O polêmico 'muro' que divide dois paísessimulator pokerilha no Caribe:simulator poker
"A República Dominicana não pode assumir a crise política e econômica daquele país (Haiti) ou resolver o restosimulator pokerseus problemas", disse Abinadersimulator pokerum ato com forte simbolismo patrióticosimulator pokerque o hino nacional foi cantado vigorosamente a poucos metros do Haiti, o país mais pobre das Américas.
Segundo os últimos dados do Banco Mundial e do governo dominicano, 60% da população haitiana vive na pobreza, contra 24% na dominicana. A pobreza extrema chega a 24% no Haiti enquanto ésimulator poker3,5% do outro lado da fronteira.
54 quilômetros
Os primeiros metros da cerca já podem ser vistossimulator pokerDajabón, no noroeste da República Dominicana, um dos principais pontossimulator pokerfronteira com o Haiti.
Oito dias após o início da construção, a BBC News Mundo, serviçosimulator pokerespanhol da BBC, visitou o local. O trabalho havia sido interrompido. Apenas uma escavadeira permaneceu com o motor ligado. Dois soldados entediados guardavam a área. Vacas mugiam e lixo plástico foi armazenado no terreno ao lado.
A poucos passos do muro e do lugarsimulator pokeronde Abinader discursou, algumas crianças haitianas tomavam banho e algumas mulheres lavavam suas roupas no rio Masacre, cuja escassa correntesimulator pokerágua forma uma fronteira flexível entre os dois países.
O muro promete ser muito mais firme.
Em uma primeira fase, com conclusão prevista para o primeiro semestre deste ano, segundo o governo dominicano, serão construídos 54 quilômetrossimulator pokerbetão armado e estrutura metálica, como o traçadosimulator pokerDajabón. Além disso, haverá 19 torressimulator pokervigia e 10 portõessimulator pokeracesso. O muro não vai cobrir toda a extensa fronteira territorial, mas se elevará acima das "áreas mais populosas e sensíveis".
Na segunda fase, que deve começar assim que a primeira estiver concluída, serão construídos mais 110 kmsimulator pokermuro, com um investimento totalsimulator pokercercasimulator pokerUS$ 30 milhões (R$ 145,1 milhões), segundo dados do governo.
"É um muro que vai beneficiar os dois países. Vai controlar o comércio bilateral, regular os fluxos migratórios para combater as máfias que traficam pessoas, alémsimulator pokerlidar com o narcotráfico e a venda ilegalsimulator pokerarmas, e proteger a criação e as colheitassimulator pokerpecuaristas e produtores agrícolas", disse Abinader.
'Não gosto do muro'
Nenhum membro do governo haitiano esteve presente no atosimulator poker20simulator pokerfevereiro. Também não comentou a construção do muro, erguidosimulator pokersolo dominicano.
O Haiti tem um governo interino desde que o presidente Jovenel Moise foi assassinado,simulator pokerjulho do ano passado. As eleições para um novo presidente foram adiadas devido ao elevado nívelsimulator pokerviolência no país, segundo o atual Poder Executivo chefiado por Ariel Henry.
A crise econômicasimulator pokercurso no Haiti, os desastres naturais e os conflitos políticos historicamente fizeram com que muitos haitianos buscassem uma vida melhor, ou pelo menos uma maneirasimulator pokerganhar dinheiro, no país com o qual compartilham a ilha.
Uma dessas pessoas é Novilia, uma haitiana que mora na República Dominicana. Ela vive uma casa feitasimulator pokerchapa e pisosimulator pokerareia, a poucos metros da primeira vala da cerca que Abinader inaugurou.
"Os haitianos fazem negócios com os dominicanos aqui. Por que temos que erguer um muro? Não temos presidente no Haiti e as coisas estão difíceis", diz a mulher, que está no país vizinho há 12 anos.
"Eu não gosto (do muro), é ruim para os negócios, todo mundo tem dificuldade, todo mundo está procurando alguma coisa aqui (na Dominicana)... Não é bom", diz, ao ladosimulator pokerum vizinho e amigo, também haitiano. O rapaz afirma ser capazsimulator pokerlimpar três casas dominicanassimulator pokeruma única manhã.
Como centenassimulator pokerhaitianossimulator pokerDajabón e milharessimulator pokertoda a República Dominicana, a dupla reflete os laços econômicos que unem os dois povos, especialmente ao longo da fronteira.
De acordo com a última Pesquisa Nacionalsimulator pokerImigrantes na República Dominicana,simulator poker2017 havia meio milhãosimulator pokerhaitianos no país, representando 87% da população estrangeira. Mas, cinco anos depois e com o acirramento dos problemas no Haiti, especialistas dizem que esse contingentesimulator pokerimigrantes pode ser 25% maior.
Esses haitianos são fundamentais para a economia dominicana, a segunda que mais cresceu na América Latina e no Caribe na última década. Estima-se que 80% da forçasimulator pokertrabalho nos setores agrícola esimulator pokerconstrução civil na República Dominicana seja haitiana.
Em 2021, o Haiti foi o terceiro maior destino das exportações dominicanas depois da Suíça e dos Estados Unidos, segundo dados da Direção Geralsimulator pokerAlfândegas.
Mas a balança comercial é extremamente favorável à República Dominicana, algosimulator pokerque se queixa o Haiti, que pede mais ajuda financeira para exportar rum, cerveja e tabaco, sobretudo, para o outro lado da fronteira.
Em 2021, a República Dominicana gastou US$ 4 milhões (cercasimulator pokerR$ 20 milhões)simulator pokerimportaçõessimulator pokerprodutos haitianos. Por outro lado, exportou US$ 500 milhões (R$ 2,5 bilhões)simulator pokerprodutos nacionais ao país vizinho.
Necessidade mútua
Para além da economia, a relação entre haitianos e dominicanos acontecesimulator pokerum nível mais modesto na fronteira.
"O dominicano precisa do haitiano, o haitiano precisa do dominicano", resume Novilia emsimulator pokerhumilde casa.
Apesar dessa realidade ser aceita por quase todos na ilha, muitos haitianos enfrentam problemas para regularizarsimulator pokersituação imigratória e, às vezes, convivem com hostilidadesimulator pokerseus vizinhos do leste.
Em um pasto com dezenassimulator pokergados, Ernesto Alfonso Martínez Peña destaca a necessidade mútuasimulator pokerambos os lados da linha.
"O presidente (Abinader) deve canalizar legalmente quem vem trabalhar na fazenda. Se os haitianos não vierem, a produçãosimulator pokerleite, a agricultura e a construção vão cair", diz Martínez, que é a favor do muro porque sofreu com roubossimulator pokergado - crime que ele atribui aos haitianos.
Um mercado sem muro
Ernesto Peña, o fazendeiro, não é o único que defende a construção do muro.
Santos tem 58 anos, é dominicano e dirige uma das milharessimulator pokerbarracas do Mercado Binacionalsimulator pokerDajabón, que abre todas as segundas e quintas-feiras para reunir comerciantes dos dois lados da fronteira.
Às 8h da manhã, a ponte sobre o rio Masacre se enchesimulator pokerhaitianos que, carregando fardossimulator pokermercadorias nos ombros, cruzam o local e correm diante do olhar vigilante e às vezes ameaçadorsimulator pokersoldados dominicanos armados e vestidos com ternosimulator pokercampanha marrom-claro.
"Há muito tempo somos invadidos. Há mais haitianos aqui do que no Haiti", exagera Santos, que vende molhos e conservas no mercado.
"Quem tem trabalho aqui são os haitianos. É ruim para nós. O que podemos ganhar está sendo ganho por eles", reclama.
No entanto, ele também admite que "viver junto é bom".
"É isso que você vive na fronteira: negócios com haitianos", ele nos conta.
Ela dividesimulator pokerbarraca no mercado - onde a música alta esconde o burburinho das compras e vendas na fronteira - com um amigo haitiano, que troca dinheiro.
Santos é uma das muitas pessoas na fronteira que se beneficiam do comércio com os haitianos, mas ao mesmo tempo se distanciam deles.
A acadêmica britânica Bridget Wooding, pesquisadora da imigração haitiana na República Dominicana, resume essa forma do dominicanosimulator pokerse relacionar com o vizinho, que oscila entre a convivência e o repúdio. "Os haitianos são necessários, mas indesejados", diz.
Outras paredes
Wooding vê o muro como um elemento "extremo" na dura história dominicanasimulator pokerrelação aos haitianos, emsimulator pokermaioria negros. Essa história remonta aos tempos do ditador Rafael Leónidas Trujillo (1930-1961) e seu projeto do branqueamento da sociedade dominicana.
Mais recentemente, continuou com a polêmica decisãosimulator poker2013 que "desnacionalizou" maissimulator poker130 mil dominicanossimulator pokerascendência haitiana.
O Tribunal Constitucional dominicano entendeu que pessoas nascidas no país desde 1929 e cujos pais estrangeiros não tivessem personalidade jurídica não correspondiam à nacionalidade dominicana.
Em maiosimulator poker2014, o Congresso dominicano aprovou uma leisimulator pokernaturalizaçãosimulator pokerresposta a essa decisão que causou críticas internacionais. No finalsimulator poker2013, também foi decretado um planosimulator pokerregularização para estrangeiros.
Mas nada disso gerou processos eficazes ou simples para milharessimulator pokerhaitianos e descendentes nascidos na República Dominicana.
"Eles tiveram que se registrar como estrangeiros no país onde nasceram e, depoissimulator pokerdois anos, naturalizar-se como dominicanos", explica Wooding, que conhece os trâmites burocráticos.
Uma dessas pessoas é Zuleica Jiménez.
Ela mora com o marido Rafael e seus filhos na comunidade ruralsimulator pokerPinzón, pertosimulator pokerComendador, na província dominicanasimulator pokerElías Piña, centro do país.
Seus pais haitianos foram documentados na República Dominicana, onde ela nasceu. Zuleica, no entanto, nunca foi registrada e agora não possui os documentos que comprovemsimulator pokernacionalidade.
"Nasci e crescisimulator pokerElías Piña, mas não tenho documentos e me sinto mal porque tenho meus filhos sem declarar", diz Zuleica, ao lado do marido, emsimulator pokerprecária casa à beirasimulator pokeruma estradasimulator pokerterra, a poucos metros da fronteira - áreasimulator pokerque Haiti e República Dominicana se misturam até se fundirem.
Após a leisimulator poker2014, Zuleica tentou regularizarsimulator pokersituação. "Gastei muito dinheiro com issosimulator pokervão... Depoissimulator pokerlevar os papéis para Santo Domingo (capital dominicana), nada aconteceu."
Ela é a favor do muro, mas preferiria que o governosimulator pokerseu país, que não a reconhece e a mantém apátrida, gastasse o dinheirosimulator pokerforma diferente.
"Estou mais interessadosimulator pokergastá-lo no processo. O muro é importante, mas estou interessado no processo."
Por que agora?
Em 2019, o então presidente Danilo Medina já havia construído alguns quilômetrossimulator pokerum muro na provínciasimulator pokerElías Piña, que agora será superado pela moderna cerca tecnológica.
Mas Abinader, eleitosimulator pokerjulhosimulator poker2020, foi mais longe ao apostar no muro como nenhum político local havia feito.
A Presidência e os ministérios da Defesa esimulator pokerRelações Exteriores não responderam aos inúmeros pedidossimulator pokerentrevistas da BBC News Mundo para falar sobre o muro e os processossimulator pokerregularização como osimulator pokerZuleica Jiménez, bem como sobre as recentes deportaçõessimulator pokermulheres grávidas haitianas.
Bridget Wooding, diretora do Centrosimulator pokerPesquisa Aplicadasimulator pokerDinâmica Migratorias (Obmica), afirma que o "muro perimetral faz partesimulator pokerum projeto que tenta mostrar o haitiano como um invasor".
"Há muito preconceito contra um grupo étnico e seus descendentes, os haitianos, devido às complexidades da história sociocultural", diz.
O sociólogo dominicano Juan Carlos Pérez, professor da Universidade Autônomasimulator pokerSanto Domingo e graduado pelo Institutosimulator pokerEstudos Políticossimulator pokerParis, argumenta que há um sentimento anti-hiatiano entre parte da elite dominicana.
"Os políticos tentam ganhar o apoio do voto usando um discurso que divide para que os daqui se sintam protegidos dossimulator pokerlá. É uma formasimulator pokerdesviar a atenção dos problemas reaissimulator pokerum país, usando uma população migrante como causador do mal", afirma.
E ele alerta para as consequências do novo.
"Nenhuma políticasimulator pokerboa vizinhança pode ser promovida a partir da política do muro. Isso tem um efeito simbólicosimulator pokeragressão, violência e maus-tratos à população que vive do outro lado."
O muro econômico
Essa opinião é compartilhada por Lesly Theogene, diretor do Ministério do Comércio e Indústria do Haiti, que prefere falar como cidadão e não como membro do governo interino.
"Achamos que Abinader poderia construir um muro econômico, não um muro eletrificado que vai causar mortes", diz ele, sobre a ponte que liga os dois paísessimulator pokerDajabón, a cidade fronteiriça onde começa o muro e que reflete as tensões, mas sobretudo os laçossimulator pokerbenefício mútuo entre os dois povos.
Santiago Riverón, prefeito da cidade fronteiriça dominicana, concorda com ele.
"Um muro não vai separar esses dois países. Bem ou mal, estamos condenados a viver juntos, eles no país deles e nós no nosso."
Riverón,simulator pokerchapéu e voz grossa, faz parte do partido do presidente Abinader.
No entanto, ele não concorda que a cerca vai parar a imigração ilegal e diz que o que é necessário é "um muro econômico", ou seja, um projetosimulator pokerdesenvolvimento empresarial que beneficie os dois países e que torne desnecessária a migração.
Ele cita como exemplo a zona franca, que no meio da fronteirasimulator pokerDajabón emprega 18 mil trabalhadores haitianos e da qual dependem cercasimulator poker40 mil pessoas na área.
"Essas pessoas que estão trabalhando lá nunca vão deixarsimulator pokerterra natal."
Jocelin é um dos haitianos que deixaram o país — ele tinha 12 anos. Como ele, muitas crianças haitianas continuam a atravessar sozinhas a pontesimulator pokerDajabón para a República Dominicana todos os dias para trabalharsimulator pokerqualquer emprego.
"Passei fome no Haiti", recorda Jocelin, prestes a completar 18 anos,simulator pokerum centrosimulator pokeracolhimentosimulator pokerOuanaminthe, no lado haitiano da fronteira, onde se vê claramente o contraste com o lado dominicano: há poucas ruas pavimentadas, muito mais lixo nas ruas e faltasimulator pokersaneamento básico.
Jocelin engraxava sapatos no país vizinho. Ele acabousimulator pokerum orfanatosimulator pokerDajabón, onde hoje muitas crianças haitianas são vistas vagando sozinhas ousimulator pokergrupos, sem nenhum adulto. Elas se oferecem principalmente para engraxar sapatos, mas muitos são vítimassimulator pokertrabalho e exploração sexual.
De volta ao Haiti, no centrosimulator pokeracolhimento Lakay Jezy (A Casasimulator pokerJesus), Jocelin encontrou três refeições por dia, um luxo para muitas crianças haitianas, e a obrigaçãosimulator pokersair das ruas e voltar à escola.
Agora ele se tornou costureiro e quer ganhar a vida como alfaiate. Seus colegas adolescentes pedem para ele ajeitar seus jeans para que fiquem mais apertados e elegantes.
"Na República Dominicana há pessoas que nos tratam bem e outras que nos tratam mal", diz,simulator pokermaneira tímida.
"Quero trabalhar, ter independência pessoal, quero ficar no Haiti, amo o Haiti", diz quando questionado sobre o futuro.
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