As supreendentes descobertasestudo sobre passado genético das Américas:

Ilustraçãohominídeo denisovano

Crédito, Maayan Harel

Legenda da foto, Acredita-se que o denisovanos foram extintos há 50.000 anos.

Foram analisados dentescercamil anos encontradosdois sítios arqueológicos no Brasil e dentescerca1.500 anos achados no Uruguai e cedidos pelos arqueólogos Mónica Sans e Gonzalo Figueiro, da Universidade da RepúblicaMontevidéu.

Pedraterreno amplo sob céu azul

Crédito, Henry Lavalle e Desiree Nascimento (UFPE)

Legenda da foto, Algumas das amostras analisadas vieram da Pedra do Tubarão,Pernambuco

"Expandimos o trabalho para a região onde nasci. Cresci no Nordeste do Brasil, no Ceará. E analisamos dentes encontradosdois sítiosPernambuco: Pedra do Tubarão e Alcobaça", disse Santos à BBC News Mundo (serviçoespanhol da BBC).

"Buscamos analisar dentesvezossos porque o DNA dentro dos dentes é mais protegido. O osso é mais poroso e exposto ao ambiente."

Os genomas do Uruguai e do nordeste do Brasil também foram comparados com outrosvários pontos do continente, como dos Estados Unidos, Panamá e sudeste brasileiro, revelados por estudos anteriores,

A rota norte-sul

Segundo o arqueólogo brasileiro, a pesquisa confirmou uma forte migração do noroeste do continente americano (EstreitoBering e Alasca) para a América do Sul, provavelmente através da costa do Pacífico.

Os humanos que chegaram à América do Norte provavelmente vieram da Ásia central (Mongólia à Sibéria).

"Dali, subiram para o extremo nordeste da Ásia e atravessaram o EstreitoBering, que no passado era uma grande ponte terrestre (chamadaBeríngia) por causa do baixo nível do mar. De lá, foram para o norte do Canadá e depois se espalharam para o resto da América."

André Luiz Campelo dos Santosfrente a computador

Crédito, A. Campelo dos Santos

Legenda da foto, 'Usamos dentesesqueletos para extrair DNA e, a partir disso, fizemos a análise computacional desse genoma', explica o arqueólogo brasileiro André Luiz Campelo dos Santos

Mas como os cientistas conseguem estabelecer a direçãouma migração, senorte a sul ou sul ao norte, com base no material genético?

"Fazemos análises comparando o material genético dos indivíduos, levandoconta também suas idades", explica o arqueólogo. "Por exemplo, quando você faz uma análise genealógica, você vê quem foi o avô, o pai e o filho. Nossa análise filogenética busca ver quem seria o ancestral e quem seria o descendente."

"Assim, vimos que os ancestraisgeral eram da América do Norte e os descendentes, da América Central e do Sul. Então, a migração deve ter começado na América do Norte e depois descido para a América do Sul."

A rota sul-norte

Foi usando essa técnicaanálise filogenética que os cientistas confirmaram pela primeira vez a existênciauma rota do sul para o norte.

"Encontramos rotasmigraçãolocais perto do Atlântico que eram independentes das do Pacífico."

"Acreditamos que há cerca1.500 anos houve uma migração que conectou o Uruguai ao Panamá, ao longomais5.200 km. Essa conexão é muito clara nos resultados que obtivemos", diz o pesquisador.

Santos e seus colegas encontraram semelhanças nos genomas dos locais que faziam parte dessa rota.

"Todos eles compartilham material genético. Encontramos uma semelhança muito grande entre os genomas do Uruguai, sudeste do Brasil, nordeste do Brasil e Panamá."

"Acreditamos que a origem dessa semelhança está no sudeste do Brasil. De lá, houve uma expansão tanto para o nordeste do Brasil quanto para o Uruguai e do Uruguai, outra expansão para o norte."

Placaterreno arenoso traz anotação: Sitio Alcobaça

Crédito, Henry Lavalle (UFPE)

Legenda da foto, Amostras vieram tambémAlcobaça, sítio arqueológicoPernambuco
Ossosterreno arenoso

Crédito, A. Campelo dos Santos

O cientista brasileiro afirma que "esses povos1.500 anos atrás eram muito parecidos com os indígenas latino-americanoshoje".

No contato com os colonizadores europeus, essas etnias passaram por mudanças, mas elas ainda têm características comuns — não apenas no DNA, mas também na cultura.

"Elas tinham uma culturafazer pinturas rupestres, como as que você vê no nordeste do Brasil. Elas também tinham rituais funerários e enterravam seus mortos, às vezestúmulos coletivos."

Traços neandertais e denisovanos

Hoje, o gênero humano é definido pela nossa espécie, o homo sapiens, também chamada"humano moderno". Mas, no passado, essa espécie conviveu com outras que já foram extintas. Uma delas é a dos neandertais, que ocuparam a Eurásia, da Espanha à Sibéria.

"Os neandertais desapareceram há cerca40 mil anos e chegaram a viver com os humanos modernos."

Outra espéciehominídeo desaparecida é a dos denisovanos.

"Na Indonésia, na Papua Nova Guiné, na Austrália e na Polinésia é possível encontrar vestígios genômicosdenisovanos", diz Santos.

"A relação no passado não era necessariamenteconflito. Muito provavelmente, o desaparecimentoneandertais e denisovanos se deu por assimilação, pois eles acabaram incorporados a gruposhumanos modernos."

"É por isso que, hoje, basicamente todas as populações do mundo, exceto os africanos subsaarianos, têm uma porcentagemDNA neandertal e uma porcentagem menorDNA denisovano."

O estudo recente sobre as Américas encontrou maior presençaDNA neandertal e menorDNA denisovano. Mas houve exceções.

"As amostras do Uruguai e do Panamá, só elas, têm uma composição genética maiordenisovanos do queneandertais."

Duas fotosdentes analisados

Crédito, Lab. Arqueologia Biológica e Forense UFPE

Legenda da foto, Dentes tendem a ter melhor preservação do que os ossos, explica cientista

"É algo muito intrigante que ainda não conseguimos explicar. Gostaríamos muitopoder encontrar outros genomas antigos que mostrem essa mesma característica."

Ligação com a Oceania

John Lindo, professorantropologia da Universidade Emory, nos Estados Unidos, e um dos autores do estudo, diz que aproximadamente uma dezenagenomas antigos da América do Sul foram completamente sequenciados — muitos menos do que as centenas da Europa.

Por isso, ainda há muito a descobrir a partir desse tipomaterial.

"Encontramos componente genético da Australásia. Isso significa um sinal maiorafinidade genética com indivíduos modernos da Oceania, incluindo Austrália e Papua Nova Guiné, do que com outras populações não americanas", diz o antropólogo.

"Em outras palavras, há um sinalparentesco genômico maior com indivíduos da Oceania do que da Europa ou da Ásia, por exemplo."

Dois outros gruposcientistas já haviam encontrado esse componente genético da Oceania no sudeste do Brasil e entre o povo Suruí na Amazônia.

"Por isso, pensava-se que esse sinal da Australásia só existia na América do Sul. Mas também o encontramos no material do Panamá", explica Santos.

Os cientistas não sabem como esse traço da Australásia chegou às Américas.

"Nós analisamos genomasindivíduos norte-americanos e nenhum deles tinha esse sinal."

"Assim, temos a impressãoque ele não veio pelo estreitoBering e pelo noroeste da América do Norte, mas por outras rotas que ainda não conhecemos."

O arqueólogo brasileiro e seus colegas consideram "todas as hipóteses", inclusive aque o componente genético da Australásia tenha chegado pelo Pacífico.

"Talvez, no passado, o nível do mar fosse mais baixo e houvesse mais ilhas, então era mais fácil migrarilha para ilha", explica o cientista. "Mas isso é apenas um palpite, uma hipótese, não temos nenhuma indicação no momentoque isso esteja correto."

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