As semelhanças e diferenças entre as reformas da Previdência do Brasil e da Argentina:
Sob intensos protestos, o Congresso da Argentina aprovou na segunda-feira uma polêmica reformaseu sistema previdenciário, que muda a forma como se reajustam os benefícios sociaisestimados 17 milhõesargentinos.
Foi uma importante vitória política do presidente Mauricio Macri, patrocinador do projeto - aprovado por 127 votos a favor, 117 contra e duas abstenções.
Enquanto isso, no Brasil a votação da Reforma da Previdência é alvointensa negociação entre o governo Michel Temer e o Congresso, que adiou a análise do tema para fevereiro.
Na Argentina, aposentadorias, pensões e benefícios eram até então reajustados semestralmente a partiríndices como evolução dos salários e arrecadação previdenciária. A reforma prevê que o aumento passe a ser regido pelos índicesinflação auferidos trimestralmente.
"O que fizemos foi garantir, nos próximos anos, uma fórmula que defenda os aposentados do pior mal que sofremos, a inflação, contra a qual lutamos, mas não conseguimos vencer", afirmou Macri.
Críticos, no entanto, argumentam que a mudança resultaráperdas para os aposentados - a aprovação foi seguidaamplas manifestações e uma greve geral.
"O projeto é perversoA a Z, prejudica o conjunto do povo argentino. Por isso gerou reaçãotodos os lados, menos neste recinto (em referência ao Congresso)", afirmou o deputado opositor Agustín Rossi.
Nas redes sociais, usuários brasileiros destacaram a forte ondaprotestos registrada na Argentina, comparando-a às reações populares à reforma daqui.
Se por um lado a reforma aprovada no país vizinho é mais restrita do que a que se planeja aplicar no Brasil, o cenário político e econômico dos dois países guarda semelhanças.
Veja, a seguir, o que hácomum ou não nos esforços governamentaisreforma, aqui e lá:
- Diferenças
Reformasalcances distintos
A reforma argentina focou sobretudo na mudança como se reajusta o benefício previdenciário, que passa a ser vinculado majoritariamente à inflação trimestral,veza um índice que combinava reajustes salariais e arrecadação.
Para compensar as perdas que serão sofridas no períodotransição das regras, o governo prometeu um bônus único adicionalaté 750 pesos (cercaR$ 140) a cerca10 milhõesaposentados - algo que foi criticado como "irrisório" por sindicatos e oposição.
Analistas afirmam que Macri tenta preservar seu capital político para as demais reformas, como a tributária, que também está tramitando no Congresso.
No Brasil, a atual propostadiscussão tem alcance mais amplo: prevê idade mínima para se aposentar (65 para homens e 62 para mulheres), tempo mínimocontribuição para se ter direito ao benefício (15 anos na iniciativa privada e 25 para servidores públicos), o fim do benefício apenas por temposerviço e limites à aposentadoria integral, restrita apenas a quem contribuir por 40 anos.
É uma das principais bandeiras do governo Temer, mas enfrenta forte resistência no Congresso. Na semana passada, depoismuitas idas e vindas, o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), declarou que a análise do tema ficaria para fevereiro.
Macri mais fortalecido
Outra importante diferença é o momento político dos governos brasileiro e argentino.
Macri viupopularidade ser afetada pelo recente desaparecimento do submarino ARA San Juan, com 44 tripulantes a bordo, e pelas falhascomunicação da Marinha argentina durante o episódio.
Mas, segundo pesquisa encomendada pelo jornal Clarín no finalnovembro, cerca54% da população mantém a aprovação ao governo - queda5 pontos percentuaisrelação ao iníciogoverno,janeiro2016, porémpatamar ainda elevado.
Temer, porvez, vive um momento bem mais delicado - usou seu capital político para angariar apoio para enterrar duas denúncias contra sidecorrência da delação premiada da JBS. Isso, somado à baixa popularidade do presidente - segundo levantamento mais recente do instituto Datafolha, ele é rejeitado por 71% da população - e à proximidade das eleições gerais2018, tem tornado mais difícil angariar apoio para uma reforma polêmica.
- Semelhanças
Deficit crescente e crise persistente
Aqui e lá, os dois governos defendem que reformas são essenciais para combater enormes rombos nas contas públicas.
Na Argentina, segundo a agência Reuters, a metaMacri é diminuir o deficit fiscal para 3,2% do PIB (Produto Interno Bruto) no ano que vem, contra os 4,2% deste ano, alémreduzir a inflação para um patamar entre 8% e 12% - atualmente, estácerca20% ao ano.
Um informe do Instituto ArgentinoAnálise Fiscal estimou que, com a reforma, ao final2019 a aposentadoria argentina estarámédia 8% menor, gerando uma economiaestimados US$ 4 bilhões no ano que vem.
No Brasil, o escopo da Reforma da Previdência é alvodebate acalorado entre economistas, mas não há dúvidasque a situação econômica seja delicada: o governo federal tem registrado rombos bilionários nas contas públicas desde 2014, reflexo da perdaarrecadação e do contínuo aumento das despesas obrigatórias, entre elas o regimeaposentadorias e pensões.
O Ministério do Planejamento calcula que, mantidas as regras atuais, os gastos do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) representarão 58% das despesas primárias do governo federal (excluindo juros com a dívida) do governo federal2022.
Impopularidadereformas
Outra similaridade é a impopularidade das reformas. Por mais que esteja disseminada a ideiaque mudanças são necessárias para conter o escalonamento dos gastos públicos, é difícil obter um consenso sobre quem deve sofrer com os cortes.
Na Argentina, a votação foi seguidaenfrentamentos entre manifestantes e policiais nas ruas, com um saldo200 feridos e dezenaspessoas detidas, alémpanelaçosdiversos bairrosBuenos Aires e a convocaçãouma greve, que afetou os transportes e o comércio.
No Brasil, pesquisamaio do Datafolha apontou que 71% das pessoas se opõem a uma reforma previdenciária, rejeição que sobe para 83% entre funcionários públicos.