O fascinante papiro sobre a infânciapromo betanoJesus Cristo descoberto por pesquisador brasileiro e colega húngaro:promo betano

Foi quando um documento chamou a atenção da dupla. Já no primeiro trabalhopromo betanodecifragem, eles notaram que havia a sequênciapromo betanotrês letras gregas antigas com o sompromo betano"ies". "De Jesus. Não tem muitas palavras na língua grega que começam com essas letras, então nos demos contapromo betanoque havia uma menção a Jesus", explica ele.

Esse tipopromo betanotrabalhopromo betanopesquisa geralmente partepromo betanoalgumas palavras-chave, para tentar ter uma ideia do que está escrito ali.

Afinal, mais do que um idioma antigo, esses papiros estão muitas vezespromo betanofragmentos e seus textos são escritos com uma grafia muito diferente da atual.

Mais tarde, no mesmo dia, eles lançaram as palavras identificadaspromo betanoum bancopromo betanodados profissional onde estão inseridos todos os textos conhecidospromo betanoliteratura grega da Antiguidade à Idade Média.

Descobriram que aquele papiro era uma cópia do trecho inicial do famoso Evangelhopromo betanoTomé Sobre a Infânciapromo betanoJesus, um texto apócrifo que relata passagens do que teria sido a vidapromo betanoJesus entre os 5 e 12 anos — ou seja, histórias que não constam da Bíblia, uma vez que os quatro evangelhos canônicos silenciam sobre esta fase.

Nos últimos 18 meses, o brasileiro Macedo e seu colega Berkes, húngaro, se debruçaram sobre o papiro. Estiveram pessoalmentepromo betanoHamburgo, para analisar fisicamente o material.

E, cada qual empromo betanouniversidade — Macedo é professor na Universidadepromo betanoLiège, na Bélgica; Berkes, napromo betanoBerlim, Alemanha —, estudaram minuciosamente todas as características do documento que, neste mês, foi divulgado ao mundo.

O material tem a grandezapromo betanoser o mais antigo manuscrito que se conhece sobre esse relato importante acerca da infânciapromo betanoJesus. De acordo com os pesquisadores, o papiro encontrado foi escrito entre os séculos 4º e 5º.

Essa datação é realizada a partir do estilo da grafia.

"As escritas são diferentes segundo a época. E algumas são mais difíceis do que outras", diz Macedo.

"No casopromo betanonosso papiro, ele não é caligráfico, não é bonito, bem feito. É uma escritura mais para o lado do feio, feita por alguém que não sabia escrever muito bem. Não era um profissional, um copista. Acho que talvez por isso não tenha chamado a atenção [em meios aos tantos documentos arquivadospromo betanoHamburgo]."

Uma das hipóteses aventadas pelos pesquisadores é que o texto tenha sido produzido como uma tarefapromo betanoaprendizado por algum monge que estava estudando para, quem sabe, um dia se tornar copista. Isso explicaria a caligrafia desajeitada e a irregularidade dos traços.

"Infelizmente, como não se conhece o contexto arqueológico, da onde veio [o papiro], o único instrumento que nos restou para a data foi a paleografia, ou seja, o tipopromo betanoescrita. Fomos pelo método comparativo", contextualiza.

No artigo acadêmico redigido pela dupla, eles salientam que "não há evidênciaspromo betanocomo ou quando o papiro foi descoberto".

Segundo os pesquisadores, a coleção papirológica mantida pela universidade hamburguesa foi formada a partir da aquisiçãopromo betanouma coleção entre 1906 e 1913 e, "posteriormente, por meiopromo betanocompras individuais até 1939".

Eles acreditam que o documento analisado só foi inventariado pela universidade neste século, poispromo betano2001 "a coleção [mantida ali] contava com apenas 782 números" — e este papiro foi catalogado sob o número 1011.

"O fragmento pode ter pertencido ao núcleo original da coleção ou a um lotepromo betanopapiros […] transferidospromo betanouma caixapromo betanomadeirapromo betanoBerlim para Hamburgopromo betano1990", afirmam os pesquisadores.

"Tentamos achar documentos sobre a história do papiro. Infelizmente não há muita coisa sobre isso", lamenta Macedo.

O textopromo betanosi

O Evangelho Sobre a Infânciapromo betanoJesus, também chamadopromo betanoEvangelhopromo betanoPseudo-Tomé ou Protoevangelhopromo betanoTomé, já era bastante conhecido entre pesquisadorespromo betanoreligião. Antes, o mais antigo documentopromo betanogrego com esse relato era do século 11.

"Ele tem uma tradição, uma transmissão muito complexa, pois é conhecidopromo betanonove línguas antigas e algumas são traduções já medievais. Algumas dessas línguas têm várias versões: o grego, por exemplo, teve quatro versões diferentes", diz o pesquisador brasileiro.

No fragmento, que mede 11 por 5 centímetros e tem 13 linhaspromo betanotexto, está um trecho do início desse evangelho. É o relato daquele que teria sido o primeiro milagre realizado por Jesus, quando ele era um meninopromo betanoapenas cinco anos.

Segundo o texto, ele "brincava no vaupromo betanoum riacho; e reuniu as águas correntespromo betanolagoas e as fez logo puras; e realizou estas coisas apenas com a palavra", conforme tradução do professor Frederico Lourenço, da Universidadepromo betanoCoimbra.

"E, fazendo barro maleável, plasmou a partir dele doze pardais. E era diapromo betanosábado, quando os fez. E havia muitas outras crianças que brincavam com ele", prossegue o texto.

"Tendo um judeu visto as coisas que Jesus fazia, brincando no sábado, foi imediatamente e anunciou ao pai dele, José. 'Eis que o teu filho está junto do riacho; e, tomando barro, plasmou doze pardais; e profanou o sábado'", continua o relato.

No caso, a problematização é por causa da lei judaica que manda guardar os sábados.

"E José, indo para o local e vendo, gritou-lhe dizendo: 'Por que fazes estas coisaspromo betanodiapromo betanosábado, coisas que não é permitido fazer?'", diz o texto. "Jesus, batendo as mãos, gritou as pardais e disse-lhes: 'Ide!'. E, voando, os pardais partiram, chilreando."

Segundo comentáriopromo betanoLourenço no livro Evangelhos Apócrifos - Gregos e Latinos, "não é possível determinar, para esse texto, nem apromo betanoautoria, nem apromo betanodata, nem o seu título original".

O professor e tradutor comenta que as hipóteses apresentadas para a datação do relato eram díspares, indo do século 2º ao século 6º — a descoberta atual encurta um pouco esse hiato.

"Trata-sepromo betanoum texto desconcertantepromo betanovários níveis, sobretudo no modo como nos retrata um menino Jesus insensível e caprichoso", analisa ele, no livro. "Também é curiosa a circunstânciapromo betanose tratar do evangelho apócrifo com o menor númeropromo betanoparalelos com os quatro canônicos (e com outros apócrifos), existindo como que numa bolha própria."

Lourenço acrescenta que "já houve quem o rotulassepromo betanoprimeiro exemplopromo betanoliteratura infantil […]promo betanocontexto cristão".

O professorpromo betanoCoimbra comenta que, parapromo betanoobra, se baseou na redaçãopromo betanogrego que partepromo betanodois manuscritos datados do século 15. Ele se diz surpreso "que os manuscritos gregos desse evangelho seja, no geral, tão tardios, uma vez que existem testemunhos mais antigos do texto (século 6º)promo betanotradução siríaca".

Macedo diz à reportagem que este é um dos pontos que apromo betanodescoberta altera: havia quem apostasse que o relato havia sido escrito originalmentepromo betanosiríaco. Agora, praticamente não restam dúvidaspromo betanoque a primeira versão foipromo betanogrego antigo, a língua franca da intelectualidade mediterrânea naqueles primeiros séculos da era Comum.

Especialistapromo betanocristianismo primitivo e autorpromo betanodiversos livros sobre o tema, o historiador André Leonardo Chevitarese, professor na Universidade Federal do Riopromo betanoJaneiro (UFRJ) ressalta à BBC News Brasil que, ao que tudo indica, a preocupação com o que ocorreu nos primeiros anospromo betanovidapromo betanoJesus foi uma construção tardia, ou seja, não era uma preocupação da primeira geraçãopromo betanoseguidores dele.

"Os autores que poderiam ter nos contado sobre a infânciapromo betanoJesus, ali nos anos 50, 60 do primeiro século, eles não falaram nada [sobre isso]", ressalta.

"Então o mais provável é que essas histórias contidas no Evangelhopromo betanoPseudo-Tomé sejam mesmo tardias, a partir da segunda metade do século 2º."

Em um momentopromo betanoque "quem poderia informar sobre como teria sido essa infância já não estava mais vivo para contar absolutamente nada", atenta o historiador.

Professor na Universidade Presbiteriana Mackenzie, o teólogo, historiador e filósofo Gerson Leitepromo betanoMoraes avalia,promo betanoentrevista à BBC News Brasil, que este texto "é uma tentativapromo betanopreencher uma lacuna" — no caso, a faltapromo betanoinformações biográficas, ou hagiográficas, sobre um período significativo da vidapromo betanoJesus.

"Foi escritopromo betanoum momento da históriapromo betanoque várias correntes teológicas estão existindo e coexistindo, à margem, dentro ou fora do cristianismo, competindo", analisa.

Nascidopromo betanoPorto Alegre, no Rio Grande do Sul,promo betano1986, o pesquisador brasileiro Gabriel Nocchi Macedo fez toda apromo betanocarreira acadêmica na Europa. Entre 2005 e 2008 se bachareloupromo betanoletras clássicas pela Universidadepromo betanoLiège. "No meu percurso, tive contato com a papirologia, que é um dos pontos fortes da minha universidade", comenta.

Em seguida, na mesma instituição, fez seu mestrado. Entre 2010 e 2015, doutorou-se. Atualmente é professor e pesquisador na universidade. Desde 2021 dirige o Centrepromo betanoDocumentationpromo betanoPapyrologie Littérarire (Cedopal), também da universidade belga.

Repercussão

Chevitarese comenta que a importância maior desta descoberta é "que ela baixa significativamente a datação desse evangelho" e o fatopromo betanoque “o original, muito provavelmente, foipromo betanogrego”.

"Também vale destacar que é bonito ver um brasileiro que trabalha no exterior fazer parte dessa descoberta. Isso mostra que brasileiros são tão pesquisadores quanto quaisquer outros. Isso precisa ser reforçado, até para incentivar novas geraçõespromo betanopesquisadores, nas mais diferentes áreas, inclusive nessa muito pouco explorada que é a papirologia", afirma o historiador.

Moraes argumenta que “qualquer manuscrito que esteja na esteira das origens do cristianismo” é muito significativo porque "vem comprovar e corroborar toda uma tradiçãopromo betanoelementos teológicos, filosóficos, históricos e sociológicos que estiveram na base da organização do cristianismo".

Moraes concorda que "a grande novidade" da descoberta é a datação. "Há a comprovaçãopromo betanoque [o Evangelhopromo betanoPseudo-Tomé] é um documento muito antigo, que tem um lastro enormepromo betanosustentaçãopromo betanogrande tradição", diz ele.