5 fatores que explicam as raízes históricas da crise permanente que afeta o Haiti:f12 bet sinais
1. Instabilidade política
O Haiti sofre com a instabilidade política desde af12 bet sinaisindependência,f12 bet sinais1804.
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Seu primeiro governante, Jean-Jacques Dessalines (1758-1806), proibiu a escravidão, mas concentrou todo o poderf12 bet sinaissi próprio, ao se declarar governador-geral vitalício do país. E, poucos meses depois, ele se autonomeou imperador Jacques 1º.
Ele foi assassinado – um destino que foi seguido por diversos líderes haitianos – ef12 bet sinaissucessão levou a uma guerra civil.
O século 19 presenciou uma sucessãof12 bet sinaisgovernantes, muitos deles vitalícios. Mas seu poder durava poucos anos e eles acabavam derrubados por revoltas, assassinados ou exilados.
A influência alemã no país crescia cada vez mais, causando preocupação nos Estados Unidos. Por isso e para proteger seus interesses na região, os americanos invadiram o Haitif12 bet sinais1915.
Eles só saíramf12 bet sinais1943, depois que conseguiram alterar a legislação haitiana. Passou a ser permitida, por exemplo, a compraf12 bet sinaisterrenos por estrangeiros, o que intensificou a influência das empresas norte-americanas na economia e na política do Haiti.
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A segunda metade do século 20 foi marcada pelos violentos governosf12 bet sinaisFrançois "Papa Doc" Duvalier (1907-1971) e seu filho, Jean-Claude "Baby Doc" (1951-2014).
A ditadura dos Duvalier durou 29 anos. Nesse período, a corrupção esvaziou os cofres do país e a repressão policial resultouf12 bet sinaiscercaf12 bet sinais30 mil mortos ou desaparecidos.
Depoisf12 bet sinaisum golpe militar fracassadof12 bet sinais1958, François Duvalier tentou enganar as forças armadas criando uma milícia pessoal, os tontons macoutes (expressão equivalente ao "homem do saco", no idioma crioulo falado no Haiti). Sua função era aterrorizar a população, proteger o governante e perseguir seus opositores.
Seu filho Jean-Claude Duvalier se manteve no poder até que uma rebelião o obrigou a se exilar na França,f12 bet sinais1986.
Em 1990, depoisf12 bet sinaisvários golpesf12 bet sinaisEstado, o Haiti escolheu seu primeiro presidente democraticamente eleito: o ex-sacerdote Jean-Bertrand Aristide.
Alçado ao poder pelos menos favorecidos, Aristide cumpriu apenas sete mesesf12 bet sinaismandato. Ele foi derrubado por outro golpe militar e precisou seguir para o exílio.
Aristide conseguiu voltar ao Haitif12 bet sinais1994, graças a uma intervenção militar norte-americana. Ao chegar, ele dissolveu o exército.
Dois anos depois, René Préval ganhou as eleições e sucedeu Aristide na presidência. O ex-sacerdote seria eleito presidente mais uma vezf12 bet sinaisnovembrof12 bet sinais2000.
Mas, depoisf12 bet sinaiscontínuas crises políticas e econômicas, Aristide foi obrigado a se retirarf12 bet sinais2004, quando a oposição se tornou cada vez mais violenta.
Houve acusaçõesf12 bet sinaisfraude eleitoral, mortes extrajudiciais, tortura e brutalidade. No mesmo ano, as Nações Unidas enviaram uma missãof12 bet sinaispaz para o Haiti, que passou 13 anos no país.
Préval voltou a ganhar as eleiçõesf12 bet sinais2006 e conseguiu terminar seu mandatof12 bet sinaiscinco anos. Mas o terrível terremotof12 bet sinais2010 devastou grande parte do país, exacerbando os problemas políticos, econômicos e sociais do Haiti.
Depois do governo do presidente Michel Martelly, o empresário Jovenel Moïse ganhou as eleiçõesf12 bet sinais2016. Seu mandato foi marcado por protestos contra o governo, frequentemente violentos, e pelas acusaçõesf12 bet sinaiscorrupção.
No dia 7f12 bet sinaisjulhof12 bet sinais2021, Moïse foi assassinado a tiros por um grupof12 bet sinaismercenários colombianos, naf12 bet sinaiscasa, perto da capital haitiana, Porto Príncipe. Até hoje, não se conseguiu descobrir quem ordenou o assassinato do presidente.
Sua morte deixou um vaziof12 bet sinaispoder e grupos armados tomaram o controlef12 bet sinaisgrande parte do país.
Seu ex-primeiro-ministro, Ariel Henry, assumiu o poderf12 bet sinaisforma interina, mas o recrudescimento dos protestos o obrigou a renunciar na segunda-feira (11/3).
Com isso, o Haiti não tem governante no momento.
2. Violência extrema
O Haiti está mergulhado na violência,f12 bet sinaisgrande parte, devido às cercaf12 bet sinais200 gangues que controlam grandes regiões do país, especialmentef12 bet sinaisPorto Príncipe.
Dados das Nações Unidas indicam que a violência já deslocou internamente quase 314 mil pessoas.
Desde os brutais tontons macoutes criados por "Papa Doc"f12 bet sinais1958, as facções criminosas só aumentaramf12 bet sinaispresença, especialmente nos momentosf12 bet sinaisvaziof12 bet sinaispoder.
Quando Aristide eliminou o exército, que era marcado pela corrupção, o Estado perdeuf12 bet sinaiscapacidadef12 bet sinaislutar contra o crime organizado.
Os narcotraficantes haitianos trabalhavam então estreitamente com o cartelf12 bet sinaisMedellín, na Colômbia, segundo um dos diretores do Centrof12 bet sinaisEstudos Latino-Americanos e Caribenhos da Universidadef12 bet sinaisEssex, no Reino Unido, Nicolas Forsans.
O Haiti funcionava como intermediário do tráficof12 bet sinaisdrogas da Colômbia para os Estados Unidos. Isso corrompeu muitos funcionários e policiais "e se tornou uma fontef12 bet sinaisrenda pouco conhecida, mas considerável, para as elites políticas e empresariais do Haiti, que ofereciam proteção e apoio logístico aos narcotraficantes", explica Forsans no sitef12 bet sinaisnotícias acadêmicas The Conversation.
O terremotof12 bet sinais2010 permitiu que muitos chefesf12 bet sinaisfacções criminosas fugissem da prisão. Isso incentivou as gangues, que realizaram sequestros, ataques à polícia, aos meiosf12 bet sinaiscomunicação e a políticos. Elas transformaram o dia a diaf12 bet sinaismuitos haitianosf12 bet sinaisum inferno.
Atualmente, a maioria das gangues é afiliada a duas facções predominantes: a G-9 e Família, chefiada por Jimmy Chérizier, conhecido como "Barbecue", e a G-Pep, liderada por Gabriel Jean-Pierre.
Fundadaf12 bet sinais2020, a G-9 é vinculada ao Partido Haitiano Tèt Kale (PHTK),f12 bet sinaisMoïse e Henry. A organização supostamente angariou votos para o partido, segundo o portal especializado Insight Crime.
A gangue controla atividades econômicas fundamentais, como o porto da capital, terminais petrolíferos e os pontosf12 bet sinaisentrada e saídaf12 bet sinaisPorto Príncipe.
A G-Pep está sediadaf12 bet sinaisCité Soleil, o bairro mais pobre e mais povoado da capital. Ela é principalmente apoiada pelos opositores do PHTK, "embora não esteja claro até que ponto ela recebe apoio material ou financeiro desses opositores atualmente", destacava Insight Crimef12 bet sinaisum relatóriof12 bet sinaisdois anos atrás.
Estimativas da ONU indicam que o númerof12 bet sinaismortos pela violência das gangues duplicou no ano passado, superando a marcaf12 bet sinais5 mil assassinatos.
A polícia conta com poucos recursos para enfrentá-las e muitos agentes abandonaram a força policial no último ano, segundo um relatório das Nações Unidas.
Atualmente, existe no Haiti 1,3 policial para cada 1 mil habitantes. O padrão internacional éf12 bet sinais2,2.
Além disso, a violência se estendeu das cidades para a zona rural. E, para o secretário-geral da ONU, António Guterres, este é "mais um motivo sériof12 bet sinaisalarme".
3. Dívida e intervenção estrangeira
O Haiti foi o primeiro país latino-americano a declarar independência. É a república negra mais antiga do mundo e a segunda república mais antiga do hemisfério ocidental, atrás apenas dos Estados Unidos.
A rebelião iniciada pelas pessoas escravizadasf12 bet sinais1791 contra os colonizadores franceses culminou com a declaraçãof12 bet sinaisindependência do Haiti,f12 bet sinais1804.
Mas a liberdade teve um preço. A luta pela libertação do domínio francês destruiu a maior parte das plantações e da infraestrutura do país, deixando o Haitif12 bet sinaisgraves dificuldades econômicas.
Nenhum país quis reconhecer diplomaticamente o Haiti, até que a França concordou com o reconhecimento da independênciaf12 bet sinais1825. Mas não sem condições: o novo país deveria pagar reparações pelas fazendas perdidas e pelas pessoas escravizadas que foram libertadas. Caso contrário, iria enfrentar uma guerra.
Foi assim que o Haiti se comprometeu a pagar uma indenizaçãof12 bet sinais150 milhõesf12 bet sinaisfrancos (cercaf12 bet sinaisUS$ 21 bilhõesf12 bet sinaisvaloresf12 bet sinaishoje, ou R$ 104,6 bilhões),f12 bet sinaiscinco parcelas.
Mas a receita anual do governo haitiano representava apenas 10% do valor exigido pela França,f12 bet sinaisforma que o país não contava com os fundos necessários para fazer os pagamentos. Para isso, o Haiti precisava pedir um empréstimo.
A antiga metrópole concordou, desde que fosse contratado junto a um banco francês. E assim começou formalmente o que é conhecido como a dívida da Independência.
As comissões draconianas impostas pelo banco Crédit Industriel et Commercial (hoje, CIC) fizeram com que o novo país passasse a ter duas dívidas: a já contratada com a França e outra, com o banco francês.
O Haiti precisou pedir enormes empréstimos a bancos norte-americanos, franceses e alemães, com taxasf12 bet sinaisjuros exorbitantes. O país foi obrigado a destinar a maior parte do orçamento nacional ao pagamento da dívida.
O Haiti só terminouf12 bet sinaiscompensar os donos das plantações da colônia francesaf12 bet sinais1947. Mas a França não foi o único país que ocupou e esvaziou os cofres daquela que, um dia, foi a pérola das Antilhas.
Em 1915, 330 fuzileiros navais dos Estados Unidos desembarcaramf12 bet sinaisPorto Príncipe para defender os interesses das empresas norte-americanas no país, tomado pela instabilidade política. E esta primeira incursão foi seguida por outra ainda maior.
Os Estados Unidos assumiram o controle da alfândega e das principais instituições econômicas do Haiti, como os bancos e o tesouro nacional – que foi praticamente esvaziado para pagar as dívidas com as empresas norte-americanas.
Em 1922, Washington obrigou o Haiti a tomar empréstimosf12 bet sinaisWall Street, o que deixou o país afogadof12 bet sinaisnovas dívidas. A ocupação americana durou até 1943, mas o controle financeiro do país se prolongou por décadas.
4. Pobreza
Toda essa instabilidade política, aliada à violência e à espoliação financeira, trouxe consequências evidentes ao país e seus habitantes. O Haiti, hoje, é o país mais pobre da América Latina e do Caribe – e um dos mais pobres do mundo.
Seu PIB per capita,f12 bet sinaisparidade do poderf12 bet sinaiscompra, foif12 bet sinaisapenas US$ 3.306 (cercaf12 bet sinaisR$ 16,5 mil)f12 bet sinais2022, segundo o Banco Mundial. E este número não considera a desigualdadef12 bet sinaisrenda entre seus habitantes.
Em termos comparativos, o PIB per capita médio da América Latina e do Caribe no mesmo período foif12 bet sinaisUS$ 19.269 (cercaf12 bet sinaisR$ 95,9 mil).
O Haiti também ocupa o 163º lugar no Índicef12 bet sinaisDesenvolvimento Humano calculado pela ONU,f12 bet sinaisum totalf12 bet sinais191 países.
Mais da metade daf12 bet sinaispopulação vive abaixo do limite da pobreza. A estimativaf12 bet sinaisvida éf12 bet sinaispouco maisf12 bet sinais64 anos, principalmente devido às péssimas condiçõesf12 bet sinaisvidaf12 bet sinaisgrande parte do país e à fragilidade do seu sistemaf12 bet sinaissaúde.
A fome e a desnutrição também atingiram níveis sem precedentes, com efeitos potencialmente mortais, segundo as Nações Unidas.
Em 2023, três milhõesf12 bet sinaiscrianças – o maior número já registrado – precisavamf12 bet sinaisajuda humanitária no Haiti. Quase umaf12 bet sinaiscada três crianças sofre desnutrição crônica no país.
A situação é particularmente grave nos bairros assolados pela violência. Um exemplo é Cité Soleil,f12 bet sinaisPorto Príncipe, que mantém um triste recorde: aquele foi, por anos, o bairro mais pobre da capital mais pobre do país mais pobre do continente americano.
As péssimas condições sanitárias enfrentadas por grande parte da população haitiana também fazem com que algumas doenças transmissíveis causem graves danos.
O país tem, por exemplo, uma das taxasf12 bet sinaisincidênciaf12 bet sinaistuberculose mais altas da região. A cólera causou cercaf12 bet sinais10 mil mortes após o terremoto que devastou o paísf12 bet sinais2010 e, agora, voltou a surgirf12 bet sinaisalguns pontos do Haiti.
E 1,7% da população adulta é portadora do vírus HIV, segundo os números do Programa Conjunto das Nações Unidas sobre o HIV/AIDS (UNAIDS).
Some-se ainda que cercaf12 bet sinais40% da população éf12 bet sinaisanalfabetos, segundo dados do Banco Mundial – e apenas a metade das crianças frequenta a escola, pelos números do Unicef.
Com um Estado debilitado e sacudido por desastres naturais periódicos, o país tem infraestrutura extremamente pobre.
Todas estas razões fizeram do Haiti um país seriamente dependente da ajuda internacional. Calcula-se que, entre 2011 e 2021, o país caribenho tenha recebido pelo menos US$ 13 bilhões (cercaf12 bet sinaisR$ 64,7 bilhões)f12 bet sinaisauxílio.
Ainda assim, o Haiti continua sendo um país pobre,f12 bet sinaisparte, porque esta dependência internacional substituiu o Estado, que deixouf12 bet sinaisestar presente entre a população. É o que afirmam economistas como Jake Johnston, do think tank Centrof12 bet sinaisPesquisa Econômica e Política, com sede nos Estados Unidos.
"Nos últimos 30 e poucos anos, observamos a terceirização do Estado haitiano", declarou Johnston ao jornalista Ronald Ávila-Claudio, da BBC News Mundo.
"Mesmo antes do terremotof12 bet sinais2010, 80% dos serviços públicos no Haiti tinham controladores privados, sejam eles organizações sem fins lucrativos, igrejas, bancosf12 bet sinaisdesenvolvimento ou o setor privado, mas não o Estado."
5. Desastres naturais
O Haiti é especialmente vulnerável aos desastres naturais devido àf12 bet sinaisprópria geografia.
O país se encontra no caminho dos furacões do Oceano Atlântico e repousa sobre duas falhas geológicas que o tornam um território com alta atividade sísmica. Mas algumas das piores consequências desses desastres naturais foram agravadas pela mão humana.
A pobreza e o quase desaparecimento do Estado propiciaram o desmatamento e a degradação ambiental, que multiplica o efeito dos furacões. Paralelamente, a precariedade das construções faz com que o númerof12 bet sinaisvítimas e destroços dos terremotos seja muito maior.
Dos quase 12 milhõesf12 bet sinaishabitantes do Haiti, 96% estão expostos a este tipof12 bet sinaisdesastre.
O Haiti fica no extremo ocidental da ilhaf12 bet sinaisLa Hispaniola, dividida entre o país e a República Dominicana. Seu terreno é acidentado, marcado pelos vales e a maior parte da população está concentrada no litoral.
O Banco Mundial calcula que 98% das suas florestas tenham sido derrubadas, principalmente para a produçãof12 bet sinaislenha e carvão. Isso causou a erosão do solo e forte escassezf12 bet sinaiságua potável.
A erosão do solo não afeta apenas a agricultura. Ela torna o Haiti ainda mais vulnerável aos furacões e tempestades tropicais que atingem periodicamente o país, causando graves inundações e deslizamentosf12 bet sinaisterra.
Em 2016, por exemplo, a passagem do furacão Matthew causou danosf12 bet sinaismaisf12 bet sinais32% do Produto Interno Bruto (PIB) do país.
O Haiti também está localizadof12 bet sinaismeio a um vasto sistemaf12 bet sinaisfalhas geológicas, resultantes da movimentação da placa do Caribe e da enorme placa da América do Norte. A Falhaf12 bet sinaisEnriquillo-Plantain Garden atravessa todo o sul do país, enquanto a Falha Setentrional Oeste percorre o norte.
Elas provocaram alguns dos terremotos mais devastadores dos últimos tempos, como of12 bet sinaismagnitude 7 que sacudiu o paísf12 bet sinais2010. Nele, morreram 250 mil pessoas e, segundo o Banco Mundial, foi destruído o equivalente a 120% do PIB do Haiti.
Em outros países do mundo, como o Chile e o Japão, ocorrem terremotosf12 bet sinaismagnitude similar ou até superior, sem produzir o mesmo númerof12 bet sinaisvítimas. Mas as estruturasf12 bet sinaisconcreto simples das cidades haitianas, sem nenhum amortecimento, desmoronaram como um castelof12 bet sinaiscartas.
Em 2021, a natureza atacouf12 bet sinaisduas frentes. Um terremotof12 bet sinaismagnitude 7,2 matou cercaf12 bet sinais2 mil pessoas e destruiu 30% da península ao sul do país. Poucos dias depois, a tempestade tropical Grace exacerbou a situação, causando inundações e deslizamentosf12 bet sinaisterra.
E os especialistas advertem que as consequências da crise climática só irão piorar a situação desse país já flagelado por inúmeros males.