Não é só efeito da pandemia: por que 19 milhõesbet7k spacemanbrasileiros passam fome:bet7k spaceman

Mulher segura tigela vazia

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, Aumento da fome no Brasil: 19 milhõesbet7k spacemanbrasileiros estãobet7k spacemansituaçãobet7k spacemanfome

São 19 milhõesbet7k spacemanbrasileirosbet7k spacemansituaçãobet7k spacemanfome no Brasil, segundo dadosbet7k spaceman2020 da Rede Brasileirabet7k spacemanPesquisabet7k spacemanSoberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Penssan). A comparação com 2018 (10,3 milhões) revela que são 9 milhõesbet7k spacemanpessoas a mais nessa condição.

Olhando dados mais antigos do Instituto Brasileirobet7k spacemanGeografia e Estatística (IBGE), é possível ver quebet7k spaceman2013 o Brasil teve o melhor nívelbet7k spacemansegurança alimentar da série histórica (Pnad), com maisbet7k spaceman77% dos domicílios nessa condição.

Em 2014, o Brasil inclusive deixou o chamado Mapa da Fome da ONU.

Cercabet7k spacemanquatro anos depois, no entanto, a Pesquisabet7k spacemanOrçamento Familiar (2017/2018) do IBGE mostrou que a situaçãobet7k spacemansegurança alimentar era vivenciada por apenas 63,3% dos domicílios pesquisados.

Nesse intervalo, houve aumento na quantidadebet7k spacemandomicíliosbet7k spacemantodos os níveisbet7k spacemaninsegurança alimentar — leve (preocupação com quantidade e qualidade dos alimentos disponíveis), moderada (restrição quantitativabet7k spacemanalimento) e grave (identificada como fome).

"A fome é consequênciabet7k spacemanuma sériebet7k spacemanerrosbet7k spacemanpolíticas públicas ebet7k spacemandestruiçãobet7k spacemanpolíticas públicas", diz Kiko Afonso, diretor executivo da ONG Ação da Cidadania, fundada por Betinho.

A socióloga Letícia Bartholo afirma que "a desestruturação das políticas públicas voltadas aos mais vulneráveis foi agravada com a pandemia, mas ela ocorre desde antes".

Antes e além da pandemia, quais fatores levaram o Brasil, segundo maior exportadorbet7k spacemanalimentos do mundo, a ver crescer a quantidadebet7k spacemanfamíliasbet7k spacemansituaçãobet7k spacemanfome?

Transferênciabet7k spacemanrenda defasada

Mulher mostra cartão do programa Bolsa Família

Crédito, Rafael Lampert Zart/Agência Brasil

Legenda da foto, Maior programabet7k spacemantransferênciabet7k spacemanrenda tem valores defasados, diz Bartholo, que foi secretária nacional adjuntabet7k spacemanrenda e cidadania

Parte da explicação está na cobertura e nos valores do maior programabet7k spacemantransferênciabet7k spacemanrenda, o Bolsa Família, segundo a socióloga Letícia Bartholo, que estuda políticas públicasbet7k spacemancombate à pobreza e à desigualdade e foi secretária nacional adjuntabet7k spacemanrenda e cidadania (2012-2016).

O primeiro problema, diz ela, é a defasagem da chamada linhabet7k spacemanpobreza (ou seja, o corte que define quais famílias têm direito ao benefício). Hoje têm direito ao benefício famílias com renda familiar per capitabet7k spacemanaté R$ 178.

No começo do programa, esse valor erabet7k spacemanR$ 100. Se estivesse atualizado, segundo os cálculosbet7k spacemanBartholo, o valor deveria estar hojebet7k spacemantornobet7k spacemanR$ 250.

"Essa desatualização é preocupante porque cria duas filas no Bolsa Família: já temos um problema da fila por faltabet7k spacemanorçamento, das famílias que cumprem os critérios e não são atendidas, e aí tem uma outra fila —bet7k spacemanpessoas que são pobres, passam fome, mas não são consideradas pobres administrativamente", explica.

E o auxílio emergencial? Bartholo diz que parte dessas famílias contam com o auxílio criado durante a pandemia, mas lembra que 400 mil famílias que estão na filabet7k spacemanespera do Bolsa Família também não recebem o auxílio emergencial, como mostrou reportagem da Folhabet7k spacemanS.Paulo.

"A desatualização da linhabet7k spacemanpobreza do programa cria um achatamento fictício da pobreza. O númerobet7k spacemanpobres, na realidade, é muito maior do que o númerobet7k spacemanpobres considerados do pontobet7k spacemanvista administrativo", diz Bartholo.

Outro ponto — que vem sendo discutidobet7k spacemanBrasília — é a faltabet7k spacemanreajuste nos valores do benefício, que variabet7k spacemanfunção da renda, do númerobet7k spacemanpessoas na família e idade delas.

O presidente Jair Bolsonaro disse que pretende ampliarbet7k spacemanR$ 190 para R$ 250 o valor médio pago a beneficiários do Bolsa Família. Outros valores, inclusive mais altos, já foram levantados, mas o governo ainda não apresentou uma proposta.

O Ministério da Cidadania disse à reportagem que trabalha na reformulação do programa "para ampliar o númerobet7k spacemanfamílias contempladas, alémbet7k spacemanreajustar os valores dos benefícios pagos atualmente, com maior eficiência no gasto do dinheiro público".

Disse, ainda, que o programa "tem alcançado os mais vulneráveis" e que o númerobet7k spacemanfamílias atendidas segue acimabet7k spaceman14 milhões. De janeiro a abril deste ano, segundo o governo, maisbet7k spaceman600 mil novas famílias ingressaram no programa.

Leticia Bartholo

Crédito, Arquivo pessoal

Legenda da foto, 'A desestruturação das políticas públicas voltadas aos mais vulneráveis foi agravada com a pandemia, mas ela ocorre desde antes', diz Bartholo

E o auxílio emergencial?

O benefício criado durante a pandemia tem sido reconhecido como importante ferramenta para combater fome e pobreza (ainda que insuficiente e apesar do período, no iníciobet7k spaceman2021,bet7k spacemanque não foi pago).

No entanto, Bartholo lembra que ele terá um fim e que é necessário, finalmente, desenhar esta transição.

"O auxílio vai findar. A gente não pode mais empurrar o problema com a barriga. Desde o ano passado estamos pensando: e quando o auxílio acabar? Vamos continuar tendo fila no Bolsa Família? Vamos continuar com linhasbet7k spacemanpobreza absolutamente defasadas? O auxílio é emergencial, portanto não corrige falhas estruturais das políticas públicas", diz Bartholo.

Fim ou enfraquecimentobet7k spacemanpolíticasbet7k spacemancombate à fome

Jair Bolsonaro

Crédito, Reuters

Legenda da foto, Bolsonaro extinguiu o Conselho Nacionalbet7k spacemanSegurança Alimentar e Nutricional (Consea), criado pelo governo do PT

Assim que assumiu o Palácio do Planalto, o presidente Jair Bolsonaro extinguiu o Conselho Nacionalbet7k spacemanSegurança Alimentar e Nutricional (Consea), que tinha atribuiçãobet7k spacemanpropor ao governo federal diretrizes e prioridades da políticabet7k spacemansegurança alimentar e nutricional.

O órgãobet7k spacemanassessoramento imediato ao Presidente da República havia sido criado no governo do PT.

Para Kiko Afonso, da ONG Ação da Cidadania, essa foi a "cartabet7k spacemanentrada do governo".

"Já entra dizendo o seguinte: não queremos participação da sociedade civil e especialistasbet7k spacemanfora do governo na políticabet7k spacemansegurança alimentar. Então, quando você extingue o Consea, extingue a ponte que havia com a sociedade civil — não só no sentidobet7k spacemandar opiniões, masbet7k spacemanmonitorar o que o governo estava fazendo. Virou uma caixa preta."

A professora do Departamentobet7k spacemanNutrição da Universidadebet7k spacemanBrasília (UnB) Elisabetta Recine, que foi a última presidente do Consea, diz que esse modelo é importante como uma fonte diretabet7k spacemaninformação para o governo ebet7k spaceman"contato com a realidade" para ajustesbet7k spacemanplanejamento ebet7k spacemanprioridade.

"A extinção do Consea tem um um significado muito objetivo, que é o desmantelamento da proposta do Sistema Nacionalbet7k spacemanSegurança Alimentar e Nutricional, mas ela tem um valor simbólico também."

Procurado pela reportagem, o Ministério da Cidadania disse que as competências do Consea foram distribuídas entre diversas áreas do governo e que "com essa formabet7k spacemanorganização administrativa, as ações governamentais tornam-se mais céleres e eficientes".

Para Recine, a justificativa não faz sentido. "É um argumento absolutamente falso, é só você olhar a lentidão com o que o governo respondeu a situação da pandemia,bet7k spacemantodos os aspectos", opina.

Elisabetta Recine, ex-presidente do Conselho Nacionalbet7k spacemanSegurança Alimentar e Nutricional

Crédito, Marcelo Camargo/Agência Brasil

Legenda da foto, Ex-presidente do Consea, Recine diz que fim do conselho teve significados prático e simbólico

Um estudobet7k spacemanpesquisadores vinculados a universidades na Alemanha e no Brasil, que mostrou que a maioria (59%) dos domicílios entrevistados no fimbet7k spaceman2020 estavambet7k spacemansituaçãobet7k spacemaninsegurança alimentar durante a pandemia, também citou o fim do Consea como um dos "retrocessos institucionais e orçamentários na agenda da segurança alimentar e nutricional".

O estudo destaca que o Brasil passa por uma combinaçãobet7k spacemancrises — política, econômica,bet7k spacemanseguridade social e sanitária.

"A crise política também afetou a agenda da alimentação por meio do enfraquecimento da estrutura institucional ebet7k spacemanimportantes políticas e programasbet7k spacemanpromoção da produção da agricultura familiar", afirma.

Os pesquisadores destacam o fim do Ministério do Desenvolvimento Agrário (2016) e o baixo investimento no Programabet7k spacemanAquisiçãobet7k spacemanAlimentos (PAA) e no Programa Nacionalbet7k spacemanAlimentação Escolar (PNAE).

"O enfraquecimento destas políticas, reconhecidas mundialmente como ações exitosas que contribuem para a metabet7k spacemanerradicação da fome, sendo importantes impulsionadoras da saída do Brasil do Mapa da Fome da FAO,bet7k spaceman2014, dificulta que os indivíduos mais pobres tenham acesso a alimentos."

Para Recine, a mudançabet7k spacemanorientação começou durante o governo do ex-presidente Michel Temer.

"As políticas públicasbet7k spacemansegurança alimentar começaram a sofrer mudanças muito profundas. Logo que o Temer assumiu a presidência, ele já teve atitudes muito importantesbet7k spacemanrelação a isso, que mostravam já o caminho do retrocesso. Ele, por exemplo, extinguiu o Ministério da do Desenvolvimento Agrário, cortou radicalmente e, com isso, começou a desmantelar todas as políticasbet7k spacemanapoio à agricultura familiar", diz a professora da UnB.

Gasto federal com políticasbet7k spacemandesenvolvimento agrário. Queda foibet7k spaceman55%bet7k spaceman2013 a 2019.  Valores corrigidos pelo IPCA (2019).

Os gastos federais com políticasbet7k spacemandesenvolvimento agrário caíram 55%bet7k spaceman2013 (R$ 1,13 bilhão) até 2019 (R$ 510 milhões), conforme aponta artigo sobre gasto federal com políticas sociais elaborado pela pesquisadora do Ipea Fabiola Vieira.

Na mesma basebet7k spacemancomparação, também houve perdabet7k spacemanrecursosbet7k spacemanpolíticas nas áreasbet7k spacemancultura (-30,2%), educação (-11,1%), habitação (-74,6%), saneamento (-53,2%), trabalho e renda (-6,1%) e urbanismo (-3,0%).

Aumentos só foram verificadosbet7k spacemanpolíticasbet7k spacemanassistência social (9,3%), previdência (16,5%) e saúde (16,5%), que envolvem muitas das chamadas despesas obrigatórias.

Projeto Covid Sem Fome

Crédito, EPA

Legenda da foto, A fome, que crescia no Brasil nos últimos anos, piorou na pandemia

Bartholo aponta que também "houve uma desestruturaçãobet7k spacemantoda uma redebet7k spacemanpolíticas públicas que se articulavabet7k spacemantorno do Cadastro Único para apoiar o desenvolvimento das famílias mais vulneráveis".

"O desenvolvimento dessa rede foi tomado, nos últimos anos, pela dimensão do controle,bet7k spacemanevitar fraudes. É claro que a dimensão do controle é muito importante nas políticas públicas, mas é uma delas. Quando o controle consome as demais dimensões das políticas públicas, elas vão se enfraquecendo, perdendo capacidadebet7k spacemanmelhoria, inclusive."

A assessoriabet7k spacemanimprensa do Ministério da Cidadania respondeu que o governo trabalha para aprimorar programas sociais como o Programabet7k spacemanAquisiçãobet7k spacemanAlimentos (PAA). "A reestruturação dos programas do Governo Federal visa, acimabet7k spacemantudo, ao fortalecimento do Sistema Únicobet7k spacemanAssistência Social (SUAS), com foco na emancipação do cidadão", diz a nota.

A assessoriabet7k spacemanimprensa da pasta disse ainda que "tem trabalhado sistematicamente para fortalecer os programas sociais e estabelecer uma redebet7k spacemanproteção para a populaçãobet7k spacemansituaçãobet7k spacemanvulnerabilidade" e que "é compromisso desta gestão ampliar o alcance das políticas sociais e atingir, com maior eficácia, a missãobet7k spacemansuperar a pobreza e minimizar os efeitos da desigualdade socioeconômica".

entregabet7k spacemancestas básicas

Crédito, Divulgação

Legenda da foto, Depoisbet7k spacemandez anos sem distribuir cestas básicas, a ONG Ação da Cidadania identificou a necessidadebet7k spacemanretomar essa distribuiçãobet7k spaceman2017

'Solução para fome não é distribuir cesta básica'

Kiko Afonso, da Ação da Cidadania, diz que é preciso combater a ideiabet7k spacemanque a solução para a fome está na distribuiçãobet7k spacemancestas básicas, que é uma açãobet7k spacemanemergencial.

"A gente não pode achar que a solução da fome é distribuir cesta básica, que a solução é pegar alimentos vencidos e distribuir pras pessoas ou pegar sobrasbet7k spacemanrestaurantes oubet7k spacemancomidasbet7k spacemanpessoas da classe média para distribuir pra população", diz.

"Isso é uma atuaçãobet7k spacemanemergência, mas a solução não é essa. O governo, ao longo dos últimos anos, criou parte desse problema que a gente está hoje."

Depoisbet7k spacemandez anos sem distribuir cestas básicas, a ONG identificou a necessidadebet7k spacemanretomar essa distribuiçãobet7k spaceman2017. Neste ano, arrecadou maisbet7k spacemanR$ 146 milhões e distribuiu alimentosbet7k spacemantodos os estados e no DF.

"A gente não quer fazer isso, a gente quer que o governo assuma o seu papel e que a política pública volte a assumir o seu papel", diz Afonso.

Rodrigo Afonso, diretor executivo da Ação da Cidadania

Crédito, Divulgação

Legenda da foto, Rodrigo Afonso, da Ação da Cidadania: distribuir cesta básica 'é uma atuaçãobet7k spacemanemergência, mas a solução não é essa'

Como uma das açõesbet7k spacemancombate à fome, o Ministério da Cidadania citou,bet7k spacemanresposta à BBC News Brasil, que estruturou a iniciativa Brasil Fraterno, "que incorporou todas as ações sob a responsabilidade da pasta voltadas para aquisição e distribuiçãobet7k spacemancestasbet7k spacemanalimentos a quem mais precisa". Segundo a pasta, trata-sebet7k spacemanuma redebet7k spacemansolidariedade, com participaçãobet7k spacemansetores da iniciativa privada como o Sistema S e o agronegócio.

O ministro da Economia, Paulo Guedes, fez uma declaração,bet7k spacemanjunho, na qual comparou o prato dos europeus ("pratos relativamente pequenos") e dos brasileiros e faloubet7k spacemandirecionar alimentos desperdiçados a programas sociais.

Procurada depois da fala do ministro para responder às críticas feitas por especialistasbet7k spacemanrelação ao enfraquecimentobet7k spacemanpolíticasbet7k spacemancombate à fome no Brasil, a assessoriabet7k spacemanimprensa respondeu à BBC News Brasil que o Ministério da Economia não comentaria o assunto.

line

bet7k spaceman Já assistiu aos nossos novos vídeos no YouTube bet7k spaceman ? Inscreva-se no nosso canal!

Pule YouTube post, 1
Aceita conteúdo do Google YouTube?

Este item inclui conteúdo extraído do Google YouTube. Pedimosbet7k spacemanautorização antes que algo seja carregado, pois eles podem estar utilizando cookies e outras tecnologias. Você pode consultar a políticabet7k spacemanusobet7k spacemancookies e os termosbet7k spacemanprivacidade do Google YouTube antesbet7k spacemanconcordar. Para acessar o conteúdo cliquebet7k spaceman"aceitar e continuar".

Alerta: Conteúdobet7k spacemanterceiros pode conter publicidade

Finalbet7k spacemanYouTube post, 1

Pule YouTube post, 2
Aceita conteúdo do Google YouTube?

Este item inclui conteúdo extraído do Google YouTube. Pedimosbet7k spacemanautorização antes que algo seja carregado, pois eles podem estar utilizando cookies e outras tecnologias. Você pode consultar a políticabet7k spacemanusobet7k spacemancookies e os termosbet7k spacemanprivacidade do Google YouTube antesbet7k spacemanconcordar. Para acessar o conteúdo cliquebet7k spaceman"aceitar e continuar".

Alerta: Conteúdobet7k spacemanterceiros pode conter publicidade

Finalbet7k spacemanYouTube post, 2

Pule YouTube post, 3
Aceita conteúdo do Google YouTube?

Este item inclui conteúdo extraído do Google YouTube. Pedimosbet7k spacemanautorização antes que algo seja carregado, pois eles podem estar utilizando cookies e outras tecnologias. Você pode consultar a políticabet7k spacemanusobet7k spacemancookies e os termosbet7k spacemanprivacidade do Google YouTube antesbet7k spacemanconcordar. Para acessar o conteúdo cliquebet7k spaceman"aceitar e continuar".

Alerta: Conteúdobet7k spacemanterceiros pode conter publicidade

Finalbet7k spacemanYouTube post, 3