'Problema da Argentina é moral': as 5 batalhas contra a esquerda que marcaram primeiros 100 diasMilei:

Milei

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Legenda da foto, Milei tem travado uma 'batalha cultural' contra a esquerda

Milei afirma que a "decadência" da Argentina começou há um século, quando o país "abandonou" o modelo capitalista para "abraçar as ideias empobrecedoras do coletivismo", a forma como normalmente se refere ao socialismo.

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É uma ideologia que, segundo ele, teve um impacto profundo no país graças aos métodos que a "esquerda" utilizou para se popularizar.

"(Antonio) Gramsci destacou que para implementar o socialismo era necessário introduzi-lo por meio da educação, da cultura e da mídia", disse empostagem, citando o filósofo marxista italiano que foi um dos fundadores do Partido Comunista da Itália.

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"A Argentina é um grande exemplo disso", disse ele.

É por isso que uma das prioridades do presidenteseus primeiros mesesmandato tem sido o que ele chama"desarmar a Gramsci Kultural", um jogopalavras que alude ao kirchnerismo, a força política peronista que governou a Argentinagrande parte do século 21, tendo como bandeiras a justiça social, a ampliação dos direitos e da inclusão como políticasEstado.

Um dos principais lemas da força liderada por Cristina Kirchner é: "Onde há necessidade, há direito", frase que Milei costuma criticar, afirmando que "o problema é que as necessidades são infinitas e alguém tem que pagar".

No livro El Loco, Biografia Não AutorizadaMilei, o jornalista Juan Luis González sustenta que a "resistência à suposta hegemonia ideológica da esquerda" foi uma das principais razões pelas quais o ex-comentarista televisivo decidiu entrar na política2021.

González destaca que muitos jovens começaram a segui-lo por causa do "cansaço" que sentiam das políticas "progressistas" promovidas pelo Estado durante os anos do kirchnerismo.

Mas, para Milei, a Argentina não é a única que estáapuros por causa do "socialismo", que, segundo ele, impôs uma "ditadura do politicamente correto."

Tal como outras figuras da chamada "nova direita", como Jair Bolsonaro e Donald Trump, o presidente argentino acredita que "a esquerda ameaça todo o mundo livre".

Essa perspectiva foi apontadaseu primeiro discurso internacional, no Fórum Econômico Mundial (mais conhecido como FórumDavos),meadosjaneiro.

"Hoje estou aqui para dizer que o Ocidente estáperigo", afirmou.

"Estáperigo porque aqueles que deveriam defender os valores ocidentais são cooptados por uma visãomundo que leva inexoravelmente ao socialismo e, consequentemente, à pobreza", disse ele.

Essa profunda crençaMilei explica por que, apesar dos enormes desafios econômicos e políticos que enfrenta (ele tem uma minoria no Congresso e não há um único governador do seu partido), grande parte daatenção nos seus primeiros dias no cargo foi dedicada a uma batalha ideológica.

"Não penso apenas na política a partir do que é a batalha política, mas também penso na batalha cultural", disse ele.

Aqui contamos cinco das frentes que este "combate" teve até agora.

A base militanteMilei é formada por jovens, principalmente homens, cansados ​​das políticas progressistas que foram promovidas pelo Estado durante o Kirchnerismo.

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Legenda da foto, A base militanteMilei é formada por jovens, principalmente homens

1. Educação pública

Um dos pilares da lutaMilei tem sido no campo educacional para contrapor "as orientaçõesGramsci".

Mesmo antesentrar na política, quando era um famoso comentarista econômico, ele já havia denunciado que "a educação pública se tornou um centrodoutrinação marxista".

Agora, como presidente, Milei repete a mesma ideia.

No iníciomarço, durante discursoabertura do ano letivo na escola onde se formou,Buenos Aires, Milei afirmou que seu partido, La Libertad Avanza (LLA), é popular entre os jovens porque eles "foram expostos ao mecanismolavagem cerebral da educação pública por menos tempo".

Embora o presidente não tenha levado adiante a ideia que lançou durante a campanhacriação"vouchers" para que os estudantes paguem pelo ensino superior - financiando a procura por educaçãovez da oferta - ele restringiu fortemente o orçamento da área.

Seu governo aplicou o mesmo corte orçamentáriooutros setores do Estado, ordenando por decreto que neste ano fosse utilizado o mesmo orçamento2023, o que - graças à inflação - significa uma redução acentuada nas verbas públicas. "Não há dinheiro", diz.

Mas o ajuste é especialmente forte no ensino superior. Alémfornecer fundos que vão cobrir menos da metade das despesas estimadas pelos reitores das universidades públicas, o orçamento retira um décimo do financiamento das instituições nacionais e corta um quinto das bolsasestudo.

Após o anúnciouma greve universitária14março, o governo aumentou as dotações orçamentárias70%, mas o dinheiro será totalmente absorvido pelo forte aumento nas contaseletricidade, gás e manutenção.

O governo também suspendeu as obrascinco universidades públicas que haviam sido aprovadas por lei no mandato anterior,Alberto Fernández.

Milei também eliminou vários fundos que promovem a ciência e a tecnologia, o que, juntamente com cortes orçamentários, levou um grupo68 vencedores do Prêmio NobelQuímica, Economia, Medicina e Físicatodo o mundo a escrever uma carta expressando preocupação com os cortes.

"Tememos que a Argentina esteja abandonando seus cientistas, estudantes e futuros líderes da ciência. Estamos preocupados que a dramática desvalorização dos orçamentos do Conicet (Conselho NacionalPesquisa Científica e Técnica) e das universidades públicas reflita não apenas uma dramática desvalorização da ciência argentina, mas também uma desvalorização do povo argentino e do futuro da Argentina", escreveram.

"O congelamento dos programaspesquisa e a redução do númeroestudantesdoutorado ejovens pesquisadores vão causar a destruiçãoum sistema que levou muitos anos para ser construído e que exigiria muitos mais para ser reconstruído", disseram os cientistas.

Milei

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Legenda da foto, Milei denunciou a 'doutrinação marxista' nas escolas, mas ele próprio foi acusadodoutrinar com o discurso que proferiu naantiga escola

2. Progressismo

Milei também apontou seus canhões para dois dos maiores símbolos do progressismo durante a era kirchnerista.

No finalfevereiro, foi fechado o Instituto Nacional contra a Discriminação, Xenofobia e Racismo (Inadi), que o porta-voz presidencial, Manuel Adorni, considerou um local "para gerar emprego para militantes".

A organização, que tinha cerca400 funcionários, foi criada por lei1995.

Durante a campanha, Milei denunciou que, durante os governos kirchneristas, o órgão se tornou um "instrumentoperseguição ideológica" que visa "controlar a cultura e que quer regular até a forma como devemos falar".

Ainda na esteira das mesmas ideias, poucos dias após o encerramento do Inadi, o governo anunciou a proibição da chamada "linguagem inclusiva" equalquer referência às discussõesgênerodocumentos oficiais.

"Não será mais permitido utilizar a letra 'e', a 'arroba', o 'x' e evitar a inclusão desnecessária do femininotodos os documentos da administração pública", disse Adorniumasuas coletivasimprensa diárias.

Ambas as medidas receberam uma enxurradacríticasgrande parte da oposição.

Germán Martínez, presidente do bloco União Peronista-Kirchnerista pela Pátria na Câmara dos Deputados, denunciou que o governoMilei "está a caminhoser o mais discriminatório, xenófobo e racista da história democrática (da Argentina)".

3. Feminismo

A eliminação das discussõesgênero não foi o único ataque contra o feminismo no governo Milei.

O presidente tem sido particularmente virulentosuas expressões contra ativistas dos direitos das mulheres, que ele recentemente descreveu como "os assassinoslenços verdes", pela bem-sucedida campanha que realizaram para conseguir a aprovação do aborto legal e gratuito na Argentina,2020, com apoio do governo anterior.

Como explicou o presidenteDavos, "o libertarianismo já estabelece a igualdade entre os sexos", e o que o "feminismo radical" propõe é uma "luta ridícula e antinatural entre homem e mulher".

Esta luta, segundo ele, é promovida pelos "socialistas" que "foram obrigados a mudar aagenda depoisdeixarem para trás a lutaclasses", afirmou.

O presidente, que nega que exista disparidade salarial entre homens e mulheres, fechou o Ministério da Mulher, Gênero e Diversidade, criado durante a gestão Fernández, transformando o órgãouma subsecretariaProteção contra a ViolênciaGênero.

Diante das críticas por suas políticas antifeministas, seu porta-voz destacou que é o governo "mais igualitário" da história argentina, com uma participação feminina"45%" (quase o dobro da durante o kirchnerismo).

“Acredito na igualdade perante a lei. Não se trataum direito, trata-seprivilégios", explicou, antecipando o fechamento do ministério.

Para deixar clara aposição sobre o que chama"ideologiagênero", no dia 8março, Dia Internacional da Mulher, o governo decidiu converter o Salão da Mulher da Casa Rosada no "Salão dos Heróis", um grupolíderes políticos, todos homens.

O anúncio foi feito pouco antesmilharesativistas marcharemprotesto contra as políticas governamentais e para exigir a proteção do direito ao aborto, uma questão sobre a qual Milei sugeriu que poderia convocar uma consulta popular.

Segundo Ana Fornaro, codiretora da Agência Presentes, veículoimprensa especializadocobrir questõesgênero e diversidade sexual, as propostasMilei são "uma cópia desajeitada da agenda da direita e da extrema direita internacionais que falam'marxismo cultural', 'neomarxismo', 'coletivismo' ou 'socialismo' para se referir a uma agendadireitos, por exemplo, os direitos das mulheres, das pessoas LGBTI+, das comunidades indígenas e do meio ambiente."

mãomulher

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Legenda da foto, Milei descreveu os ativistas pelo direito ao aborto como 'assassinoslenços verdes'

4. Mídia

Uma das primeiras iniciativasMilei, apenas dois dias após assumir o cargo, foi cortar por um ano o que é conhecido como "diretriz oficial", a publicidade institucional do governo na mídia.

A Argentina é um dos países com maior númeroveículosnotícias, e muitos — como jornais, revistas e sites da internet — dependem da publicidade do governo para sobreviver.

Embora a decisão tenha sido tomada no âmbitouma sériemedidasemergência anunciadas pelo ministro da Economia, Luís Caputo,corte na despesa pública — as obras públicas também ficaram congeladas durante um ano —, o presidente não deixou dúvidasque o corte também visa minar o poder da mídia crítica, que considera "formadoresopinião extremistas".

Mas a maior parte dos ataquesMilei foram dirigidos aos meioscomunicação públicos, que durante os governos kirchneristas foram fortemente criticados pelafaltaimparcialidaderelação ao governo.

O presidente, que também é criticado por apenas dar entrevistas a meioscomunicação "amigos", considera-os "mecanismospropaganda política". Em fevereiro, ele anunciou uma intervenção por um ano, o que abre caminho àpossível privatização.

Em seu discursoabertura das sessões do Congresso, no dia 1ºmarço, o presidente causou surpresa — e indignaçãoalguns setores — ao anunciar o fechamento da agência estatalnotícias Télam, a maior da América Latina, fundada1945.

"Vamos fechar a agência Télam que tem sido utilizada, nas últimas décadas, como agênciapropaganda kirchnerista", afirmou.

Para Tomás Eliaschev, representante sindicalTélam, o fechamento — ocorrido apenas dois dias após o anúncio,meio a uma forte operação policial — foi "um ataque à liberdadeexpressão sem precedentes na Argentina."

"Nas últimas décadas, não vimos nada parecido", afirmou Eliaschev à BBC News Mundo, serviçoespanhol da BBC.

Ao criticar a mídia tradicional, Milei utiliza as redes sociais, que foram fundamentais paravitória eleitoral, para travar"batalha cultural".

Desde que assumiu o cargo, ele publicou milharescomentários, curtidas e posts que atacam "os esquerdistas", os "jornalistas militantes", os governadores ou atores políticos com os quais ele tem divergências, alémtudo o que é estatal ou público.

Seus comentários são chamados"discriminatórios" por organizações como a Academia NacionalJornalismo, a AssociaçãoEntidadesJornalismo Argentinas (Adepa) e o Fórum ArgentinoJornalismo (Fopea), entre outras.

O jornalista e escritor José Benegas, autor do livro Milei, Todas as Respostas às Questões Que Levanta, considera que o presidente se tornou um "atirador digital".

"Está inaugurando uma forma sujapolítica que não conhecíamos antes", disse eleum artigoopinião na revista Notícias.

manifestantes a favor da Télam

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Legenda da foto, O governo fechou a agêncianotícias Télam, que empregava cerca700 pessoas

5. Cultura

Além da área científica, outro setor atingido pelos cortes foi o cultural.

A Fundação El Libro, que organiza a prestigiada Feira do LivroBuenos Aires — prevista para o finalabril — informou que o Ministério da Cultura não alugará o pavilhão do evento, como tradicionalmente fazia, e — pela primeira vez na história da feira — não enviará um representante para a cerimôniaabertura.

Enquanto isso, na semana passada, um cinema emblemáticoBuenos Aires — a sala Gaumont — tornou-se focoum protesto contra os cortes no orçamento do Instituto NacionalCinema e Artes Audiovisuais (INCAA).

Atores e artistas argentinos — como Leonardo Sbaraglia — participaramuma manifestação no centro da capital argentina enquanto outros artistas internacionais, como Viggo Mortensen, enviaram seu apoio do exterior.

Mas, talvez, o confronto mais inesperado tenha sido aquele que Milei teve com a cantora e atriz Lali Espósito, uma das artistas mais populares do país (rivalidade que alguns compararam àTrump com Taylor Swift, nos EUA).

A jovem despertou a ira dos libertários quando, diante do inesperado primeiro lugarMilei nas primáriasagosto passado, publicou uma mensagem nas redes sociais que dizia: "Que perigoso. Que triste".

Desde então, o presidente tem criticado repetidamente a artista, a quem apelidou"Lali Depósito"entrevista, acusando-areceber grandes somasdinheiro público — mais do que cobra pelos seus espectáculos particulares —governadores e autarquias para realizar espetáculos.

Questionado sobre a assimetriapoder que tem, enquanto presidente, e a suas críticas a Espósito, Milei explicou que "é preciso compreender que, quando brigo com um artista popular, não o faço por brigar, mas como parte da batalha cultural, para libertar os argentinos do sistema que os rouba".

“O caso (de Lali Espósito) serviu para mostrar como os políticos usam os artistas para manipular as pessoas. E o mesmo acontece com a educação, e o mesmo acontece também com os meioscomunicação social”, disseentrevista ao TN.

Ele reiterou que não é algo pessoaluma publicação no X. "O problema aqui não é uma atriz. É uma arquitetura cultural pensada para apoiar o modelo que beneficia os políticos. Bom, estamos aqui para acabar com isso", afirmou.