'Checava se alguém se mataria ao vivo': a rotina do brasileiro que moderava posts denunciados no Facebook:dicas apostas liga dos campeoes
"Impossível não ter erro humano nesse ritmo", diz Sergio, que hoje trabalha como freelancer e decidiu apagar seus rastros na rede social depoisdicas apostas liga dos campeoesa conhecer "por dentro".
Na semanadicas apostas liga dos campeoesque Mark Zuckerberg anunciou a contrataçãodicas apostas liga dos campeoes10 mil novos funcionários diretos e indiretos para funções como a desempenhada por Sergio, a rotina do brasileirodicas apostas liga dos campeoesuma espéciedicas apostas liga dos campeoescall center digital ilustra o desafio enfrentado pelo Facebook para conter milhõesdicas apostas liga dos campeoesdemonstrações explícitasdicas apostas liga dos campeoesviolência com consequências cada vez mais dramáticas - do incentivo a suicídios infantis a ameaças à segurança nacional do país mais rico do mundo.
No Estados Unidos, na semana passada, o Facebook admitiu que grupos russos criaram perfis falsos ligados a movimentos sociais como o Black Lives Matter para divulgar memes que incitavam o ódiodicas apostas liga dos campeoesgrupos racistas durante as eleiçõesdicas apostas liga dos campeoes2016.
Segundo as revelações do Senado americano, notícias falsas sobre muçulmanos também teriam sido impulsionadas por russos na rede para irritar o eleitorado xenófobo.
Procurada na manhã desta terça-feira, 7, a matriz americana do Facebook encaminhou as perguntas da BBC Brasil ao escritório paulista da rede, que no início da noite informou que "não irá comentar" os relatos do ex-funcionário.
Nas questões enviadas, a reportagem pedia confirmação das informações sobre carga horária e metas, respostas sobre contratosdicas apostas liga dos campeoestrabalho terceirizados e dados sobre eventual apoio psicológico a trabalhadores expostos a publicações violentas.
Rotina
Para além da frieza dos robôs e relatórios, a experiência do brasileiro traz luz ao trabalho daqueles que ocupam funçõesdicas apostas liga dos campeoesbasedicas apostas liga dos campeoesempresas terceirizadas pelo impériodicas apostas liga dos campeoesMark Zuckerberg - com relaçõesdicas apostas liga dos campeoestrabalho bem diferentes do clichêdicas apostas liga dos campeoesescritórios descolados, do Vale do Silício, com montanhasdicas apostas liga dos campeoesM&Ms e cachorros-quentes à disposição das equipes.
Em um prédio com longas bancadasdicas apostas liga dos campeoescomputadores distribuídasdicas apostas liga dos campeoesvários andares, Sergio e aproximadamente 500 colegas do mundo inteiro passavam dias avaliando denúncias sobre pedofilia, nudez, necrofilia, suicídios, assassinatos, assédios, ameaças, armas, drogas e violência animal publicadasdicas apostas liga dos campeoesmaisdicas apostas liga dos campeoes10 idiomas.
Segundo o ex-funcionário, nestes centrosdicas apostas liga dos campeoesrevisão da rede social mais usada do planeta, celulares são proibidos, pausas para comida ou banheiro são monitoradas e contratosdicas apostas liga dos campeoestrabalho preveem multas e processos judiciais contra vazamentodicas apostas liga dos campeoesinformações.
"Era como um grande call center, sem os telefones. A gente estava ali para atender ao cliente: no caso, o Facebook e todos os seus usuários", diz.
Em seu computador, Sergio tinha acesso a uma linha do tempo "alternativa" que exibia apenas as postagens alvodicas apostas liga dos campeoesdenúnciasdicas apostas liga dos campeoesusuários,dicas apostas liga dos campeoesforma aleatória, junto a um menu sobre possíveis violações.
Os moderadores só visualizam o nome do autor das publicações e não têm acesso a seus perfis completos. Sua missão é apagar, ignorar ou encaminhar a publicação para a avaliação superior - o que ocorre especialmentedicas apostas liga dos campeoescasosdicas apostas liga dos campeoessuicídio ou pedofilia, que pordicas apostas liga dos campeoesvez são encaminhados a autoridades.
As decisões, pautadas por políticas internas da rede social, servem para "educar" os algoritmos, que com o tempo repetem as respostas automaticamente, por meiodicas apostas liga dos campeoesrecursos avançadosdicas apostas liga dos campeoesidentificaçãodicas apostas liga dos campeoesrostos ou frases ofensivas.
"Quanto mais ensinávamos o algoritmo, menos nos tornávamos necessários. Nosso trabalho era tornar o nosso trabalho obsoleto", diz Sergio.
O brasileiro também pede sigilo sobre a cidade onde trabalhava, mas conta que o Facebook escolhe locais com alto fluxodicas apostas liga dos campeoesestrangeiros, onde é fácil encontrar pessoas fluentesdicas apostas liga dos campeoesdiferentes idiomas.
Os revisoresdicas apostas liga dos campeoesconteúdo são normalmente jovens profissionais que vivem no exterior ou que não encontram trabalhodicas apostas liga dos campeoessuas áreas. A rotatividade é alta e a maioria não completa um ano no posto.
Metas
Para conseguirem decidirdicas apostas liga dos campeoesmenosdicas apostas liga dos campeoes10 segundos se uma publicação merece ou não ser apagada, os funcionários decoram regras e recebem memorandos digitais sobre mudançasdicas apostas liga dos campeoeslistasdicas apostas liga dos campeoesgrupos extremistas ou atualizaçõesdicas apostas liga dos campeoespolíticas, como a que permitiu fotos e vídeosdicas apostas liga dos campeoesmães amamentando e imagensdicas apostas liga dos campeoesmulheres que passaram por mastectomia.
A pressão para cumprir as metas aparecia, segundo Sergio,dicas apostas liga dos campeoesreuniões recorrentes com supervisores.
"Tinha relatórios periódicos sobre metasdicas apostas liga dos campeoesmoderação. Os chefes às vezes pareciam cheerleaders (líderesdicas apostas liga dos campeoestorcida,dicas apostas liga dos campeoesinglês) e tentavam nos motivar dizendo que havíamos 'salvado X pessoasdicas apostas liga dos campeoessuicídios ou agressões no mês'", conta.
"Mas também diziam sempre que a continuidade dos nossos empregos dependia do batimento das metas diárias e citavam outros lugares com resultados melhores que o nosso. A gente nunca sabia quanto tempo o escritório iria durar", completa o ex-funcionário.
Há uma semana, ao anunciar um aumentodicas apostas liga dos campeoes47% no faturamento anual do Facebook, que ultrapassou pela primeira vez na história a marcadicas apostas liga dos campeoesUS$ 10 bilhõesdicas apostas liga dos campeoesum trimestre, Mark Zuckerberg prometeu investirdicas apostas liga dos campeoes"pessoas e tecnologia para identificar mau comportamento e remover notícias falsas, discursodicas apostas liga dos campeoesódio, bullying e outros conteúdos problemáticos" da rede.
Em maio, a chefedicas apostas liga dos campeoesPolítica Global do Facebook, Monika Bickert, comentou o trabalhodicas apostas liga dos campeoesrevisores como Sergiodicas apostas liga dos campeoesum texto sobre os desafios da moderaçãodicas apostas liga dos campeoesconteúdos.
"Eles têm um obstáculo: entender o contexto. É difícil julgar a intenção por trásdicas apostas liga dos campeoesuma postagem, ou o risco implícitodicas apostas liga dos campeoesoutra. Alguém publica um vídeo violentodicas apostas liga dos campeoesum ataque terrorista. Isso inspirará as pessoas a imitar a violência, ou a falar contra isso? Alguém escreve uma piada sobre suicídio. É um mero comentário ou um gritodicas apostas liga dos campeoesajuda?"
O brasileiro confirma as dificuldades, mas diz que não conseguia discutir decisões com superiores. "Não tinha espaço para pensamento crítico, o trabalho tinha que ser automático e acelerado. Era seguir o manual, apertar botão e não fazer muitas perguntas", diz.
Ferimentos x Morte
Os dados mais recentes do Facebook apontam que a rede exclui quase 300 mil publicações por mês. Entre os brasileiros, segundo o ex-revisor, boa parte dos conteúdos denunciados são casosdicas apostas liga dos campeoesnudez.
"Ver conteúdos fortes todos os dias te faz perder a sensibilidade para certas coisas. Especialmentedicas apostas liga dos campeoesrelação à nudez - eram tantas selfiesdicas apostas liga dos campeoesgente nua, closesdicas apostas liga dos campeoespênis, vaginas e mamilos, que a pornografia perdeu a graça", afirma.
Como não há consenso nas leisdicas apostas liga dos campeoesdiferentes países sobre conteúdos ofensivos ou discursodicas apostas liga dos campeoesódio online (frases que podem levar à prisãodicas apostas liga dos campeoeslocais como a Alemanha podem ser protegidas como liberdadedicas apostas liga dos campeoesexpressão pela Constituição dos EUA), o Facebook criou suas próprias regras, considerando raça e etnia, religião, gênero e orientação sexual como "categorias protegidas".
Os revisores são orientados, seguindo as normas da rede, a apagar "qualquer ataque direto a pessoas" com base nestas categorias.
Sobre violência, a rede determina que imagensdicas apostas liga dos campeoesinteresse público, "como abusosdicas apostas liga dos campeoesdireitos humanos ou atosdicas apostas liga dos campeoesterrorismo", sejam mantidas quando as postagens expressarem reprovação ou conscientização.
Em casosdicas apostas liga dos campeoescompartilhamento "pelo prazer sádicodicas apostas liga dos campeoescelebrar ou enaltecer a violência", elas devem ser apagadas. Muitos casos geravam discórdia entre os funcionários.
"Ferimento grave, por exemplo, podia. Se depoisdicas apostas liga dos campeoesser atropeladadicas apostas liga dos campeoesum vídeo a pessoa ainda estivesse se mexendo, o conteúdo era marcado como "sensível", mas continuava no ar", lembra. "Só se houvesse morte a gente apagava".
Além da pressa, códigos sociais usados por diferentes grupos podiam dificultar o trabalho dos moderadores.
"Muitos gays chamam uns aos outrosdicas apostas liga dos campeoes'veado', por exemplo. Veado (ou faggot,dicas apostas liga dos campeoesinglês) era uma palavra proibida, a não ser que fosse uma autorrefêrencia. E acontecia sempredicas apostas liga dos campeoesum gay usar a palavra veado e ter a conta bloqueada ou desativada por ofensa", diz Sergio. "Muitas vezes, na moderação, era a gente quem decidia se a pessoa era gay ou não na horadicas apostas liga dos campeoesanalisar a denúncia."
Erros
A rede social costuma reconhecer falhas no sistema. "Nossos erros causaram muita preocupaçãodicas apostas liga dos campeoesvárias comunidades, inclusive entre grupos que sentem que nós agimos - ou deixamosdicas apostas liga dos campeoesagir - por parcialidade", dizia um post do Facebookdicas apostas liga dos campeoesjulho.
"Estamos profundamente empenhadosdicas apostas liga dos campeoesdiscutir e enfrentar a parcialidadedicas apostas liga dos campeoesqualquer lugar do mundo. Ao mesmo tempo, trabalhamos para corrigir nossos erros rapidamente, assim que eles acontecem."
Sergio diz que nunca encontrou uma denúnciadicas apostas liga dos campeoespostagem envolvendo algum amigo ou conhecido - as publicacões para revisão apareciamdicas apostas liga dos campeoesseu computadordicas apostas liga dos campeoesforma aleatória.
Ameaças contra políticos e pessoas públicas, no entanto, eram frequentes, diz ele - e as regras da rede para este público são distintas.
"Nós apagamos ameaças reais contra a integridade física das pessoas e removemos ameças específicasdicas apostas liga dos campeoesroubo, vandalismo ou prejuízo financeiro", dizem as regras oficiais do Facebook.
O texto oficial diz, porém, quedicas apostas liga dos campeoescasosdicas apostas liga dos campeoes"pessoas com visibilidade pública", as chances reais "das ameaças se concretizarem" são levadasdicas apostas liga dos campeoesconsideração na horadicas apostas liga dos campeoesapagar ou não a postagem.
Segundo Sergio, publicações como o vídeodicas apostas liga dos campeoesque o deputado Jair Bolsonaro afirma que a colega Maria do Rosario "não merece ser estuprada" e comentários violentos continuaram no ar porque a deputada se encaixaria nesta categoria. "Qualquer pessoa com maisdicas apostas liga dos campeoes100 mil seguidores é considerada pública", afirma o brasileiro.
Choque
Ele conta que o que mais chocava os colegas era a crueldadedicas apostas liga dos campeoespublicações com agressões a animais. "Num deles aparecia uma máquinadicas apostas liga dos campeoesmatadouro, com uma corda que girava presa a um motor e tinha uma vaca amarradadicas apostas liga dos campeoesuma das pontas. A corda a puxava e ela era despedaçada viva", diz.
A exposição excessiva a imagens violentas já levou moderadores do Facebook a desenvolverem distúrbiosdicas apostas liga dos campeoesansiedade, problemas sexuais e pânico, segundo jornais estrangeiros.
O brasileiro, no entanto, diz que era afetadodicas apostas liga dos campeoesmenor grau pelas imagens.
"Primeiro, porque nasci no Brasil, e nossas referências sobre violência tendem a ser mais agressivas que asdicas apostas liga dos campeoescolegas europeus, por exemplo", afirma.
Ele continua: "Depois, porque eu via todos os dias vídeosdicas apostas liga dos campeoesbrutalidades contra crianças, minorias e bichos, e a gente acaba se acostumando com imagens gráficas. Para mim, a crueldade humanadicas apostas liga dos campeoestermosdicas apostas liga dos campeoespalavras, apoiando agressões, pregando ódio, rindodicas apostas liga dos campeoesvítimasdicas apostas liga dos campeoescomentários e compartilhamentos, era sempre muito pior".
Os traumas levaram Sergio a apagar definitivamente deu perfil no Facebook.
"Para não ficar preso nas bolhas, nas câmarasdicas apostas liga dos campeoeseco onde as pessoas só ouvem as próprias vozes e asdicas apostas liga dos campeoesquem concorda com elas, eu decidi me isolar", conta o brasileiro."Eu não queria me tornar uma daquelas pessoas que apareciam nas denúncias."