'Trump não é liberal': as polêmicas propostas do novo presidente dos EUA para a economia:real bet dicas

"Liberal [ele] não é, né?", diz Luciano Sobral, economista-chefe da Neo Investimentos,real bet dicasentrevista à BBC News Brasil. "Pensandoreal bet dicaspolítica econômica, no que a gente costuma associar ao liberalismo econômico, Trump está sinalizando na direção contrária. Um governo que está aparentemente pouco preocupado com a austeridade fiscal, que não defende o livre comércio, muito pelo contrário", completa.

"A políticareal bet dicasaumentoreal bet dicastarifareal bet dicasimportações,real bet dicasfechamento da economia ao comércio internacional, a política públicareal bet dicasreindustrialização, que envolve uma atuação do governo mais firme… tudo isso vai no sentido contrário do liberalismo econômico", concorda Armando Castelar, coordenadorreal bet dicaseconomia aplicada do Instituto Brasileiroreal bet dicasEconomia da Fundação Getulio Vargas (Ibre-FGV) e professor do Institutoreal bet dicasEconomia da Universidade Federal do Rioreal bet dicasJaneiro (IE/UFRJ).

Se não é liberal, a agendareal bet dicasTrump também não se encaixa exatamente nas ideologias econômicas clássicas, dizem os economistas ouvidos pela reportagem.

"Keynes dizia que os homens práticos são escravosreal bet dicasalgum economista morto, mas não tem nenhum economista morto guiando [a agendareal bet dicasTrump]", observa Sobral, referindo-se ao fatoreal bet dicasque não parece haver um ideólogo por trás da plataforma econômica do republicano. "É um montereal bet dicascoisa misturada", completa.

A política comercial protecionista e a ideiareal bet dicasque o país precisa ter saldo positivo na balança contra todos os seus parceiros comerciais, ele exemplifica, se aproximam do mercantilismo, modelo que vigorou na Europa antes da Revolução Industrial.

"É um discurso nacionalista", acrescenta diz Armando Castelar. "As propostas têm como linha mestra a ideiareal bet dicasque são voltados para favorecer os cidadãos e as empresas americanas. Aumentar tarifa é algo que, na minha leitura, acaba prejudicando mais do que ajudando, mas o discurso é nacionalista."

Agenda Trump

A promessareal bet dicaselevação generalizada das tarifasreal bet dicasimportação praticadas pelos Estados Unidos é uma das que suscitam maior preocupação entre especialistas, inclusive por seus possíveis impactos na economia global.

Trump faloureal bet dicasaumentar as alíquotas para um patamar entre 10% e 20% para todos os parceiros comerciais, alémreal bet dicas60% para produtos da China, e prometeu sobretaxasreal bet dicasmaisreal bet dicas100%real bet dicascircunstâncias específicas.

Na visão do republicano, o "tarifaço" incentivaria as empresas a produzirem mais localmente e a criar empregos no país.

A maioria dos especialistas discorda. Em uma consulta realizada pelo jornal americano The Wall Street Journal com 39 economistas, todos desaprovaram a medida, a única unanimidade diantereal bet dicasuma listareal bet dicaspropostas polêmicas das candidaturas tanto do republicano quantoreal bet dicassua oponente derrotada, a democrata Kamala Harris.

A avaliação éreal bet dicasque a medida pode reduzir o fluxo do comércio global, com desaceleração da atividade econômicareal bet dicasdiversos países, e aumentar a inflação nos EUA, processo que,real bet dicasúltima instância, fortalece o dólar e deixa a moeda americana mais cara.

O protecionismo tarifário, como é chamado no jargão econômico, "ou vira inflação ou vira reduçãoreal bet dicasdemanda", pontua José Franciscoreal bet dicasLima Gonçalves, economista-chefe do Banco Fator.

Ele explica com um exemplo ilustrativo da China. Os americanos ou não fabricam ou têm capacidade reduzida para produzir o que importam do país asiático.

Se,real bet dicasuma hora para outra, esses importados forem sobretaxados, o americano ou vai topar pagar mais caro para ter acesso ao produtoreal bet dicasqualquer forma (o que os economistas chamamreal bet dicasdemanda pouco elástica), processo que alimenta a inflação, ou vai deixarreal bet dicascomprar porque acha que ele ficou caro demais, com impacto na redução do consumo.

Subsídios, isenções e deportaçãoreal bet dicasmassa

Outra proposta que teve apelo entre eleitores e desagrada economistas é areal bet dicastornar permanente uma sériereal bet dicascortesreal bet dicasimpostos que Trump instituiureal bet dicas2017,real bet dicasseu primeiro mandato, e que deveriam ser temporários, com previsão para perderem a validadereal bet dicas2025.

Esse é um roteiro bastante conhecido no Brasil: benefícios fiscais que nascem com datareal bet dicasvalidade e acabam se perpetuando indefinidamente. Um exemplo é a desoneração da folhareal bet dicaspagamentos, instituídareal bet dicas2011, durante o governo Dilma Rousseff, com caráter provisório, mas que acabou sendo ampliada e seguereal bet dicasvigor maisreal bet dicasuma década depois.

"Eles [americanos] não estão muito acostumados com isso porque não é da natureza do debate político delesreal bet dicascurto prazo. A gente [o Brasil] é catedrático nesse tema, infelizmente", diz Livio Ribeiro, pesquisador associado do Ibre-FGV e sócio da BRCG Consultoria.

Além da perenização do Tax Cuts and Jobs Act — o pacotereal bet dicas2017 que deveria caducarreal bet dicas2025 —, o republicano lançou uma sériereal bet dicasoutras propostas que preveem subsídios e isenções, ressalta o economista Steven Kamin, pesquisador sênior do centroreal bet dicaspesquisa American Enterprise Institute.

Entre elas está areal bet dicasisentarreal bet dicasimpostos as gorjetasreal bet dicasquem trabalha no setorreal bet dicasserviços, ideia que acabou sendo também abraçada pela campanhareal bet dicasKamala Harris.

Além do custo para as contas do governo, economistas avaliam que a medida pode distorcer o mercadoreal bet dicastrabalho, já que beneficiaria uma quantidade pequenareal bet dicastrabalhadoresreal bet dicasbaixa renda.

Outra promessa considerada populista que fez sucesso com o eleitorado trumpista e que Kamin considera que pode produzir grande impacto negativo na economia americana é areal bet dicasdeportar milhõesreal bet dicasimigrantes sem documentos.

A mãoreal bet dicasobra dos imigrantes, ele argumenta, é hoje a basereal bet dicassetores como a construção e diversos segmentosreal bet dicasserviços, especialmente os que pagam menores salários.

A redução dessa forçareal bet dicastrabalho, alémreal bet dicascriar um problema para essas indústrias no curto prazo, alimentaria mais inflação.

Liberalismo no divã

O rompimento que Trump representa se encaixareal bet dicasum processo mais amplo, dizem os economistas ouvidos pela BBC News Brasil, com repercussões que vão além dos EUA.

A globalização provocou profundas transformações na estrutura da economia americana: a indústria perdeu importância, parte da produção foi reorientada principalmente para a Ásia e os serviços passaram a ser o principal motorreal bet dicascrescimento, respondendo hoje por 70% do Produto Interno Bruto (PIB) americano pelo lado da oferta.

Em paralelo, países como a China viram suas economias crescerem e ganharem importância geopolítica.

Os EUA continuam sendo o país mais rico do mundo, mas perderam o protagonismo e a influência que tiveram no pós-Segunda Guerra e no período logo depois do colapso da União Soviética.

"Os EUA promoviam o liberalismo quando eram os grandes competidores internacionais na produçãoreal bet dicasmanufaturados", pontua Armando Castelar.

"Queriam promover porque eram exportadores. Conforme essa competitividade vai desaparecendo, a motivação vai desaparecendo também."

Do pontoreal bet dicasvista dos eleitores, a transiçãoreal bet dicasuma economia baseada na manufatura para uma economiareal bet dicasserviços é "dolorosa", diz o economista-chefe da Genial Investimentos José Márcio Camargo, e ajuda a explicar porque o discurso do republicano tem apelo entre uma fatia grande da população.

"Não é uma transição suave. A demanda por trabalho pouco qualificado diminui, e isso vira um problema político", ele completa, referindo-se ao desemprego gerado pela transferênciareal bet dicasparte da produção para outras regiões do planeta.

Nesse sentido, para o economista Francis Fukuyama, o grande recado das urnas neste 5real bet dicasnovembro foi a rejeição dos americanos ao liberalismo.

Em um artigo no no jornal britânico Financial Times, ele avalia que a história americana vive uma nova fase e que o segundo mandatoreal bet dicasTrump tem potencial ainda maior do que o primeiro para ser um divisorreal bet dicaságuas.

"A extensão da vitória republicana, da Presidência ao Senado e provavelmente também à Câmara dos Deputados, será interpretada como um forte mandato político que confirma estas ideias e permitirá a Trump agir como bem entender."