Como imunizantes contra covid-19 podem alavancar vacinas que combatem câncer:cupom pixbet

Ilustração mostra hélices do DNA dentrocupom pixbettubos

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, Vacinas personalizadas contra câncer partem da amostracupom pixbetsangue ecupom pixbettumores dos pacientes, dos quais se faz uma análise genética

"Construímos uma tecnologia que nos permitiu trazer uma vacina dentrocupom pixbetalgumas semanas, e quando a pandemia estourou, percebemos que essa tecnologia também poderia usada para trazer uma potente vacina contra a covid, no menor tempo possível" relatou o diretor executivo da BioNTech, Uğur Şahin, no congresso anual da Sociedade para Imunoterapiacupom pixbetCâncer dos EUA (SITC).

Uğur Şahin sorri timidamentecupom pixbetfrente a fundo preto,cupom pixbetfotocupom pixbetestúdio
Legenda da foto, 'Construímos uma tecnologia que nos permitiu trazer uma vacina dentrocupom pixbetalgumas semanas', comemorou Uğur Şahin, diretor executivo da BioNTech

"O processo para fazer uma vacinacupom pixbetmRNA personalizada contra câncer, versus o processocupom pixbetfazer uma vacinacupom pixbetmRNA contra o SARS-CoV-2, é exatamente o mesmo. Isso significa que a tecnologia desenvolvida para tratarcupom pixbetum único paciente é a mesma adaptada para vacinas contra a covid-19 para grandes populações."

Depois da corrida inesperada provocada pela covid-19, especialistas na tecnologiacupom pixbetRNA avaliam que as conquistas científicas durante a pandemia poderão impulsionar também tratamentos contra o câncer atravéscupom pixbetvacinas.

Vacina contra o câncer — como assim?

Imunizantes como da BioNTech e da Moderna, baseadoscupom pixbetRNA, são um tipocupom pixbetvacina gênica. Esta categoria é mais moderna do que vacinas tradicionais com vírus inativado, que vêm sendo usadas há décadas para proteger contra contra hepatite A, poliomielite — e também teve uma contra a própria covid-19, como a CoronaVac.

Ao falarcupom pixbetgenética, que é a área das vacinas gênicas, surgem letrinhas que são bastante conhecidas: o DNA e o RNA. O DNA é composto por uma fita duplacupom pixbetcódigos, formando uma hélice; e o RNA, por uma fita simples que levará à produçãocupom pixbetproteínas a partir do código genético do DNA.

Uma boa analogia apresentada pelo repórter Tim Smedleycupom pixbetuma matéria recente da BBC Future é: se o DNA fosse um cartãocupom pixbetbanco, o RNA seria como o leitor desse cartão.

Há vacinascupom pixbetDNAcupom pixbetestudo, mas vamos falar aqui dascupom pixbetRNA, que estão unindo tecnologias que podem servir da covid-19 ao câncer.

Enquanto vacinas tradicionais entregam ao corpo um pedacinho inofensivo do vírus, incapazcupom pixbetprovocar doença ou deixar o patógeno se reproduzir, ascupom pixbetRNA consistemcupom pixbetum código genético criadocupom pixbetlaboratório que levará à produçãocupom pixbetproteínas simulando as do vírus, provocando então uma resposta do sistemacupom pixbetdefesa. Por transmitir essas instruções, o nome completo dessa tecnologia é RNA mensageiro (mRNA).

As vacinascupom pixbetRNA contra a covid-19 orientam as células humanas a produzirem cópias da proteína spike encontrada na superfície do coronavírus. Essa produção é incapazcupom pixbetprovocar uma infecçãocupom pixbetverdade.

Como disse o próprio diretor da BioNTech, Uğur Şahin, no congresso da SITC, as etapascupom pixbetproduçãocupom pixbetuma vacinacupom pixbetRNA contra a covid-19 são bem parecidas com aquelas contra o câncer.

Ampolas com rótulos das vacinas da Pfizer/BioNTech e da Moderna

Crédito, Reuters

Legenda da foto, A BioNTech e Moderna usaram tecnologias que vinham desenvolvendo contra o câncer para produzir vacinascupom pixbetRNA contra a covid-19

A BioNTech e a Moderna têm trabalhado com a proposta das vacinas personalizadas contra o câncer.

Nelas,cupom pixbetvezcupom pixbetcientistas coletarem o material genéticocupom pixbetum vírus, eles extraem amostras do sangue, tecidos ou mesmo do tumorcupom pixbetum paciente; identificam mutações e outras informações genéticas; ecupom pixbetseguida produzem proteínas simulando a composiçãocupom pixbetcélulas malignas. O objetivo, novamente, é levar a uma resposta imune do corpo.

Mas diferente das vacinas contra a covid-19, destinadas a milhõescupom pixbetpessoas ao redor do mundo como estratégiacupom pixbetprevenção, os tratamentos personalizados propostos contra o câncer serviriam para pessoas já diagnosticadas com a doença — e seriam no geral customizados individualmente, com a análise do DNAcupom pixbetcada paciente e identificaçãocupom pixbetmutações e outras características das células cancerosas.

Sediada na Alemanha, a BioNTech tem atualmente dois produtos na fase 2cupom pixbetensaios clínicos (testes com humanos, que costumam ter três fases) que consistemcupom pixbetvacinas para câncer: iNeST e FixVac.

A iNeST tem uma proposta altamente individualizada e linhascupom pixbetestudo na fase 2 contra um tipocupom pixbetcâncercupom pixbetpele melanoma e o câncer colorretal,cupom pixbetparceria com a empresa Genentech. Já a vacina FixVac serviria para gruposcupom pixbetpacientes com tipos parecidoscupom pixbetcâncer e tem na fase 2 suas linhas para tratamentocupom pixbetmelanoma avançado e câncerescupom pixbetcabeça e pescoço induzidos pelo vírus HPV (papilomavírus humano).

A Moderna não tem as letras "rna" no seu nome por acaso — a empresa fundada nos EUA tem esta tecnologia como foco, e tratamentos experimentais contra o câncer são um dos investimentos da empresa. Atualmente, ela tem a Vacina Personalizada contra Câncer (PCV, ou mRNA-4157) na fase 2cupom pixbetensaios clínicos, e a vacina KRAS na fase 1. Ambas têm participação da farmacêutica Merck.

A PCV propõe-se a tratar vários tiposcupom pixbetcâncer, mas a fase 2 dos ensaios clínicos está trabalhando especificamente com pacientes com melanoma. Já a vacina KRAS mira cânceres que têm mutações frequentes no gene KRAS, sobretudo oscupom pixbetpâncreas, pulmão e colorretal.

Também no congresso da SITC, o diretor clínico da Moderna, Robert Meehan, afirmou que os testes com a vacina personalizada mRNA-4157 acabaram ajudando para que a empresa pudesse rapidamente desenvolvercupom pixbetvacina contra a covid-19 (mRNA-1273).

"A mRNA-4157 ajudou a preparar o terreno — com prazocupom pixbet6 a 8 semanas desde a coletacupom pixbetamostras do tumor ou do sangue até a entrega das vacinas para pacientes com câncer — para a entrega do primeiro lotecupom pixbetmRNA-1273 ocorrercupom pixbet25 dias, do sequenciamento ao término da produção", comemorou Meehan.

"A mRNA-1273 foi (resultado de) um acúmulocupom pixbet10 anoscupom pixbetpesquisas básicas e clínicas na Moderna."

A empresa americana está testando também vacinascupom pixbetRNA contra os vírus da gripe, HIV e zika, alémcupom pixbetdoenças autoimunes e outras condiçõescupom pixbetsaúde. A BioNTech também está na fasecupom pixbetestudos pré-clínicos (ainda sem humanos) com vacinascupom pixbetRNA contra o HIV, tuberculose e malária, entre outros.

A reportagem tentou entrevistas com representantes dessas empresas, mas não obteve resposta.

Pesquisa no Brasil contra o HPV

A cientista Jamile Ramos da Silva, doutoracupom pixbetciências pela Universidadecupom pixbetSão Paulo (USP), explica que o estudocupom pixbetvacinascupom pixbetRNA começou a tomar corpo nos anos 1990.

"Só que por muito tempo, essas vacinas se mostravam altamente frágeis: se você simplesmente inocular esse RNA, ele pode ser entendido pelo corpo humano como infecção e ser destruído (antescupom pixbetele produzir o efeito desejado). O nosso corpo não era preparado pra enxergar isso como vacina, e as tecnologias foram aprimoradas ao longo do tempo", conta a pesquisadora, que defendeucupom pixbettesecupom pixbetdoutorado no iníciocupom pixbetdezembro, explorando três tiposcupom pixbetvacinas baseadascupom pixbetRNA para tratamentocupom pixbettumores induzidos pelo HPV.

Para impedir a destruição imediata do RNA, uma solução que passou a ser estudada foi envolver este material genéticocupom pixbetuma capacupom pixbetgordura, as chamadas nanopartículas lipídicas. Em 2005, foi publicado um artigo científico demonstrando que essas nanopartículas poderiam ser produzidascupom pixbetescala; ecupom pixbet2018, o FDA (a agência eguladoracupom pixbetmedicamentos dos EUA) aprovou pela primeira vez um medicamento que envolve a entrega do RNA encapsulado por uma nanopartícula lipídica.

"Essa capacupom pixbetgordura é muito semelhante à composição da membrana plasmática das nossas células. Isso permite que, no corpo humano, elas não sejam tóxicas, não gerem reação."

A solução reanimou o desenvolvimentocupom pixbetvacinascupom pixbetRNA para infecções virais, câncer, entre outras doenças.

Jamile da Silva é pesquisadora colaboradora da ImunoTera, uma empresacupom pixbetbiotecnologia fundada por pesquisadoras que estudavam juntas no Institutocupom pixbetCiências Biomédicas da USP e tiveram incentivos da universidade para empreender. Por isso, a ImunoTera é chamadacupom pixbetuma spin-off da USP, ou seja, uma empresa derivada das pesquisas realizadas na universidade.

A ImunoTera, sediadacupom pixbetSão Paulo, está se preparando para realizar nos próximos anos ensaios clínicos com candidatas a vacinas terapêuticas contra o câncer, incluindo ascupom pixbetRNA. A empresa explora também tratamentos contra doenças infecciosas.

Luana Moraes, Jamile Ramos da Silva e Bruna Porchia posam para foto abraçadas e sorrindocupom pixbetlaboratório

Crédito, Arquivo pessoal

Legenda da foto, Luana Moraes, Jamile Ramos da Silva e Bruna Porchia estão estudando aplicações da tecnologiacupom pixbetRNA na ImunoTera, empresa nascida na USP

A tecnologia patenteada pela ImunoTera junta uma proteína ativadora ao chamado antígeno viral — ou seja, uma proteína correspondente ao vírus que se quer combater. Emcupom pixbetpesquisacupom pixbetdoutorado, orientada pelo professor Luís Carloscupom pixbetSouza Ferreira, Jamile Ramos da Silva usou a plataforma da ImunoTera contendo um antígeno do HPV, o vírus do papiloma humano, que pode causar alguns tiposcupom pixbetcâncer.

A pesquisadora também fez um período do doutorado na Universidade da Pensilvânia, EUA, instituiçãocupom pixbetreferência nos estudos com vacinascupom pixbetRNA.

Já existe uma vacina preventiva contra o HPV, aplicada gratuitamente pelo Sistema Únicocupom pixbetSaúde (SUS) no Brasilcupom pixbetmeninascupom pixbet9 a 14 anos e meninoscupom pixbet11 a 14 anos idade, alémcupom pixbetalguns grupos específicos. Esta não é uma vacinacupom pixbetRNA, mas sim do tipo recombinante.

Já as vacinascupom pixbetRNAcupom pixbetestudo e que têm como alvo o HPV visam ajudar no tratamentocupom pixbetcânceres induzidos por este vírus. Em seu trabalhocupom pixbetdoutorado, Jamile da Silva afirma ter tido resultados "altamente promissores" nos três tiposcupom pixbetvacinacupom pixbetRNA que testoucupom pixbetcamundongos.

Fundadora e diretora científica da ImunoTera, Bruna Porchia Ribeiro ressalta que o futuro das vacinas terapêuticas provavelmente não as colocará como tratamento único contra o câncer. Elas deverão ser associadas a outras intervenções, como a quimioterapia e a radioterapia.

"Dificilmente a gente vai ter um único remédio pra tratar (câncer). A gente tem uma gama enormecupom pixbettiposcupom pixbetcâncer — cada um tem acupom pixbetpeculiaridade, acupom pixbetformacupom pixbettratamento. Associar terapias realmente é uma estratégia que vem sendo muito debatida nessa área e explorada por outros pesquisadores. Você tem a chancecupom pixbetdiminuir a quimioterapia e trazer mais qualidadecupom pixbetvida pro paciente associando à imunoterapia. Esse é o caminho para tratamentocupom pixbetcâncer para os próximos anos", diz Porchia.

Uma 'nova era da medicina'

Ilustraçãocupom pixbetcélula cancerosa rodeada por símbolocupom pixbetalvo

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, Análise genética permite identificar mutações e características das células cancerosas — e a partir disso, uma vacinacupom pixbetRNA pode ser produzida

Jamile Ramos da Silva lembra que, ao iniciar seu doutoradocupom pixbet2016, resultados positivos com vacinascupom pixbetRNA estavam começando a aparecer, mas eram incipientes. Agora, finalizado o doutorado e uma pandemiacupom pixbetcoronavírus depois, ela enxerga que a tecnologia avançou para outro patamar.

"Como na pandemia tivemos a necessidadecupom pixbetdesenvolver vacinas mais rápidas e seguras, foi uma oportunidadecupom pixbettestar issocupom pixbetensaios clínicos e mostrar que,cupom pixbetfato, essas vacinas são passíveiscupom pixbetserem utilizadascupom pixbethumanos. Porque a gente não tinha anteriormente nenhuma aprovada e licenciada. Isso abre um leque para que sejam testadas outras vacinas, não só contra a covid, mas também para imunoterapia (para câncer)", aponta a cientista.

Além da eficácia e segurança demonstradas nos ensaios clínicos e na própria imunizaçãocupom pixbetgrandes populações durante a pandemia, as vacinascupom pixbetRNA disseminaram a tecnologia e deram um lucro sem precedentes a empresas que estão explorandocupom pixbetaplicaçãocupom pixbetoutras doenças, com destaque ao câncer. Isso deverá também alavancar a área da imunoterapia.

Um relatório para investidores da BioNTech mostrou que, considerando o períodocupom pixbetjaneiro a setembro, a receita da empresa saltoucupom pixbet€136,9 milhões (R$ 872 milhões)cupom pixbet2020 para €13,4 bilhões (R$ 86 bilhões)cupom pixbet2021. Para o mesmo períodocupom pixbetnove meses, a Moderna divulgou ter tido receitacupom pixbetUS$ 232 milhõescupom pixbet2020 e,cupom pixbet2021,cupom pixbetUS$ 11,2 bilhões. Ambas companhias atribuíram estes expressivos aumentos na receita às vacinas contra a covid-19.

O oncologista Alessandro Leal destaca que, embora a pandemiacupom pixbetcoronavírus tenha deixado um "grande legado" para o desenvolvimentocupom pixbetvacinascupom pixbetRNA, a proposta para o câncer é diferente.

"Todo mundo infectado com a covid-19 tem a proteína spike (circulando no organismo), então a vacina pode ser universal. Só que nossos traços genéticos são diferentes: a gente espera que os traços genéticos dos tumores das pessoas sejam diferentes. Então é preciso fazer uma vacina específica para o sistema imunológico reconhecer as mutações, as alterações genéticas do tumorcupom pixbetuma pessoa oucupom pixbetoutra", aponta Leal, membro da Sociedade Brasileiracupom pixbetOncologia Clínica (SBOC) e consultor médico do Programacupom pixbetMedicinacupom pixbetPrecisão do Hospital Albert Einstein,cupom pixbetSão Paulo.

"É algo que acompanha uma nova era da medicina, que a gente conhece como medicina personalizada oucupom pixbetprecisão. O desenvolvimentocupom pixbetnovas tecnologiascupom pixbetsequenciamento genético tem permitido a individualização do tratamento", aponta Leal.

Entretanto, o oncologista destaca que personalização implicacupom pixbetaltos custos, o que não é trivial no lequecupom pixbettratamentos para câncer, que já são caros.

"Quando você tem esse nívelcupom pixbetindividualização, há aumentocupom pixbetcustos", diz, apontando para etapas custosas como o sequenciamento genético e a confecção,cupom pixbetlaboratório,cupom pixbetmoléculascupom pixbetRNA envoltascupom pixbetcápsulascupom pixbetgordura.

Apesar desta forte demanda financeira, Leal diz que as vacinas personalizadascupom pixbetRNA contra o câncer são "um caminho sem volta" e explica que os tumores que mais podem se beneficiar dessa terapia são aqueles que tendem a ter uma melhor resposta com imunoterapias hoje. Exemplos deles são alguns tiposcupom pixbetcâncercupom pixbetintestino,cupom pixbetmama, pulmão e melanoma.

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