Como os EUA se apropriaram do Canal do Panamá e por que tiveram que devolvê-lo nos anos 1990:r1 esportes net bet

Hoje, a soberania da hidrovia interoceânica está mais uma vez no centro das notícias após as polêmicas declarações do presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump.

"Estamos sendo enganados no Canal do Panamá", disse Trump no domingo (22/12), fazendo alusão às taxas cobradas aos navios americanos.

O político republicano sugeriu que, se isso não mudar, "exigiremos que o Canal do Panamá seja devolvido na íntegra aos Estados Unidos, rapidamente e sem perguntas". Não disse, no entanto, como pretende fazê-lo.

Porr1 esportes net betvez, o presidente panamenho, José Raúl Mulino, respondeu contundentemente num comunicado publicado na rede social X: "Cada metro quadrado do Canal continuará pertencendo ao Panamá".

Mas, voltando ao passado, como os Estados Unidos se apropriaram da Zona do Canal e o Panamá conseguiu recuperá-la há 25 anos?

A BBC News Mundo, serviçor1 esportes net betespanhol da BBC, relembra os acontecimentos que levaram ambas as nações a um acordo sem precedentes sobre a rota interoceânica que reconfigurou os padrões do comércio regional e global.

Uma guerra civil e uma oportunidade

A necessidader1 esportes net betconstruir uma passagem que ligasse o Oceano Pacífico ao Oceano Atlântico era algo que preocupava os colonizadores europeus desde o século 16.

Naquela época, o único acesso que tinham aos mares do sul era o Estreitor1 esportes net betMagalhães, no sul do Chile, o que significava navegar enormes distâncias e enfrentar o perigoso clima do Cabo Horn.

Foram avaliadas inúmeras ideias: um canal na Nicarágua, umr1 esportes net betTehuantepec (México), outror1 esportes net betDarién, na fronteira do Panamá com a Colômbia, e uma passagem pelo istmo panamenho, que na época era território colombiano.

Mas nenhuma dessas ideias se concretizaria até o século 19. A primeira grande aposta ocorreur1 esportes net bet1880, quando a Colômbia concedeu a concessão para a construção do canal a Fernandor1 esportes net betLesseps, engenheiro francês que havia construído o Canalr1 esportes net betSuez, no Egito.

Mas as doenças dos trabalhadores, muitos deles africanos escravizados, a umidade do território e as chuvas constantes levaram o projeto à falência.

É aí que o interesse dos Estados Unidos por essa rota marítima se junta à dificuldade do Estado colombianor1 esportes net better o controle do seu território.

A Colômbia emergiar1 esportes net betuma guerra civil que havia deixado milharesr1 esportes net betmortos e enfrentava elevados níveisr1 esportes net bettensão política, o que acabaria por abrir caminho à independência do Panamá.

Naquela época, os Estados Unidos eram uma potência emergente que mantinha o controler1 esportes net betPorto Rico e Cuba - e souberam ler a crise interna colombiana como uma grande oportunidade: propuseram pagar 40 milhõesr1 esportes net betdólares para ter a concessão para a construção do canal.

Esse acordo materializou-se com o tratado Herrán-Hay entre a Colômbia e os Estados Unidos, que estabeleceu as diretrizes da licitação e foi acordado entre o secretárior1 esportes net betEstado norte-americano, John Hay, e o ministro colombiano Tomás Herrán.

Foi uma negociação complexa na qual cogitaram construir o canal na Nicarágua, mas também tinham que levarr1 esportes net betconsideração que os franceses já haviam feito um investimento inicial no Panamá.

Por fim, ficou decidido que o canal seria construído no Panamá com capital dos Estados Unidos, que, porr1 esportes net betvez, pagariam à Colômbia e à empresa francesa.

Mas, no dia 5r1 esportes net betagostor1 esportes net bet1903, o governo colombiano, depois que o Congresso se opôs a vários pontos do acordo, alegando que o texto violava a soberania do país, informou que o rejeitava.

Esta última decisão da Colômbia levou à separação do Panamá.

"Quando a Colômbia rejeita o tratado Herrán-Hay, e havia boas razões para rejeitá-lo, vários fatores se combinam a favor da independência do Panamá da Colômbia", disse a historiadora panamenha Marixa Lasso à BBC Mundo.

Finalmente, os Estados Unidos encontraram neste descontentamento panamenho "uma excelente oportunidade para obter o tratado que desejavam sem a interferência da Colômbia".

E foi então que o Panamá ignorou a rejeição do tratado e,r1 esportes net betaliança com os Estados Unidos — que disseram que iriam intervir se houvesse retaliação militar da Colômbia — declarour1 esportes net betindependência no dia 3r1 esportes net betnovembror1 esportes net bet1903.

Um país dividido e o início das tensões

Após a independência do Panamá, ambas as nações assinaram o tratado Hay-Bunau Varilla durante a presidênciar1 esportes net betTheodore Roosevelt, nos Estados Unidos.

Nesse pacto, os Estados Unidos garantiam que manteriam a independência do Panamá desde que o país concedesse a concessão perpétua do canal, além do domínio da chamada Zona do Canal, que incluía 8 kmr1 esportes net betcada lado da via estratégica.

O Panamá receberia US$ 10 milhões como compensação.

Concluída a obra,r1 esportes net bet1913, o barco a vapor Ancón tornou-se a primeira embarcação do tipo a cruzar as suas águas, constituindo-se como um símbolo dar1 esportes net betabertura ao mundo.

Mas as tensões não demorariam a aparecer.

Na prática, o país estava fisicamente divididor1 esportes net betdois. Milharesr1 esportes net betamericanos e suas famílias viviam na área sob suas próprias leis e costumes enquanto trabalhavam no canal, que foi formalmente inaugurador1 esportes net bet1914.

Os "zoneítas" (de zonians,r1 esportes net betinglês) viviam praticamente isolados e sem contato com a população panamenha, que não podia acessar aquele território sem autorização especial.

O ressentimento dos panamenhos contra os privilégios dos zoneítas aumentou ao longo dos anos, até que décadas mais tarde começaram os protestos para recuperar o controle do seu território.

E há dois marcos que seus protagonistas lembram como fundamentais.

Uma delas é a "Operação Soberania"r1 esportes net bet1958, na qual um grupor1 esportes net betestudantes universitários surpreendeu a polícia da Zona do Canal ao entrar para "plantar" pacificamente 75 bandeiras panamenhas.

"Isso marcou o novo rumo das negociações do canal, porque a partir daquele momento derrotamos a agressão psicológica que os EUA realizavam no Panamá desde 1903", disse Ricardo Ríos Torres, um dos líderes dessa manifestação, à BBC Mundor1 esportes net bet2019.

"Disseram-nos que este não era um territórior1 esportes net betacesso para os panamenhos. Naquele dia, dissemos que não tínhamos mais medo e que queríamos um novo tratado que acabasse com a perpetuidade da presença colonial."

O outro acontecimento que influenciou o caminho para a recuperação da hidrovia interoceânica foi a Marcha Patrióticar1 esportes net bet1959, na qual o povo panamenho foi convidado a entrar na Zona do Canal portandor1 esportes net betbandeira.

Esta marcha também começour1 esportes net betforma pacífica, mas, quando o governador da Zona do Canal proibiu a entradar1 esportes net betmanifestantes, ocorreram confrontos entre panamenhos e policiais - dezenasr1 esportes net betpessoas ficaram feridas.

Ambas as mobilizações foram a origemr1 esportes net betuma frase que mais tarde se tornaria popular no Panamá: "Quem semeia bandeiras colhe soberania".

Dia dos Mártires

Esses acontecimentos históricos desencadearam mais mobilizações nos anos seguintes.

A população panamenha não estava disposta a recuar nas suas exigências e era cada vez mais evidente que o governo dos EUA não podia fazer ouvidosr1 esportes net betmercador aos protestos.

Assim, as negociações lentas culminaram num acordor1 esportes net bet1962 entre o presidente panamenho Roberto Chiari e o americano John F. Kennedy, graças ao qual se estabeleceu que as bandeirasr1 esportes net betambos os países deveriam hastear nas áreas civis da Zona do Canal.

Mas quando chegou o dia 1ºr1 esportes net betjaneiror1 esportes net bet1964, datar1 esportes net betque o acordo entrariar1 esportes net betvigor, os zoneítas ignoraram as ordens do próprio governador da Zona do Canal e recusaram-se a hastear a bandeira do Panamá.

As autoridades da região nada fizeram a respeito, e a notícia irritou os panamenhos.

No dia 9r1 esportes net betjaneiro daquele ano, dezenasr1 esportes net betestudantes do Instituto Nacional do Panamá dirigiram-se à Zona do Canal carregando a bandeirar1 esportes net betsua escola para que também pudesse ser hasteada no Colégio Balboa, instituição mantida pelos americanos.

Mas alguns policiais americanos os impediram, e o confronto terminou na violação da bandeira panamenha. A atmosferar1 esportes net bettensão era total.

O dia terminou com maisr1 esportes net bet20 manifestantes mortos e centenasr1 esportes net betferidos no que é conhecido como "Dia dos Mártires".

Esse fato, concordam todos os analistas, foi o grande gatilho para que o Canal do Panamá acabasse por ser transferido para mãos panamenhas maisr1 esportes net bet35 anos depois.

A dureza da resposta do Exército americano às mobilizações levou o então presidente do Panamá, Roberto Chiari, a anunciar que o país estava interrompendo as relações diplomáticas com Washington até que um novo tratado fosse assinado entre os dois países.

Esta decisão - sem precedentes para um país onde os EUA estavam presentes - é o que fez com que, ainda hoje, muitos se refiram a Chiari no Panamá como "o presidente da dignidade".

A pressão internacional foi decisiva para que os Estados Unidos concordassemr1 esportes net betnegociar.

O acordo Torrijos-Carter

Após aquele janeiro sombrio,r1 esportes net bet3r1 esportes net betabrilr1 esportes net bet1964 começaram as conversas entre os Estados Unidos e o Panamá.

Ambos países se comprometeram a nomear embaixadores especiais para conduzir um diálogo tenso.

"Não havia volta atrás. O Panamá só aceitaria um novo tratado. O presidente Carter compreendeu isso, e foi assim que os Estados Unidos acabaram assinando o acordo. A população panamenha estava convencidar1 esportes net betque era necessário eliminar aquele enclave colonial e reivindicar o que era nosso", disse o líder manifestante Ríos Torres à BBC Mundor1 esportes net bet2019.

"Ou entregavam o canal, ou simplesmente desapareciam."

No entanto, foi necessário esperar 10 anos até que, sob o governor1 esportes net betRichard Nixon, fosse assinada, na Cidade do Panamá, uma declaração conjunta entre o secretárior1 esportes net betEstado dos EUA, Henry Kissinger, e o chanceler panamenho, Juan Antonio Tack.

Naquele momento, já estava claro para ambas as partes que, antesr1 esportes net bettudo, era preciso revogar o Tratado Hay-Bunau-Varilla, que havia concedido os direitos do canal aos Estados Unidos, alémr1 esportes net betencerrarr1 esportes net betjurisdição no país centro-americano.

E essa seria a base para o acordo que, três anos depois, seria assinado por Jimmy Carter e Omar Torrijos.

O tratado, firmado na sede da Organização dos Estados Americanos (OEA)r1 esportes net betWashington, no dia 7r1 esportes net betsetembror1 esportes net bet1977, contemplava a celebraçãor1 esportes net betdois pactos: o Tratador1 esportes net betNeutralidade e o Tratado do Canal do Panamá.

Em termos simples, neles ficou acordado que a soberania da Zona do Canal estaria sujeita à legislação panamenha e se estabeleceu uma data para a transferência do domínio da via interoceânica ao país centro-americano: 31r1 esportes net betdezembror1 esportes net bet1999.

Para Carter, com a devolução do canal aos panamenhos, os americanos demonstraram que "como um país grande e poderoso, somos capazesr1 esportes net bettratarr1 esportes net betforma justa e honrosa com uma nação soberana, orgulhosa, mas menor".

Emr1 esportes net betopinião, esse marco selava "um novo sentimentor1 esportes net betconfiança mútua e respeito pelos Estados Unidos" entre os países latino-americanos, conforme informou, na época, o jornal The New York Times.

Suas palavras, após a assinatura dos tratados Torrijos-Carter, também buscavam acalmar as águas internas. Nos Estados Unidos, principalmente entre os setores conservadores, havia uma forte resistênciar1 esportes net betceder a jurisdição que o país exercera por quase um século.

"Não somos proprietários da Zona do Canal do Panamá, nunca tivemos soberania sobre ela. Só tivemos o direitor1 esportes net betutilizá-la", disse Carter.

Suas palavras encontraram eco no Senado americano, que, posteriormente, ratificaria o pacto e selaria os destinos do canal.

O mesmo fizeram os panamenhos. Torrijos submeteu os tratados a plebiscito e obteve amplo apoio.

A devolução

Após um períodor1 esportes net bettransição, a poucos dias da virada do século, autoridadesr1 esportes net bettodo o mundo chegaram ao Panamá para participar da cerimônia oficial do que já se tornara um sonho histórico para seus habitantes.

No dia 14r1 esportes net betdezembro, realizou-se um primeiro evento,r1 esportes net betMiraflores, uma das comportas do canal.

A cerimônia, que reuniu cercar1 esportes net bet1,5 mil convidados, contou com a presençar1 esportes net betmandatários e delegaçõesr1 esportes net betpaíses como Colômbia, Equador, Costa Rica, México e Bolívia. A eles também se juntaram o rei Juan Carlos I da Espanha e o próprio Jimmy Carter.

O porte da delegação americana — presidida pelo secretárior1 esportes net betComércio e Transporte, William Daley — e a ausência do presidenter1 esportes net betexercício, Bill Clinton, no entanto, não passaram despercebidos pelo governo panamenho, liderado na época pela presidente Mireya Moscoso.

A líder inclusive transmitiu seu desconforto aos enviados especiais dos jornais mais importantes do mundo que foram cobrir o momento histórico.

Mas nada disso ofuscou o que seria vivido após o meio-dia do dia 31r1 esportes net betdezembro. Com telõesr1 esportes net betvários pontos da cidade e um relógior1 esportes net betcontagem regressiva, os panamenhos acompanharam ao vivo a devolução definitiva da via interoceânica.

Foi Mireya Moscoso quem hasteou a bandeira panamenha naquele dia no Edifício da Administração do Canal, selando assim a transferência, que ratificou junto ao secretário do Exército dos Estados Unidos, Louis Caldera.

"Panamá, o canal é dos panamenhos", disse a presidente naquele dia, conforme reportado pela agência Associated Press. "O Panamá finalmente alcança a plenituder1 esportes net betum Estado soberano".

Cantou-se o hino nacional, houve celebração e até fogosr1 esportes net betartifício.

"Neste dia, atingimos a maioridade como nação", afirmou Moscosor1 esportes net betseu discurso, destacando que, a partir daquele momento, os panamenhos assumiam uma nova tarefa: gerenciar "de maneira eficiente, como uma questãor1 esportes net betEstado e livrer1 esportes net betinteresses políticos" o Canal do Panamá.