'Tinha 9 anos, não falava nem sorria': o caso1 2 betanoaborto na infância que chocou o Brasil há 13 anos:1 2 betano

Legenda do áudio, 'Tinha 9 anos, não falava nem sorria': o aborto na infância que chocou o Brasil há 13 anos

'Menina não falava'

O ano era 2009 quando a menina1 2 betanoPesqueira (PE) se queixou1 2 betanodores e foi levada pela mãe a uma consulta médica.

Os médicos descobriram que ela estava grávida1 2 betanogêmeos - e, posteriormente, que ela era vítima1 2 betanoestupros cometidos pelo padrasto desde quando ela tinha 6 anos1 2 betanoidade.

A gestação era1 2 betanoalto risco, pela idade da menina e por seu pequeno porte físico. Reportagens da época indicam que ela tinha 36 quilos e 1,32 metro1 2 betanoaltura.

"Era uma menina muito pequena, tanto1 2 betanoidade quanto fisicamente, e não tinha muita noção do que estava acontecendo", conta à BBC News Brasil Cristina Buarque, que na época era secretária estadual da Mulher no governo1 2 betanoPernambuco e que acompanhou a menina depois que o caso foi encaminhado ao Recife.

A história rapidamente atraiu a atenção da imprensa e da sociedade civil, colocando a família e a menina no centro das atenções.

Segundo Buarque, a mãe estava muito decidida pela interrupção da gestação, diante do fardo sobre1 2 betanofilha.

"Tenho a lembrança muito clara1 2 betanoque a menina não falava nada. Ficava o tempo todo com uma boneca na mão. E era uma criança muito temerosa, angustiada. Não respondia nenhuma pergunta", diz Buarque. "Eu só vi ela sorrir e falar depois que o aborto aconteceu."

A interrupção da gravidez foi realizada no Centro Integrado1 2 betanoSaúde Amaury1 2 betanoMedeiros (Cisam), hospital1 2 betanoRecife ligado à Universidade1 2 betanoPernambuco. O médico Olímpio1 2 betanoMoraes, coordenador do centro, tem recordação parecida à1 2 betanoCristina Buarque.

"A menina tinha menstruado uma vez só e não entendia o que estava acontecendo, embora fosse dito para ela o que era uma gravidez. Ela achava que estava doente e ia para o hospital tirar o tumor. Estava sempre com uma boneca", contou o obstetra à BBC News Brasil,1 2 betanoentrevista concedida1 2 betano2016.

Mas o aborto foi duramente criticado pela Igreja Católica, que se mobilizou para impedi-lo.

O então arcebispo1 2 betanoOlinda e Recife, Dom José Cardoso Sobrinho, excomungou todas as pessoas envolvidas no procedimento - desde a mãe da menina até os médicos do hospital.

"A lei1 2 betanoDeus está acima1 2 betanoqualquer lei humana. Quando a lei humana, quer dizer, uma lei promulgada pelos legisladores humanos, é contrária à lei1 2 betanoDeus, essa lei humana não tem nenhum valor", afirmou o arcebispo à época.

A menina foi poupada da excomunhão.

"Para incorrer nessa penalidade eclesiástica, é preciso maioridade. A Igreja, então, é muito benévola, sobretudo com as pessoas1 2 betanomenor. Agora os adultos - quem aprovou e quem realizou este aborto - incorreram na excomunhão", declarou Dom José Cardoso na ocasião.

Olímpio Moraes

Crédito, BBC News Brasil

Legenda da foto, 'Nunca tive dúvidas1 2 betanoque era o correto a fazer', diz obstetra sobre aborto1 2 betanogarota vítima1 2 betanoestupro e excomungado pela Igreja

Passados 13 anos, Cristina Buarque diz que achou a atuação da Igreja Católica no episódio "algo monstruoso".

"Eram muitos homens metidos a controlar (o corpo)1 2 betanouma pessoa do sexo feminino, e essa pessoa era uma criança", critica.

"Mas vi também um grupo1 2 betanomulheres muito decidido a proteger a menina. Foi a sociedade civil que me acionou: recebi ligações dizendo 'secretária, isso (o cerceamento ao aborto legal) está acontecendo, e a senhora precisa agir'", relembra Buarque.

"E eu já sabia que tinha1 2 betanoagir, mas quero deixar clara a importância1 2 betanoos movimentos sociais estarem vigilantes;1 2 betanoterem o telefone1 2 betanouma secretária (de governo) e poderem me ligar."

O médico Olímpio Moraes contou à BBC1 2 betano2016 que nunca teve dúvidas "de que aquilo (interrupção da gravidez) era o correto a se fazer. No caso dela se somavam duas indicações para o aborto legal. Além do estupro, havia o risco1 2 betanomorte. Era uma criança1 2 betano1,32 m grávida1 2 betanogêmeos. Isso é uma gravidez1 2 betanoalto risco".

Apesar1 2 betanoalgumas meninas já menstruarem a partir dos 9 ou 10 anos1 2 betanoidade, a puberdade precoce ligada a questões sociais e hormonais não significa que o corpo delas esteja preparado para gestar ou parir, explica à BBC News Brasil Melania Amorim, professora1 2 betanoGinecologia e Obstetrícia da Universidade Federal1 2 betanoCampina Grande (PB).

Na fase1 2 betanocrescimento do corpo, "em muitas meninas, os ossos da pélvis não estão formados, então o parto vaginal é muito difícil", detalha Amorim. Mesmo com cesárea, há riscos1 2 betanosangramento excessivo, anemia, eclâmpsia (hipertensão na gravidez), partos prematuros, rompimento do útero, necessidade1 2 betanotransfusão1 2 betanosangue ou internação1 2 betanoUTI.

Mulher grávida

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, Embora algumas meninas já menstruem, seu corpo e desenvolvimento ainda não está pronto para gestar e parir, fazendo da gestação um risco para suas vidas

Olímpio Moraes também ressalta que,1 2 betanoum corpo imaturo para a gestação, a chance1 2 betanomorte ou complicações graves é muito mais alta do que numa gravidez1 2 betanomulheres na casa dos 20 anos.

Sobre a excomunhão, ele disse:

"Até brinco dizendo que não recebi nenhum certificado (da Igreja) para colocar no meu currículo,1 2 betanodefesa das mulheres. Sou católico, como a maior parte dos brasileiros, mas não sou praticante. E acho que esse é um dos motivos que fazem a gente se afastar quando começa a exercer a profissão. Às vezes acho que muitas religiões não condizem com um princípio básico que é ter compaixão e respeitar o sofrimento dos outros."

Nova vida

Depois do aborto, a menina voltou a viver com a mãe e a irmã - e o padrasto foi preso.

Por conta da grande repercussão do caso, conta Cristina Buarque, o governo pernambucano transferiu a família - a menina com a mãe e a irmã - para uma outra cidade, onde pudessem recomeçar a vida, com acompanhamento psicológico.

"Foi o mínimo que poderíamos fazer como um Estado laico que protege suas crianças", argumenta a ex-secretária. "Não achávamos que um caso desses pudesse ser abandonado. Ela não poderia voltar a morar no mesmo lugar, onde o mundo inteiro sabia onde era."

Buarque diz que o caso foi monitorado pela secretaria estadual por alguns anos, até o início da adolescência da menina.

"Ela retomou o colégio e ficou junto da mãe. Teve a vida ordenada. (...) Não sei se ela é feliz, não é um conto1 2 betanofadas, mas sei que1 2 betanomãe voltou a trabalhar, e ela se encaminhou dentro1 2 betanouma vida1 2 betanofamília pobre."

O caso da menina pernambucana1 2 betano2009 veio à mente1 2 betanoBuarque ao ver o noticiário dois anos atrás - quando uma menina do Espírito Santo, estuprada aos 10 anos, foi impedida1 2 betanoabortar1 2 betanoseu Estado e levada para o Recife para realizar o procedimento - e, agora1 2 betanojunho, com o ocorrido1 2 betanoSanta Catarina.

"É impensável que os Estados não tenham como fazer ou se neguem a fazer algo que a lei obriga", diz Buarque,1 2 betanoreferência ao aborto legal no Brasil - nos casos1 2 betanoestupro, risco1 2 betanovida à mãe ou anencefalia.

Em Santa Catarina, a menina1 2 betano11 anos teve o aborto inicialmente negado pelo hospital1 2 betanoFlorianópolis que a atendeu, porque a gravidez passava das 22 semanas - apesar1 2 betanoo Código Penal brasileiro não impor limite1 2 betanoidade gestacional.

O caso foi judicializado, e gravações publicadas pelo Portal Catarinas e o The Intercept Brasil mostram a juíza perguntando à garota se ela aceitaria "suportar mais um pouquinho" a gestação. Depois da repercussão do caso, a menina foi retirada do abrigo, devolvida ao convívio com a mãe, e1 2 betanogravidez foi interrompida.

O presidente Jair Bolsonaro (PL) se manifestou nas redes sociais sobre o caso, dizendo que "tirar uma vida inocente, além1 2 betanoatentar contra o direito fundamental1 2 betanotodo ser humano, não cura feridas nem faz justiça contra ninguém, pelo contrário, o aborto só agrava ainda mais esta tragédia".

Dados levantados pela BBC News Brasil1 2 betano2020 mostram que, segundo dados oficiais, ocorrem no Brasil,1 2 betanomédia, seis internações diárias por aborto envolvendo meninas1 2 betano10 a 14 anos que engravidaram após serem estupradas.

Línea

- Este texto foi originalmente publicado1 2 betanohttp://vesser.net/brasil-61930150

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