'Luta deve continuar sem armas', diz ex-guerrilheira que foi perseguida pelas Farc:link realsbet
Após quatro anoslink realsbetnegociaçõeslink realsbetHavana, Cuba, e três fracassoslink realsbetgovernos anteriores, os dois lados estabeleceram as bases para iniciar o processolink realsbetpaz - que precisará ser confirmado no plebiscito nacional deste domingo.
Segundo as pesquisas, o "sim" lidera. Para que o acordo seja ratificado, o governo necessita do apoiolink realsbetpelo menos 13% dos eleitores registrados da Colômbia, ou cercalink realsbet4,5 milhõeslink realsbetpessoas.
As Farc inclusive afirmaram no sábado que vão indenizar materialmente as vítimas do conflito, no âmbito do acordo.
Mas a resistência dos grupos conservadores, liderada pelo ex-presidente Álvaro Uribe, divide a sociedade colombiana. Para eles, o acordo favorece as Farc e prevê sentenças "muito reduzidas" para ex-guerrilheiros que cometeram crimes graves. Eles também criticam a anistia para crimes considerados mais leves e a autorização para que ex-membros das Farc sejam eleitos.
Os apoiadores do acordo reforçam que a guerra já causou muitos estragos e que o voto pelo "sim" é um passolink realsbetdireção à construção da paz.
"Chegou a horalink realsbetcolocar um fim nessa guerra e continuar nossa luta sem armas", opina Sandra, que pretende ingressar na política para "lutar por direitoslink realsbetex-combatentes".
'Limbo'
Quando se entregou às autoridades colombianas,link realsbet2003, Sandra não tinha a intençãolink realsbetdeixar o grupo.
Ela havia pedido autorização às Farc para "deixar a selva temporariamente para tratar uma gripe mal curada". Aproveitou a licença temporária para visitarlink realsbetfilha, fruto da relação que teve com um guerrilheiro quando ainda servia como miliciana na cidade.
Sua saída prolongada da selva causou desconfiançalink realsbetpartelink realsbetmembros do grupo, que começaram a persegui-la. Ao mesmo tempo, ela estava sendo caçada pelas autoridades.
"Fiquei num limbo jurídico, sem saber o que fazer", relembra Sandra. Na época, a política do então presidente Álvaro Uribe para o conflito era a saída militar, e não negociada. As alternativas à luta armada eram a rendição ou a morte.
"Sem saída", ela se entregou às autoridades e se incorporou ao programalink realsbetreintegração social estabelecido pelo governo colombiano para incentivar as deserções.
Carta às Farc
O primeiro contatolink realsbetSandra com a guerrilha ocorreu aos 11 anoslink realsbetidade, quando decidiu escrever uma carta para um comandante das Farc, solicitando ingresso voluntário.
Fazer parte das fileiras das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia, o maior grupo rebelde do país, era uma formalink realsbet"fugir da realidade que estava vivendo", relembra Sandra, hoje com 36 anos.
De origem camponesa, ela cresceu numa comunidade indígena no departamentolink realsbetCauca, território com grande incidência guerrilheira.
Criada pelos avós, teve uma infância marcada por pobreza e trabalho duro. Mas o que levou a jovem a deixarlink realsbetcasa foi a violência sexual que sofreu desde pequena. "Os abusos vieramlink realsbetquatro ou cinco pessoas muito próximas à minha família", relata Sandra.
"Começou quando eu era muito pequena e foi até meus 11 anos, quando tomei a decisãolink realsbetme defender."
Não demorou muito até quelink realsbetcarta fosse respondida por um comandante das Farc. "Ele disse que eu era muito jovem, teria que esperar."
Enquanto esperava, Sandra tornou-se ativista e passou a defender o direito e o acesso ao territóriolink realsbetsua comunidade indígena. Em protestos e assembleias, conta a ex-guerrilheira, aprendeu sobre a política e a história da Colômbia.
Aos 17 anos, quando "finalmente" foi recrutada pelas Farc, o desejolink realsbetentrar para a guerrilha continuava forte, mas suas razões haviam mudado. Agora, desejava combater para "mudar a realidade do país".
"Eu achava que a pobreza que eu vivia era a única que existia", diz Sandra. "Mas foi nas montanhas da Colômbia que eu presenciei a real miséria que existe no meu país."
Somos todos vítimas'
Sua entrada oficial na guerrilha ocorreulink realsbet1997. Iniciou como miliciana, conta, e após dois anos foi transferida para a selva. Nas Farc, Sandra recebeu uma formação políticalink realsbetinspiração marxista, aprendeu sobre igualdadelink realsbetgênero e chegou a se tornar comandante.
Sandra conheceu seu atual companheiro, Jhon Jairo Romero,link realsbetBogotá, seis anos após desmobilizar-se. Na época, trabalhava como gestoralink realsbetprojetos sociais e tinha como desafio reconciliar pessoas deslocadas pelo conflito, ex-guerrilheiros, ex-paramilitares e vítimas da guerra.
O primeiro contato do casal aconteceulink realsbetuma reunião comunitária. Sandra diz ter encontrado na histórialink realsbetJhon semelhanças com alink realsbetprópria trajetória.
Assim como Sandra, Jhon cresceu num território rural dominado por guerrilhas e teve uma infância na pobreza. A única diferença entre os dois, diz Sandra, é que ele optou por uma juventude longe das armas.
Aos 15 anos, Jhon e seu irmão fugiram para Bogotá para se proteger das Farc, que os perseguia com intençãolink realsbetrecrutá-los. Eles não imaginavam, porém, que a vida na capital seria outro tipolink realsbetbatalha.
"Chegaram aqui sem comida, moradia nem emprego e tiveram que começarlink realsbetvida do zero", conta Sandra. Atualmente, o casal vive numa casa precárialink realsbettrês cômodos na periferialink realsbetBogotá, juntamente com suas duas filhas - além das duas filhas mais velhaslink realsbetSandra, que são frutoslink realsbetsua relação anterior.
"A sociedade não entende que somos todos vítimas", diz Sandra. "Meu companheiro foi deslocado por causa das Farc e eu estou deslocada porque lutei para mudar a realidadelink realsbetmeu país", conta a ex-guerrilheira, que optou por não retornar ao seu territóriolink realsbetorigem por questãolink realsbetsegurança.
A aprovação do acordolink realsbetpaz no plebiscitolink realsbetdomingo, diz ela, aumentaria suas chanceslink realsbetrevisitarlink realsbetcidade natal.
Sociedade dividida
O governolink realsbetJuan Manuel Santos alertou que não existe um plano B nem a possibilidadelink realsbetrenegociação com as Farc caso o "não" vença nas urnas. Mas a vitória do "sim" não significa que a paz será restabelecida na Colômbia da noite para o dia. O conflito marcou muitas vidas e deixou grandes sequelas na sociedade.
Para muitos colombianos, a possibilidadelink realsbetum acordolink realsbetpaz, ironicamente, traz memórias sombrias do passado. Durante negociações na décadalink realsbet1980, membros da guerrilha se uniram ao partido político União Patriótica (UP) e milhares deles foram assassinados por grupos paramilitareslink realsbetextrema direita.
Em umlink realsbetseus discursos recentes, Santos chegou a admitir publicamente o papel do governo nos assassinatos, reconhecendo que não foram tomadas medidas necessárias para prevenir o que muitos consideram um "genocídio político".
Já as sequelas causadas pelas Farc incluem sequestrolink realsbetmilhareslink realsbetpessoas, extorsão e tráficolink realsbetdrogas - meios que o grupo utilizou para financiar suas cinco décadaslink realsbetconflito.
Esses atos, que direta ou indiretamente tocaram muitas famílias, deixam colombianos divididoslink realsbetimportantes questões relacionadas ao acordolink realsbetpaz. A reintegraçãolink realsbetrebeldes à sociedade é uma delas.
Enquanto parte da população está otimista e acredita que o retorno dos guerrilheiros à vida civil trará mais benefícios do que problemas, muitos ainda estão preocupados com a ideialink realsbetviverlink realsbetmeio a ex-combatentes.
Se o acordo for ratificado, aproximadamente 7 mil membros da Farc deverão entregar suas armas à ONU ao longo dos próximos seis meses.
"É importante que a sociedade se comprometa a não estigmatizá-los ou rejeitá-los", afirma Joshua Mitrotti, diretor da Agência Colombiana para Reintegração (ACR), entidade encarregadalink realsbetassistir os desmobilizados no retorno a sociedade civil.
"Essa não é uma histórialink realsbetbons ou maus, e sim uma história complexa que nós colombianos vivemos", opina Mitrotti.