diz.

Ela soube da ocupaçãoboom casinouma conversa com amigos venezuelanos no Peru. "[Eles falaram] 'Vamos ao Brasil que lá tem uma invasão, e há uma chance para a gente,boom casinoviver bem lá'. Viemos pedindo carona para o Brasil. Não entendíamos português. E assim começou a trajetória onde estamos aqui,boom casinoVeneza City."

Maria Jose Pabón sentadaboom casinofrente ao seu barraco.

Crédito, Felix Lima

Legenda da foto, Maria Jose Pabón não vê o filho desde que deixou a Venezuela, há sete anos

'Ficou tudo uma bagunça'

Nos últimos anos, o Brasil recebeu cercaboom casino510 mil imigrantes da Venezuela, segundo o governo federal.

Atualmente, os venezuelanos formam o maior contingenteboom casinoestrangeiros no Brasil.

Desde 2019, o Brasil reconhece que a Venezuela enfrenta uma situaçãoboom casino"grave e generalizada violaçãoboom casinodireitos humanos", o que pode facilitar e acelerar a análise para emissãoboom casinorefúgio e visto humanitário.

No dia 28boom casinojulho, uma eleição presidencial intensificou ainda mais o conflito no país.

Por um lado, o Conselho Nacional Eleitoral (CNE) apontou que o vencedor é o atual presidente, Nicolás Maduro, no cargo desde 2013. Por outro, o opositor Edmundo González diz ter vencido o pleito, acusando o atual governoboom casinofraude eleitoral.

González tem apoio da União Europeia e dos Estados Unidos, que reconheceramboom casinovitória. Já Brasil, Colômbia e México estão pressionando Maduro a divulgar as atas eleitorais que apontariam o verdadeiro ganhador da eleição.

Na quinta-feira (15/8), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) afirmou que não reconhece a vitóriaboom casinoMaduro, e sugeriu a possibilidadeboom casinonovas eleições.

Em Veneza City, a costureira Yoraima Herrera,boom casino59 anos, se emociona ao lembrar da Venezuela antes do governo Maduro.

"Morávamos bem. Era como estar aqui. Não faltava nada. Quem trabalhava tinha suas coisas. Trabalho, alimentação, remédios, médicos, hospital. Tudo estava 'de boa'. Mas depois desses anos do mandato dele [Maduro], tudo ficou uma bagunça", conta ela, que hoje viveboom casinopequenos bicos como costureira.

"Não havia remédios, hospital, comida. Não havia nada. Eu estava passando fome, fiquei desnutrida, muito doente. E decidi vir, sair do meu país", diz Yoraima, que trabalhava como faxineira na Prefeituraboom casinoCaracas, capital da Venezuela. Antesboom casinoVeneza City, ela morou na Colômbia, Peru e Equador.

Já Carmen Noriega,boom casino72 anos, conta que perdeu seu empregoboom casinouma escola no interior da Venezuela, envia parte do valor que recebe do BPC (Benefícioboom casinoPrestação Continuada) para alguns familiares que ficaram no país. "Às vezes, quando posso, mando U$ 15 (R$ 81) para um dos meus netos", diz.

O BPC, cujo valor é um salário mínimo, também pode ser concedido a estrangeiros caso eles tenham maisboom casino65 anos e vivamboom casinosituaçãoboom casinovulnerabilidade social.

Em Veneza City, ela vive com três familiares que também decidiram emigrar. "Já estamos há três anos vivendo aqui no Brasil. Para a glóriaboom casinoDeus, nós aqui recebemos muitos benefícios. Meu filho está trabalhando. E meus netos estão estudando", diz.

Carmen Noriega, uma mulherboom casino72 anos,boom casinofrente ao seu barracoboom casinomadeira pintadaboom casinoazul

Crédito, Felix Lima

Legenda da foto, Carmen Noriega elogia benefícios do Brasil: 'Meus netos estão estudando'

'Uma ordem do Criador'

Débora dos Santos, uma mulherboom casino42 anos, com chapéu preto e camiseta branca,boom casinofrente a barranco na ocupação

Crédito, Felix Lima

Legenda da foto, Débora dos Santos, líder da ocupação, encara Veneza City como uma 'missão divina'

Embora quase a totalidade dos moradoresboom casinoVeneza City sejaboom casinoestrangeiros, a ocupação é liderada pela Débora dos Santos,boom casino42 anos, que nasceu e cresceuboom casinoFazenda da Juta. Ela é a responsável por dialogar com o poder público, e ajudar os imigrantes a angariar doações.

"Quando eu entrei aqui foi para ajudar uma famíliaboom casinobrasileiros a fazer um quarto. Foi quando umas pessoas mandaram venezuelanos me procurar", conta.

"Devagarinho, começou a vir venezuelanos, e fizemos esta arca com 40 famílias. Fizemos essas casas todos unidos com a misericórdia do Senhor", diz Débora, que é evangélica e sempre cita Veneza City como uma missão divina dada a ela.

"Como foi uma ordem do Criador que eu recebi para ajudar essas famílias, estou disposta a enfrentar qualquer tipoboom casinosituação para ajudá-los", afirma.

Débora nega que a ocupação tenha desmatado o terreno. “Quando entrei aqui, o que tinha era mato e muito lixo. Isso tinha bastante. Não derrubamos nenhuma árvore grossa”, afirma.

Para ela, a solução do impasse seria melhorar as moradias dos venezuelanos na comunidade, fazendo com que eles ajudem na preservação da mata.

"Eu acredito que poderíamos unir o meio ambiente e a ajuda a essas pessoas. Elas poderiam cuidar dessa área, para que ela não fique vazia, largada", diz.

Mutirão na Fazenda da Juta

Yoraima Herrera, vestida com um casaco verde,boom casinofrente a seu barraco. Acima, uma bandeira da Venezuela pregada na madeira

Crédito, Felix Lima

Legenda da foto, Yoraima Herrera saiu da Venezuela para fugir da fome: 'Eu estava desnutrida', diz

O nome Veneza City vem da forma como alguns brasileiros da periferiaboom casinoSão Paulo se referem aos venezuelanos: "os veneza".

Ela é uma das 371 ocupaçõesboom casinosem-teto monitoradas pela prefeituraboom casinoSão Paulo — 63 mil pessoas vivemboom casinoáreas como essaboom casinotoda a cidade.

Em fevereiroboom casino2020, antes da pandemiaboom casinocovid-19, havia 218 ocupações irregulares no município, por exemplo. Ou seja,boom casinopouco maisboom casinoquatro anos, houve um crescimentoboom casino70%, segundo a Prefeitura. Especialistas creditam esse fenômeno ao aumento da pobreza e dos despejos durante a pandemia.

Já a fila da moradia social tem 276 mil pessoas cadastradas, segundo a Secretariaboom casinoHabitação.

Em uma cidade com alto déficit habitacional e escassezboom casinoterrenos vazios, a áreaboom casinoVeneza City acabou ficando no centroboom casinoum conflito por território.

E ele envolve os imigrantes, moradores do bairro e a prefeitura.

Erguidaboom casino2021, a ocupação está localizadaboom casinoum terreno do municípioboom casino55 mil metros quadrados, encravado entre prédios da Cohab (Companhiaboom casinoHabitação Popular) e um projetoboom casinomoradia social chamado Mutirão 26boom casinoJulho.

No início da décadaboom casino1990, a gestão da então prefeita Luiza Erundina (na época no PT, hoje no PSOL) cedeu o materialboom casinoconstrução e um grande loteboom casinoterreno a um movimentoboom casinomoradia da Zona Leste.

E a mão-de-obra ficou a cargo dos futuros moradores — as 560 casas foram entreguesboom casino26boom casinojulhoboom casino1997, data que acabou dando nome ao local.

Porém, o terrenoboom casinofrente ao mutirão também é um pequeno fragmentoboom casinoMata Atlântica, classificado pela Prefeitura como áreaboom casinopreservação ambiental.

Vista aérea dos barracosboom casinoVeneza Cityboom casinomeio às árvores (à esquerda). Do lado direito, uma fileiraboom casinocasas do mutirão 26boom casinojulho

Crédito, Felix Lima

Legenda da foto, Veneza City ficaboom casinofrente a um projetoboom casinomoradia conhecido como mutirão

Segundo a gestão do prefeito Ricardo Nunes, ele está destinado a se tornar um anexoboom casinoum parque municipal que está sendo construídoboom casinooutra área verde a poucos metros dali.

Uma das moradoras do mutirão é Deocleciana Ferreira,boom casino62 anos, doutoraboom casinoServiço Social pela Pontifícia Universidade Católicaboom casinoSão Paulo (PUC-SP) e autoraboom casinoum livro sobre a história da Fazenda da Juta. Conhecida como Crécia, ela vive no bairro desde julhoboom casino1997.

Crécia conta que, quando as chavesboom casinoseu sobrado foram entregues, técnicos da prefeitura pediram que cada morador cuidasse da área verde na frenteboom casinocasa. Foi assim que o terreno, antes degradado, voltou a ter árvores, frutas e animais — ali também há uma nascente e um pequeno riacho, mas a água já aparenta estar poluídaboom casinoalguns pontos.

"Nesse períodoboom casinocuidado, nós todos plantamos. Então, assim, cada árvore que tem aqui tem a presençaboom casinoum morador", conta.

"O desencanto veio a partirboom casino2021. Durante a pandemia, houve um movimentoboom casinoocupação por pessoas que vieramboom casinofora e passaram a ocupar a área da mata", diz Crécia.

Embora os moradores do mutirão sejam contra a ocupação, a relação deles com os venezuelanos é pacífica — a ocupação chega a receber doaçõesboom casinoquem vive no bairro.

"São pessoas que necessitamboom casinoapoio,boom casinoproteção,boom casinoacolhida. Eles têm direito à moradia digna, então assim, não pode ficar ocupando dentro da mata, dentroboom casinomanancial, ou seja, a gente é a favor que eles sejam acolhidos, mas a mata precisa ser preservada", afirma Crécia.

Crécia, uma mulherboom casino62 anos, vestida com um casaco laranja

Crédito, Felix Lima

Legenda da foto, Crécia é uma das moradoras do mutirão que lutam para que área vire um parque

Moradia e preservação

O pesquisador britânico Matthew Aaron Richmond, professorboom casinoGeografia na Universidadeboom casinoNewcastle, na Inglaterra, acompanha a históriaboom casinoVeneza City desde 2021, quando fazia uma pesquisa sobre moradia popularboom casinoSão Paulo.

Para ele, a ocupação é "uma continuação da dinâmicaboom casinourbanização na capital paulista ao longoboom casinodécadas."

"Grupos muito pobres, que não conseguem acessar moradias populares pelo mercado privado nem por programasboom casinohabitação social, acabam ocupando terras urbanas subutilizadas", diz o pesquisador, afiliado ao Alameda Institute.

Mas algumas coisas mudaram nos últimos anos, aponta.

"Houve algum sucesso na criaçãoboom casinozonasboom casinoconservaçãoboom casinoSão Paulo, mas a implementação dessas áreas é frequentemente fraca. Isso significa que populações vulneráveis são empurradas para ocupar áreas ambientalmente sensíveis."

Para Richmond, a solução para o problema "precisa levarboom casinoconta ambos os lados desta equação: fornecer moradia acessível para as pessoas que precisam proteger adequadamente áreas ambientalmente importantes."

Barracosboom casinomadeiraboom casinomeio a árvores

Crédito, Felix Lima

Legenda da foto, Segundo prefeitura, as moradias serão removidas e os imigrantes vão deixar o local

'Vai ficar pior'

Em nota, a Prefeituraboom casinoSão Paulo informou que um decreto municipalboom casino2007 determina que "qualquer construção" não autorizadaboom casinoáreasboom casinoposse do município "deve ser removida".

Segundo a gestão Ricardo Nunes, "todas as tratativas que envolvem a ocupação Veneza City são norteadas por diversas políticas habitacionais e sociais que visam o atendimento pleno das famílias residentes no território."

Embora ainda não exista uma data para a remoção dos moradores,boom casinoVeneza City, o clima é novamenteboom casinoincerteza e insegurança sobre o futuro.

"Se sair daqui, eu não tenho lugar para ir. Nem condições para voltar à Venezuela. Maduro ganhou a eleição. Vai ficar pior", diz Maria Pabón.

Já Yoraima Herrera se emociona ao falarboom casinosua casa na periferiaboom casinoSão Paulo. "Dizem que aqui vai virar um parque… Eu tenho minha casinha. Eu vivo sozinha, com minha cachorra. Eu quero morar aqui, todos queremos morar aqui."

Colaboraram Felix Lima e Shin Suzuki