Proximidade com poder favorece milíciasbwin afiliadosdisputa por territórios no Rio, diz pesquisador:bwin afiliados

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Legenda da foto, Cercabwin afiliados4,4 milhõesbwin afiliadospessoas vivembwin afiliadosterritório controlado pelo crime organizado no Rio, segundo o Mapa Histórico dos Grupos Armados do Riobwin afiliadosJaneiro

Em entrevista à BBC News Brasil, Paes Manso explica a escalada recente da violência na cidade, que também levou ao episódiobwin afiliadosque três médicosbwin afiliadosSão Paulo foram assassinados no Rio.

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O pesquisador também fala sobre seu livro recém-publicado A Fé e o Fuzil (Todavia, 2023),bwin afiliadosque discute crime e religião no Brasil e explica o fenômeno dos traficantes que se declaram evangélicos no Riobwin afiliadosJaneiro.

O protestantismo inicialmente cresceubwin afiliadosoposição à desordem do crime na capital carioca, explica Paes Manso. Mas, nos últimos anos, segundo o pesquisador, vertentes religiosas passaram a ser usadas para legitimar autoridadebwin afiliadostraficantes.

No livro, Paes Manso conta as históriasbwin afiliadosdiversos ex-criminosos que mudarambwin afiliadosvida ao se converterem. E fala sobre um "constrangimento" gerado pelo novo fenômenobwin afiliadostraficantes que fazem uso ostensivo da religião e não deixam o crime.

Leia os principais trechos da entrevista à BBC News Brasil.

Crédito, Todavia Editora

Legenda da foto, Bruno Paes Manso é pesquisador do Núcleobwin afiliadosViolência da USP (NEV) e autorbwin afiliadosdiversos livros pela editora Todavia
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Uma toneladabwin afiliadoscocaína, três brasileiros inocentes e a busca por um suspeito inglês

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Fim do Novo podcast investigativo: A Raposa

bwin afiliados BBC News Brasil - A Polícia Civil tem falado bwin afiliados que "já não diferencia" bwin afiliados o tráfico da milícia (que surgiu com ex-policiais e ex-bombeiros). Hoje, quem compõe a milícia? É possível diferenciá-la dos traficantes?

bwin afiliados Paes Manso - Existem semelhanças importantes entre os diferentes modelosbwin afiliadosnegócios criminais no Rio. A primeira é o fatobwin afiliadosserem grupos armados que controlam territórios e a partir desses territórios extraem suas receitas ilegais.

No caso do tráficobwin afiliadosdrogas, o básico é o controle do território principalmente para a vendabwin afiliadosdrogas no varejo. No caso das milícias, originalmente, (o negócio) começou com outros tiposbwin afiliadosreceitas ligadas à extorsão, vendabwin afiliados"gatonet", internet, imóveis clandestinosbwin afiliadosárea ambiental, cigarro pirata, etc. Mas cada vez mais os grupos passaram a ampliar suas receitas.

As milícias passaram a organizar a vendabwin afiliadosdrogas e o tráfico passou a organizar outros tiposbwin afiliadosnegócios. Então, realmente eles se aproximaram.

Mas as diferenças ainda são importantes. A influência das milícias no governo e a capacidade dos milicianosbwin afiliadosgarantir votos para parlamentares e influenciar a política do Rio e as instituições é muito maior.

Basta ver as operações policiais que se concentram fundamentalmentebwin afiliadosáreasbwin afiliadostráficobwin afiliadosdrogas. A população desses bairros, que são sujeitas à tirania dos traficantes, acaba também ficando sujeita às operaçõesbwin afiliadosguerra da polícia.

Então, milícias e tráfico estão mais próximos. Mas as milícias, por serem formadas principalmente por policiais e terem sociedades com policiais, têm mais influência no Estado e, por isso, estão menos sujeitas às operações policiais que os traficantes.

A origem das milícias continua pesando na forma como elas estruturam seus modelosbwin afiliadosnegócios, mas houve uma mudança importante. A milícia dos bairrosbwin afiliadosCampo Grande e Santa Cruz (onde aconteceram os ataques a ônibus na segunda, 23/10) é o principal exemplo.

Ela foi formada pelo ex-vereador Jerominho Guimarães e seu irmão, o ex-deputado estadual Natalino Guimarães, como a Liga da Justiça. A partir do momento que eles foram presos, depois da CPI das milíciasbwin afiliados2008, ela sofreu alguns rachas e acabou controlada por Carlinhos Três Pontes (Carlos Alexandre da Silva Braga), que passou a fazer sociedade com o tráficobwin afiliadosdrogas.

E também passou a se expandir, formando uma espéciebwin afiliadosmodelobwin afiliadosfranquias, onde eles davam apoiobwin afiliadosarmado ebwin afiliadoscapital para grupos que se formaram na Baixada Fluminense — mas sempre com participaçãobwin afiliadospoliciais como componentes importantes desses negócios. E com a adesão, tolerância e parceria, muitas vezes,bwin afiliadospolíticos municipais.

O Carlinhos Três Pontes foi mortobwin afiliados2016; depois veio o Ecko (Wellington da Silva Braga), que morreubwin afiliados2021; e foi sucedido pelo Zinho. A milícia acabou rachando e se fragilizando a partirbwin afiliados2022 quando o Zinho ( Luís Antônio da Silva Braga) e o Tandera (Danilo Dias Lima, ex braço direitobwin afiliadosEcko) passaram a disputar território e dando início a esse desequilíbrio que a gente está vendo hoje, essa buscabwin afiliadosconquistas territoriais por grupos rivais que a gente vê hoje (Zinho é tio do miliciano conhecido Faustão, cuja morte levou aos ataquesbwin afiliadossegunda,bwin afiliadosacordo com a polícia).

bwin afiliados BBC News Brasil - Em seu trabalho, você fala bastante sobre o descontrole da polícia como uma das causas do problema das milícias no Rio. Como enxerga a atuação da corporação nesse momento? E as respostas dadas a casos como o dos médicos assassinados no início do mês ou as cenasbwin afiliadossegunda-feira?

bwin afiliados Paes Manso - O caso dos médicos assassinados foi um exemplo desse descontrole das polícias, um exemplo do caos, dos problemas gerados por esses conflitos que já vinham crescendo desde o primeiro semestrebwin afiliados2023. A gente já tinha identificado no Monitor da Violência um crescimentobwin afiliados17% nos homicídios no Rio.

O (grupobwin afiliadospesquisa) Fogo Cruzado também já tinha identificado na regiãobwin afiliadosJacarepaguá um aumentobwin afiliadosmaisbwin afiliados100%. Só que (isso) dentro dessa “normalidade” dos conflitos,bwin afiliadosforma que a população acaba meio que aprendendo a conviver com eles. Isso saiu da curvabwin afiliados“normalidade” com a morte dos três médicos — todo mundo ficou chocado diante das vítimas que fugiam do perfil até então esperado naquele conflito.

Mas para mim o mais surpreendente foi a forma como ele foi resolvido. A própria polícia passou a divulgar que recebeu informações (da milícia)bwin afiliadosque os médicos tinham sido mortos por engano. (Os criminosos) identificaram os responsáveis pelo equívoco, mataram os supostos autores do crime e enviaram para a polícia, que divulgou a história e acalmoubwin afiliadosalguma forma a opinião pública. Tanto que o assunto foi esquecido dois dias depois.

Essa capacidade do crimebwin afiliadosprestar contas para a opinião pública para que tudo continue como está, como se nadabwin afiliadosextraordinário tivesse acontecido, foi o que mais surpreendeu. Aí veio a tentativa dos parlamentares (cariocas)bwin afiliadosescolher um novo secretário da Polícia Civil (Marcus Amim), que precisou mostrar a que veio.

Aí o novo secretário fez a operação que levou à morte do sobrinho do Zinho. Ao que parece, o Zinho tentou mostrar força e marcar a posição, revelandobwin afiliadoscapacidadebwin afiliadosmobilização no crime na região, fazendo açõesbwin afiliados40 pontos diferentes.

É sempre difícil saber exatamente o que passa na cabeça deles. Mas o que parece é que foi para passar um recadobwin afiliadosque (políticos) não tentem ganhar nomebwin afiliadoscima deles, um recado que parece ter sido dado diante dessa operação com um secretário novo. É um quadro dramático porque a gente vê quase 10 anosbwin afiliadosfortalecimento desses grupos armados no Riobwin afiliadosJaneiro.

Crise que vem desde a crise política do Rio, com a prisão do ex-governador Sérgio Cabral, depois a eleição do governador (Wilson) Witzel, um candidato já frágil que dois anos depois sofreu processobwin afiliadosimpeachment.

No lugar dele assumiu um político outsider, que vinhabwin afiliadosfora da cena da política carioca, o Cláudio Castro, que tinha sido vereador com pouquíssimos votos, vindos da Igreja Católica, da Renovação Carismática.

Ele foi mantido no poder justamente por causa dabwin afiliadosfragilidade, que permitia que o poderbwin afiliadosfato ficasse nos territórios e nos municípios onde esses grupos controlam o dia a dia, o dinheiro, a economia e a política.

E não é à toa que eles apoiaram fortemente a eleição do Cláudio Castro. Ele foi eleito no primeiro turno e continuou frágil, e essa fragilidade permitiu que esses grupos continuassem ganhando força. E nessa segunda a gente viu justamente a demonstraçãobwin afiliadosforça desses grupos diantebwin afiliadosum governo fraco.

bwin afiliados BBC News Brasil - Você vê alguma solução para o Riobwin afiliadosJaneiro?

bwin afiliados Paes Manso - Não existe solução que seja fora da política. O que você vai fazer? Vai entrarbwin afiliadosguerra contra quem? Vai fazer uma guerrabwin afiliadosdefesa do quê? O fortalecimento das instituições democráticas, republicanas, depende do diálogo, da capacidadebwin afiliadosconvencimento,bwin afiliadosmostrar que esse projetobwin afiliadosaumentar a violência é um projeto autodestrutivo, que a gente tolerar as milícias não é uma coisa boa.

bwin afiliados BBC News Brasil - No livro bwin afiliados A Fé e o Fuzil bwin afiliados você conta que já pesquisava o tema da violência nos anos 2000 e desde então a religião e o crime já eram mundos que se cruzavam. Por que escrever sobre isso agora?

bwin afiliados Bruno Paes Manso - Eu comecei a falar com convertidos para ouvir sobre a violência, não sobre religião. Era muito difícil conseguir entrevistar homicidas e criminososbwin afiliadosgeral, porque eles acabam se expondo se falarem (com a imprensa). Então eu comecei a apelar para os religiosos. Eles me falavam do passado, até porque falar sobre o passado demonstrava o tamanho do milagre e da transformação na vida deles.

Eu ficava fascinado com essas transformações, para mim tudo parecia muito mágico. Eu gostava das histórias. Mas era um tema que estava muito vinculado a crenças individuais, privadas, que não erambwin afiliadosinteresse público.

Isso começou a mudar quando eu escrevi o livro A República das Milícias. Conheci um traficante que perseguia religiõesbwin afiliadosmatrizes africanas, que tinha Jesus Cristo tatuado no braço, era parceirobwin afiliadosum miliciano próximo do Adriano da Nóbrega, próximo à família Bolsonaro (Nóbrega tinha parentes alocados no gabinetebwin afiliadosFlávio Bolsonaro).

Depois eu conheci a história do traficante que montou um complexobwin afiliadosfavelas que ele denominou como Complexobwin afiliadosIsrael. Por que aquilo era diferente? Porque eles usavam a religião para legitimar o poder e autoridade deles, era com objetivos públicos e políticos: para promover obediência, legitimar autoridadebwin afiliadosum lugar como o Riobwin afiliadosJaneiro onde você tem o caosbwin afiliadosvários gruposbwin afiliadosconfronto.

Onde todo mundo é vilão, eles estavam tentando dar um arbwin afiliadosmocinho (àbwin afiliadosatuação) a partirbwin afiliadosum discurso religioso. Mas o discurso, ao meio tempo, era real - ele não estava inventando nada, ele realmente acreditava naquilo.

E aí veio também o bolsonarismo, que acaba sendo meio transversal a esse debate. Veio esse discurso da guerra espiritual, da luta do bem contra o mal invadindo a esfera pública. Aí era o momentobwin afiliadosenfrentar esse assunto, havia um interesse público, uma questão política a ser explorada.

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Legenda da foto, Pesquisa feita pelo Datafolhabwin afiliados2020 aponta que 31% da população do país era evangélica

bwin afiliados BBC News Brasil - Antes eram comuns as histórias das pessoas que deixaram o crime porque viraram evangélicos. Mas agora passam a existir pessoas que se declaram evangélicas enquanto ainda estão no crime. Como elas conciliam essas coisas opostas? E como os líderes pentecostais têm lidado com o constrangimento que, você diz, esses traficantes evangélicos geram?

bwin afiliados Paes Manso - É mais ou menos como todos os evangélicos,bwin afiliadosalguma forma têm lidado com essa profusãobwin afiliadosinterpretações bíblicas que são características do próprio protestantismo.

Ao contrário do catolicismo, onde você tem uma interpretação mediada pelos padres e pelos teólogos católicosbwin afiliadoscima para baixo, o protestantismo é justamente caracterizado pela inexistência dessa mediação.

Isso deu margem a uma sériebwin afiliadoscongregações que a gente viu surgirbwin afiliadosdiversas ondas ao longo da história. Mas nos últimos anos isso se espraiou e as pessoas passaram a fazer interpretações mediadas a partir da leitura da existênciabwin afiliadosuma batalha espiritual que enxerga a iminência do fim do mundo.

Então os evangélicos precisam catequizar o máximobwin afiliadospessoas para se aproximarembwin afiliadosJesus, porque o diabo está presentebwin afiliadosvários lugares, nos territórios, na política, nas escolas, nas universidades.

Isso casou também com uma sériebwin afiliadosdiscursos anticomunistas e da batalha cultural que a partirbwin afiliados2014 passou a só fazer muito sentido para um montebwin afiliadosgente, principalmente depois das redes sociais. Esse discurso da guerra espiritual, esse discurso bélico que justifica a violência, passou a constranger muita gentebwin afiliadosuma forma geral.

Existem muitos evangélicos que se sentem constrangidos com a forma como o bolsonarismo afetou a religiosidade evangélica. Porque o bolsonarismo é um discurso truculento, misógino, preconceituoso, que justifica a violência sob uma justificativabwin afiliadosque representa os valores bíblicos numa guerra do bem contra o mal. E a mensagem pacifista e universalistabwin afiliadosJesus Cristo do Novo Testamento fica à margem, a pontobwin afiliadosevangélicos levarem revólveres para a marchabwin afiliadosJesus.

Esse é um tipobwin afiliadosconstrangimento que,bwin afiliadosuma forma geral, passou a atingir muitas pessoas, mas ao mesmo tempo acaba sendo meio naturalbwin afiliadosdecorrência da horizontalidade da interpretação da Bíblia. Então, da mesma forma que os "traficrentes" (que é o termo que passaram a usar) constrangem os pentecostais, esses evangélicos que passaram a justificar a violência também constrangem. Existe uma disputabwin afiliadosinterpretações da Bíblia nesse universo.

bwin afiliados BBC News Brasil - Então é o mesmo discursobwin afiliadosfundo? Mas o constrangimento para a comunidade evangélica gerado pelo discurso bolsonarista não é equivalente ao constrangimento gerado pelos traficantes que são evangélicos? Porque houve um grande apoio a Bolsonaro entre diferentes denominações religiosas.

bwin afiliados Paes Manso - Não, não é o mesmo nívelbwin afiliadosconstrangimento. Porque essa crença pentecostal nas cidades surgiubwin afiliadosoposição à desordem do crime e sempre esteve muito colocada como uma oportunidade para transformar essas vidas,bwin afiliadosbairros que se sentiam muito vulneráveis com o crime e com as drogas.

O pentecostalismo busca promover o autocontrole e a ordembwin afiliadosum universobwin afiliadosdesordem,bwin afiliadoscaos. E o crime e as drogas representam essa imprevisibilidade, essa desordem. E o bolsonarismo,bwin afiliadosalguma forma, pretende representar essa ordem, essa previsibilidade, com o uso da violência.

Então ele dialoga mais naturalmente com esse discursobwin afiliadosordem ebwin afiliadosautocontrole, com esse discurso conservador e reacionário. Então sem dúvida o discurso do traficante evangélico constrange muito mais. Só que o irônico é que eles são muito parecidos. Eles justificam a violência na defesa daquilo que eles enxergam como bem e no combate do que eles estigmatizam como mal. O discurso da guerra está presente nos dois.

bwin afiliados BBC News Brasil - No seu livro você combate muito a estigmatização da religiosidade. Mas o uso desse termo "traficrentes" não cai um pouco nesse caminho?

bwin afiliados Paes Manso - O termo estereotipa e estigmatiza, sem dúvida. Mas é um termo que não fui eu que inventei. Eu relato que existe esse termo e que ele foi inventado para falar sobre eles no Riobwin afiliadosJaneiro. Estou descrevendo como eles definem isso, algo até típico do bom humor carioca e da criatividade. Surgem esses termos da mesma forma que surgiu o termo “milícias”.

"Milícia", durante muito tempo, foi um termo muito criticado, mas já entrou para o léxico. Esse termo "traficrentes" eu não uso para estigmatizá-los ou para ou para defini-los, ou para parar tirar sarro, mas para explicar que é um termo nativo, criado naquele ambiente que você está pesquisando.

bwin afiliados BBC News Brasil - Você entroubwin afiliadoscontato com líderes que dizem que esses traficantes não são verdadeiros evangélicos?

bwin afiliados Paes Manso - Claro, muitos não vão enxergar essas pessoas como reais evangélicos

Isso sem falarbwin afiliadospastores que pregam o ódio, que demonizam uma outra religião. Esse é um verdadeiro evangélico? Esse tipobwin afiliadospostura oubwin afiliadoscrítica sempre vai existir diante da horizontalidade das interpretações entre os protestantes.

É óbvio que um traficante que se diz evangélico é algo chocante e que batebwin afiliadosfrente com diversos dogmas e leituras bíblicas, mas tem muitas outras coisas que também são chocantes e que também são alvosbwin afiliadoscontestação entre os próprios evangélicos.

A gente tem que mostrar porque a gente está relatando isso: para aprofundar a discussão e mostrar uma realidade que muitos preferem fingir que não existe.

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Legenda da foto, Armas ao ladobwin afiliadosescritos religiosos

bwin afiliados BBC News Brasil - Você fala muito sobre como a religião evangélica é um movimentobwin afiliadosbaixo para cima, algo do povo que chegou na elite. Quando o Lula foi eleito pela primeira vezbwin afiliados2002, muito se falou que era a primeira vez que um presidente estava sendo eleitobwin afiliadosum movimento que veiobwin afiliadosbaixo e subiu. Você acha que existe relação entre esse crescimento do pensamento evangélico e um certo empoderamentobwin afiliadosuma classe C, e depois um achatamento dessa nova classe média?

bwin afiliados Paes Manso - São movimentos diferentes. Quando surgiu o PT nos anos 80, a gente vinhabwin afiliadosuma ditadura militar. Com a revoluçãobwin afiliadosCuba, a Igreja Católica na América Latina passou a temer que a revolução se espalhasse por todo o continente, porque eles simplesmente proibiam a crença católica.

Houve um processo reformista vindo da Igreja, do Concílio Vaticano 2º. Tinha uma visão da Teologia da Libertaçãobwin afiliadosaproximar os padres e a religiosidade dos pobres, para que os pobres percebessem coletivamente que eles podiam pressionar o Estado por mais direitos. O Estado era referência.

Então você se unia, percebia criticamente o papel que você tinha na sociedade e lutava por mais direitos para conseguir avanço. Você tinha uma visãobwin afiliadosque a partir dessa consciência e dessa luta dos pobres e dos excluídos o Brasil pudesse talvez se transformar numa grande Suécia, numa grande Dinamarca, exigindo do Estado seus direitos.

Com o passar do tempo, contudo, aumentou o ceticismo diante do Estado, apesar do SUS, apesar da universalização da educação, apesar do controle da inflação, apesar dos avanços.

Mas chega na crise econômica e políticabwin afiliados2016 e 2017 e as pessoas percebem que se elas não tiverem dinheiro elas estão ferradas. Se você não tem dinheiro, você vai para a rua, você é morto pela polícia, você passa fome, você é despejado, você não tem planobwin afiliadossaúde.

Ter dinheiro é fundamental nas cidades. Isso é que vai dialogar muito bem com o movimento pentecostal, muito relacionado à prosperidade, a uma celebração do empreendedorismo e da própria auto estima das pessoas. As pessoas precisam acreditarbwin afiliadossi próprias.

A partir do momento que ela ama Deus, ela tem mais condiçõesbwin afiliadosconseguir. Ela vai criar uma redebwin afiliadosapoio com pessoas que pensam como ela, com valores iguais, iguais aos dela. Ela vai ter uma disciplina, um autocontrole, um espírito mais moderno para se incluir no mercado, para fazer parte do mercado.

bwin afiliados BBC News Brasil - Você escreve no livro que essa culturabwin afiliadosempreendedorismo gera resultados mais rápidos para essas pessoas do que uma luta conjunta por uma melhoria que parece uma coisa muito mais distante.

bwin afiliados Paes Manso - Sim, porque você vai depender sóbwin afiliadosvocê mesmo. A luta coletiva por mais direitos às vezes pode demorar anos e muitas vezes nunca conseguir. E aí você passa a ver o Estado como um local que todo mundo quer ganhar só pra beneficiar a si mesmo, voce passa a ver o Estado com um certo ceticismo, desacreditar no Estadobwin afiliadosgarantir direito.

É muito mais sedutora e muito mais convincente essa ideiabwin afiliadosuma solução que dpende do próprio amor, do amor próprio, da crençabwin afiliadossi mesmo, da vontade própria.

O pentecostalismo é uma ferramenta, entre as crenças, para as pessoas viverem melhor no mercado,bwin afiliadosum mundo muito dependente do mercado. Mas a gente sempre imaginou que a gente ia educar as pessoasbwin afiliadoscima pra baixo, que a universidade, o Estado ia trazer essas ferramentas.

Mas as pessoas aprendem a sobreviver e inventam ferramentas para elas próprias saírem da miséria. Então isso que pra mim é muito impressionante, da onde parecia haver só ignorância, que a gente via com o despeito, com superioridade, o povo inventou uma formabwin afiliadossobreviver na miséria das cidades onde, se você não tem dinheiro, você está ferrado.

Eles inventaram uma maneirabwin afiliadossair dessa situação, muito a partirbwin afiliadosvalores que os tornavam mais capazesbwin afiliadossobreviver,bwin afiliadosganhar dinheiro,bwin afiliadossobreviver ao mercado,bwin afiliadosse juntar,bwin afiliadoster uma disciplina,bwin afiliadoster um autocontrole,bwin afiliadosacreditarbwin afiliadossi próprio,bwin afiliadoster uma auto estima tal.

bwin afiliados BBC News Brasil - Qualquer religião pode ser usada como manipulação. Por que o catolicismo e umbanda - que são também muitas vezes, individualmente, as religiões pessoais dos bandidos - não foram usadas também pelos traficantes como formasbwin afiliadoslegitimação?

bwin afiliados Paes Manso - A principal diferença é que a religião evangélica permite um discurso moral e ético a partirbwin afiliadosuma hermenêutica (interpretação bíblica) horizontal. Essa possibilidade que o protestantismo dábwin afiliadosvocê fazer uma interpretação bíblica própria é o que torna essa religião mais propensa a esse tipobwin afiliadosapropriação, a ponto do próprio bolsonarismo ter se apropriado dela também.

Então, o traficante evangélico do Complexobwin afiliadosIsrael, por exemplo, diz que sonhou com Deus e que Deus disse para ele que ele era o ungidobwin afiliadosCristo na favela e que ia lutar contra os outrosbwin afiliadosdefesabwin afiliadosDeus. Aí ele vai olhar no Antigo Testamento, e tem o povobwin afiliadosIsrael que passa a ser visto como representante ético e moralbwin afiliadosDeus na terra a partirbwin afiliadosuma lutabwin afiliadosséculos contra os inimigos que não obedeciam à moral divina.

Então,bwin afiliadosalguma forma, ele se vê como representante dessa ética do bem e passa a interpretar a Bíblia e se enxergar como um representante do bem a partirbwin afiliadoscoisas que aconteceram na Bíblia. E ele passa a propor isso como um discursobwin afiliadoslegitimidade dabwin afiliadosautoridadebwin afiliadosum Estadobwin afiliadosque você tem quatro organizações criminosas brigando pela hegemonia. Ele começa a se enxergar diferente, como mais legítimo e, por isso, mais forte.

bwin afiliados BBC News Brasil - O fenômeno da população estar mais evangélica acontece no Brasil inteiro. Por que não acontece no PCC ainda a existênciabwin afiliadoslíderes que usam a religião dessa forma ostentosa?

bwin afiliados Paes Manso - No PCC houve gente que tentou usar igreja para lavar dinheiro. O segundo homem do PCC fez isso com igrejas do Rio Grande do Norte. Mas eu acho que aquibwin afiliadosSão Paulo a mistura acontecebwin afiliadosuma outra forma.

A transformação que começou a acontecer é que o dinheiro do crime começou a entrar na economia formal. Como começou a ser lavado, começou a ser investidobwin afiliadosempresas formaisbwin afiliadosônibus que transportam milharesbwin afiliadospassageirosbwin afiliadosSão Paulo,bwin afiliadosorganizações sociais,bwin afiliadospostosbwin afiliadosgasolina,bwin afiliadosempresasbwin afiliadoslixo,bwin afiliadosentulho,bwin afiliadosadegas,bwin afiliadosuma sériebwin afiliadosnegócios. E aí sim, essas coisas (o crime) e a religião dialogam.

Tanto o esses empresários quando os neopentecostais e os pentecostais dessa terceira onda valorizam muito a capacidadebwin afiliadosconsumo ebwin afiliadosganhar dinheiro como uma bênção divina. A pessoa que ganha muito dinheiro se enxerga como uma espéciebwin afiliadosabençoadobwin afiliadosDeus.

O empresário que cresceu, mesmo que seja com o dinheiro lavado do crime, ele frequenta igreja, oferece empregos, se relaciona com outras pessoas e a mistura passou a acontecer por aí. Então você vê sim uma espéciebwin afiliadosde mistura acontecendo, apesar dos mundos serem diferentes, a partir do momento que o crime se formaliza e passa a participar da economia a mistura acontecebwin afiliadosuma outra forma,bwin afiliadosuma outra maneira.

E ao mesmo tempo você tem essa cultura pentecostal gospel fazendo partebwin afiliadosuma cultura geral, inclusive dos criminosos que vão falar: "olha, beleza, eu ainda não me converti, mas eu respeito o pastor, eu sou justo no crime, eu corro do lado certobwin afiliadosuma vida errada".

bwin afiliados BBC News Brasil - No livro você compara o PCC a uma agência reguladora do crime e diz que, no caso do Rio, as facções seriam como empresas competindo. E você fala que no início o PCC aumentou a violência para estabelecer a dominância e só depois, com as regras, o homicídio caiu. É isso que está acontecendo na Bahia neste momento, essa disputabwin afiliadosum lugar onde não existe uma dominância clara?

bwin afiliados Paes Manso - Sim, na Bahia ebwin afiliadosvários estados. São Paulo é o Estado que conseguiu, a partir do PCC, criar essas regras para a cena do crime e virar essa agência reguladora. E isso o PCC conseguiu principalmente a partir da expansão dos presídios e do controle dos presídios que eles conseguiram fazer nos anos 1990. A partir desse momento o PCC começou a dar passos mais largos e chegou às fronteiras da Bolívia, à Colômbia, ao Paraguai.

Ao mesmo tempo o PCC se comunicava com diversos criminosos nos presídios federais. E aí as gangues começaram a aparecerbwin afiliadostodo o Brasil. De repente, são quase 60 gangues no Brasil inteiro,bwin afiliadostodos os estados. Só que nesses estados o PCC enfrentou resistência.

Podia ser resistência localbwin afiliadosuma gangue local, mas muitas vezes associada com o Comando Vermelho, que virou uma referência nacional. Então são mercadosbwin afiliadosdisputa. Na Bahia são várias gangues. Ebwin afiliadosmercados do crime que são competitivos, essas disputas acontecem pela bala.

bwin afiliados BBC News Brasil - Como você avalia o plano do governo federal contra a violência após a crise na Bahia?

bwin afiliados Paes Manso - O ministro (da Justiça) Flávio Dino abordou o problema, falou corretamente: são quase 60 gangues, é um problema nacional e as gangues se comunicam, enquanto as polícias não se comunicam. Então é preciso trocar informação, é preciso juntar as instituições. Da mesma forma ele falou da relevância do controle das polícias por meio dos ministérios públicos para a reduçãobwin afiliadoshomicícios.

Ele faloubwin afiliadosusar taxasbwin afiliadoscrime para medir as metas, para depois eles serem cobrados. Até hoje, ao longobwin afiliados30 anos, o governo federal buscou se omitir do problema, buscou fingir que não era com ele. Faz parte da tradição dos presidentes evitar trazer para eles o problema dos governadores.

Então eu acho que tem que ser apontado esse aspecto positivo do governo federal estar compartilhando com os governadores esse compromisso. É um princípio, me parece importante. Mas óbvio que não vão mudar as coisas do dia para noite, porque,bwin afiliadosfato depende dos governadores e dependebwin afiliadosuma capacidadebwin afiliadosarticulação política.

bwin afiliados BBC News Brasil - Tenho uma pergunta um pouco mais pessoal. Ao longo do livro você conta que é agnóstico e chamabwin afiliados"dom" a capacidade das pessoas religiosasbwin afiliadosacreditar. Você tem - na faltabwin afiliadosuma palavra melhor - uma certa inveja dessa capacidade das pessoasbwin afiliadosacreditarem, da propensão para a fé? Tem vontadebwin afiliadosconseguir sentir o que eles descrevem?

bwin afiliados Paes Manso - Eu já tive. Realmente, às vezes, parece que a vida fica mais fácil quando você tem respostas. Por que você vai acordar, vai sofrer, vai enfrentar vai lutar. Quando você não acreditabwin afiliadosnada, as coisas correm o riscobwin afiliadoscair num vazio mesmo. E acaba sendo sempre um imenso desafio você enxergar propósito nabwin afiliadosvida. Eu fico pensando, será que nunca vou acreditar? Sou mais cético... Mas isso também significa que eu nunca seria ateu, por exemplo, porque o ateu ele acredita na não-existênciabwin afiliadosDeus. E eu eu acredito no mistério. Eu acho que talvez exista alguma coisa que a gente vai ainda encontrar. A gente estábwin afiliadosbuscabwin afiliadosrespostas. E talvez essa seja uma das minhas motivações quase espirituais também. Ou talvez seja impossível encontrar qualquer tipobwin afiliadosresposta. Mas existe um mistério, eu respeito muito esse mistério.