A incrível história da 1ª estátualogin eurowinChe Guevara no mundo, desaparecida há maislogin eurowin50 anos:login eurowin

Ernesto "Che" Guevara

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, Ernesto "Che" Guevara, guerrilheiro argentino e companheirologin eurowinlutalogin eurowinFidel Castro durante a revolução cubana

"É impressionante que ninguém saiba onde está. Como algo tão grande, tão massivo, desaparece. Como ninguém - nem do mundo político, nem do artístico - jamais denuncioulogin eurowinperda?", diz Meneseslogin eurowinentrevista à BBC Mundo, serviçologin eurowinespanhol da BBC.

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Fotografia da estátua do Che que desapareceu há maislogin eurowin50 anos

Crédito, Alfred Seidelman / Arquivo familiar

Legenda da foto, A primeira estátualogin eurowinChe Guevara está desaparecida a maislogin eurowin50 anos
Linha cinza

login eurowin BBC - Como você chegou a essa história incrível e desconhecida?

Juan Pablo Meneses - Eu já a ouvia há muito tempo e cada vez que alguém me contava algo, ela ficava maior. Mas quando comecei a investigar não tinha quase nada, praticamente não tinha fotos, as pessoas que moravam lá não lembravam.

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Fui encontrando detalhes, no entanto, como ologin eurowinque era o primeiro monumento do mundo a Che,login eurowinque [Augusto] Pinochet havia pedido pessoalmente que fosse tirada,login eurowinque Fidel [Castro] visitou-a poucos dias após ser inaugurada elogin eurowinque [Pablo] Neruda organizou uma arrecadação quando levaram a cabeça (da estátua).

Tudo isso me chamou a atenção e me motivou a querer escrever sobre o assunto.

login eurowin BBC - É, como seu livro anterior 'Uma História Perdida' – que narra o atentado ao hospital da Força Aérea no Chilelogin eurowin11login eurowinsetembrologin eurowin1973 –, uma história esquecida. O que te atrai no esquecimento?

Meneses - Venhologin eurowindez anoslogin eurowincrônica, oulogin eurowinjornalismo literário - como quiser chamar - e com este livro e com o romance anterior faço um exercíciologin eurowinmovimentar os componentes e faço algo que poderia ser chamadologin eurowinliteratura crônica.

Acho que para a América Latina é importante relatar as histórias desconhecidas que têm a ver com a memória e começar a usar a ficçãologin eurowinalguns elementos, porque só assim podemos contar a nossa história real.

login eurowin BBC - Por que?

Meneses - Porque acontece que não virão as investigações jornalísticas, nem as investigações judiciais, nem as acadêmicas.

Então, como ninguém veio nos dizer 'isso foi o que realmente aconteceu', o que fazer: não contamos ou terminamoslogin eurowincontar as partes que faltam, juntando-as, com a ficção, com as histórias, com as coisas que nos vão contando?

De certa forma, isso já está acontecendo nas séries.

Eu estava no México ministrando um workshoplogin eurowinjulho, quando Mayo Zambada foi preso nos Estados Unidos, e um líder do workshop me disse que só saberemos toda a verdade quando Narcos 15 for lançado na Netflix.

Você percebe? Parece que já estamos presumindo que quando a ficção nos conta uma história, o que acabaremos entendendo será a história real.

É isso que me interessa: ficção que estabeleça verdades.

Juan Pablo Meneses

Crédito, Ignacia Uribe

Legenda da foto, O jornalista e escritor chileno Juan Pablo Meneses

login eurowin BBC - Como você descreveria alogin eurowinhistória da estátua?

Meneses - Tudo parece muito louco para mim.

Estamos falandologin eurowinum monumento que, no total, media quase dez metros: a estátua uns três, e o resto era a estrutura, porque foi pensada para que as pessoas peregrinassem até ali.

Era um Chelogin eurowinbronzelogin eurowinposiçãologin eurowinresistência, com um grito no rosto, segurando um rifle, como se estivesse crucificado, nada parecido com a típica estátua do herói.

Foi feitalogin eurowinalgumas fundiçõeslogin eurowinSantiago, muito secretamente, e depois passou muito tempo escondida na Câmara Municipallogin eurowinSan Miguel, porque o administrador - que era do Partido Socialista, mas fez isso a título pessoal - queria surpreender e aproveitar a posselogin eurowinAllende para que todas as delegações internacionais pudessem visitá-la, especialmente aslogin eurowinCuba, Bolívia e Argentina.

Mas o projeto foi além da estátua: o que tentaram criar foi uma zona guevarista, com gente que, como na Bolívia, tinha fotoslogin eurowinChelogin eurowincasa, que rezava para ele.

login eurowin BBC - Che competindo com Jesus Cristo, como você descreve no livro.

Meneses - Claro... A revolução cubana foi um projeto pelo qual todo mundo se apaixonou.

Pense que no Chile o slogan do governo anterior aologin eurowinAllende,login eurowinEduardo Frei Montalva (1964-1970), era revoluçãologin eurowinliberdade, mas revolução sim ou sim.

Foi um ideal que começou a inspirar muitos grupos religiosos que viam Jesus como um revolucionário... E então chegam aqueles que fizeram a revolução, Che morre e começam a aparecer muraislogin eurowin"Che vive" ao lado daqueleslogin eurowin"Cristo vive".

Então, sim, naqueles anos, num bairrologin eurowinSantiago do Chile, houve uma verdadeira disputa santa entre Che e Jesus Cristo.

login eurowin BBC - Nem Fidel, nem Che. Uma das frases mais engenhosas do livro é “Sem Meneses não há revolução”, que tem dupla leitura: conta uma história verdadeira e dá a oportunidadelogin eurowinbrincar com seu sobrenome e o título do romance. Tremenda coincidência, certo?

Meneses - Hahaha. Sim, foi uma tirada muito feliz, porque Enrique Meneses realmente existiu e foi um personagem incrível.

Na verdade, quando o conheci conversamos longamente sobre o nosso sobrenome, e no final dessa conversa ele também me contou sobre a existência da estátua.

Meneses tirou uma fotologin eurowinFidel atirando e Che a seu lado, na Sierra Maestra, que conseguiu que fosse capa da revista Paris Matchlogin eurowin1958, ou seja, antes da vitória da revolução.

Naquela época, sair na Paris Match era uma das coisas mais legais que poderiam acontecer, e todos os intelectuais franceses se conectaram muito com esses belos jovens latino-americanos, na selva. Foi como seu lançamento ao mundo.

Tanto que mais tarde,login eurowinseu livro Diáriologin eurowinViagem, Che afirma que sem a participaçãologin eurowinMeneses a revolução não teria triunfado. Daí a frase e daí o título.

login eurowin BBC - Outra imagem chavelogin eurowinChe é aquela que tiraram dele na Bolívia depoislogin eurowino matarem, que se sabe que manipulam e movem seu corpo e até abrem seus olhos…

Meneses - Alma Guillermoprieto diz que Che começa a existir depoislogin eurowinmorto, e essa é, aliás, uma imagem que dá muito poder àlogin eurowinfigura.

Poderíamos dizer quelogin eurowinmorte é talvez o ponto mais alto alcançado pela influência e o encantamento latino-americano pela revolução, porquelogin eurowinmorte o convertelogin eurowinum deus.

Che Guevara mortologin eurowinum hospital na Bolívia

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, Che foi morto a tiroslogin eurowin9login eurowinoutubrologin eurowin1967. Seu corpo foi exposto na Bolívia para que correspondentes estrangeiros pudessem se certificar da morte do guerrilheiro argentino

E talvez todo esse ideário começa a cair com o golpelogin eurowinPinochet, que foi muito emblemático a nível mundial.

Entre 1967 – quando matam o Che – e 1973 – quando Allende morre no [Palácio] La Moneda –, vive-se o que um dos personagens que participou da construção do monumento chamoulogin eurowinembriaguez revolucionária, que todos sabemos como terminou.

login eurowin BBC - De certa forma, embora o protagonista seja Che, o livro também é uma desculpa para falar do Chile e dos paralelos entre a estátua e o governo da Unidade Popular.

Meneses - A estátua durou o mesmo tempo do governologin eurowinAllende: foi inaugurada cinco dias depoislogin eurowinsua posse e demolida cinco dias após o golpe.

Acredito que se fosse feito um documentário sobre como foi instalada, as homenagens que lhe fizeram, os ataques que sofreu, mostrarialogin eurowinmaneira quase certeira tudo o que foi aquele período da história do Chile, sobretudo a questão da violência e do fanatismo.

login eurowin BBC - Anteslogin eurowincomeçar esse livro, você não era um guevarista, você diz. Você se converteu escrevendo?

Meneses - Sim, é verdade, nunca fui guevarista, mas também, no Chile, falarlogin eurowinChe Guevara durante a ditadura era realmente falar do demônio.

Agora, como autor, sinto que Che está no seu pior momento. Há países onde estátuas emlogin eurowinhomenagem foram derrubadas, ou se propõe que sejam derrubadas, e seu ideário é cada vez mais esquecido.

Minha abordagemlogin eurowinsua figura vem da minha experiência no Clarín, onde editei uma série sobre o consumo, que também é incrível: como o capitalismo transforma um dos seus piores inimigos nas coisas mais absurdas,login eurowinsorvetes, sapatoslogin eurowinverão e atélogin eurowinambulâncias, o que vejologin eurowincerta forma como um fracasso capitalista, uma rendição.

Sou um guevarista do Che que as pessoas compram e usam sem saber realmente quem ele é, o que significa, porque no fim das contas ninguém sabe o que é o Che: eu diria que ele é a grande invenção, a grande obra literária latino-americana dos últimos tempos.

Sua história foi construída apóslogin eurowinmorte por aqueles que o odeiam e por aqueles que estão a seu favor. E nem mesmo a partirlogin eurowinseus discursos.

Mural com a imagemlogin eurowinChe Guevaralogin eurowinCuba

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, 'Poderíamos dizer que Guevara foi o primeiro influenciador latino-americano', diz Juan Pablo Meneses

Observe que existem dois centroslogin eurowinestudos latino-americanos focadoslogin eurowinChe, umlogin eurowinRosário, na Argentina, e outrologin eurowinHavana [em Cuba], e eles nunca entraram num acordo sobre o que é o pensamento guevarista.

Nesse sentido, poderíamos dizer que Guevara foi o primeiro influenciador latino-americano, do pontologin eurowinsentir quelogin eurowinrepente as pessoas o seguem, mesmo que não saibam bem o porquê.

login eurowin BBC - Vamos falar da denúncia que Juan, seu personagem central, faz, exigindo que investiguem onde está a estátua, e inspira você a fazer isso... O personagem criando a realidade.

Meneses - Isso é 100% verdade.

Há muitos autores que dizem que o personagem é inspirado neles. Nesse caso, devo dizer que com a denúncia estou inspirado no personagem.

Uma das coisas que a ficção tem é quelogin eurowinrepente os personagens seguem seu próprio caminho. Não é como na crônica, no jornalismo, que sempre se tem as rédeas, guiado pelos dados.

Em vez disso, lá vão eles elogin eurowinrepente o Juan começa a falarlogin eurowinfazer uma denúncia, prepara ela, e quando a tem pronta, eu digo, ei, eu também quero fazer isso, por que não vou fazer? E eu meio que o copiei.

Livrologin eurowinJuan Pablo Meneses, "Revolução".

Crédito, Tusquets

Legenda da foto, A capa do livrologin eurowinJuan Pablo Meneses, 'Revolução',login eurowintradução livre

Assim, o resultado é que hoje a única denúncia sobre o desaparecimento da estátua do Che que foi feitalogin eurowinforma real é a partirlogin eurowinum personagem fictício.

login eurowin BBC - E você entralogin eurowinum mundo bem kafkiano, um mundo muito diferente do Chile moderno e eficiente que costuma ser publicizado...

Meneses - Claro! É o Chile dos cartórios, dos carimbos, da convocação posterior, dos trâmites, o Chile onde ainda existe um Conselhologin eurowinMonumentos com um militar dentro.

É verdade que isto acontece porque a maioria dos monumentos que existem são militares, mas até hoje ninguém se atreve a perguntar a ele o que aconteceu com o monumentologin eurowinChe.

No Conselho, me disseram que no final jogaram a bola para a Municipalidadelogin eurowinSan Miguel, que é uma coisa muito chilena, né,login eurowinpassar o procedimentologin eurowinum lugar para outro.

login eurowin BBC - Ganha o silêncio?

Meneses - Para mim, o Chelogin eurowinSan Miguel é o símbolologin eurowinmuitos pactoslogin eurowinsilêncio, nos quais se dizia sigamoslogin eurowinfrente e esqueçamos algumas coisas, que no final ficam numa zonalogin eurowinabandono.

O melhor exemplo é o criador da ideia do monumento, o prefeitologin eurowinSan Miguel, Tito Palestro - partelogin eurowinum conhecido clã político do Chile -, que após o golpe passou vários anos entre o Estádio Nacional, Dawson Island e centrologin eurowintorturalogin eurowinTres Álamos, e depois exilou-se na Áustria, onde faleceu.

Até hoje não há um único verbete na Wikipédia sobre ele, não há sequer uma rua, uma passagem, uma coisinha, nada, nem mesmo sobre as estátuas que ele construiu, inclusive umalogin eurowinCarlos Gardel. Tudo isso se foi.

E o escultor Praxíteles Vázquez, que tinha algum reconhecimentologin eurowinValparaíso,login eurowinonde eralogin eurowinfamília. Além do trabalhologin eurowinChe, ele fez alguns muraislogin eurowin100 metros que também foram demolidos. E embora não tenha se exilado, seus trabalhos mais importantes desapareceram e ele passou a viver no anonimato.

Praxíteles Vázquez

Crédito, Alfred Seidelman / Archivo familiar

Legenda da foto, Praxíteles Vázquez, o criador da estátua chilenalogin eurowinChe

Assim, os dois criadores dessa estátua, que foram uma espécielogin eurowinQuixote e Sancho Pança, acabaram completamente esquecidos por todos.

Gostologin eurowinpensar que resgatar essa história é também resgatar esses personagens que ficaram pelo caminho.

login eurowin BBC - Você acredita que ainda vão encontrá-la? As pistas que você dá no livro sãologin eurowinque ela estarialogin eurowinum armazém militar ou enterrada debaixologin eurowinuma piscina…

Meneses - Depoislogin eurowinpublicar o livro, chegou a mim uma nova versãologin eurowinque teria sido destruída, dinamitada.

É algo que me custa acreditar porque outro ex-militar me disse que esse tipologin eurowinestátua, roubada assim, são como troféuslogin eurowinguerra.

Falei com um curador na França e ele me disse que tinha interesse que fosse encontrada, mas acho difícil, embora seria lindo, porque é um momento da história do país.

De qualquer forma, não é uma tarefa da qual vou me encarregar. Sinto que cheguei até este ponto com o meu livro; afinal, não sou um caçadorlogin eurowinestátuas.

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