Segundo mais caro do mundo, Congresso brasileiro tem parlamentares demais?:
O númerorepresentantes nos parlamentos costuma guardar alguma proporcionalidade com o tamanho da população. Com base nessa lógica,tese, quanto mais populoso um país, maior seria o seu Legislativo. Na prática, não é bem isso o que acontece.
O Brasil tem uma população209,3 milhõeshabitantes e um Congresso Nacional com 594 parlamentares (513 deputados e 81 senadores). Da América Latina, é a nação mais populosa e o terceiro país com mais deputados federais, atrás apenas do México (628) eCuba (605).
Mas, quando comparado a alguns dos principais países da Europa, nosso país não assustanúmeroparlamentares. Na França, existem atualmente 924 deputados e senadores para representar apenas 67 milhõeshabitantes.
A Alemanha tem mais778 parlamentares (709 da assembleia legislativa e 69 do Conselho Legislativo Federal), a Itália conta com 950 (630 deputados e 320 senadores), e o Reino Unido tem mais1,4 mil (650 integrantes da Câmara dos Representantes e 791 da Câmara dos Lordes). Esses três países possuem populações muito menores que a brasileira - entre 60 e 80 milhõeshabitantes.
Na Ásia, os países com legislativos maiores que o brasileiro incluem Japão (704), Índia (779), Mianmar (654) e China (2.980). Já os Estados Unidos possuem uma população maior que a brasileira,325 milhões, mas um Congresso menor, com 535 integrantes.
"Os Estados Unidos são o único exemplo que você vai encontrartamanho populacional maior que o Brasil e menos deputados", destaca o professorciência política da Universidade FederalMinas Gerais Carlos Ranulfo, coordenador do CentroEstudos Legislativos.
"Somos uma Câmara grande porque somos um país com população imensa. Em termosproporcionalidade, seria até razoável ter mais deputados. Mas não seria funcional ter 800 parlamentares."
Para o professor da UFMG, um dos objetivoscortar o númerodeputados poderia ser facilitar as negociações para aprovaçãoprojetosinteresse do governo.
Isso porque o excessopartidos políticos no Brasil - atualmente são 30 com representação no Congresso - historicamente exigiu que o presidente formasse coligações amplas com várias siglas e trocasse a aprovaçãopropostas por ministérios e emendas parlamentares.
Em tese, seria mais fácil negociar com 15 partidos do que 30, e com 400 deputadosvez513. "Acho que a verdadeira intenção é controlar melhor o parlamento. Se reduzisse para 400 deputados, isso automaticamente diminuiria o númeropartidos. Mas uma proposta assim dificilmente seria aprovada pelos próprios deputados e senadores", avalia Carlos Ranulfo.
Mas como chegamos ao número513 deputados e 81 senadores?
A Constituição1891, elaborada após a proclamação da República, já lançava as bases do Congresso Nacional que temos hoje. Ela instituía o bicameralismo, ou seja, a existênciaduas casas no Legislativo - Câmara e Senado. Também estabelecia um número fixo para os integrantes do Senado, seguindo a ideiaque os Estados deveriam ter representação igual (cada um teria o mesmo númerosenadores).
Já o númerodeputados seria estipuladomaneira proporcional ao tamanho da população, considerando um mínimoquatro deputados por Estado. Ao longo dos anos, os limites mínimos e máximosparlamentares foram modificados e o Congresso Nacional foi crescendotamanho, assim como a população brasileira como um todo.
A Constituição Federal1988 estabeleceu que Senado seria formado por 81 representantes - 3 por Estado e o Distrito Federal.
O número totaldeputados, assim como a representação por Estado, seria determinada por lei complementar proporcionalmente à população dos Estados. Mas a Constituição1988 fixou70 o número máximodeputados por estado e8 o número mínimo.
Esses limites foram vistos como uma vitória dos Estados menos populosos, que queriam evitar que regiões com muitos habitantes, como o EstadoSão Paulo, concentrassem um número muito maiordeputados. Em 1993, uma lei complementar foi aprovada limitando513 o número totaldeputados.
Na prática, o teto70 deputados acabou gerando uma distorção, já que o votoum moradorSão Paulo, com 44 milhõeshabitantes, acaba "valendo menos" que oum eleitorRoraima, que tem 497 mil habitantes e oito deputados.
"Havia uma preocupaçãoevitar um Estado com super-representação, que tivesse o domínio. Mas, na prática, acabou que São Paulo ficou sub-representado", admite o ex-deputado Genebaldo Correia (PMDB-BA), autor da lei que instituiu o limite513 deputados.
Para o professor Carlos Ranulfo, o maior problema relacionado ao tamanho do Congresso brasileiro não está no número absolutoparlamentares, mas sim na forma como é feita a distribuição por Estado.
"O argumento para fixar esses limites é oque se equilibraria a força dos Estados, mas esse argumento é fácilser contestado porque o Senado já faz isso. Lá você tem trêsRoraima e trêsSão Paulo. Ou seja, lá já temos uma representação por igual", defende.
Congresso brasileiro é o segundo mais caro do mundo
Se, por um lado, o númeroparlamentares brasileiros não é excessivo, na comparação com o resto do mundo, os gastos definitivamente são.
Uma pesquisa das Nações Unidasparceria com a União Interparlamentar (UIP) revela que o Congresso americano, menor que o brasileiro, é o mais caro - custa maisUS$ 5,1 bilhões por ano. Mas o Brasil vem logo atrás, com um custo anualcerca US$ 4,4 bilhões, conforme dados repassados pela UIP à BBC News Brasil.
Para permitir uma comparação justa entre países, o estudo usa dadosdólares, ajustados pela paridade do podercompracada região. Trata-seum sistema adotado pelo Banco Mundial para corrigir diferenças nos custovidadiferentes países.
Ao dividir os gastos pelo númeroparlamentares, é possível descobrir o custo por deputado e senador. Cada deputado americano custa US$ 9 milhões aos cofres públicos, enquanto o deputado brasileiro custa US$ 7,4 milhões por ano.
Países com parlamentos muito maiores que o Brasil conseguem ter um custo bem menor por deputado. Um parlamentar alemão ou francês, por exemplo, custa seis vezes menos que um brasileiro. No Reino Unido, um parlamentar custa US$ 360 mil - mais20 vezes menos que um legislador brasileiro.
Gil Castello Branco, da ONG Contas Abertas, fez um cálculo mais atualizado dos custos do Senado e da Câmara com base no orçamento2018.
Segundo ele, juntas, as duas Casas legislativas custam R$ 28 milhões por dia. Além do salárioR$ 33,7 mil, os deputados recebem auxílio-morada no valorR$ 4,2 mil mensais e Cota para o Exercício da Atividade Parlamentar, que variaR$ 30,7 mil a R$ 45,6 mil, dependendo do Estado do deputado.
Para os senadores, essa cota vaiR$ 21 mil a R$ 44,2 mil por mês. Conhecido como "cotão", o beneficio serve para pagar, por exemplo, gastos com telefonia, correios, hospedagem, alimentação e passagem aérea.
"Temos R$ 1,1 bilhão por ano sóestrutura ligada ao deputado, o que inclui recursos para contratar até 25 assessores próprios. No casosenador, não há limite para o númeroassessores. Temos o casoum senador que contratou quase 100 assessores para atuar no seu Estado com dinheiro do Senado", destacou Castello Branco.
"A democracia não tem custo, mas a verdade é que o Congresso brasileiro é caríssimo se comparado aos parlamentosoutros países do mundo todo."
Solução seria cortar deputados ou 'penduricalhos'?
O coordenador do CentroEstudos Legislativos da UFM concorda que o custo do Congresso brasileiro é elevado demais, na comparação com outros países. Mas ele discorda da propostaBolsonaroreduzir para 400 o númeroparlamentares.
Para ele, seria possível reduzir custos cortando "gorduras" dos orçamentos da Câmara e do Senado. "O Congresso nunca enxugou seu orçamento, só aumentou os gastos ao longo dos anos", destaca.
Ranulfo afirma que o corpofuncionários concursados do Congresso Nacional éalta qualidade, mas diz que há um número excessivoterceirizados e pessoascargosconfiança.
"Há um corpo técnicoaltíssimo nível. É um dos melhores do mundo, já que as pessoas são contratadas por concursos altamente competitivos. Agora, o outro lado é a quantidaderecursos disponíveis a deputados e senadores. Você tem um número elevadoassessorescargos comissionados, barbeiros, motoristas, tomadorescontacarro, lavadorescarro... É aí que a coisa foi se perdendo e virando cabideemprego", afirmou à BBC News Brasil.
O professor da UFMG diz que seria possível revisar auxílios concedidos atualmente aos parlamentares, levandoconta, contudo, a necessidadegarantir reembolso para deslocamentos, já que os deputados e senadores se deslocam semanalmente dos seus Estadosorigem para Brasília.
"Câmara e o Senado poderiam passar por um enxugamento talvez dramático dos cargos comissionados,recrutamento amplo. E tem uma estruturaserviço aos deputados, que não é serviço legislativo, que é nababesca. O Congresso poderia passar por análisegastos por uma empresa para mostrar o que é superficial e o que não é e fazer uma propostareduçãocustos", defende.
Já Gil Castello Branco, da ONG Contas Abertas, defende um esforço que combine cortar o númerodeputados com uma redução dos orçamentos da Câmara e do Senado.
"Poderíamos ter menos representantes na Câmara e também cortar despesas, principalmente as diretamente ligadas ao parlamentar, reduzindo os penduricalhos. Também existe espaço para reduzir cargos nas comissões e outras estruturas administrativas da Câmara", defende.
"O que não é admissível é que o Brasil fiquesegundo lugar no mundocusto."
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