Colapsobancos nos EUA e crise no Credit Suisse podem se alastrar pelo mundo? :
Três crises envolvendo grandes bancospouco maisuma semana abalaram mercados e despertaram um sinal vermelho entre autoridades monetáriastodo o planeta.
Apesaras crises serem localizadas — problemasbalanços e saquesmassa por correntistas — qualquer criseum banco tem potencial para contaminar todas as outras instituições financeiras do país ou até no exterior.
Isso acontece porque os bancos emprestam dinheiro entre si — portanto a quebrauma instituição pode gerar problemas financeiros para as demais.
Analistas destacam que quando um sentimentomedo se espalha entre correntistasdiversos bancos, pode haver uma corridamassaclientes para sacarem os seus depósitos — algo que levaria a uma quebradeira mais ampla no setor, com consequências para todas as economias.
Nesta semana, diante das notícias sobre os problemas nos bancos, o presidente dos EUA, Joe Biden, anunciou medidas para tranquilizar os americanos preocupados com o sistema bancário. No anúncio, ele disse: "Seus depósitos estarão lá quando vocês precisarem deles."
Três problemas
O primeiro problema aconteceu na semana passada, nos Estados Unidos, com o colapso do Silicon Valley Bank, o 16º maior credor do país. Dois dias depois, autoridades anunciaram uma intervenção no Signature BankNova York .
Esta semana foi a vez do gigante suíço Credit Suisse, cujas ações desabaram 24% na quarta-feira (15/3), depois que o Banco afirmou ter encontrado "fraquezas"seus relatórios financeiros.
Os temoresuma crise bancária mais ampla provocaram fortes quedas nas bolsasvalorestodo o mundo na quarta-feira.
As autoridades monetáriasEUA e Suíça reagiram rapidamente para que o problema localizado das instituições não se tornasse uma crise geral — com corrida a diversos bancosdiversos países.
O Credit Suisse tomará empréstimosaté 50 bilhõesfrancos suíços (US$ 54 bilhões ou R$ 285 bilhões) do banco central do país para reforçar suas finanças.
O banco central da Suíça disse que o Credit Suisse tem dinheiro suficiente para não quebrar e alertou que está pronto para intervir caso seja necessário.
O banco central dos EUA foi forçado a intervir para evitar uma corrida aos depósitos bancários à medida que o pânico se espalhava.
Nesta quinta-feira (16/03), diante dos anúncios dos bancos centrais, os mercados mundiais mostravam recuperação.
'Grande demais para quebrar'
O economista Nouriel Roubini — que ficou famoso por alertar o mundo para a crise financeira2008, que começou com a quebra do banco americano Lehman Brothers — disse à BBC que a possível quebraum banco como o Credit Suisse teria consequências graves para a economia global.
O banco é considerado por muitos como "grande demais para quebrar" — um termo usado para instituições financeiras cujas falências poderiam ameaçar a economia global.
"O Silicon Valley Bank era apenas um bancoativosUS$ 200 bilhões e causou efeitos cascata nos mercados financeiros globais, enquanto o Credit Suisse é um bancoativosUS$ 700 bilhões, então um colapso do Credit Suisse teria um efeito muito mais sistêmico e contagioso na economia e nos mercados financeiros", disse Roubini à BBC.
"As reservascaixa do banco podem ser fortes, mas no ano passado eles perderam cerca100 bilhõesfrancos suíços (US$ 107 bilhões)depósitos", afirmou Robini.
"Sempre que um banco perde depósitos — e isso pode acontecer da noite para o dia — ele pode entrarcolapso porque está ficando sem dinheiro, então é preciso vender ativos líquidos, o que provoca a falência. Foi o que aconteceu com o Silicon Valley Bank. Isso pode acontecer até no caso do Credit Suisse. Eu diria que seria outro 'momento Lehman' no mundo, porque esse banco é enorme, é global e isso teria efeitos sistêmicos."
Larry Fink, o fundador da maior gestoraativos do mundo, a Blackrock, disse que é possível que vejamos uma "crise lenta" que pode arrastar centenaspequenos bancos para a falência, como a crisepoupança e empréstimos da década1980, quando maismil bancos pequenos faliram nos EUA.
Autoridades preocupadas
Os problemas financeiros do Credit Suisse não ficaram circunscritos apenas às autoridades monetárias da Suíça.
Um ex vice-diretor do Banco da Inglaterra disse à BBC que os bancos centraisSuíça e EUA estão sinalizando aos mercadostodo o mundo que esses problemas serão contidos localmente, antes que possam se alastrar pelo mundo.
John Gieve disse que, no caso do Credit Suisse, isso provavelmente será suficiente para impedir que a crise do banco se espalhasse para outros setores e países.
"O que vimos da noite para o dia é o banco central suíço dizendo 'não vamos deixar isso virar um colapso caótico'", disse Gieve à BBC.
"Não sei o que o futuro reserva para o Credit Suisse, mas até agora eles ainda estão vivos e parece que o banco central suíço garantirá que estejam vivos por tempo suficiente para reorganizarem seus negócios para o futuro."
'Fraquezas materiais'
O Credit Suisse, fundado1856, enfrentou uma sérieescândalos nos últimos anos, incluindo acusaçõeslavagemdinheiro, alegaçõesespionagem e pedidosdemissão no alto escalão.
O banco teve prejuízo2021 e 2022, e avisou seus acionistasque não previa voltar a dar lucros até o ano que vem.
A divulgação do banco na terça-feira (14/3) sobre "fraqueza material"seus balanços financeiros renovou as preocupações dos investidores.
Daniel Davies, diretor-gerente da Frontline Analysts e ex-analista bancário do Credit Suisse, disse que a "baseclientes milionários e bilionários do banco parece ter chegado ao fimsua tolerância e eles têm retirado dinheiro do banco nos últimos seis mesesum ritmo cada vez maior".
Segundo o analista, a situação no Credit Suisse é preocupante o suficiente para fazer com que o Banco da Inglaterra faça sondagens junto ao Banco Central da Suíça sobre as perspectivas da crise no banco.
"Porque a natureza dessas crises é que, quando você tem uma corridamassa por saques, isso funciona como um tsunami — não há nada que as pessoas possam fazer pode pará-la. A única coisa que você pode fazer é impedir isso antes que se transformeuma corrida aos bancos e as únicas pessoas que podem fazer isso são as que trabalham nos bancos centrais."
A tensão aumentou ainda mais depois que o maior acionista do Credit Suisse, o Saudi National Bank, disse que não compraria mais ações do banco suíço por motivos regulatórios. Os primeiros-ministros da Espanha e da França se pronunciaramuma tentativaaliviar os temores.
O colapso do Silicon Valley Bank também alimentou preocupações sobre o valor dos títulos mantidos pelos bancos, já que o aumento das taxasjuros tornou esses títulos menos valiosos.
O Silicon Valley Bank era especializadoempréstimos para empresastecnologia. Ele foi fechado por reguladores dos EUA que apreenderam seus ativos na sexta-feira. Essa foi a maior quebraum banco dos EUA desde a crise financeira2008.
O banco estava tentando levantar dinheiro para cobrir uma perda com a vendaativos afetados por taxasjuros mais altas nos EUA.
A notícia dos problemas levou uma corrida dos clientes para sacar fundos, criando uma crisefluxocaixa.
No domingo, as autoridades americanas também assumiram o controle do Signature BankNova York, que tinha muitos clientes envolvidos com criptomoedas e era vista como a instituição vulnerável a esse tiposaquesmassa.
E agora?
Analistas estão divididos sobre qual será o impacto dos problemas bancários desta semanatoda a economia global — mesmo que não haja uma corrida aos bancos.
A economia global vive um momentodificuldades — com grandes aumentospreçosdiversas partes do planeta (como EUA, Europa e Brasil). Desde o ano passado, as autoridades monetárias vêm respondendo a essa crise com aumento das taxas básicasjuros.
Juros mais altos costumam provocar queda na inflação. Mas taxas elevadas também podem ter efeitos adversos na economia, por aumentarem os custosinvestimentos e empréstimos — com potencial para gerar desemprego e recessão.
Algumas economias, como a do Reino Unido, podem até mesmo entrarrecessão este ano.
Economistas no mundo inteiro e também no Brasil estão debatendo quando o recente cicloaltajuros deve chegar ao fim — e quando começará o movimentocorte dos juros.
O cicloalta derrubou bolsastodo o mundo e afetou diversos setores econômicos — sobretudotecnologia, onde houve demissõesmassamuitas empresas.
Alguns analistas acreditam que as turbulências dos bancos desta semana farão com que o Banco Central americano interrompa o cicloalta dos juros, para dar um certo "alívio" à economia global neste momentoestresse.
"À luz do estresse no sistema bancário, não esperamos mais que o FOMC [comitê do Federal Reserve americano] decida aumentara juros empróxima reunião", afirmounota o banco Goldman Sachs.
A próxima reunião das autoridades monetárias americanas sobre os juros acontece na quarta-feira da próxima semana. No mesmo dia, as autoridades brasileiras também se reunirão para decidir sobre a Selic, a taxa básicajuros da economia brasileira.
- Este texto foi publicado