Em meio à exportação recordeaposta gratis hojealimentos, seca e pandemia agravam fome no campo:aposta gratis hoje
Em áreas rurais, 28% dos domicílios estavamaposta gratis hojesituaçãoaposta gratis hojeinsegurança alimentar leve (marcada pela incerteza no acesso aos alimentos e qualidade inadequada da alimentação) ao fimaposta gratis hoje2020; 19,9% passavam por insegurança moderada (quando há redução na quantidadeaposta gratis hojealimentos disponíveis para os adultos) e 27,3% enfrentavam insegurança alimentar grave.
Jáaposta gratis hojeáreas urbanas, a insegurança alimentar leve afetava 31,6% dos lares, a moderada 11% e um totalaposta gratis hoje13,1% conviviam com a insegurança alimentar grave.
Segundo especialistas, o elevado índiceaposta gratis hojeinsegurança alimentaraposta gratis hojeáreas rurais no Brasil se deve a uma combinaçãoaposta gratis hojefatores.
Entre eles estão o maior percentualaposta gratis hojepobreza no campo, a elevada concentração no acesso à terra, a limitação dos recursos hídricosaposta gratis hojemuitas regiões do país e o menor acesso das comunidades rurais afastadas aos equipamentos públicosaposta gratis hojesegurança alimentar e às redes privadasaposta gratis hojesolidariedade e doações.
Essa situação tem sido agravada, desde 2016, por um desmonte das políticas públicasaposta gratis hojesegurança alimentar, dizem os estudiosos. E, na pandemia, somou-se a esse quadro um menor acesso dos pequenos produtores rurais aos mercados, que prejudicouaposta gratis hojecondiçãoaposta gratis hojerenda.
Em 2021, uma forte seca tem tornado o cenário ainda mais dramático.
Um sistema alimentar que produz desigualdade
"O sistema alimentar dominante do país referenda e produz desigualdade", afirma Renato Maluf, coordenador da Rede Brasileiraaposta gratis hojePesquisaaposta gratis hojeSoberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Rede Penssan).
"A agropecuária exportadora concentra propriedade, tem impactos sociais e ambientais onde atua e promove êxodo rural. Essa é uma característica da formação histórica da sociedade brasileira, não éaposta gratis hojeagora", observa o pesquisador.
"Esse modelo não tem a perspectivaaposta gratis hojealimentar pessoas, é um grande negócio global. O mundo nunca produziu tantos alimentos como agora e a fome continua. Portanto, não é essa a saída", avalia o especialistaaposta gratis hojesegurança alimentar.
Renata Motta, pesquisadora da Universidade Livreaposta gratis hojeBerlim e uma das autoras do estudo Efeitos da pandemia na alimentação e na situação da segurança alimentar no Brasil tem avaliação similar.
"A fome não é resultado da faltaaposta gratis hojeproduçãoaposta gratis hojealimentos, mas da faltaaposta gratis hojeacesso a eles", diz Motta.
"Josuéaposta gratis hojeCastro, o pesquisador da fome que construiu uma agenda importante sobre o tema na Organização das Nações Unidas (ONU), sempre falava que a fome é uma questão política. Ela não é uma questãoaposta gratis hojemercado e não vai ser resolvida pelas leisaposta gratis hojemercado, pois o mercado vende para quem pode comprar."
Ela cita o exemplo do arroz brasileiro, que acumula uma altaaposta gratis hojepreçosaposta gratis hoje57%aposta gratis hoje12 meses até abril, segundo o Instituto Brasileiroaposta gratis hojeGeografia e Estatística (IBGE),aposta gratis hojemeio ao aumento das exportações do produto para a China.
"Compra quem pode. No Brasil e no mundo, temos uma produçãoaposta gratis hojealimentos suficiente para alimentar a população inteira e temos a fome, porque ela é uma questãoaposta gratis hojedesigualdade."
A BBC News Brasil procurou as principais entidades representantes do agronegócio no país para falar sobre a insegurança alimentaraposta gratis hojeáreas rurais.
A Associação Brasileira do Agronegócio (Abag) e o Instituto Pensar Agropecuária (IPA) não quiseram dar entrevistas, mas destacaram que o setor lançaaposta gratis hoje1ºaposta gratis hojejunho, junto ao Ministério da Agricultura, o programa Agro Fraterno, que vai arrecadar e doar alimentos para famílias necessitadas e afetadas pela pandemia da covid-19.
Já a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) informou atravésaposta gratis hojesua assessoriaaposta gratis hojeimprensa que ainda não havia recebido retornoaposta gratis hojesua área técnica até o fechamento desta reportagem.
Seca e pandemia: uma combinação sem precedentes
Na semana passada, o Sistema Nacionalaposta gratis hojeMeteorologia (SNM) emitiu o primeiro alertaaposta gratis hojeemergência hídrica para o períodoaposta gratis hojejunho a setembro, na região da Bacia do Paraná, que abrange os estadosaposta gratis hojeMinas Gerais, Goiás, Mato Grosso do Sul, São Paulo e Paraná, informou o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento na quinta-feira (27/05).
A seca tem agravado a situaçãoaposta gratis hojeinsegurança alimentaraposta gratis hojecomunidades rurais cuja renda já vinha sendo afetada pela pandemia desde o ano passado.
"Nossa comunidade é uma comunidade quilombola, uma comunidade carente do municípioaposta gratis hojeIaciara, que é uma cidade muito pobre", conta Antonino Bispo da Silva,aposta gratis hoje57 anos, uma das lideranças da comunidade quilombola do Levantado,aposta gratis hojeIaciara, no nordesteaposta gratis hojeGoiás.
A comunidade fica cercaaposta gratis hoje320 kmaposta gratis hojeBrasília e pouco maisaposta gratis hoje200 km por estradaaposta gratis hojeAlto Paraísoaposta gratis hojeGoiás.
Os quilombolas do Levantado são cercaaposta gratis hoje40 famílias, das quais entre 200 e 300 pessoas vivem atualmente na comunidade, que há 14 anos aguarda a demarcação pelo Instituto Nacionalaposta gratis hojeColonização e Reforma Agrária (Incra).
"A gente passa muita dificuldade, porque a sobrevivência da gente é o plantio da gente mesmo e já há algum tempo que aqui há faltaaposta gratis hojechuva e as nossas lavouras não rendem", diz o líder quilombola.
Além da faltaaposta gratis hojechuvas, os quilombolas enfrentam uma disputa por água com os fazendeiros vizinhos que represam o fluxo do riacho local para a produção agrícola rio acima da comunidade. Também estãoaposta gratis hojeconflito com a mineradora CalBrax, que pretende explorar calcário, tendo a baseaposta gratis hojeexploração a 1,5 km das casas da comunidade.
Segundo Bispo da Silva, quando não havia seca, a comunidade plantava cana-de-açúcar, banana, arroz, feijão, mandioca, milho. "A gente se alimentava e ainda sobrava um pouquinho para vender", lembra o agricultor.
Agora, as famílias têm se sustentado com a aposentadoria rural dos idosos e uma ou outra diáriaaposta gratis hojefazendas que os mais jovensaposta gratis hojevezaposta gratis hojequando conseguem, alémaposta gratis hojedoaçõesaposta gratis hojecestas básicas feitas pela Comissão Pastoral da Terra (CPT).
"Se a gente já vinha sofrendo, agora está muito mais. E, com a pandemia, quando pega serviço, não pode botar muita gente para trabalhar, para não ter aglomeração", conta. "Se não tivéssemos as pessoas que às vezes nos dão um auxílio, seria pecaminosa a nossa situação."
'Nunca tinha recebido tanto pedidoaposta gratis hojecesta básica'
Na vizinha Minas Gerais, a faltaaposta gratis hojechuva também tem agravado a insegurança alimentar na regiãoaposta gratis hojecerrado do norte do Estado.
"Tem 18 anos que eu trabalho aqui, desde que me formei, e eu nunca tinha recebido tanto pedidoaposta gratis hojecesta básicaaposta gratis hojecomunidades rurais como está acontecendo agora", relata Samuel Caetano, assessor técnico do Centroaposta gratis hojeAgricultura Alternativa do Norteaposta gratis hojeMinas (CAA).
O CAA é uma organização formada há 35 anos por agricultores familiares e comunidades tradicionais, que atua no norteaposta gratis hojeMinas desde que a monoculturaaposta gratis hojeeucalipto chegou ao cerrado, ocupando territórios tradicionais desses povos.
"Estamos numa região semiárida,aposta gratis hojechuvas irregulares. Não é que não chove, mas o que tem que chover ao longo do períodoaposta gratis hojechuva, às vezes aconteceaposta gratis hoje15 dias e isso tem um impacto muito grande, a agricultura fica muito comprometida", diz Caetano.
"No meio disso, teve o processo da pandemia, que se soma à diminuiçãoaposta gratis hojeprogramas como o PAA (Programaaposta gratis hojeAquisiçãoaposta gratis hojeAlimentos), o Pnae (Programa Nacionalaposta gratis hojeAlimentação Escolar) e as políticasaposta gratis hojeacesso a crédito", enumera o assessor técnico.
"Tudo isso deixa a agricultura familiar muito fragilizada, porque o agricultor planta, às vezes perde o que plantou e, com o processo da pandemia, muitas vezes não consegue comercializar, porque os mercados estão comprometidos, as feiras ficaram fechadas, impedindoaposta gratis hojevender a produção para comprar os outros itensaposta gratis hojeque eles têm necessidade."
Segundo Caetano, a segunda onda da pandemia foi muito mais devastadora do que a primeira, porque pegou as comunidadesaposta gratis hojeestado muito mais frágil.
"Na primeira onda, tinha o auxílio emergencialaposta gratis hojeR$ 600 e houve um bom períodoaposta gratis hojechuva, foi um anoaposta gratis hojefartura — se produziu muita abóbora, feijão, milho, então os celeiros estavam abastecidos, mesmo que não se pudesse comercializar", relata o técnico.
"Isso foi esgotado, esse ano muita gente não conseguiu pegar o auxílio e a seca chegou forte, não vai ter mais o plantio. Então, o que se anuncia é um processoaposta gratis hojefome, que já está acontecendo na prática e que é agravado pelo quanto o preço das coisas está crescendo."
A inflação medida pelo Índice Nacionalaposta gratis hojePreços ao Consumidor Amplo (IPCA) acumula altaaposta gratis hoje6,76%aposta gratis hoje12 meses até abril. Os alimentos e bebidas, no entanto, subiram quase o dobro disso, com um avançoaposta gratis hoje12,31% no mesmo período.
Itens básicos como óleoaposta gratis hojesoja (82%), arroz (57%), feijão preto (42%), carnes (35%) e o botijãoaposta gratis hojegás (21%) usado para cozinhar acumulam aumentosaposta gratis hojepreços ainda mais expressivos.
Como mudar esse quadro
Questionado sobre o que é preciso ser feito para mudar o atual quadroaposta gratis hojeinsegurança alimentar no campo, Renato Maluf, coordenador da Rede Penssan, não titubeia.
"A primeira coisa que precisa ser feita é tirar o Bolsonaro", responde o pesquisador, sem meias palavras. "Isso não é apenas uma manifestaçãoaposta gratis hojedesejo. Não há a menor possibilidadeaposta gratis hojeos programasaposta gratis hojesegurança alimentar serem retomados, da forma como foram concebidos, sob esse governo."
Maluf afirma que o desmonte dessas políticas teve inícioaposta gratis hoje2016, após o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff (PT) e com a aprovação da regra do tetoaposta gratis hojegastos, que limitou as despesas do governo federal, visando controlar a trajetória da dívida pública.
Entre os programas que foram esvaziados, o pesquisador cita oaposta gratis hojeconstruçãoaposta gratis hojecisternas, o Programaaposta gratis hojeAquisiçãoaposta gratis hojeAlimentos da agricultura familiar, além do fim da políticaaposta gratis hojevalorização do salário mínimo que, junto com o avanço do emprego, foram fundamentais para que o Brasil deixasse do mapa da fome da ONUaposta gratis hoje2014.
Ele cita ainda a extinção do Conselho Nacionalaposta gratis hojeSegurança Alimentar e Nutricional (Consea), o encerramento da Câmara Interministerialaposta gratis hojeSegurança Alimentar e Nutricional e o fim do Ministério do Desenvolvimento Agrário, que concentrava as açõesaposta gratis hojeapoio à agricultura familiar.
"Houve um desmonte da estrutura institucional que havia sido montada nessa área", avalia.
Para Renata Motta, da Universidade Livreaposta gratis hojeBerlim, além da retomada desse sistema, é necessário,aposta gratis hojecaráter imediato, tornar o auxílio emergencial uma política perene enquanto durar a pandemia, para que não seja necessário renegociá-lo a cada três meses.
Além disso, segundo a socióloga, é preciso retomar um valoraposta gratis hojeauxílio que permita às pessoas ficaremaposta gratis hojecasa, para que a pandemia possaaposta gratis hojefato ser controlada.
Débora Nunes, membro da direção nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), defende ainda que o fim da insegurança alimentar no campo depende do avanço da reforma agrária no Brasil.
"Há dois projetosaposta gratis hojeagricultura no nosso país: o do agronegócio que produz commodities para exportação e o da agricultura camponesa e familiar."
"Quanto mais gente no campo, quanto mais terra democratizada, maior a possibilidadeaposta gratis hojeproduçãoaposta gratis hojealimentos. Por isso dizemos que a reforma agrária possibilita resolver problemas fundiários do nosso país, com a democratização da terra, mas também tem a possibilidadeaposta gratis hojeenfrentar outros problemas estruturais que a sociedade vivencia, como a fome", afirma.
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