Eleição na Venezuela: Maduro corre riscoperder o poder?:
Eleições anteriores foram denunciadas como fraudulentas por organizações internacionais como a Organização dos Estados Americanos (OEA), além dos Estados Unidos e da União Europeia. Partidosoposição foram proibidosparticipar, sendo rotulados pelo governoMaduro como marionetes "fascistas" alinhados a potências estrangeiras.
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Fim do Matérias recomendadas
Desta vez, Maduro permitiu a participação da coalizãopartidos opositores, a Plataforma Unitária,um acordo que resultouum breve alívio nas sanções econômicas dos EUA.
No entanto, essas sanções foram reimpostasmeio ao bloqueio da candidaturaMaría Corina Machado e outras medidas contra opositores.
Uma toneladacocaína, três brasileiros inocentes e a busca por um suspeito inglês
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Ex-deputada, Machado, que se autointitula "liberal", venceu com mais90% nas primárias da oposição venezuelanaoutubro do ano passado, mas foi impedidaconcorrer pelo governoMaduro,decisão posteriormente confirmada pela Suprema Corte da Venezuela.
Mais recentemente, Maduro cancelou o convite à missão da União Europeia para monitorar o processo eleitoral, enquanto a ONU confirmou o envioobservadores, que não têm previsãofazer declarações públicas.
Especialistas consultados pela BBC News Brasil analisam os pontos cruciais da eleição da Venezuela2024.
"As condições da eleição estão extremamente desequilibradas, com o governo usando todos os recursos estatais para favorecer Nicolás Maduro. Portanto, a eleição não é justa. No entanto, a oposição ainda tem chances. De fato, as pesquisas mostram Edmundo González, substitutoMaría Corina, com uma vantagempelo menos 20 pontos na intençãovoto", diz Phil Gunson, analista sênior da consultoria Crisis Group sediadoCaracas.
Muitas questões ainda estãoaberto e serão respondidas nos próximos dias: Maduro conseguirá vencer sem manipular os resultados? E, se perder, aceitará a derrota? Nesse caso, como seria a transferênciapoder? Qual seria o papel dos militares, que já declararam apoio e lealdade a Maduro, nesse contexto? E qual seria o futuro do chavismo, que governa a Venezuela há 25 anos?
Em meio a tantas perguntas, os especialistas acrescentam que, devido às circunstâncias atuais, se Maduro optar por fraudar as eleições, isso pode representar "um grande risco pessoal" para ele.
A seguir, a BBC News Brasil explicaseis pontos-chave da eleição na Venezuela que pode selar o futuro do país.
1. O candidato da oposição
Edmundo González Urrutia, um diplomata aposentado74 anosperfil discreto, é o principal rivalMaduro e lidera nas pesquisasintençãovoto.
González, também escritor e acadêmico, foi escolhido como candidatoconsenso pela coalizãooposição Plataforma Unitária após o governo Maduro proibir María Corina Machadoocupar cargos públicos por 15 anos, acusando-afraude, o que ela nega.
A decisão, confirmada pela Suprema Corte controlada pelo governo, impediu Machadoconcorrer à presidência.
Sua substituta, a historiadora Corina Yoris, também não pôde concorrer. A oposição alega que não conseguiu fazer o registrosua candidatura no sistema online da autoridade eleitoral. "Eles (governo) não nos permitiram", afirmou o chefe da coalizão, Omar Barboza.
María Corina Machado, que se define como "liberal", emergiu como a figuradestaque da oposição2023, ao mobilizar milhõesvenezuelanos nas primáriasoutubro com seus ataques à corrupção e má administração.
No entanto, a Suprema Corte da Venezuela declarou as primárias ilegais e iniciou investigações criminais contra alguns organizadores.
Vários apoiadoresMachado foram alvomandadosprisão, e membrossua equipe foram detidos.
Apesar disso, Machado continuoucampanha, transformando-a num símbolo da perdaseus direitos.
Sem as duas mulheres na disputa, a Plataforma Unitária se uniutorno do nomeGonzález, que conta com o apoioMachado.
Os dois se comprometem a revitalizar a economia para trazervolta os milhõesvenezuelanos que emigraram desde 2013.
Atualmente, os venezuelanos representam o segundo maior grupoimigrantes indocumentados que cruzaram a fronteira dos Estados Unidos, atrás apenas dos mexicanos.
"As eleições na Venezuela não são justas, nem limpas, nem equitativas”, disse González em entrevista recente à BBC News Mundo, o serviçoespanhol da BBC.
"Estamos olhando para o futuro. Não estamos olhando para trás. Queremos uma missão que siga para frente e é por isso que estamos empenhados para que todo o processo eleitoral seja equitativo, justo e transparente.”
"Vamos ganhar do chavismo com uma força majoritária que será expressa nas urnas e o respaldomilhõesvenezuelanos que estão comprometidos com a mudança da Venezuela", acrescentou.
2. Por que Maduro está atrás nas pesquisas?
Apesarmanter um considerável apoiofervorosos seguidores, conhecidos como "chavistas", que incluem milhõesfuncionários públicos, ecultivar uma imagem"homem do povo", a popularidadeMaduro caiu devido à crise econômica, corrupção e má administração, segundo especialistas.
Sondagens realizadas por três institutos (Datincorp, Meganálisis, ORC Consultores) mostram González com mais50% das intençõesvoto, enquanto Maduro tem menos20%.
Maduro disse, durante um comício recente, que haveria "banhosangue,uma guerra civil fratricida" se ele não vencer as eleições.
Com a economiacolapso, o acesso aos programas sociais que anteriormente mobilizavam eleitores foi drasticamente reduzido, apontam especialistas.
"Os venezuelanos vivem na pobreza. Quase 8 milhões deixaram o país por faltaperspectivas e empregos dignos. Nesta campanha eleitoral, muitos esperam um resultado que permita o retornomilhões ao país", diz à BBC News Brasil Gunson, da Crisis Group.
"Maduro, desde que assumiu o poder, prometeu prosperidade e recuperação econômica, mas nunca cumpriu suas promessas. Isso está gerando o grande impulso por mudança", acrescenta ele.
Para o especialista, "não se tratauma questão ideológica".
"Não é porque as pessoas rejeitam o socialismo ou são atraídas pelo conservadorismoMaría Corina. O que elas desejam é ver um tipomudança que permita o retorno ao crescimento, a restauração da governança institucional e a recuperação da infraestrutura do país", diz.
Maduro responsabiliza os Estados Unidos e a oposição pelas dificuldades econômicas da Venezuela, citando as sanções impostas pelos americanos.
Gunson diz que as sanções "certamente tiveram um papel", mas observa que a crise econômica começou "muito antes das sanções" e que a maior parte da responsabilidade recai sobre o governo.
Vice e herdeiro políticoHugo Chávez, Maduro, um ex-motoristaônibus, foi eleito pela primeira vez presidente da Venezuelaabril2013 por uma margem estreita, após governar interinamente por alguns meses.
Chávez havia sido eleitooutubro2012 para um quarto mandato, masposse acabou adiada devido ao tratamentoseu câncer. Ele morreuCaracas, aos 58 anosmarço2013.
Em 2018, Maduro foi reeleitouma eleição contestada tanto internamente quanto internacionalmente.
Sua vitória não foi reconhecida pelos Estados Unidos e vários outros países, que passaram a reconhecer Juan Guaidó, então presidente da Assembleia Nacional, como líder legítimo do país.
No entanto, Guaidó nunca conseguiu assumir o controle efetivo do governo, e Maduro permaneceu no poder.
Em resposta, os Estados Unidos impuseram sanções econômicas contra a Venezuela.
3. Quem vai votar?
Mais21 milhõesvenezuelanos estão registrados para votar, mas o êxodo7,7 milhões deve reduzir o eleitorado para cerca17 milhões.
Além disso, apenas cerca69 mil venezuelanos no exterior podem votar devido a inúmeras exigências burocráticas impostas pelo governo.
Nos Estados Unidos, os consulados, onde normalmente os eleitores votam, foram fechados desde o rompimento das relações diplomáticas entre Caracas e Washington.
Na Venezuela, o voto não é obrigatório e é realizado por meiournas eletrônicas.
4. Qual é o contexto da eleição?
A esperançauma eleição mais justa surgiu quando Maduro e a Plataforma Unitária, principal oposição da Venezuela, assinaram o AcordoBarbados, mediado pela Noruega,outubro2023.
Nele, o governo venezuelano se comprometeu a garantir as eleições deste ano e aceitar o resultado das urnas.
Como consequência desse acordo, os Estados Unidos relaxaram sanções econômicas contra os setoresgás, mineração e petróleo controlados pelo governo.
Contudo, o cenário mudou quando as primárias da oposição foram suspensas e declaradas ilegais pela Suprema Corte. Também foram emitidos mandadosprisão contra defensoresdireitos humanos, jornalistas e membros da oposição.
Um painelespecialistas da ONU relatou um aumento na repressão aos críticos do regime, enquanto a campanhaMachado e González acabou limitada pelo controle da máquina pública nas mãosMaduro.
Isso levou o governo Biden a reimpor sanções no início deste ano.
No fimjunho, Maduro e outros candidatos às eleições presidenciais assinaram um acordo para respeitar os resultados. Mas a Plataforma Unitária se absteve, argumentando que o governo já havia violado o AcordoBarbados.
Esse novo acordonove pontos foi apresentado pelo Conselho Nacional Eleitoral (CNE), a mais alta autoridade eleitoral da Venezuela, que os críticos dizem ser uma extensão do partidoMaduro no poder.
Laura Dib, diretora do Programa da Venezuela na WOLA (EscritórioWashington para a América Latina), uma ONG com sedeWashington DC que promove os direitos humanos nas Américas, diz: "Estamos documentando as irregularidades no processo eleitoral e trabalhando com nossos parceiros na Venezuela. Está claro que as eleições não serão justas, nem livres, pois o governo já mostrounatureza autoritária", diz.
Esse receio aumentou na semana passada quando María Corina Machado,uma postagem no X (antigo Twitter), anunciou que seu chefesegurança, Milciades Avila, havia sido detido, na mais recenteuma sérieprisõesativistas e membros da oposição.
Apesar disso, ela acrescentou: "O aspecto mais valioso é que a população venezuelana permanece comprometida com a via eleitoral e com a buscauma solução pacífica e democrática para a crise política".
Maduro, porvez, afirmou que o sistema eleitoral da Venezuela é "o mais transparente do mundo" e acusou a oposiçãolevantar suspeitasfraude para criar caos.
"(A oposição) quer semear uma hecatombe, uma tragédia, para gritar: 'suspensão das eleições'. E daí os gringos virão, virá o maldito Milei (presidente da Argentina), virá o Noboa (presidente do Equador), virá a direita dizendo: 'suspendam as eleições'", disse.
"Mesmo se houver chuva, trovões e relâmpagos, no dia 28julho haverá eleições na Venezuela, e ninguém vai sabotá-las", acrescentou.
Um estudo recente, realizado pelo CentroEstudos Políticos eGoverno da Universidade Católicas Andrés Bello,Caracas, na Venezuela, mostrou que 85% da população venezuelana deseja uma mudança no governo.
Apesarpossuir as maiores reservaspetróleo do mundo, a má gestão e as sanções dos EUA mergulharam o paísuma das piores emergências humanitárias testemunhadas foraum contextoguerra, deixando cerca19 milhõespessoas necessitandoajuda.
A escassez generalizadaalimentos, medicamentos e habitação adequada também levou milhões a fugir do país.
A Venezuela tem experimentado um dos declínios mais rápidos na democraciatodo o mundo nos últimos anos, posicionando-se entre os 25 piores nesse quesito segundo o ranking Global State of Democracy realizado pelo Instituto Internacional para a Democracia e Assistência Eleitoral (International IDEA), uma organização intergovernamental que apoia a democraciatodo o mundo.
5. O que pode acontecer?
Especialistas consultados pela BBC News Brasil afirmam que é difícil prever o que pode acontecer. Entre as questões levantadas, estão: Maduro pode vencer as eleições sem fraude? Haverá protestos contra os resultados? Ele aceitaria uma possível derrota? Em caso afirmativo, como será feita a transiçãopoder? Os militares vão intervir? Qual será o papeloutros países?
Em meio a tanta indefinição, há uma certeza: a participação popular será crucial nessas eleições, segundo eles.
"É muito mais difícil fraudar uma eleição quando a diferençavotos é grande. Além disso, a presençaobservadores nacionais e internacionais, bem como a atenção da comunidade internacional, é crucial", diz Dib, da WOLA.
Gunson acrescenta: "O governo ainda acredita que pode vencer, conseguindo 6 milhõesvotos a seu favor e impedindo que a oposição alcance um número semelhantevotos".
No entanto, diferentemente das eleições passadas, caso Maduro fraude as eleições ou não aceite a derrota, isso aconteceria sob grande risco pessoal para ele, acreditam os especialistas.
"Acredito ser importante considerar quais são os custospermanência para Maduro no poder", diz Dib.
"Neste cenário,que Maduro precisalegitimidade e o país enfrenta crise humanitária e econômica, é importante considerar se o chavismo também precisa se adaptar para manter algum poder", acrescenta.
Segundo Gunson, do Crisis Group, o pior cenário para Maduro seria "uma divisão interna no chavismo", onde uma parte da coalizão aceita negociar e reconhecer a vitória da oposição, enquanto a outra prefere resistir.
"No casouma vitória clara e esmagadora da oposição ratificada pelos monitores eleitorais, com as multidões indo às ruas, seria altamente arriscado para Maduro tentar permanecer no poder", diz à BBC News Brasil Mark Feierstein, consultor sênior do Programa América Latina do think tank United States Institute of Peace, sediadoWashington DC.
"Será que as forças armadas reprimiriam manifestantesum presidente rejeitado? E os aliadosMaduro aceitariam sanções e a ira popular por um líder repudiado?", questiona.
Os especialistas acreditam que, mesmouma eventual vitória da oposição e com a aceitação da derrota por Maduro, a transiçãopoder será difícil.
"O mais provável é que uma transição seja uma negociação longa e complicada, na qual Maduro pode realmente desviar ou sequestrar o processo", diz Ryan Berg, diretor do ProgramaAméricas do CentroEstudos Estratégicos e Internacionais, think tank com sedeWashington, D. C.
"Mesmouma situaçãoque o regime admita a derrota e entrenegociações, todos os detalhes dessa negociação são importantes"
"O cenário menos provável é uma verdadeira transiçãopoder com Maria Corina Machado ou Edmundo González Urrutia assumindo cargos importantes. Isso exigiria uma fratura significativa no regime, intervenção militar ou um movimentoprotesto difícilreprimir", acrescenta.
Gunson, da Crisis Group, lembra ainda que Maduro ainda governará a Venezuela até janeiro2025.
"Maduro ainda será presidente e controlará todas as instituições principais, incluindo o parlamento, o Supremo Tribunal e as forças armadas. Mesmo enfraquecido internamente, ele poderá dificultar, se não impedir, a posseEdmundo González e o governo do país".
"Uma transição para uma política mais normal exigirá negociações extensas entre os dois lados."
6. Que papéis outros países podem desempenhar?
Especialistas destacaram a importância do papelpaíses da região, como Brasil e Colômbia, além dos Estados Unidos, nas eleições e na eventual transiçãopoder, caso a oposição vença.
"Não há árbitro neutro, e o Supremo Tribunal e a autoridade eleitoral estão nas mãos do governo. Isso destaca a importância da comunidade internacional, especialmente os países da região que desejam uma Venezuela democrática", diz Gunson, da Crisis Group.
"O Brasil, com a intervenção pessoal do presidente Lula, e a Colômbia têm desempenhado papéis cruciais. Sem essas intervenções, a oposição, como Edmundo González, talvez não estivesse participando, e a situação poderia ser semelhante à2018", acrescenta.
Nesta semana, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva expressoupreocupação com a retórica do presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, e solicitou respeito pelo processo democrático e pelo resultado das eleições presidenciais no país.
"Fiquei assustado com a declaração do Maduro dizendo que, se ele perder as eleições, vai ter um banhosangue. Quem perde as eleições toma um banhovoto. O Maduro tem que aprender, quando você ganha, você fica; quando você perde, você vai embora", disse Lula,entrevista a agênciasnotícias internacionais no Palácio da Alvorada.
Gunson espera que, se Maduro "tentar rejeitar a vitória da oposição ou assumir o poder ditatorial", "Colômbia e Brasil se oponham e exerçam pressão significativa sobre Maduro para reconhecer o resultado”, observando que não prevê “um rompimento das relações diplomáticas" mesmo que esse cenário venha a se concretizar.
Feierstein acredita que os EUA também terão um papel a desempenhar "no avançouma transição democrática", caso Maduro aceite a derrota.
Segundo ele, o governo Biden poderia suspender a recompensaUS$ 15 milhões (R$ 84 milhões) pela capturaMaduro, que ainda está ativa, ou, mais importante, retirar a acusaçãotráficodrogas contra o líder venezuelano e outros altos funcionários do governo.
Para Gunson, "uma recuperação completa da Venezuela só será possível se o resultado da eleição for reconhecido internacionalmente e se houver uma restauração da normalidade, começando com a suspensão das sanções".
"Além disso, o governo precisará mudar significativamenteabordagemrelação às políticas econômicas e sociais e restaurar o EstadoDireito", completa.