'Quando super-ricos não pagam impostos, é o resto da população que paga', diz economista Gabriel Zucman:betnacional comercial
"Grande concentraçãobetnacional comercialriqueza é também grande concentraçãobetnacional comercialpoder, o que corrói a democracia."
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Fim do Matérias recomendadas
Vencedorbetnacional comercialprêmios como a prestigiada medalha John Bates Clark para jovens economistas, Zucman tem sido convocadobetnacional comercialdiversos países para dar conselhos sobre políticas econômicas - notoriamente, foi considerado o "guru tributário" dos candidatos presidenciais americanos Bernie Sanders e Elizabeth Warren, que concorreram às primáriasbetnacional comercial2020.
Na última semana, o economista estevebetnacional comercialSão Paulo a convite do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, para dar uma palestrabetnacional comercialum dos encontros do G20, grupo que reúne as maiores economias do mundo.
Ele discursou para ministros da Economia dos países do grupo com o objetivobetnacional comercialconvencer líderes mundiais das vantagensbetnacional comercialum imposto global mínimo a ser pago pelos super-ricos.
Em entrevista à BBC News Brasil pouco antes do encontro, Zucman defendeu não apenas as vantagensbetnacional comercialuma medida do tipo, mas também a viabilidadebetnacional comercialtal acordo.
Ele diz que já existem experiências econômicas internacionais bem-sucedidas e que pesquisas recentes mostram onde os países errarambetnacional comercialtentativasbetnacional comercialtributar bilionários no passado.
O economista diz ainda que não haveria um impacto negativobetnacional comercialum imposto sobre riquezas para a grande maioria da população e refuta argumentosbetnacional comercialque isso poderia prejudicar o crescimento econômico.
Leia a seguir os principais trechos da entrevista concedida por Zucman à BBC News Brasil.
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betnacional comercial BBC News Brasil - Em seu trabalho o sr. propõe um imposto mínimo sobre grandes riquezas, um imposto globalbetnacional comercialpelo menos 2%. Qual a diferença entre cobrar imposto sobre riqueza e impostobetnacional comercialrenda?
betnacional comercial Gabriel Zucman - Essa é uma questão importante. Um pontobetnacional comercialpartida é que,betnacional comercialacordo com estudos feitosbetnacional comercialdiversos países, os super-ricos pagam muito menos imposto proporcionalmente do que o resto da população. O motivo é que, quando você é muito rico, é muito fácil estruturarbetnacional comercialriquezabetnacional comercialforma que ela não gere o que é considerado renda.
Por exemplo, indivíduos como Jeff Bezos [fundador da Amazon] ou Elon Musk [presidente da Tesla], algumas das pessoas mais ricas do mundo, às vezes não têm nenhuma renda passívelbetnacional comercialtributação. Porque a noçãobetnacional comercialrenda não é muito bem definida para os ricos, eles podem minimizarbetnacional comercialrenda.
Então, nossa proposta é que haja um imposto global mínimo sobre riqueza, porque a riqueza é mais bem definida. Se você é bilionário, isso normalmente significa a soma do valorbetnacional comercialmercadobetnacional comercialtodos os seus ativos menos a dívida.
Então, para as pessoas que pagam impostobetnacional comercialrenda, não haveria cobrança a mais, mas, para os super-ricos, a cobrança seria uma porção dabetnacional comercialriqueza.
betnacional comercial BBC News Brasil - Isso se aplicaria somente aos bilionários? Qual seria o pontobetnacional comercialcorte?
betnacional comercial Zucman - A ideia é um imposto mínimo global para os muito ricos, e quem entraria nessa categoria é algo que precisa ser discutido. Mas, para começar, cobrar 2% sobre a riqueza dos bilionários é algo que afetaria menosbetnacional comercial3 mil pessoas no mundo todo e geraria uma receitabetnacional comercialUS$ 250 bilhões.
Conceitualmente, não há nenhum motivo para taxar somente os bilionários, poderíamos taxar pessoas com centenasbetnacional comercialmilhõesbetnacional comercialdólares. Mas a ideia geral é ser um imposto para os super-ricos. Não é um imposto para quem só está bembetnacional comercialvida.
betnacional comercial BBC News Brasil - Um acordo internacional do tipo é viável? É uma proposta bastante ambiciosa.
betnacional comercial Zucman - É viável, com certeza. Quais são as principais dificuldades? Existe o riscobetnacional comercialevasão fiscal. Mas a gente pode aproveitar uma iniciativabetnacional comercialgrande sucessobetnacional comercialcooperação internacional da última década: a criação do sistema automáticobetnacional comercialtrocabetnacional comercialinformações bancárias. Isso tornou mais difícil para os ricos esconderem ativos.
Existe a questãobetnacional comercialcomo medir a riqueza, mas, para isso, só precisamos formalizar regras comuns para a avaliação da riqueza, e isso é factível. Outro risco é a competição tributária [quando países ou Estados diminuem os impostos para atrair os ricos], mas um acordo internacional diminui as chancesbetnacional comercialpaíses "perderem" residentes, porque vai haver um imposto mínimo global.
betnacional comercial BBC News Brasil - Mesmo se houver uma cooperação internacional para um imposto mínimo, pode haver países que decidam não aderir. O que impede os super-ricosbetnacional comercialse mudarem para esses países? Isso seria algo que precisaria ser unânime para dar certo?
betnacional comercial Zucman - Com certeza, haveria países que ficariambetnacional comercialfora do acordo. Mas não precisamosbetnacional comercialum consenso global, porque nunca vai haver um consenso realmente global. É possível ter um grande númerobetnacional comercialpaíses, como aconteceubetnacional comercial2021, quando 130 países concordaram com um imposto mínimobetnacional comercial15% para multinacionais.
Alguns países não ratificaram o acordo, mas há uma cláusula que diz que os países que ratificam o acordo têm o direitobetnacional comercialtributar as empresas multinacionais dos países que não cooperarem para que abetnacional comercialtaxa efetivabetnacional comercialimposto também atinja 15%, então, poderíamos aplicar essa lógica na tributação dos super-ricos.
É possível que um grande númerobetnacional comercialpaíses concordem, mas mesmo que alguns não concordem, isso não seria um problema, porque sempre podemos arrecadar os impostos que os outros países não arrecadam. Os países podem dizer, 'olha, mesmo que você se mude para um paraíso fiscal, vamos continuar cobrando o imposto, então a mudança nem faz mais sentido'. Cria-se um mecanismo que, se um país não arrecadar aquele imposto, vai ter mais dinheiro na mesa para os outros arrecadarem.
betnacional comercial BBC News Brasil - Como isso funcionaria?
betnacional comercial Zucman - Haveria dificuldades se fosse um acordo somentebetnacional comercialpaíses pequenos. Mas, se grandes países do G20 concordarem e uma grande massa crítica aderir, não seria um problema se alguns outros países não aderissem, porque os países que aderissem poderiam cobrar os bilionários até atingir 2% da riqueza total - na medidabetnacional comercialque eles têm necessariamente investimentos nos países que ratificaram ou durante o tempobetnacional comercialque passam nesses países.
Hoje, os muito ricos obtêmbetnacional comercialriqueza por possuírem empresas que têm clientesbetnacional comercialtodo o mundo e produzembetnacional comercialtodo o mundo. Foi assim que se resolveu o problema da competição tributária no acordo para o imposto mínimo sobre multinacionais.
O resumo é que é possível criar esse impostobetnacional comercialuma forma que os ricos não poderiam evitá-lo se mudando. É muito importante entendermos que a competição tributária internacional não é uma lei da natureza. É uma escolha política. Podemos escolher tolerar isso ou não.
betnacional comercial BBC News Brasil - Falamosbetnacional comercialdificuldades operacionais e soluções, mas e as dificuldades políticas?
betnacional comercial Zucman - A gente vê que há um caminho políticobetnacional comercialmuitos países para isso. Um exemplo marcante são os Estados Unidos. Olha a evolução, é bem incrível. Em 2019, 2020, o presidente Joe Biden fez campanha contra um imposto sobre muito ricos. E, agora, ele apresentou um impostobetnacional comercial25% sobre a rendabetnacional comercialbilionários - com uma noção bem abrangente do que é renda.
Se você olhar para pesquisasbetnacional comercialopiniãobetnacional comercialmuitos países, vê que existe um apoio popular enorme para um sistema tributário mais progressista. Estamos falandobetnacional comercial70% a 80%betnacional comercialapoio entre pessoasbetnacional comercialdiversas orientações políticas.
Hoje, existe um entendimento melhor do que precisa ser feito concretamente para lidar com imposto sobre grandes riquezas. Muitos países tiveram impostos sobre riqueza no passado, mas que foram muito mal desenvolvidos, havia muita evasão fiscal, e os países toleravam a competição fiscal. Mas, desde então, tem havido muita pesquisa para entender essa experiência histórica, para aprender com os erros que alguns países cometeram. Então existem condições ideais para issobetnacional comercialmuitos países grandes.
betnacional comercial BBC News Brasil - Um argumento frequentemente usado por quem se opõe a essa ideia é que o imposto poderia desencorajar o crescimento econômico e diminuir o ritmobetnacional comercialgeraçãobetnacional comercialriqueza.
betnacional comercial Zucman - O impacto negativobetnacional comercialum imposto sobre grandes fortunas seria zero para a grande maioria dos contribuintes e seus negócios. O impacto sobre o crescimento econômico seria, na verdade, positivo, porque a arrecadação poderia ser usada para ampliar o acesso à educação e à saúde e ampliar a infraestrutura, que são a chave do crescimento econômico.
Para a sociedade, o efeito seria muito positivo não só pelos investimentos possíveis gerados pela arrecadação, mas por outras razões. Quando os super-ricos conseguem não pagar impostos, é o resto da população que paga, e isso não é sustentável.
Um acordo reforçaria a confiança nas instituições democráticas e tornaria a globalização mais aceitável. E, com isso, os bilionários teriam benefícios, e seus negócios também. Eles deveriam apoiar - alguns apoiam.
betnacional comercial BBC News Brasil - Quais são as áreas que criam mais oportunidades para evasão fiscal? Em seu relatório, o sr. citou o mercado imobiliário.
betnacional comercial Zucman - Sim, o mercado imobiliário é uma das áreas, porque não está incluído no sistemabetnacional comercialtroca automáticabetnacional comercialinformação bancária. É um ponto cego, mas a solução é muito simples: basta incluir propriedades imobiliárias no sistema.
betnacional comercial BBC News Brasil - E as outras áreas? Hoje há uma preocupação com criptomoedas.
betnacional comercial Zucman - Há evasão no mercadobetnacional comercialcriptomoedas com certeza. Mas, hoje, a principal forma dos muito ricosbetnacional comercialevitar pagar impostos é criar empresas fantasmas, holdings artificiais que administram os negócios para evitar qualquer impostobetnacional comercialrenda.
É um tipobetnacional comercialplanejamento tributário, uma zona cinzenta entre evitar impostos e evasão fiscal. Essas empresas não têm nenhuma atividade econômicabetnacional comercialfato. Esse é um problema que um imposto mínimo global sobre riquezas ajudaria a resolver.
betnacional comercial BBC News Brasil - No Brasil, não são cobrados impostos sobre lucros e dividendos. O que o sr. pensa sobre isso?
betnacional comercial Zucman - É um erro. Quase todos os países que têm impostobetnacional comercialrenda também tributa dividendos. O problemabetnacional comercialfazer isso é que dividendos são uma das principais formasbetnacional comercialrenda dos muito ricos, então, o que está acontecendo é que você não está tributando os mais ricos, o que é muito injusto.
O outro problema é que cria uma formabetnacional comercialevitar o pagamentobetnacional comercialimpostos. Uma das regras para uma legislação tributária eficiente é tributar diferentes formasbetnacional comercialrenda da mesma forma, assim as pessoas não podem estruturarbetnacional comercialrenda para pagar menos impostos.
betnacional comercial BBC News Brasil - A escolabetnacional comercialpensamento que o sr. e Thomas Piketty seguem argumenta que o aumento da desigualdade vai gerar instabilidade política no longo prazo. Seu trabalho é uma crítica ao capitalismo ou uma maneirabetnacional comercial"salvá-lo"?
betnacional comercial Zucman - Meu trabalho é uma crítica ao capitalismo, no sentidobetnacional comercialque há necessidadebetnacional comercialuma crítica, porque sempre podemos fazer melhor. A forma como tributamos neste momento tem esse problema muito óbvio e gritante: o fatobetnacional comercialfavorecer a concentraçãobetnacional comercialriquezas e a desigualdade. Concentraçãobetnacional comercialriqueza significa também concentraçãobetnacional comercialpoder, o que corrói a democracia.
Estou muito focadobetnacional comercialcorrigir esse problema específico. Não vai consertar o capitalismo. Mas, junto com um impostobetnacional comercialrenda progressivo, junto com um imposto sobre grandes heranças, pode ter um efeito grande.
O imposto sobre grandes riquezas não vai salvar o capitalismo, mas é um primeiro passo.