Por que Espanha quer rever reforma trabalhista, o mesmo que Lula disse querer fazer no Brasil:
Menoscinco anos depoisser aprovada no Congresso e implementada no Brasil, a reforma trabalhista do governoMichel Temer (2016-2018) voltou a ser pauta na agenda política brasileira, após manifestações do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Lula, que é tido como pré-candidato ao Planalto nas eleições deste ano, publicou no Twitter na semana passada: "É importante que os brasileiros acompanhemperto o que está acontecendo na Reforma Trabalhista da Espanha, onde o presidente [de governo, cargo equivalente aoprimeiro-ministro] Pedro Sánchez está trabalhando para recuperar direitos dos trabalhadores".
O tuíte era acompanhadoum link para uma reportagem do site BrasilFato, com críticas à reforma.
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Na terça-feira (11/1), Lula se reuniu virtualmente com sindicalistas e com o Partido Socialista Operário da Espanha (PSOE), que voltou ao poder no país2018 e vem discutindo formasreverter a reforma trabalhista implementada na Espanha2012.
No encontro promovido pela Fundação Perseu Abramo, ligada ao PT, esquerdistas brasileiros e espanhóis concordaramcontinuar as discussões para revisar as leis trabalhistasambos os países.
O partido espanhol publicou no seu Twitter após o encontro: "A partir do diálogo e do acordo constroem-se grandes avanços".
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Uma revisão da reforma trabalhista espanhola2012 se tornou uma das principais bandeiras do governoSánchez no quarto ano do seu mandato. A Espanha vem tentando reagir à crise econômica provocada pela pandemiacovid.
Mas o que está acontecendo na Espanha? E como esse processo tem relação com o que Lula defende para o Brasil, caso seja eleito?
Confira abaixo algumas questões sobre a reforma trabalhista.
O que foi a reforma trabalhista espanhola2012?
A Espanha foi um dos países europeus mais afetados pela crise financeira que assolou o mundo2008. Em 2012, o desemprego eramais20% — ou seja, atingia quatro milhõesespanhóis.
O então presidentegoverno Mariano Rajoy, do Partido Popular (PP),direita, conseguiu aprovarjulho2012 no Parlamento espanholproposta para flexibilizar as leis trabalhistas do país.
O discurso do governo na época eraque a flexibilização das leis trabalhistas era necessária para a Espanha gerar mais empregos e retomar a competitividadesua economia, que teve uma grande expansão nos anos 1990. O argumento eraque a legislação trabalhista espanhola — grande parte dela ainda resquício da era Franco (1939-1975) — exigia demais das empresas, dificultando contratações e reduzindo a competitividade da iniciativa privada no país.
A esquerda espanhola sempre combateu esse discurso, e,fevereiro2012, organizou protestos e greves geraisdezenascidades. Mesmo assim, as reformas foram aprovadas pelo Congresso, dentroum cenáriourgência para recuperação da economia espanhola.
Poucos meses antes, sindicatos e empregadores haviam concordadolimitar os aumentos salariais para os próximos três anos, como parteum compromisso coletivo contra a crise.
Quais eram os pontos da reforma2012?
A reforma permitiu que os empregadores flexibilizassem contratostrabalho para evitar demissõesfuncionários. Leis sobre demissãojusta causa foram flexibilizadas. As empresas não precisavam mais comprovar que uma demissão era essencial para garantir a rentabilidade futura do negócio.
Além disso, a reforma deu prioridade a acordos coletivos firmados diretamente entre empregados e empresas —vezsetores inteiros com sindicatos.
Com isso, empresas podiam negociar diretamente com seus trabalhadores a redução da jornadatrabalho e salários mais baixos, por exemplo.
A indenizaçãodemissão sem justa causa foi reduzida para 33 diassalário por anoserviço até um máximo24 meses. Antes da reforma, demitidos sem justa causa tinham direito a 45 diassalário por ano até um máximo42 meses.
A economia espanhola voltou a crescer dois anos após a aprovação das reformas trabalhistas, tendo se expandido mais2%médiatodos os anos até a chegada da crise da pandemia.
No entanto, a discussão sobre se a reforma trabalhista contribuiu ou não para esse crescimento sempre foi marcada por divisões.
Em 2013, um relatório a OCDE destacou que a reforma "promoveu flexibilidade interna, reduziu custosdemissão para trabalhadores permanentes, aumentou a contratação com contratos permanentes e levou a uma queda nas demissões coletivas".
Por que o governo da Espanha reverteu parte das reformas agora?
Nem todos os lados concordam com essa avaliação da OCDE.
O presidentegoverno, Pedro Sánchez, evice-premiê, Yolanda Díaz, sempre atacaram a legislação trabalhista aprovada2012, argumentando que ela não gerava empregos e tornava mais precária a situação dos trabalhadores espanhóis.
Uma das consequências da reforma, segundo eles, é que houve um boomcontratos temporáriostrabalho, que substituíramforma indevida empregos permanentes.
No fim2021, o governo espanhol anunciou um consenso para revisar as reformas2012, após nove mesesnegociações entre governo, sindicatos e entidades patronais.
A revisão modificou um tipocontrato conhecido na Espanha como "por obra y servicio", onde trabalhadores eram contratados para um projeto ou serviço específico.
Este é o modelo que vinha sendo usado para contratações fraudulentas, com empresas emitindo e renovando contratos temporáriosvezgarantir um vínculo permanente, com melhores condições.
Agora, contratos desse tipo só podem ser renovados por até seis meses, ou um ano se houver um acordo coletivo específico.
Quem acumula 18 mesescontratos temporáriosapenas 24 meses é considerado permanente. A reformaSánchez abriu uma janelaexceção para épocas especiais, como Natal e tempocolheita.
Essas revisões da reforma trabalhista espanhola foram realizadas por um decreto e já estãovigor, mas ainda precisam ser aprovadas no Parlamento da Espanha nos próximos dias para se tornarem permanentes.
O que foi a reforma trabalhista2017 do Brasil?
As reformas trabalhistas2017 foi uma das principais realizações do governoMichel Temer (MDB), que foi eleito como vice-presidenteDilma Rousseff (PT)2014 e assumiu o poder após o impeachment da petista, tendo rompido com ela no processo.
Na época, o Brasil vivia uma forte recessão econômica. Temer argumentava, como na Espanha2012, que era preciso flexibilizar e modernizar leis trabalhistas antigas.
Como na Espanha, a reformaTemer reforçou a negociação direta entre empresas e trabalhadoresacordos que poderiam prevalecer sobre a lei vigente. Um dos objetivos do governo era evitar que muitas disputas fossem acabar na Justiça, gerando insegurança.
A reforma ainda regulamentou o home office, definiu que trabalhadores autônomos que trabalham com exclusividade para um empregador não podem ser considerados empregados da empresa, modificou os contratos parciaistrabalho, determinou o fim do imposto sindical obrigatório, obrigou trabalhadores a arcarem com os custosações trabalhistas perdidas, flexibilizou o trabalhomulheres grávidaslugares insalubres, ampliou as possibilidadesterceirização e impediu que o tempodeslocamentocasa para o trabalho fosse contabilizado como hora trabalhada.
Como na Espanha, sindicatos e partidosesquerda criticaram a reformaTemer, dizendo que — ao invésgerar empregos — ela acabava por retirar direitos dos trabalhadores.
O que Lula pretende fazer?
Lula vem defendendo uma revisão da reformaTemer nos moldes do que está sendo discutido na Espanha. Em novembro, ele visitou a vice-premiê, Yolanda Diaz, durante uma viagem à Europa.
Na terça-feira, no encontro virtual, Lula se reuniu com representantes do governo espanhol, que, segundo o site do ex-presidente, estavam trabalhando "fora do horáriotrabalho do governo".
Na nota, Lula cita uma fala do ministro da Inclusão da Espanha, José Luis Escrivá: "É uma mentira que a competitividadeum país seja conseguida reduzindo salários. Se consegue com salários melhores combinados com a qualificação da mãoobra".
O encontro terminou com a promessa "de seguir aprofundando o intercâmbio e o diálogo", mas não houve detalhamento específico do que Lula mudaria na lei trabalhista brasileira, caso fosse eleito.
O episódio teve repercussões políticas, gerando pressão sobre Geraldo Alckmin — tido como potencial candidato a vice-presidenteuma chapa com Lula — para conter o ímpetorevisão dos petistas.
No PSDB, o governadorSão Paulo e pré-candidato à Presidência, João Doria, manifestou-se a favor da reforma trabalhista2017 e prometeu aprofundar as reformas, caso seja eleito.
Em artigo no jornal FolhaS. Paulo, o ex-presidente Michel Temer defendeureforma trabalhista, alegando que ela foi importante para gerar "credibilidade fiscal e econômica no país".
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