São Paulo, o santo que fez do cristianismo uma religião:kings bulls bet

Um feliz acaso, diriam os estudiosos do cristianismo. Porque se a cidade que comemora o 470º aniversário nesta quinta-feira (25/1) se tornou uma das mais importantes do mundo, este cidadão romano chamado Paulo que viveu 2.000 anos atrás também pode ser chamadokings bulls betprotagonista.

Não fosse Paulo, prolífico escritor do seu tempo, empreendedorkings bulls betdiversas viagens missionárias, perspicaz na resoluçãokings bulls betconflitos e hábilkings bulls betorganizar e sistematizar o conhecimento, o cristianismo não teria se tornado uma religião — ao menos não uma religião tão importante, sobretudo para o Ocidente.

"Ele foi, sem dúvida, o primeiro grande teólogo do cristianismo", afirma o religioso Darlei Zanon, filósofo e teólogo, conselheiro da Società San Paolo,kings bulls betRoma. "E ainda hoje pode ser considerado um dos maiores teólogos da história do cristianismo, porque as bases [que ele fundamentou] ainda são estudadas."

"Mais do que teólogo, diria que foi um grande pastoralista, porque ele dava respostas concretas às questões pastorais, da sociedade, daquelas primeiras comunidades cristãs. Assim, vejo-o como um teólogo prático, um pastor, já que suas cartas tentavam dar respostas concretas aos problemaskings bulls betmoral,kings bulls betliturgia,kings bulls betcorreção fraterna,kings bulls betliderança…", enumera.

Nascidokings bulls betTarso, na atual Turquia, por volta do ano 5, ele se chamava Saulo. Cidadão romano, tornou-se um oficial encarregadokings bulls betperseguir cristãos naqueles temposkings bulls betque, logo após a mortekings bulls betJesus, os primeiros seguidoreskings bulls betseus ensinamentos precisavam agir na clandestinidade.

Conforme relatos bíblicos constantes do livro Atos dos Apóstolos, foikings bulls betuma dessas missões que ele viveu uma experiência mística decisiva. Segundo o texto, depois corroborado pela tradição, o oficial estava saindokings bulls betJerusalém a caminhokings bulls betDamasco, onde deveria buscar prisioneiros para serem interrogados e, muito provavelmente, executados.

Sua jornada, então, teria sido interrompida por uma luz ofuscante, seguidakings bulls betuma voz divina. "Saulo, Saulo, por que me persegues?", teria ele ouvido. "Quem és, Senhor?", foikings bulls betresposta, atônito. "Eu sou Jesus, a quem tu persegues."

A partir desta experiência, Paulo resolveu mudarkings bulls betlado. Deixoukings bulls betperseguir cristãos para se tornar um deles. "Essa narrativa é uma espéciekings bulls betritokings bulls betpassagem, a mudançakings bulls betperseguidor para perseguido", analisa o estudiosokings bulls bethagiografias Thiago Maerki, pesquisador da Universidade Federalkings bulls betSão Paulo (Unifesp) e associado da Hagiography Society, dos Estados Unidos.

E, num simbolismokings bulls betmudançakings bulls betvida, adotou novo nome. Saulo passou então a ser Paulo.

Mais do que seguidor do cristianismo, tornou-se um protagonista da evangelização. Fundou comunidades, com as quais mantinha contato frequente por cartas, e sistematizou os ensinamentoskings bulls betJesuskings bulls betforma a consolidar, alémkings bulls betuma doutrina, uma religião.

"Não fosse Paulo, talvez hoje não conheceríamos Jesus. Ao menos não o cristianismo como temos hoje", afirma Maerki. "Os escritoskings bulls betPaulo e toda a reverberação posterior foramkings bulls betfato uma espéciekings bulls betraiz do cristianismo."

Uma teologia a partir da experiência

Vice-diretor do Lay Centrekings bulls betRoma e doutor pela Pontifícia Universidade Gregorianakings bulls betRoma, o vaticanista Filipe Domingues atenta para o pontokings bulls betque a teologiakings bulls betPaulo "partekings bulls betuma experiência. "É importante frisar isso, porque anteskings bulls betprocurar entender o que é a fé cristã ou racionalizar sobre ela, os seguidoreskings bulls betCristo, principalmente os primeiros, partiramkings bulls betuma experiênciakings bulls betfé. No casokings bulls betPaulo, foi a conversão, que o tornou o maior anunciador", comenta ele.

"Nesse sentido, não se tratakings bulls betum processo racional, político ou metódico, simplesmente. Ele teve uma experiência radical, fez uma interpretação e, a partir dali, começou a anunciar", complementa o vaticanista.

A importância é tamanha que a Igreja Católica, cujo costume mais frequente é celebrar como data festivakings bulls betum santo o dia da morte do mesmo, reservou para Paulo duas efemérides: enquanto o 29kings bulls betjunho marca seu martírio, o 25kings bulls betjaneiro recorda o episódiokings bulls betsua conversão.

Ambas as datas, diga-se, foram inventadas a posteriori, pois não há registros precisos que atestem a exata ocorrência desses episódios. Segundo pesquisaskings bulls betMaerki, a festa da conversãokings bulls betPaulo começou a ocorrer na região da Gália, hoje França, no século 6. Em Roma, ela só começou a aparecer 500 anos mais tarde.

Fato é que mesmo não tendo convivido com Jesus vivo, Paulo acabou assumindo um papel importante no grupo dos primeiros cristãos — sendo que muitos deles, como Pedro, tinham vivido junto e acompanhado o mestrekings bulls betvida. Não à toa, ele mesmo se autodenomina apóstolo — e é reconhecido como tal —, usando aqui um termo mais comumente reservado aos 12 primeiros seguidores, os "escolhidos" por Jesus no iníciokings bulls betsua missão, que conviveram com ele.

Há um racha inicial desses primeiros anos do que viria a ser o cristianismo. E a quedakings bulls betbraço, vencida por Paulo, deixa claro que ele tinha poder argumentativo sobre os demais pensadores dessa igreja ainda embrionária.

"Ele abriu a Igreja para aqueles que não eram judeus. E esse foi o grande feitokings bulls betPaulo", lembra Domingues. Era uma questão pertinente na época. Como Jesus era judeu e havia pregado o seu evangelho aos judeus, os primeiros seguidores eram todos previamente judeus — convertidos ao cristianismo. Esse modus operandi fazia com que alguns pensassem, inclusive Pedro — considerado o primeiro papa —, que para se tornar cristão era preciso, antes, ser judeu.

"Paulo tinha um entendimento diferente. Entendia que era preciso abrir para todo mundo", salienta Domingues. "Interpretava que, se Jesus tinha vindo para salvar a todos, o evangelho não deveria ser anunciado antes apenas aos judeus."

Como a visão dele prevaleceu, o cristianismo pôde se espalhar.

Escritor prolífico

De regiões no Oriente Médio a pontos importantes na Europakings bulls betentão, cada viagem representava a evangelização cristã e o assentamentokings bulls betcomunidades do que viria a ser a Igreja Católica.

Para não perder o contato com tantos povos, Paulo escrevia cartas. Muitas cartas. Eram documentos nos quais consolidava o que ele entendia do cristianismo, por meiokings bulls betorientações morais, recordações interpretativas das mensagens deixadas por Jesus e recomendações sobre como as lideranças deveriam se comportar.

Mas não era nada simples escrever naquela época. "Tratava-sekings bulls betum processo lento e muito caro, muito custoso", comenta Zanon. Escrevia-se nos papiros ou nos pergaminhos e, segundo pesquisas, Paulo preferia os pergaminhos, preparados a partirkings bulls betcouro.

Para escrever, Paulo utilizava um instrumento cortante chamado cálamo. As letras eram riscadas e preenchidas a tinta. "Era um processo muito lento. Mesmo assim ele escreveu muito. Não sabemos quantas cartas. Catorze estão na Bíblia, sendo que alguns estudiosos consideram que 9 são dele e outras cincokings bulls betcomunidades paulinas", diz Zanon. "Mas as próprias cartas trazem referências a outras que não temos hoje, então ele certamente escreveu muito mais. Escreveu muito."

"Como era um processo caro, tinhakings bulls betser feito com cuidado. Ele não podia errar nem reescrever, para não desperdiçar material. Escrevia com as letras muito próximas, muito juntas, ocupando o máximo possível o espaço do pergaminho", detalha.

Essas missivas foram escritas durante suas viagens e, principalmente, nos anoskings bulls betque ele esteve preso — justamente por praticar o cristianismo. "Ficou parte do períodokings bulls betcárcere domiciliar e tinha a liberdadekings bulls betescrever. Escrevia para animar as comunidades que ele fundou", conta Zanon.

O religioso lembrakings bulls betoutra característica das cartaskings bulls betPaulo. "Ele conhecia o aramaico e o hebraico, mas escreveu as cartaskings bulls betgrego, o que deve ter tornado um processo ainda mais lento", aponta.

A escolha do idioma já denotava uma aspiração a universalizar cada vez mais o cristianismo. "O grego era a cultura predominante na época e foi assim que ele espalhou aquilo que era da cultura localizada naquela época onde a gente chama hojekings bulls betTerra Santa. Trouxe para a cultura grega, ocidental. Isso foi uma grande abertura. Por isso a Igreja Católica não existiria hoje não fosse o trabalhokings bulls betPaulo", diz o vaticanista Domingues.

Zanon lembra que "a grande novidade"kings bulls betPaulo foi a "inculturação do evangelho". "Ele fez uma 'tradução' da mensagem, adaptando os conceitos-chave para a linguagem e a mentalidade greco-romana", analisa. "Soube dar categorias teóricas, e adaptar a mensagem para outras culturas, para as exigências e os problemas concretos das comunidades. Trouxe imagens da guerra, do esporte, da cidade, coisas que Jesus não utilizavakings bulls betsuas parábolas, que eram calcadaskings bulls betsímbolos agropastoris."

"São Paulo fez a passagem para o mundo mais amplo, universal. Deu as bases para que o cristianismo se tornasse universal", afirma ele.

Zanon acredita que se Paulo tivesse vividokings bulls bettempos contemporâneos, teria se tornado "um grande escritor, talvez um jornalista". "Ele escrevia muito, conhecia muito os problemas do mundo. Hoje, tentaria dar respostas para as problemáticas atuais, expor as dificuldades e os problemas, denunciar as injustiças", compara.

Morte por decapitação

Todo esse trabalho, é claro, passou a incomodar os romanos, que viam no cristianismo um grupokings bulls betarruaceiros que, ao proclamar Jesus como um rei, poderia botarkings bulls betrisco a hegemonia política do sistema.

Há controvérsias sobre quantas vezes e por quanto tempo Paulo teria ficado preso, mas o mais provável é que tenha sido uma vez na atual Turquia e duas vezes, mais para o fimkings bulls betsua vida, na região da cidadekings bulls betRoma.

É certo que ele participou presencialmentekings bulls betum encontro ocorrido entre os primeiros líderes cristãos,kings bulls betalgum momento entre os anoskings bulls bet48 e 50,kings bulls betJerusalém — naquele que é conhecido como o primeiro concílio da história da Igreja.

E acredita-se que tenha ido evangelizar na regiãokings bulls betRoma a partir do anokings bulls bet60. Ali teria sido preso novamente e, por fim, provavelmente no ano 67, condenado à morte.

"Não se sabe exatamente o dia da morte [a Igreja acabou, por convenção, adotando o dia 29kings bulls betjunho]. O que temos veio por tradição: ele teria morrido durante as perseguiçõeskings bulls betNero [imperador romano que governoukings bulls bet54 a 68]. Foi decapitado com uma espada na então periferiakings bulls betRoma", conta Zanon.

Era uma pena capital considerada mais branda, reservada aos cidadãos romanos. "Sua morte teria sido mais digna do que a dos outros cristãos. Os não-romanos, como Pedro, foram crucificados. A decapitação era algo menos doloroso, e Paulo tinha cidadania romana", explica.

No local onde acredita-se que ele tenha sido morto, depois foi erguida uma igreja, hoje a Basílicakings bulls betSão Paulo Fora dos Muros.

Protetorkings bulls betmuitas causas

Curiosamente, apesarkings bulls betemprestar seu nome à cidade desde a fundação, São Paulo só passou a ser reconhecido como patrono da capital paulistakings bulls bet2008, quando o cardeal arcebispo d. Odilo Scherer apresentou um pedido formal ao então papa Bento 16.

Mas o santo é tradicionalmente citado como protetorkings bulls betmuitas coisas e muitas causas. Zanon frisa que ele também é patrono oficialkings bulls betRoma ekings bulls betLondres, alémkings bulls betser considerado o protetor dos escritores, impressores e editores — "por uma questão óbvia, já que foi ele talvez um dos maiores escritores da história da humanidade", ressalta.

"Também é o patrono dos evangelizadores e missionários", acrescenta. "E, não oficialmente, também podemos dizer que ele é o patrono dos imigrantes e dos viajantes, porque ele passou grande parte da vida viajando. É o santo da universalidade, conheceu muitas culturas e tem um coração universal."

O religioso ainda lembra que Paulo é acionado "contra as tempestades do mar e os naufrágios" ekings bulls betcasos "de picadakings bulls betcobra", também conforme a devoção popular. "E padroeiro dos convertidos", diz.

"No mundo atual, ele pode nos ajudar muito porque foi alguém que sempre se abriu ao diferente. Precisamoskings bulls bettolerância,kings bulls betabertura ao diálogo,kings bulls betaceitação das diferençaskings bulls betbuscakings bulls betum denominador comum", comenta Zanon.

De olho nos problemas contemporâneos, o religioso ainda atualiza Paulo como "um modelo contra as fake news". "Porque Paulo,kings bulls betsuas cartas, era o defensor da verdade. Ele passou a vida toda escrevendo para as comunidades buscando combater a manipulação, criticando as pessoas que tentavam manipular os povoskings bulls betbenefício próprio. Nesse sentido, estava combatendo as fake news, o que hoje chamamoskings bulls betfake news", acredita.

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