O que é ser feminista?:pagbet cnpj

Ilustraçãopagbet cnpjfeministas

Crédito, Daniel Arce Lopez/BBC

E por quê? Há diversos motivos. Em seu livro O Feminismo é para Todos, a escritora e ativista bell hooks (ela assina o seu nome com letras minúsculas) cita um dos principais: muita gente pensa,pagbet cnpjforma errada, que o feminismo é "anti-homem". Mas ela explica que, na verdade, o centro do feminismo é ser anti-sexismo (ou anti-machismo), e não ser anti-homem.

Para entender todas essas questões, a BBC News Brasil explica abaixo as origens do feminismo, as ondas do movimento ao longo dos anos e por que não existe um, mas vários feminismos. Em seguida, é preciso entender as críticas ao movimento feitas por mulheres negras e por outras que atualmente rejeitam o termo feminista. Depois, vale se debruçar sobre como as mulheres se tornaram a maioria do eleitorado, mas só ocupam 15% dos assentos no Congresso brasileiro.

As origens do feminismo

O primeiro registro conhecido do termo "feminismo" datapagbet cnpj1837,pagbet cnpjescritos do filósofo francês Charles Fourier, que comparava a situação das mulheres à dos escravizados. À época, a palavra derivava o termopagbet cnpjlatim femina ("mulher") e remetia a características e qualidades femininas. Mas décadas depois passou a ser associado aos movimentos por direitos das mulheres, e a acepção original caiupagbet cnpjdesuso.

Como ocorre com outros termos políticos importantes (como comunista, liberal e conservador), não há consenso sobre o que realmente significa feminismo, considerado um movimento, uma filosofia política ou uma atitudepagbet cnpjrelação ao mundo.

Mas ainda assim diversas especialistas tentam explicar o que, afinal, é ser feminista.

bell hooks

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, bell hooks explica que feminismo não é ser anti-homem, mas ser anti-machismo

Por exemplo: para a escritora e pesquisadora britânica Rosalind Delmar,pagbet cnpjseu artigo "O que é Feminismo?", "uma feminista é no mínimo alguém que acredita que mulheres sofrem discriminação por causapagbet cnpjseu sexo, que elas têm necessidades específicas que continuam a ser negadas e desatendidas, e que a satisfação dessas necessidades demanda uma mudança radical na ordem política, social e econômica".

Carla Cristina Garcia, no livro Breve História do Feminismo, porpagbet cnpjvez, define o feminismo "como a tomadapagbet cnpjconsciência das mulheres como coletivo humano, da opressão, dominação e exploraçãopagbet cnpjque foram e são objeto por parte do coletivopagbet cnpjhomens no seio do patriarcado sob suas diferentes fases históricas, que as movepagbet cnpjbusca da liberdadepagbet cnpjseu sexo epagbet cnpjtodas as transformações da sociedade que sejam necessárias para este fim".

Em seu livro O Feminismo é para Todos, hooks diz que feminismo é "um movimento para acabar com sexismo, exploração sexista e opressão". Neste livro, ela cita como exemplo sexista a violência patriarcal, "baseada na crençapagbet cnpjque é aceitável que um indivíduo mais poderoso controle outros por meiopagbet cnpjvárias formaspagbet cnpjforça coercitiva".

"Assim como a maioria dos cidadãos desta nação acreditapagbet cnpjsalários iguais para funções iguais, a maioria do pessoal acredita que homens não deveriam espancar mulheres nem crianças. Ainda assim, quando dizem para essas pessoas que violência doméstica é um resultado do sexismo, que ela não vai acabar enquanto não acabar o sexismo, elas não conseguem fazer essa dedução lógica, porque isso exige desafiar e mudar maneiras fundamentaispagbet cnpjpensar gênero", escreve ela.

Sexismo é "o conjuntopagbet cnpjtodos e cada um dos métodos empregados no seio do patriarcado para manterpagbet cnpjsituaçãopagbet cnpjinferioridade, subordinação e exploração o sexo dominado: o feminino", explica a pesquisadora e professora Carla Cristina Garcia (PUC-SP), no livro Breve História do Feminismo.

E o que seria o patriarcadopagbet cnpjque hooks e outras feministas falam? De acordo com o Dicionário Ideológico Feminista, organizado pela ativista e psicóloga espanhola Victoria Sau, o patriarcado é uma "formapagbet cnpjorganização política, econômica, religiosa, social baseada na ideiapagbet cnpjautoridade e liderança do homem, no qual se dá o predomínio dos homens sobre as mulheres, do marido sobre as esposas, do pai sobre a mãe, dos velhos sobre os jovens, e da linhagem paterna sobre a materna".

Segundo esse dicionário, o patriarcado "surgiu da tomadapagbet cnpjpoder histórico por parte dos homens que se apropriaram da sexualidade e reprodução das mulheres e seus produtos: os filhos, criando ao mesmo tempo uma ordem simbólica por meio dos mitos e da religião que o perpetuam como única estrutura possível".

Na históriapagbet cnpjquadrinhos Uma Breve História do Feminismo no Contexto Euro-Americano, a artista gráfica Patu e a jornalista e cientista política Antje Schrupp dizem que feminismo não é um programapagbet cnpjconteúdo fixo, mas uma atitude orientada pela liberdade feminina e "quem quer entender as ideias feministas precisa sempre enxergá-laspagbet cnpjseu contexto e não deve jamais exigir uma definição inequívoca".

Por isso, muitos pesquisadores falampagbet cnpj"feminismos", como feminismo marxista, feminismo negro, feminismo radical, feminismo pós-moderno (ou interssecional) e feminismo queer (expressão da língua inglesa que significa estranho, excêntrico, e era usada pejorativamente para se referir a homossexuais, mas foi reivindicada por movimentos LGBTI, passando a designar comportamentos que não se encaixampagbet cnpjpadrões normativospagbet cnpjgênero).

Ainda assim, mais uma vez, diversos especialistas tentam reunir ou explicar o que grande parte das feministas defendempagbet cnpjcomum.

Ativista sufragista do início do movimento feminista

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, Movimento feminista surgiupagbet cnpjtorno da luta pelo direitopagbet cnpjvotar e ser votada

De acordo com o Dicionário Routledgepagbet cnpjPolítica,pagbet cnpjforma simplificada, o movimento feminista busca direitos sociais e políticos para as mulheres equivalentes aos dos homens. E, apesar das divergências entre os diversos grupos feministas, o principal pressuposto compartilhado por todos os braços do movimento é que fazemos partepagbet cnpj"uma tradição históricapagbet cnpjexploração masculina das mulheres, originada inicialmente das diferenças sexuais que levaram a uma divisão do trabalho, como, por exemplo, a criação dos filhos".

Hoje, segundo esse dicionário, as políticas defendidas por feministas variam bastante, incluindo igualdadepagbet cnpjoportunidades, fim da discriminação sexualpagbet cnpjcontratações e salários, creches gratuitas para retirar as desvantagens das mulheres no mercadopagbet cnpjtrabalho e ações afirmativas contra a desigualdadepagbet cnpjgêneropagbet cnpjvagaspagbet cnpjemprego, candidaturas políticas e cargospagbet cnpjchefia.

No Dicionário do Pensamento Político, o filósofo conservador britânico Roger Scruton identifica três reivindicações frequentes entre feministas modernas, que também carregam bastante divergências entre si.

Primeiro, a reivindicaçãopagbet cnpjque as diferenças biológicas entre mulheres e homens não são suficientes para explicar as diferenças atuaispagbet cnpjseus comportamentos, papeis e status. Ou seja, essa disparidade é uma criação social baseada no poder que deve ser removida.

Segundo, a ideiapagbet cnpjque as diferenças naturais entre homens e mulheres (como atributos físicos) não podem servirpagbet cnpjbase para a desvalorizaçãopagbet cnpjatributos femininos e valorização dos masculinos.

Terceiro, a ideiapagbet cnpjque "as mulheres não devem ser incentivadas a pensar que ser completas só é possível numa relação com os homens. Mais especificamente, as mulheres devem pararpagbet cnpjpensar suas identidades a partir da aparência aos olhos e mentes dos homens".

Ondas do feminismo: do século 19 até hoje

Costuma-se dizer que o feminismo teve pelo menos três ondas,pagbet cnpjgeral ligadas a fasespagbet cnpjgrande mobilização do movimento feminista branco europeu ou americano. Mas a própria ideiapagbet cnpjondas é criticada por parte do movimento, por, entre outros pontos, ser reducionista ao sugerir uma suposta unidade nas reivindicações ou sugerir implicitamente que há períodospagbet cnpj"calmaria" entre uma onda e outra.

No livro Ideologias Políticas: Uma Introdução, o professor e cientista político britânico Rick Wilford (Queen's University) explica que onda é uma metáfora usada para indicar períodospagbet cnpjque uma marépagbet cnpjnovas ideias feministas surgia para transformar a paisagem política.

A primeira onda se deu do fim do século 19 até as primeiras décadas do século 20, tendo como principal bandeira o direitopagbet cnpjvotar e ser votada para as mulheres ao redor do mundo (essa vitória sufragista se daria no Brasilpagbet cnpj1932, por exemplo).

Apontava-se à época também como o sistema econômico vigente "se beneficiava do trabalho gratuito das mulheres nos núcleos familiares e da diferença salarial entre os sexos para gerar e ampliar lucros", explica a filósofa e pesquisadora brasileira Ilze Zirbel (UFSC),pagbet cnpjartigo sobre o tema.

Segundo ela, é comum afirmar que as protagonistas da primeira onda eram mulherespagbet cnpjclasse média, mas "a maioria das manifestantes presentes nas grandes manifestações que deram visibilidade a essa onda era da classe trabalhadora, lutando contra as péssimas condiçõespagbet cnpjvida e trabalho a que estavam submetidas".

Vale lembrar que a primeira greve geral do Brasil foi iniciadapagbet cnpj1917 por mulherespagbet cnpjuma fábrica têxtil paulistana. Além disso, o chamado Dia Internacional da Mulher (8pagbet cnpjmarço) teve origempagbet cnpjreivindicaçõespagbet cnpjoperárias ao redor do mundo no início do século 20.

A segunda onda ganha força nos anos 1960, com um movimentopagbet cnpjlibertação feminina e ligado à ideiapagbet cnpjsororidade (uniãopagbet cnpjmulheres com o mesmo fim, segundo o Dicionário Priberam da Língua Portuguesa), tendopagbet cnpjvista a discriminação desigual que atinge mulherespagbet cnpjdiferentes classes e etnias.

Em seu livro A Mística Feminina, um dos principais da segunda onda, a escritora e ativista americana Betty Friedan exorta as mulheres, entre outros objetivos, a se qualificarem, voltarem ao mercadopagbet cnpjtrabalho e tomarem as rédeaspagbet cnpjseus direitos reprodutivos (graças ao surgimento da pílula anticoncepcional), se livrando assim das amarras da vida doméstica.

Ilustração sobre desigualdadepagbet cnpjgênero, com mulher cuidandopagbet cnpjcriança enquanto homem faz planos
Legenda da foto, Desigualdadepagbet cnpjoportunidade entre os gêneros está no centropagbet cnpjdiversas batalhas das feministas

Por outro lado, durante a segunda onda, diversas pensadoras feministas (como Angela Davis e Lélia Gonzalez) ganharam proeminência questionando justamente ideias baseadas no pontopagbet cnpjvista das mulheres brancas e mais ricas. Um exemplo: muitas mulheres negras no Brasil, além das atribuições domésticas e maternas, já estavam inseridas no mercadopagbet cnpjtrabalho há décadaspagbet cnpjpostos como comerciante informal e empregada doméstica (geralmente sob condições bastante precárias).

E o que significa "libertação"? E como essa palavra se diferenciapagbet cnpj"emancipação"?

No Dicionáriopagbet cnpjPolítica organizado por Norberto Bobbio e outros, a cientista política e professora italiana Ginevra Conti Odorisio (Universidade Roma Tre) ressalta que "emancipação", simbolizada pela luta do direito ao voto, consistia na "exigência da igualdade (jurídica, política e econômica) com o homem, mas mantinha-se na esfera dos valores masculinos, implicitamente reconhecidos e aceitos". A libertação, no entanto, prescinde "da 'igualdade' para afirmar a 'diferença' da mulher, entendida não como desigualdade ou complementaridade, mas como assunção histórica da própria alteridade e buscapagbet cnpjvalores novos para uma completa transformação da sociedade".

A ideiapagbet cnpjuma terceira onda surgiu por volta dos anos 1990, épocapagbet cnpjque a mídia, segundo Ilze Zirbel, divulgava que as jovens seriam "pós-feministas", porque entendia-se que o feminismo havia garantido diversas conquistas (como acesso a educação e emprego) e, portanto, havia perdidopagbet cnpjrazãopagbet cnpjexistir. Algo que, obviamente, não é uma realidade para todas as mulheres.

E pelo que elas lutavam? "Para aquelas a quem o acesso à educação, ao saneamento, ao aborto seguro, ao divórcio, à mobilidade básica estavam garantidos por lei, foi possível focar mais intensamentepagbet cnpjoutras questões. Para as que não viviam esse tipopagbet cnpjrealidade, foi necessário seguir lutado por direitos mínimospagbet cnpjcidadania. Outras pautas seguiram sendo comuns à maioria: a luta contra a exploração, a violência física e psicológica, o feminicídio, a discriminação no trabalho, as jornadas duplas ou triplas, os privilégios masculinos."

Além disso, explica a pesquisadora, as descrições sobre a terceira onda costumam ressaltar disputas e debates internos, sugerindopagbet cnpjforma equivocada que as fases anteriores tiveram unidadepagbet cnpjdemandas epagbet cnpjidentidade (o que é ser mulher). "Feministas latinas, negras, revolucionárias, proletárias, lésbicas, pró-sexo, antipornografia (dentre outras) fomentaram o debate feminista por todo o século 20, evidenciando a grande diversidade do feminismo (de indivíduos, grupos, pautas, estratégias)."

Mulheres com bandeiras da diversidade

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Legenda da foto, Para Judith Butler, as pessoas têm seu gênero designado ao nascerpagbet cnpjacordo com seu sexo biológico e que isso determina a forma como são tratadas na sociedade ao longo da vida

Em mapeamento das mais diversas categorias ou vertentes do feminismo, a antropóloga e professora brasileira Fabiana Martinez (UFG) explica que geralmente o movimento traça a trajetória dos femininos a partirpagbet cnpj"uma preocupação com igualdade e semelhança nos anos 1970, passando por diferença e diversidade nos anos 1980 e indopagbet cnpjdireção à fragmentação dos anos 1990".

Hoje, conta a pesquisadora, essa fragmentação é potencializada pela internet, mais especificamente nas redes sociais, onde experiências são compartilhadas a pontopagbet cnpjganharem um caráter coletivo.

Segundo ela, o ciberfeminismo impulsionou diversas campanhas no Brasil a partirpagbet cnpj2015, numa espéciepagbet cnpj"Primavera Feminista" mobilizadaspagbet cnpjredes sociais, hashtags, ruas e passeatas. Esses atos problematizam questões como "o machismo, a violência contra mulheres, o assédio sexual, o estupro, a pedofilia, a segurança das mulherespagbet cnpjvias públicas, o racismo e as leis sobre o aborto e o feminicídio".

Em umpagbet cnpjseus estudos sobre o tema, a pesquisadora analisa as principais vertentes feministas citadas nesses ambientes digitais: feminismo negro, feminismo interseccional (ou pós-moderno), feminismo radical, feminismo liberal/libertário, transfeminismo, feminismo marxista/socialista/materialista e feminismo queer/LGBT.

Influenciado por feministas como a escritora francesa Simonepagbet cnpjBeauvoir, o feminismo marxista, por exemplo, "entende que a causa da subordinação feminina está na organização da economia e no mundo do trabalho", explica Martinez. Isso inclui, entre outros elementos, o papel feminino na esfera doméstica como reprodutora da família e a desigualdadepagbet cnpjclasse entre mulheres (patroas e empregadas).

íconespagbet cnpjaplicativospagbet cnpjredes sociais

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, Redes sociais impulsionaram expansão e diversificação do feminismo

O feminismo radical (conhecido também como radfem), por outro lado, é influenciado por ativistas como as escritoras canadense Shulamith Firestone e americana Andrea Dworkin, além da própria Beauvoir. Uma das que mais crescem na internet, essa corrente defende que "a raiz da dominação masculina estaria no patriarcado, nos papéis sociais intrínsecos ao sistemapagbet cnpjgênero" e faz críticas a "estruturas que consideram reforçar o gênero e seus efeitos como a maternidade, a feminilidade, a pornografia e a prostituição", explica Martinez.

Há também o feminismo queer ou LGBT. Entre 1988 e 1993, a filósofa e escritora americana Judith Butler publicou trabalhos considerados hoje basepagbet cnpjáreaspagbet cnpjestudos conhecidas como teoria queer epagbet cnpjgênero, segundo as quais há uma diferença entre o sexo biológico e as identidades masculina e feminina que, alémpagbet cnpjserem formadas por aspectos físicos, seriam também construções sociais por receberem influências históricas e sociais.

Para ela, na sociedade contemporânea, as pessoas têm seu gênero designado ao nascerpagbet cnpjacordo com seu sexo biológico e que isso determina a forma como são tratadas na sociedade ao longo da vida. "Claro que há aspectos nossos que são sólidos, mas também é verdade que, dependendo da forma como somos criados, da culturapagbet cnpjque vivemos, diferentes possibilidadespagbet cnpjdesejo emergempagbet cnpjnós. Ser humano é viver na interseção entre biologia e cultura", disse ela à BBC News Brasilpagbet cnpj2017.

"Muitos não querem flexibilizar as categoriaspagbet cnpjgênero, mas, para outros, é uma questãopagbet cnpjvida ou morte", afirmou Butler. "Assim, mulheres percebem que podem fazer mais, homens podem se expressar mais, o amor gay e lésbico torna-se legítimo, as pessoas queer se veem como parte do mundo. O gênero abre para elas a possibilidadepagbet cnpjrespirar, viver, pertencer. É um espaçopagbet cnpjcompaixão para a luta que enfrentam."

As mulheres que rejeitam o rótulopagbet cnpjfeminista e as críticas das mulheres negras

"Alguém que lute por igualdade das minoriaspagbet cnpjum modo geral — e, consequentemente, da mulher — não tem como não ser feminista", disse a senadora Simone Tebet (MDB-MS), hoje candidata à Presidência,pagbet cnpjentrevista à BBC News Brasilpagbet cnpj2021. "(Mas) tenho dificuldadepagbet cnpjfalar que eu sou feminista."

E por quê essa dificuldade? "É um termo que agora você não consegue mais nem definir, é uma coisa que nós vamos ter que voltar a discutir: o que é o feminismo? O que é ser feminista no Brasil, que também não se iguala a ser feministapagbet cnpjoutros países? (...) Eu tô dizendo que,pagbet cnpjmodo geral, como tudo no Brasil também, está polarizado e há certo radicalismo. Às vezes, não me enxergam como feminista, ou, às vezes, eu tenho dificuldade, também,pagbet cnpjdizer que sou, embora seja, porque há uma pauta ou outrapagbet cnpjque pode ser que eu não me enquadre nesse perfil", disse a candidata.

Para Tebet, o importante nessa discussões são atitudes, e não rótulos. "Sou uma pessoapagbet cnpjcentro e tenho horror a essa polarização. Uma pessoapagbet cnpjcentro como eu tem dificuldade atépagbet cnpjse adjetivar: sou feminista ou não sou feminista? Não importa. Não adianta você ser rotulada e não seguir a cartilha, né? Então, o que importa são seus gestos epagbet cnpjhistória."

empregada doméstica limpa porta

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, Uma das principais críticas ao movimento feminista décadas atrás erapagbet cnpjque ele falavapagbet cnpjacesso ao mercadopagbet cnpjtrabalho ignorando o fatopagbet cnpjque muitas mulheres negras já trabalhavam há décadaspagbet cnpjcondições precárias

Um estudo com 27 mil pessoas nos EUApagbet cnpj2016 mostrou que dois terços dos entrevistados acreditavam que a igualdadepagbet cnpjgênero é importante, um aumentopagbet cnpjrelação a 1977, quando pesquisas similares apontavam que um quarto dos entrevistados pensava assim.

Em uma pesquisa feita no Reino Unidopagbet cnpj2018, 8% das pessoas disseram concordar com papéispagbet cnpjgênero tradicionais — que o homem deve trabalhar e que as mulheres devem cuidar da casa. O índice erapagbet cnpj43%pagbet cnpj1984.

Se muitas pessoas acreditam que a igualdadepagbet cnpjgênero é importante, e ainda não foi atingida, porque não há tantas pessoas — especialmente jovens mulheres — se identificando como feministas?

Pode ser que elas não se sintam representadas pelo termo, afirmam especialistas. Segundo pesquisas, mulherespagbet cnpjbaixa renda tendem a se identificar menos com a palavra "feminismo". Isso não significa, porém, que elas não defendem bandeiras feministas.

Cercapagbet cnpj1pagbet cnpjcada 3 pessoas entre as classes mais altas se consideram feministas,pagbet cnpjacordo com uma pesquisa feita na Grã-Bretanhapagbet cnpj2018. Em comparação, nas classes mais baixas 1pagbet cnpjcada cinco pessoas se identificam com esse termo.

Mas, por outro lado, pessoaspagbet cnpjbaixa renda são tão propensas a apoiar direitos iguais para homens e mulheres quanto pessoaspagbet cnpjclasses mais altas. Em todas as faixas socioeconômicas,pagbet cnpjcada 10 pessoas, 8 concordam que homens e mulheres devem ter os mesmos direitos,pagbet cnpjacordo com uma pesquisa britânicapagbet cnpj2015.

A questão racial também parece afetar a maneira como a palavra "feminista" é vista. Pesquisas com jovens dos EUA mostram que cercapagbet cnpj12% das mulheres latinas se identificam como feministas, mas que o índice sobe para mulheres negras (21% se consideram feministas), asiáticas (23%) e brancas (26%).

Quase 75%pagbet cnpjtodas as mulheres disseram que o movimento feminista fez "muito" ou "algo" para melhorar a vida das mulheres brancas. Mas o índice cai para 60% quando a pergunta é se o feminismo conquistou muito para mulherespagbet cnpjtodas as etnias. Entre as mulheres negras, só 46% acham que o feminismo melhorou a vidapagbet cnpjmulherespagbet cnpjtodas as etnias.

Em artigo sobre o tema, a filósofa e professora brasileira Halina Leal (Universidade Regionalpagbet cnpjBlumenau) explica que grande parte das feministas negras apontam que tanto o movimento feminista quanto o movimento negro "falharam e ainda falham ao negligenciar as peculiaridades das necessidades das mulheres negras".

Como no momentopagbet cnpjque somente os homens negros obtiveram direito ao voto nos Estados Unidos ou quando feministas brancas trataram apenas as necessidadespagbet cnpjmulheres brancaspagbet cnpjclasse média e alta fosse comuns a mulherespagbet cnpjtodas as raças, etnias e classes sociais.

Manifestante com cartaz escrito Sou Mãe e defendo o aborto legal e seguro

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, Direito é uma das principais questões que dividem as mulheres

"Quando falamos do mito da fragilidade feminina, que justificou historicamente a proteção paternalista dos homens sobre as mulheres,pagbet cnpjque mulheres estamos falando? Nós, mulheres negras, fazemos partepagbet cnpjum contingentepagbet cnpjmulheres, provavelmente majoritário, que nunca reconhecerampagbet cnpjsi mesmas esse mito, porque nunca fomos tratadas como frágeis. Fazemos partepagbet cnpjum contingentepagbet cnpjmulheres que trabalharam durante séculos como escravas nas lavouras ou nas ruas, como vendedoras, quituteiras, prostitutas", afirma a escritora e filósofa Sueli Carneiro no artigo "Enegrecer o Feminismo: A Situação da Mulher Negra na América Latina a partirpagbet cnpjuma perspectivapagbet cnpjgênero".

Essa diferença já havia sido levantada um século antes, mais especificamente no discurso "Eu não sou mulher?" proferidopagbet cnpj1851 por Sojourner Truth, abolicionista americana, ex-escravizada e ativista dos direitos das mulheres negras.

"Aquele homem ali diz que é preciso ajudar as mulheres a subir numa carruagem, é preciso carregá-las quando atravessam um lamaçal, e elas devem ocupar sempre os melhores lugares. Nunca ninguém me ajuda a subir numa carruagem, a passar por cima da lama ou me cede o melhor lugar! E não sou eu uma mulher? Olhem para mim! Olhem para meu braço! Eu capinei, eu plantei, juntei palha nos celeiros, e homem nenhum conseguiu me superar! E não sou eu uma mulher? Consegui trabalhar e comer tanto quanto um homem — quando tinha o que comer — e aguentei as chicotadas! Não sou eu uma mulher?", afirmou Truth.

"Ser negra e mulher no Brasil, repetimos, é ser objetopagbet cnpjtripla discriminação, uma vez que os estereótipos gerados pelo racismo e pelo sexismo a colocam no mais baixo nívelpagbet cnpjopressão", diz a filósofa, professora e ativista brasileira Lélia Gonzalez.

Ou seja, "as experiências das mulheres negras não se inserem nem no ser mulher nem no ser negro", resume Leal.

Por isso, Carneiro explica que enegrecer o movimento feminista brasileira significa, entre diversos outros pontos, tratarpagbet cnpjviolência racial contra mulheres negras, formular políticas públicas também para doenças que atingem mais a população negra e contestar "mecanismospagbet cnpjseleção no mercadopagbet cnpjtrabalho como a 'boa aparência', que mantém as desigualdades e os privilégios entre as mulheres brancas e negras".

Mulheres no centro das eleições no Brasil

Em 2002, as mulheres passaram a ser maioria no eleitorado do Brasil, e hoje, duas décadas depois, representam 53% do total — são 78 milhõespagbet cnpjeleitoras, ante 69,5 milhõespagbet cnpjeleitores. Mas ainda estão longe da representação equivalente no Congresso. Elas somam 15% das cadeiras, metade da média latino-americana.

Em 2018, houve uma transformação nesse campo: foi a primeira eleição presidencial desde a redemocratizaçãopagbet cnpjque houve uma diferença entre o voto masculino e o feminino para um candidato competitivo à Presidência: Jair Bolsonaro (então-PSL, hoje PL).

manifestantes contra bolsonaro no protesto conhecido como Ele Não

Crédito, AFP

Legenda da foto, Manifestação contra Bolsonaro batizadapagbet cnpjEle Não

De 1989 a 2014, homens e mulheres sempre votarampagbet cnpjforma equivalente nos principais candidatos presidenciais, mesmo nas eleições com candidatas com chancepagbet cnpjvitória ou eleitas, como Marina Silva (Rede) e Dilma Rousseff (PT).

Só que na última eleição surgiu uma disparidadepagbet cnpjgênero. Segundo análise do cientista político e especialistapagbet cnpjeleições Jairo Nicolau,pagbet cnpjseu livro O Brasil Dobrou à Direita, 64 homens a cada 100 votarampagbet cnpjBolsonaro. Já apenas 53pagbet cnpjcada 100 mulheres fizeram o mesmo.

Para a pesquisadora Cecilia Machado, da FGV,pagbet cnpjartigo sobre o tema, a principal hipótese é que esquerda e direita no Brasil não tinham "posições marcadamente antagônicas com relação ao papel das mulheres na sociedade", como ocorre nos EUA desde os anos 1980, quando o Partido Republicano passou a adotar uma postura antiaborto, por exemplo.

Maspagbet cnpj2018, Bolsonaro "iniciou no país uma discussão francamente aberta sobre como ele vê o papel da mulher na sociedade", afirma Machado, e se tornou assim o "grande responsável pela disparidadepagbet cnpjgênero nas intençõespagbet cnpjvoto que surgiu no Brasil".

Nicolau aponta outras hipóteses para o apoio desproporcional entre homens e mulheres, entre eles o histórico políticopagbet cnpjBolsonaro (ligado às demandaspagbet cnpjmilitares, uma categoria majoritariamente masculina) e as bandeiras defendidas por ele (como armamento da população) que têm mais acolhida entre o eleitorado masculino.

O presidente refutou os dados que apontam uma maior rejeição feminina apagbet cnpjcandidatura. "Segundo pesquisa, as mulheres não votampagbet cnpjmim, a maioria vota na esquerda. Agora, não sei, pesquisa a gente não acredita, se há reação por parte das mulheres, faz uma visitinhapagbet cnpjPacaraima, Boa Vista, nos abrigos, e vê como é que estão as mulheres fugindo do paraíso socialista defendido pelo PT", disse Bolsonaro,pagbet cnpjreferência a imigrantes oriundos da Venezuela.

A eleiçãopagbet cnpj2018 teve outro fato inédito ligado às mulheres: foi a primeira disputapagbet cnpjque pessoas saírampagbet cnpjmassa às ruas não para apoiar um candidato presidencial preferido, mas para protestar contra outra. No caso, o movimento #EleNão impulsionado por mulherespagbet cnpjesquerdapagbet cnpjredes sociais que resultoupagbet cnpjdezenaspagbet cnpjmanifestações ao redor do país contrárias a Bolsonaro.

Mas logo após os protestos o candidato cresceu nas pesquisas eleitorais. Nicolau explica que os dados disponíveis não permitem saber com certeza o impacto positivo ou negativo no resultado eleitoral desses protestos, mas o pesquisador estima que "os efeitos devem ter sido mais para reforçar a identidade e os valores dos eleitores que já haviam feito suas escolhas (contra ou a favorpagbet cnpjBolsonaro) do que para influenciar maciçamente a definição eleitoral fora do círculopagbet cnpjpessoas mais ativas na política".

Nicolau lembra como as pesquisaspagbet cnpjintençãopagbet cnpjvoto indicavam ao longo da campanhapagbet cnpj2018 um apoio reduzido a Bolsonaro no eleitorado feminino, mas essa situação perdeu força a poucos dias da votação. Ele aponta algumas hipóteses. Uma delas é que historicamente o volumepagbet cnpjindecisos é bem maior no eleitorado feminino nos dias que antecedem o pleito. "Outro fator a ser considerado é o efeito da mobilização pró-Bolsonaropagbet cnpjalgumas lideranças evangélicas, segmento religioso majoritariamente composto por mulheres."

Um estudo liderado pela antropóloga e professora brasileira Isabela Kalil (Fespsp) afirma que as análises sobre a subida eleitoralpagbet cnpjBolsonaro depois dos protestos do "Ele Não" devem levarpagbet cnpjconta tanto "traços fortespagbet cnpjantifeminismo no eleitorado feminino" quanto fatores como "mudanças nas estratégiaspagbet cnpjcampanha do candidato, a declaraçãopagbet cnpjintençãopagbet cnpjvotopagbet cnpjlíderes religiosos, açõespagbet cnpjpropaganda por partepagbet cnpjseus apoiadores epagbet cnpjalta hospitalar (depois do atentado)".

Segundo esse estudo, Bolsonaro conseguiu atrair diferentes grupospagbet cnpjeleitoras, entre elas aquelas que enxergavam a educação como um grande campopagbet cnpjbatalha contra "doutrinações" da esquerda e aquelas que se veem como mulheres bem-sucedidas que atingiram seus objetivos por méritos próprios, sem precisarpagbet cnpjajudapagbet cnpjfeministas e sem abrir mão da feminilidade.

Manifestante pró-Bolsonaro no movimento Ele Sim

Crédito, AFP

Legenda da foto, Movimento Ele Não deu origem a reaçõespagbet cnpjmulheres que votavampagbet cnpjBolsonaro

Uma das principais críticas feitas ao feminismo épagbet cnpjque partepagbet cnpjsuas lutas atuais não atendem às demandas das "mulheres comuns".

Muitas pensadoras feministas, no entanto, argumentam que o feminismo pretende justamente que todas as mulheres tenham a liberdade e a oportunidadepagbet cnpjfazer suas escolhas sobre suas vidas, seja trabalhar dentropagbet cnpjcasa ou fora dela, por exemplo.

O neologismo empoderamento, inclusive, é usado como símbolo dessa meta,pagbet cnpjempoderar,pagbet cnpjgarantir a possibilidadepagbet cnpjescolha.

Segundo a economista e professorapagbet cnpjorigem indiana Naila Kabeer (London School of Economics), ele é "o processo através do qual aqueles/as a quem era negada a capacidadepagbet cnpjfazer escolhas estratégicas parapagbet cnpjvida adquirem tal capacidade", explica a antropóloga e professora brasileira Cecília Sardenberg (UFBA)pagbet cnpjartigo com um panorama do conceito.

Nesse sentido, poder é a capacidadepagbet cnpjfazer escolhas (epagbet cnpjter alternativas).

E isso passa, segundo a ativista e escritora indiana Srilatha Batliwala, também citada por Sardenberg, por construirpagbet cnpjprópria autonomia ao se ter controle sobre recursos materiais, intelectuais e ideológicos. "Recursos, que têm estado,pagbet cnpjgrande parte, sob o controle masculino." Ainda que seja um percurso individual, Sardenberg ressalta que essas mudanças "não acontecem sem ações coletivas" e conscientização.

*Com informações adicionaispagbet cnpjRafael Barifouse, da BBC News Brasilpagbet cnpjSão Paulo

- Este texto foi publicadopagbet cnpjhttp://vesser.net/geral-62551293

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