A obscura religião antiga que influencia o mundo até hoje:
AntesZaratustra, os antigos persas veneravam divindades da antiga religião irano-ariana, homóloga à religião indo-ariana que, mais tarde, viria a ser conhecida como hinduísmo.
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Mas Zaratustra condenava aquela prática. Ele defendia que Deus – Ahura Mazda, o Senhor da Sabedoria – era o único a ser louvado.
Com isso, ele contribuiu não só para a grande divisão entre os iranianos e os indo-arianos, mas provavelmente apresentou à humanidadeprimeira religião monoteísta: o zoroastrismo.
A ideiaum só Deus não foi o único princípio essencialmente zoroástrico a se introduziroutras religiões importantes, especialmente as três maiores: Judaísmo, Cristianismo e Islamismo.
Os conceitoscéu e inferno, o dia do julgamento, a revelação final do mundo, os anjos e os demônios também se originaram nos ensinamentosZaratustra e no conjunto posteriorliteratura zoroástrica inspirado por ele. A própria ideiaSatanás é fundamentalmente zoroástrica.
Na verdade, toda a fé do zoroastrismo é baseada na luta entre Deus e as forças do bem e da luz (representadas pelo Espírito Santo, Spenta Manyu) e Ahriman, que dirige as forças do mal e das trevas.
Enquanto os homens precisam escolher o lado ao qual pertencem, a religião ensina que, no fim, Deus irá prevalecer e os próprios condenados ao fogo do inferno irão desfrutar das bênçãos do paraíso (que, aliás, é uma antiga palavra persa).
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Mas como as ideiasZoroastro chegaram às religiões abraâmicas e outras?
Estudiosos indicam que muitos desses conceitos foram apresentados aos judeus da Babilônia quando foram libertados pelo imperador persa Ciro, o Grande.
Eles se infiltraram nas correntes centrais do pensamento judeu, e surgiram figuras como Belzebu.
Após as conquistasterras gregas pelos persas durante o auge do Império Aquemênida (550-330 a.C.), a filosofia grega tomou um rumo diferente.
Os gregos acreditavam que os seres humanos têm pouca independência e que seu destino estaria à mercê dos seus diversos deuses, que frequentemente agiam conforme seus caprichos e fantasias.
Mas, depoisconhecerem a religião e a filosofia iraniana, os gregos começaram a sentir que eram os senhores dos seus destinos e que suas decisões estavamsuas próprias mãos.
O zoroastrismo já foi a religião oficial do Irã e também era amplamente praticadaoutras regiões habitadas pelos povos persas, como o Afeganistão, o Tajiquistão e grande parte da Ásia central.
Atualmente, o zoroastrismo é uma religião minoritária no Irã e reúne poucos fiéisoutras partes do mundo. Mas seu legado cultural é inegável.
Muitas tradições zoroástricas continuam a inspirar e caracterizar a cultura iraniana.
Fora do país,influência também é considerável, principalmente na Europa ocidental.
Rapsódia zoroástrica
Séculos antesDante Alighieri (1265-1321) escrever A Divina Comédia, o LivroArda Viraf descreveunumerosos detalhes uma viagem para o céu e o inferno.
Seria possível que Dante tivesse ouvido falar do relato do viajante cósmico zoroástrico, que assumiuforma final perto do século 10 a.C.?
A similaridade entre as duas obras é desconcertante, mas o que existe são apenas hipóteses.
Mas existem outros pontosque a "conexão" zoroástrica é menos incerta.
O profeta iraniano aparece segurando um globo brilhante no quadro EscolaAtenas, do pintor renascentista Rafael (1483-1520).
E o manuscrito alquímico Clavis Artis, publicado na Alemanha entre o final do século 17 e início do século 18, diz ser uma traduçãoum textoZoroastro.
Zoroastro "veio a ser considerado [na Europa cristã] um mestre da magia, filósofo e astrólogo, especialmente após o Renascimento", diz Ursula Sims-Williams, da EscolaEstudos Africanos e Orientais da UniversidadeLondres.
Hojedia, na Europa, a menção do nome Zadig traz imediatamente à mente a marcamoda francesa Zadig & Voltaire.
Suas roupas podem não ter origem zoroástrica, mas a história por trás do seu nome certamente remonta ao zoroastrismo.
Escritomeados do século 18 por ninguém menos que Voltaire (1694-1778), o romance Zadig, ou O Destino, conta a história do herói zoroástrico persa do mesmo nome que, após uma sérieadversidades e julgamentos, acaba se casando com uma princesa da Babilônia.
Às vezes irreverente e não baseado na história, o conto filosóficoVoltaire surgiu do seu real interesse pelo Irã, compartilhado por outros expoentes do iluminismo.
Da mesma forma, a coleçãopoemas Divã ocidento-orientalGoethe (1749-1832), dedicada ao poeta persa Hafez, apresenta um capítulo com temática zoroástrica, enquanto o escritor irlandês Thomas Moore (1779-1852) lamentava o destino dos zoroastristas iranianos no seu romance Lalla Rookh.
Não foi apenas na arte e na literatura ocidental que o zoroastrismo deixou amarca.
A antiga religião também fez uma sérieaparições musicaispalcos europeus.
Além do personagem sacerdote Sarastro, a ópera A Flauta Mágica,Mozart (1756-1791) é repletatemas zoroástricos, como a luz contra as sombras, julgamentos com fogo e água e a busca da sabedoria e do bem acimatudo.
Mais recentemente, o cantor e compositor Farrokh Bulsara – mais conhecido como Freddie Mercury (1946-1991) – tinha imenso orgulho das suas origens persas zoroástricas.
"Sempre andarei por aí como um papagaio persa", observou eleuma entrevista, "e ninguém vai me impedir, meu bem!"
Sua irmã Kashmira Cooke também refletiu sobre o papel do zoroastrismo na família,uma entrevista2014.
"Nós, enquanto família, temos muito orgulhosermos zoroastristas", disse ela.
"Acho que o que a fé zoroástrica [de Freddie] deu a ele foi o trabalho duro, perseverar, ir atrás dos seus sonhos."
Gelo e fogo
Mas, quando o assunto é música, o melhor exemplo da influência do legado do zoroastrismo ainda é o poema sinfônico Assim Falou Zaratustra,Richard Strauss (1864-1949), que formou a espinha dorsalgrande parte do filme 2001: Uma Odisseia no Espaço,Stanley Kubrick (1928-1999).
A obraStrauss deveinspiração ao livro mais importante do filósofo alemão Friedrich Nietzsche (1844-1900), que leva o mesmo nome.
O texto segue um profeta chamado Zaratustra, mas muitas das ideias propostas por Nietzsche, na verdade, contrariam o zoroastrismo.
O filósofo alemão rejeitava a dicotomia entre o bem e o mal, tão característica do zoroastrismo, e, por ser ateu, Nietzsche não via sentido no monoteísmo.
AlémFreddie Mercury e Zadig & Voltaire, existem outros exemplos claros da influência do zoroastrismo sobre a cultura popular contemporânea do Ocidente.
Ahura Mazda, o deusZaratustra, inspirou o nome para a companhia automobilística japonesa Mazda e serviuinspiração para a lendaAzor Ahai (um semideus que triunfa sobre as trevas)Game of Thrones,George R. R. Martin, como muitos dos seus fãs descobriram recentemente.
E também é possível argumentar que a batalha cósmica entre os lados luminoso e negro da ForçaStar Wars tenha sido ostensivamente influenciada pelo zoroastrismo.
Apesar das contribuições para o pensamento, a religião e a cultura ocidentais, relativamente pouco se sabe sobre a primeira religião monoteísta do mundo e seu fundador iraniano.
No pensamento comum e para muitos políticos americanos e europeus, o Irã é considerado o polo opostotudo o que defende o mundo livre.
Mas, além dos muitos outros legados e influências iranianas, o zoroastrismo é uma religião que não foi esquecida e pode simplesmente fornecer a chave para entendermos as similaridades existentes entre "nós" e "eles".
Leia a versão original desta reportagem (em inglês) no site BBC Culture.