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O que é ser feminista?:blaze podpah
E por quê? Há diversos motivos. Em seu livro O Feminismo é para Todos, a escritora e ativista bell hooks (ela assina o seu nome com letras minúsculas) cita um dos principais: muita gente pensa,blaze podpahforma errada, que o feminismo é "anti-homem". Mas ela explica que, na verdade, o centro do feminismo é ser anti-sexismo (ou anti-machismo), e não ser anti-homem.
Para entender todas essas questões, a BBC News Brasil explica abaixo as origens do feminismo, as ondas do movimento ao longo dos anos e por que não existe um, mas vários feminismos. Em seguida, é preciso entender as críticas ao movimento feitas por mulheres negras e por outras que atualmente rejeitam o termo feminista. Depois, vale se debruçar sobre como as mulheres se tornaram a maioria do eleitorado, mas só ocupam 15% dos assentos no Congresso brasileiro.
As origens do feminismo
O primeiro registro conhecido do termo "feminismo" datablaze podpah1837,blaze podpahescritos do filósofo francês Charles Fourier, que comparava a situação das mulheres à dos escravizados. À época, a palavra derivava o termoblaze podpahlatim femina ("mulher") e remetia a características e qualidades femininas. Mas décadas depois passou a ser associado aos movimentos por direitos das mulheres, e a acepção original caiublaze podpahdesuso.
Como ocorre com outros termos políticos importantes (como comunista, liberal e conservador), não há consenso sobre o que realmente significa feminismo, considerado um movimento, uma filosofia política ou uma atitudeblaze podpahrelação ao mundo.
Mas ainda assim diversas especialistas tentam explicar o que, afinal, é ser feminista.
Por exemplo: para a escritora e pesquisadora britânica Rosalind Delmar,blaze podpahseu artigo "O que é Feminismo?", "uma feminista é no mínimo alguém que acredita que mulheres sofrem discriminação por causablaze podpahseu sexo, que elas têm necessidades específicas que continuam a ser negadas e desatendidas, e que a satisfação dessas necessidades demanda uma mudança radical na ordem política, social e econômica".
Carla Cristina Garcia, no livro Breve História do Feminismo, porblaze podpahvez, define o feminismo "como a tomadablaze podpahconsciência das mulheres como coletivo humano, da opressão, dominação e exploraçãoblaze podpahque foram e são objeto por parte do coletivoblaze podpahhomens no seio do patriarcado sob suas diferentes fases históricas, que as moveblaze podpahbusca da liberdadeblaze podpahseu sexo eblaze podpahtodas as transformações da sociedade que sejam necessárias para este fim".
Em seu livro O Feminismo é para Todos, hooks diz que feminismo é "um movimento para acabar com sexismo, exploração sexista e opressão". Neste livro, ela cita como exemplo sexista a violência patriarcal, "baseada na crençablaze podpahque é aceitável que um indivíduo mais poderoso controle outros por meioblaze podpahvárias formasblaze podpahforça coercitiva".
"Assim como a maioria dos cidadãos desta nação acreditablaze podpahsalários iguais para funções iguais, a maioria do pessoal acredita que homens não deveriam espancar mulheres nem crianças. Ainda assim, quando dizem para essas pessoas que violência doméstica é um resultado do sexismo, que ela não vai acabar enquanto não acabar o sexismo, elas não conseguem fazer essa dedução lógica, porque isso exige desafiar e mudar maneiras fundamentaisblaze podpahpensar gênero", escreve ela.
Sexismo é "o conjuntoblaze podpahtodos e cada um dos métodos empregados no seio do patriarcado para manterblaze podpahsituaçãoblaze podpahinferioridade, subordinação e exploração o sexo dominado: o feminino", explica a pesquisadora e professora Carla Cristina Garcia (PUC-SP), no livro Breve História do Feminismo.
E o que seria o patriarcadoblaze podpahque hooks e outras feministas falam? De acordo com o Dicionário Ideológico Feminista, organizado pela ativista e psicóloga espanhola Victoria Sau, o patriarcado é uma "formablaze podpahorganização política, econômica, religiosa, social baseada na ideiablaze podpahautoridade e liderança do homem, no qual se dá o predomínio dos homens sobre as mulheres, do marido sobre as esposas, do pai sobre a mãe, dos velhos sobre os jovens, e da linhagem paterna sobre a materna".
Segundo esse dicionário, o patriarcado "surgiu da tomadablaze podpahpoder histórico por parte dos homens que se apropriaram da sexualidade e reprodução das mulheres e seus produtos: os filhos, criando ao mesmo tempo uma ordem simbólica por meio dos mitos e da religião que o perpetuam como única estrutura possível".
Na históriablaze podpahquadrinhos Uma Breve História do Feminismo no Contexto Euro-Americano, a artista gráfica Patu e a jornalista e cientista política Antje Schrupp dizem que feminismo não é um programablaze podpahconteúdo fixo, mas uma atitude orientada pela liberdade feminina e "quem quer entender as ideias feministas precisa sempre enxergá-lasblaze podpahseu contexto e não deve jamais exigir uma definição inequívoca".
Por isso, muitos pesquisadores falamblaze podpah"feminismos", como feminismo marxista, feminismo negro, feminismo radical, feminismo pós-moderno (ou interssecional) e feminismo queer (expressão da língua inglesa que significa estranho, excêntrico, e era usada pejorativamente para se referir a homossexuais, mas foi reivindicada por movimentos LGBTI, passando a designar comportamentos que não se encaixamblaze podpahpadrões normativosblaze podpahgênero).
Ainda assim, mais uma vez, diversos especialistas tentam reunir ou explicar o que grande parte das feministas defendemblaze podpahcomum.
De acordo com o Dicionário Routledgeblaze podpahPolítica,blaze podpahforma simplificada, o movimento feminista busca direitos sociais e políticos para as mulheres equivalentes aos dos homens. E, apesar das divergências entre os diversos grupos feministas, o principal pressuposto compartilhado por todos os braços do movimento é que fazemos parteblaze podpah"uma tradição históricablaze podpahexploração masculina das mulheres, originada inicialmente das diferenças sexuais que levaram a uma divisão do trabalho, como, por exemplo, a criação dos filhos".
Hoje, segundo esse dicionário, as políticas defendidas por feministas variam bastante, incluindo igualdadeblaze podpahoportunidades, fim da discriminação sexualblaze podpahcontratações e salários, creches gratuitas para retirar as desvantagens das mulheres no mercadoblaze podpahtrabalho e ações afirmativas contra a desigualdadeblaze podpahgêneroblaze podpahvagasblaze podpahemprego, candidaturas políticas e cargosblaze podpahchefia.
No Dicionário do Pensamento Político, o filósofo conservador britânico Roger Scruton identifica três reivindicações frequentes entre feministas modernas, que também carregam bastante divergências entre si.
Primeiro, a reivindicaçãoblaze podpahque as diferenças biológicas entre mulheres e homens não são suficientes para explicar as diferenças atuaisblaze podpahseus comportamentos, papeis e status. Ou seja, essa disparidade é uma criação social baseada no poder que deve ser removida.
Segundo, a ideiablaze podpahque as diferenças naturais entre homens e mulheres (como atributos físicos) não podem servirblaze podpahbase para a desvalorizaçãoblaze podpahatributos femininos e valorização dos masculinos.
Terceiro, a ideiablaze podpahque "as mulheres não devem ser incentivadas a pensar que ser completas só é possível numa relação com os homens. Mais especificamente, as mulheres devem pararblaze podpahpensar suas identidades a partir da aparência aos olhos e mentes dos homens".
Ondas do feminismo: do século 19 até hoje
Costuma-se dizer que o feminismo teve pelo menos três ondas,blaze podpahgeral ligadas a fasesblaze podpahgrande mobilização do movimento feminista branco europeu ou americano. Mas a própria ideiablaze podpahondas é criticada por parte do movimento, por, entre outros pontos, ser reducionista ao sugerir uma suposta unidade nas reivindicações ou sugerir implicitamente que há períodosblaze podpah"calmaria" entre uma onda e outra.
No livro Ideologias Políticas: Uma Introdução, o professor e cientista político britânico Rick Wilford (Queen's University) explica que onda é uma metáfora usada para indicar períodosblaze podpahque uma maréblaze podpahnovas ideias feministas surgia para transformar a paisagem política.
A primeira onda se deu do fim do século 19 até as primeiras décadas do século 20, tendo como principal bandeira o direitoblaze podpahvotar e ser votada para as mulheres ao redor do mundo (essa vitória sufragista se daria no Brasilblaze podpah1932, por exemplo).
Apontava-se à época também como o sistema econômico vigente "se beneficiava do trabalho gratuito das mulheres nos núcleos familiares e da diferença salarial entre os sexos para gerar e ampliar lucros", explica a filósofa e pesquisadora brasileira Ilze Zirbel (UFSC),blaze podpahartigo sobre o tema.
Segundo ela, é comum afirmar que as protagonistas da primeira onda eram mulheresblaze podpahclasse média, mas "a maioria das manifestantes presentes nas grandes manifestações que deram visibilidade a essa onda era da classe trabalhadora, lutando contra as péssimas condiçõesblaze podpahvida e trabalho a que estavam submetidas".
Vale lembrar que a primeira greve geral do Brasil foi iniciadablaze podpah1917 por mulheresblaze podpahuma fábrica têxtil paulistana. Além disso, o chamado Dia Internacional da Mulher (8blaze podpahmarço) teve origemblaze podpahreivindicaçõesblaze podpahoperárias ao redor do mundo no início do século 20.
A segunda onda ganha força nos anos 1960, com um movimentoblaze podpahlibertação feminina e ligado à ideiablaze podpahsororidade (uniãoblaze podpahmulheres com o mesmo fim, segundo o Dicionário Priberam da Língua Portuguesa), tendoblaze podpahvista a discriminação desigual que atinge mulheresblaze podpahdiferentes classes e etnias.
Em seu livro A Mística Feminina, um dos principais da segunda onda, a escritora e ativista americana Betty Friedan exorta as mulheres, entre outros objetivos, a se qualificarem, voltarem ao mercadoblaze podpahtrabalho e tomarem as rédeasblaze podpahseus direitos reprodutivos (graças ao surgimento da pílula anticoncepcional), se livrando assim das amarras da vida doméstica.
Por outro lado, durante a segunda onda, diversas pensadoras feministas (como Angela Davis e Lélia Gonzalez) ganharam proeminência questionando justamente ideias baseadas no pontoblaze podpahvista das mulheres brancas e mais ricas. Um exemplo: muitas mulheres negras no Brasil, além das atribuições domésticas e maternas, já estavam inseridas no mercadoblaze podpahtrabalho há décadasblaze podpahpostos como comerciante informal e empregada doméstica (geralmente sob condições bastante precárias).
E o que significa "libertação"? E como essa palavra se diferenciablaze podpah"emancipação"?
No Dicionárioblaze podpahPolítica organizado por Norberto Bobbio e outros, a cientista política e professora italiana Ginevra Conti Odorisio (Universidade Roma Tre) ressalta que "emancipação", simbolizada pela luta do direito ao voto, consistia na "exigência da igualdade (jurídica, política e econômica) com o homem, mas mantinha-se na esfera dos valores masculinos, implicitamente reconhecidos e aceitos". A libertação, no entanto, prescinde "da 'igualdade' para afirmar a 'diferença' da mulher, entendida não como desigualdade ou complementaridade, mas como assunção histórica da própria alteridade e buscablaze podpahvalores novos para uma completa transformação da sociedade".
A ideiablaze podpahuma terceira onda surgiu por volta dos anos 1990, épocablaze podpahque a mídia, segundo Ilze Zirbel, divulgava que as jovens seriam "pós-feministas", porque entendia-se que o feminismo havia garantido diversas conquistas (como acesso a educação e emprego) e, portanto, havia perdidoblaze podpahrazãoblaze podpahexistir. Algo que, obviamente, não é uma realidade para todas as mulheres.
E pelo que elas lutavam? "Para aquelas a quem o acesso à educação, ao saneamento, ao aborto seguro, ao divórcio, à mobilidade básica estavam garantidos por lei, foi possível focar mais intensamenteblaze podpahoutras questões. Para as que não viviam esse tipoblaze podpahrealidade, foi necessário seguir lutado por direitos mínimosblaze podpahcidadania. Outras pautas seguiram sendo comuns à maioria: a luta contra a exploração, a violência física e psicológica, o feminicídio, a discriminação no trabalho, as jornadas duplas ou triplas, os privilégios masculinos."
Além disso, explica a pesquisadora, as descrições sobre a terceira onda costumam ressaltar disputas e debates internos, sugerindoblaze podpahforma equivocada que as fases anteriores tiveram unidadeblaze podpahdemandas eblaze podpahidentidade (o que é ser mulher). "Feministas latinas, negras, revolucionárias, proletárias, lésbicas, pró-sexo, antipornografia (dentre outras) fomentaram o debate feminista por todo o século 20, evidenciando a grande diversidade do feminismo (de indivíduos, grupos, pautas, estratégias)."
Em mapeamento das mais diversas categorias ou vertentes do feminismo, a antropóloga e professora brasileira Fabiana Martinez (UFG) explica que geralmente o movimento traça a trajetória dos femininos a partirblaze podpah"uma preocupação com igualdade e semelhança nos anos 1970, passando por diferença e diversidade nos anos 1980 e indoblaze podpahdireção à fragmentação dos anos 1990".
Hoje, conta a pesquisadora, essa fragmentação é potencializada pela internet, mais especificamente nas redes sociais, onde experiências são compartilhadas a pontoblaze podpahganharem um caráter coletivo.
Segundo ela, o ciberfeminismo impulsionou diversas campanhas no Brasil a partirblaze podpah2015, numa espécieblaze podpah"Primavera Feminista" mobilizadasblaze podpahredes sociais, hashtags, ruas e passeatas. Esses atos problematizam questões como "o machismo, a violência contra mulheres, o assédio sexual, o estupro, a pedofilia, a segurança das mulheresblaze podpahvias públicas, o racismo e as leis sobre o aborto e o feminicídio".
Em umblaze podpahseus estudos sobre o tema, a pesquisadora analisa as principais vertentes feministas citadas nesses ambientes digitais: feminismo negro, feminismo interseccional (ou pós-moderno), feminismo radical, feminismo liberal/libertário, transfeminismo, feminismo marxista/socialista/materialista e feminismo queer/LGBT.
Influenciado por feministas como a escritora francesa Simoneblaze podpahBeauvoir, o feminismo marxista, por exemplo, "entende que a causa da subordinação feminina está na organização da economia e no mundo do trabalho", explica Martinez. Isso inclui, entre outros elementos, o papel feminino na esfera doméstica como reprodutora da família e a desigualdadeblaze podpahclasse entre mulheres (patroas e empregadas).
O feminismo radical (conhecido também como radfem), por outro lado, é influenciado por ativistas como as escritoras canadense Shulamith Firestone e americana Andrea Dworkin, além da própria Beauvoir. Uma das que mais crescem na internet, essa corrente defende que "a raiz da dominação masculina estaria no patriarcado, nos papéis sociais intrínsecos ao sistemablaze podpahgênero" e faz críticas a "estruturas que consideram reforçar o gênero e seus efeitos como a maternidade, a feminilidade, a pornografia e a prostituição", explica Martinez.
Há também o feminismo queer ou LGBT. Entre 1988 e 1993, a filósofa e escritora americana Judith Butler publicou trabalhos considerados hoje baseblaze podpaháreasblaze podpahestudos conhecidas como teoria queer eblaze podpahgênero, segundo as quais há uma diferença entre o sexo biológico e as identidades masculina e feminina que, alémblaze podpahserem formadas por aspectos físicos, seriam também construções sociais por receberem influências históricas e sociais.
Para ela, na sociedade contemporânea, as pessoas têm seu gênero designado ao nascerblaze podpahacordo com seu sexo biológico e que isso determina a forma como são tratadas na sociedade ao longo da vida. "Claro que há aspectos nossos que são sólidos, mas também é verdade que, dependendo da forma como somos criados, da culturablaze podpahque vivemos, diferentes possibilidadesblaze podpahdesejo emergemblaze podpahnós. Ser humano é viver na interseção entre biologia e cultura", disse ela à BBC News Brasilblaze podpah2017.
"Muitos não querem flexibilizar as categoriasblaze podpahgênero, mas, para outros, é uma questãoblaze podpahvida ou morte", afirmou Butler. "Assim, mulheres percebem que podem fazer mais, homens podem se expressar mais, o amor gay e lésbico torna-se legítimo, as pessoas queer se veem como parte do mundo. O gênero abre para elas a possibilidadeblaze podpahrespirar, viver, pertencer. É um espaçoblaze podpahcompaixão para a luta que enfrentam."
As mulheres que rejeitam o rótuloblaze podpahfeminista e as críticas das mulheres negras
"Alguém que lute por igualdade das minoriasblaze podpahum modo geral — e, consequentemente, da mulher — não tem como não ser feminista", disse a senadora Simone Tebet (MDB-MS), hoje candidata à Presidência,blaze podpahentrevista à BBC News Brasilblaze podpah2021. "(Mas) tenho dificuldadeblaze podpahfalar que eu sou feminista."
E por quê essa dificuldade? "É um termo que agora você não consegue mais nem definir, é uma coisa que nós vamos ter que voltar a discutir: o que é o feminismo? O que é ser feminista no Brasil, que também não se iguala a ser feministablaze podpahoutros países? (...) Eu tô dizendo que,blaze podpahmodo geral, como tudo no Brasil também, está polarizado e há certo radicalismo. Às vezes, não me enxergam como feminista, ou, às vezes, eu tenho dificuldade, também,blaze podpahdizer que sou, embora seja, porque há uma pauta ou outrablaze podpahque pode ser que eu não me enquadre nesse perfil", disse a candidata.
Para Tebet, o importante nessa discussões são atitudes, e não rótulos. "Sou uma pessoablaze podpahcentro e tenho horror a essa polarização. Uma pessoablaze podpahcentro como eu tem dificuldade atéblaze podpahse adjetivar: sou feminista ou não sou feminista? Não importa. Não adianta você ser rotulada e não seguir a cartilha, né? Então, o que importa são seus gestos eblaze podpahhistória."
Um estudo com 27 mil pessoas nos EUAblaze podpah2016 mostrou que dois terços dos entrevistados acreditavam que a igualdadeblaze podpahgênero é importante, um aumentoblaze podpahrelação a 1977, quando pesquisas similares apontavam que um quarto dos entrevistados pensava assim.
Em uma pesquisa feita no Reino Unidoblaze podpah2018, 8% das pessoas disseram concordar com papéisblaze podpahgênero tradicionais — que o homem deve trabalhar e que as mulheres devem cuidar da casa. O índice erablaze podpah43%blaze podpah1984.
Se muitas pessoas acreditam que a igualdadeblaze podpahgênero é importante, e ainda não foi atingida, porque não há tantas pessoas — especialmente jovens mulheres — se identificando como feministas?
Pode ser que elas não se sintam representadas pelo termo, afirmam especialistas. Segundo pesquisas, mulheresblaze podpahbaixa renda tendem a se identificar menos com a palavra "feminismo". Isso não significa, porém, que elas não defendem bandeiras feministas.
Cercablaze podpah1blaze podpahcada 3 pessoas entre as classes mais altas se consideram feministas,blaze podpahacordo com uma pesquisa feita na Grã-Bretanhablaze podpah2018. Em comparação, nas classes mais baixas 1blaze podpahcada cinco pessoas se identificam com esse termo.
Mas, por outro lado, pessoasblaze podpahbaixa renda são tão propensas a apoiar direitos iguais para homens e mulheres quanto pessoasblaze podpahclasses mais altas. Em todas as faixas socioeconômicas,blaze podpahcada 10 pessoas, 8 concordam que homens e mulheres devem ter os mesmos direitos,blaze podpahacordo com uma pesquisa britânicablaze podpah2015.
A questão racial também parece afetar a maneira como a palavra "feminista" é vista. Pesquisas com jovens dos EUA mostram que cercablaze podpah12% das mulheres latinas se identificam como feministas, mas que o índice sobe para mulheres negras (21% se consideram feministas), asiáticas (23%) e brancas (26%).
Quase 75%blaze podpahtodas as mulheres disseram que o movimento feminista fez "muito" ou "algo" para melhorar a vida das mulheres brancas. Mas o índice cai para 60% quando a pergunta é se o feminismo conquistou muito para mulheresblaze podpahtodas as etnias. Entre as mulheres negras, só 46% acham que o feminismo melhorou a vidablaze podpahmulheresblaze podpahtodas as etnias.
Em artigo sobre o tema, a filósofa e professora brasileira Halina Leal (Universidade Regionalblaze podpahBlumenau) explica que grande parte das feministas negras apontam que tanto o movimento feminista quanto o movimento negro "falharam e ainda falham ao negligenciar as peculiaridades das necessidades das mulheres negras".
Como no momentoblaze podpahque somente os homens negros obtiveram direito ao voto nos Estados Unidos ou quando feministas brancas trataram apenas as necessidadesblaze podpahmulheres brancasblaze podpahclasse média e alta fosse comuns a mulheresblaze podpahtodas as raças, etnias e classes sociais.
"Quando falamos do mito da fragilidade feminina, que justificou historicamente a proteção paternalista dos homens sobre as mulheres,blaze podpahque mulheres estamos falando? Nós, mulheres negras, fazemos parteblaze podpahum contingenteblaze podpahmulheres, provavelmente majoritário, que nunca reconheceramblaze podpahsi mesmas esse mito, porque nunca fomos tratadas como frágeis. Fazemos parteblaze podpahum contingenteblaze podpahmulheres que trabalharam durante séculos como escravas nas lavouras ou nas ruas, como vendedoras, quituteiras, prostitutas", afirma a escritora e filósofa Sueli Carneiro no artigo "Enegrecer o Feminismo: A Situação da Mulher Negra na América Latina a partirblaze podpahuma perspectivablaze podpahgênero".
Essa diferença já havia sido levantada um século antes, mais especificamente no discurso "Eu não sou mulher?" proferidoblaze podpah1851 por Sojourner Truth, abolicionista americana, ex-escravizada e ativista dos direitos das mulheres negras.
"Aquele homem ali diz que é preciso ajudar as mulheres a subir numa carruagem, é preciso carregá-las quando atravessam um lamaçal, e elas devem ocupar sempre os melhores lugares. Nunca ninguém me ajuda a subir numa carruagem, a passar por cima da lama ou me cede o melhor lugar! E não sou eu uma mulher? Olhem para mim! Olhem para meu braço! Eu capinei, eu plantei, juntei palha nos celeiros, e homem nenhum conseguiu me superar! E não sou eu uma mulher? Consegui trabalhar e comer tanto quanto um homem — quando tinha o que comer — e aguentei as chicotadas! Não sou eu uma mulher?", afirmou Truth.
"Ser negra e mulher no Brasil, repetimos, é ser objetoblaze podpahtripla discriminação, uma vez que os estereótipos gerados pelo racismo e pelo sexismo a colocam no mais baixo nívelblaze podpahopressão", diz a filósofa, professora e ativista brasileira Lélia Gonzalez.
Ou seja, "as experiências das mulheres negras não se inserem nem no ser mulher nem no ser negro", resume Leal.
Por isso, Carneiro explica que enegrecer o movimento feminista brasileira significa, entre diversos outros pontos, tratarblaze podpahviolência racial contra mulheres negras, formular políticas públicas também para doenças que atingem mais a população negra e contestar "mecanismosblaze podpahseleção no mercadoblaze podpahtrabalho como a 'boa aparência', que mantém as desigualdades e os privilégios entre as mulheres brancas e negras".
Mulheres no centro das eleições no Brasil
Em 2002, as mulheres passaram a ser maioria no eleitorado do Brasil, e hoje, duas décadas depois, representam 53% do total — são 78 milhõesblaze podpaheleitoras, ante 69,5 milhõesblaze podpaheleitores. Mas ainda estão longe da representação equivalente no Congresso. Elas somam 15% das cadeiras, metade da média latino-americana.
Em 2018, houve uma transformação nesse campo: foi a primeira eleição presidencial desde a redemocratizaçãoblaze podpahque houve uma diferença entre o voto masculino e o feminino para um candidato competitivo à Presidência: Jair Bolsonaro (então-PSL, hoje PL).
De 1989 a 2014, homens e mulheres sempre votaramblaze podpahforma equivalente nos principais candidatos presidenciais, mesmo nas eleições com candidatas com chanceblaze podpahvitória ou eleitas, como Marina Silva (Rede) e Dilma Rousseff (PT).
Só que na última eleição surgiu uma disparidadeblaze podpahgênero. Segundo análise do cientista político e especialistablaze podpaheleições Jairo Nicolau,blaze podpahseu livro O Brasil Dobrou à Direita, 64 homens a cada 100 votaramblaze podpahBolsonaro. Já apenas 53blaze podpahcada 100 mulheres fizeram o mesmo.
Para a pesquisadora Cecilia Machado, da FGV,blaze podpahartigo sobre o tema, a principal hipótese é que esquerda e direita no Brasil não tinham "posições marcadamente antagônicas com relação ao papel das mulheres na sociedade", como ocorre nos EUA desde os anos 1980, quando o Partido Republicano passou a adotar uma postura antiaborto, por exemplo.
Masblaze podpah2018, Bolsonaro "iniciou no país uma discussão francamente aberta sobre como ele vê o papel da mulher na sociedade", afirma Machado, e se tornou assim o "grande responsável pela disparidadeblaze podpahgênero nas intençõesblaze podpahvoto que surgiu no Brasil".
Nicolau aponta outras hipóteses para o apoio desproporcional entre homens e mulheres, entre eles o histórico políticoblaze podpahBolsonaro (ligado às demandasblaze podpahmilitares, uma categoria majoritariamente masculina) e as bandeiras defendidas por ele (como armamento da população) que têm mais acolhida entre o eleitorado masculino.
O presidente refutou os dados que apontam uma maior rejeição feminina ablaze podpahcandidatura. "Segundo pesquisa, as mulheres não votamblaze podpahmim, a maioria vota na esquerda. Agora, não sei, pesquisa a gente não acredita, se há reação por parte das mulheres, faz uma visitinhablaze podpahPacaraima, Boa Vista, nos abrigos, e vê como é que estão as mulheres fugindo do paraíso socialista defendido pelo PT", disse Bolsonaro,blaze podpahreferência a imigrantes oriundos da Venezuela.
A eleiçãoblaze podpah2018 teve outro fato inédito ligado às mulheres: foi a primeira disputablaze podpahque pessoas saíramblaze podpahmassa às ruas não para apoiar um candidato presidencial preferido, mas para protestar contra outra. No caso, o movimento #EleNão impulsionado por mulheresblaze podpahesquerdablaze podpahredes sociais que resultoublaze podpahdezenasblaze podpahmanifestações ao redor do país contrárias a Bolsonaro.
Mas logo após os protestos o candidato cresceu nas pesquisas eleitorais. Nicolau explica que os dados disponíveis não permitem saber com certeza o impacto positivo ou negativo no resultado eleitoral desses protestos, mas o pesquisador estima que "os efeitos devem ter sido mais para reforçar a identidade e os valores dos eleitores que já haviam feito suas escolhas (contra ou a favorblaze podpahBolsonaro) do que para influenciar maciçamente a definição eleitoral fora do círculoblaze podpahpessoas mais ativas na política".
Nicolau lembra como as pesquisasblaze podpahintençãoblaze podpahvoto indicavam ao longo da campanhablaze podpah2018 um apoio reduzido a Bolsonaro no eleitorado feminino, mas essa situação perdeu força a poucos dias da votação. Ele aponta algumas hipóteses. Uma delas é que historicamente o volumeblaze podpahindecisos é bem maior no eleitorado feminino nos dias que antecedem o pleito. "Outro fator a ser considerado é o efeito da mobilização pró-Bolsonaroblaze podpahalgumas lideranças evangélicas, segmento religioso majoritariamente composto por mulheres."
Um estudo liderado pela antropóloga e professora brasileira Isabela Kalil (Fespsp) afirma que as análises sobre a subida eleitoralblaze podpahBolsonaro depois dos protestos do "Ele Não" devem levarblaze podpahconta tanto "traços fortesblaze podpahantifeminismo no eleitorado feminino" quanto fatores como "mudanças nas estratégiasblaze podpahcampanha do candidato, a declaraçãoblaze podpahintençãoblaze podpahvotoblaze podpahlíderes religiosos, açõesblaze podpahpropaganda por parteblaze podpahseus apoiadores eblaze podpahalta hospitalar (depois do atentado)".
Segundo esse estudo, Bolsonaro conseguiu atrair diferentes gruposblaze podpaheleitoras, entre elas aquelas que enxergavam a educação como um grande campoblaze podpahbatalha contra "doutrinações" da esquerda e aquelas que se veem como mulheres bem-sucedidas que atingiram seus objetivos por méritos próprios, sem precisarblaze podpahajudablaze podpahfeministas e sem abrir mão da feminilidade.
Uma das principais críticas feitas ao feminismo éblaze podpahque parteblaze podpahsuas lutas atuais não atendem às demandas das "mulheres comuns".
Muitas pensadoras feministas, no entanto, argumentam que o feminismo pretende justamente que todas as mulheres tenham a liberdade e a oportunidadeblaze podpahfazer suas escolhas sobre suas vidas, seja trabalhar dentroblaze podpahcasa ou fora dela, por exemplo.
O neologismo empoderamento, inclusive, é usado como símbolo dessa meta,blaze podpahempoderar,blaze podpahgarantir a possibilidadeblaze podpahescolha.
Segundo a economista e professorablaze podpahorigem indiana Naila Kabeer (London School of Economics), ele é "o processo através do qual aqueles/as a quem era negada a capacidadeblaze podpahfazer escolhas estratégicas parablaze podpahvida adquirem tal capacidade", explica a antropóloga e professora brasileira Cecília Sardenberg (UFBA)blaze podpahartigo com um panorama do conceito.
Nesse sentido, poder é a capacidadeblaze podpahfazer escolhas (eblaze podpahter alternativas).
E isso passa, segundo a ativista e escritora indiana Srilatha Batliwala, também citada por Sardenberg, por construirblaze podpahprópria autonomia ao se ter controle sobre recursos materiais, intelectuais e ideológicos. "Recursos, que têm estado,blaze podpahgrande parte, sob o controle masculino." Ainda que seja um percurso individual, Sardenberg ressalta que essas mudanças "não acontecem sem ações coletivas" e conscientização.
*Com informações adicionaisblaze podpahRafael Barifouse, da BBC News Brasilblaze podpahSão Paulo
- Este texto foi publicadoblaze podpahhttp://vesser.net/geral-62551293
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