'Meu pai, o genocida': as filhasbetsultorturadores na Argentina que romperam silêncio sobre 'segredo familiar':betsul
O temido Doutor K
Analía Kalinec,betsul40 anos, tem olhos claros, grandes e silenciosos. Ela se apresenta e contabetsulhistória: "Sou professora, psicóloga, mãebetsuldois filhos... e também filhabetsulum genocida.
Meu pai nasceubetsul1952, no seiobetsuluma famíliabetsulclasse média que tinha dificuldades econômicas. Ele abandonou os estudos no terceiro ano do ensino médio e decidiu entrar na Polícia Federal por voltabetsul1973, muito jovem.
Nasci na ditadura e sempre soube que meu pai era policial, não nos perguntávamos o que ele fazia ou deixavabetsulfazer. Em casa, ele era um pai muito presente, mas nunca perguntei nada a ele.
Éramos uma 'família típica', que se reunia para comer churrasco, ir ao clube da polícia e pescar... Meu pai era o pai provedor, muito querido, muito respeitado dentrobetsulcasa.
Nós éramos quatro irmãs e vivíamos na nossa bolha. Depois, fomos nos casando e tendo filhos, como esperavambetsulnós. Fui a última das quatro, casei com apenas 22 anos... imagine!
E a vida era assim. Até o anobetsul2005.
Era o último diabetsulagosto. Eu estavabetsulcasa quando recebi uma ligação. Era minha mãe. 'Olha, não entrebetsulpânico, seu pai está preso. Mas fique tranquila, ele vai sair (de lá)'.
Até essa ligação, eu nunca havia relacionado meu pai à ditadura, nembetsullonge... nembetsullonge."
betsul O comissário Eduardo Emilio Kalinec foi mantidobetsulprisão preventiva. Ele havia sido mencionado no depoimentobetsultestemunhas e denunciado por crimes graves: 181 vítimas, acusaçõesbetsulsequestro, tortura e assassinato. E tranquilizou a família dizendo que se tratavabetsuluma jogada política contra ele.
"No dia seguinte àquela ligação, visitamos meu pai na prisão. E ele nos disse que não precisávamos acreditarbetsulnada, que muitas mentiras seriam ditas, mas que ele não tinha nada a se arrepender. Que ele tinha saído para lutarbetsuluma guerra e que isso estava acontecendo agora porque 'revanchistasbetsulesquerda' chegaram ao poder (uma alusão ao governo do então presidente Néstor Kirchner).
Não entendi nada, para mim a ditadura era algo do passado. Eu estava totalmente alheia ao que estava acontecendo no país. Eu trabalhavabetsuluma escola particular, costumava encontrar minhas irmãs no fimbetsulsemana, circulávamos entre famíliasbetsulcolegas policiais do meu pai — e esse era meu círculo.
Eu não tinha acesso a muitas informações e tampouco tinha interesse. Meus pais também procuraram manter uma posturabetsulneutralidade, 'não nos metemosbetsulpolítica, somos apolíticos'.
Quando meu pai foi preso, comecei com muita dificuldade a colocar tudo dentrobetsulum contexto. Os três primeiros anos forambetsulnegação absoluta. De entender a ditadura, entender a luta das Mães e Avós (da PraçabetsulMaio) e sentir empatia com elas, masbetsuldizer que meu pai não teve nada a ver com isso. Que foi um erro, que os julgamentos estavam indo bem, mas que estavam erradosbetsulrelação a meu pai.
Até que,betsul2008, eles levaram o caso dele a julgamento. E comecei a pensar que o que meu pai estava me dizendo não era bem verdade... "
betsul Kalinec foi um dos 15 réus no primeiro julgamento do chamado Circuito ABO — sigla para os centros clandestinosbetsuldetenção Atlético, Banco e Olimpo, que operaram sucessivamente entre 1976 e 1979. Tanto os acusados quanto muitos presos foram transferidosbetsulum centro para outro.
"Eu li o processo, que até aquele momento eu não tinha lido. Li com muita velocidade e pedindo para 'que o nome dele não apareça, por favor, que o nome dele não apareça'. Não queria pular nenhuma linha para ter certezabetsulque não havia perdido nada, ebetsulrepente apareceu... Kalinec. Lembro claramente daquele momento.
Eu li os relatos das testemunhas, as descrições do que havia sido um campobetsulconcentração. Criar todo esse mapa na minha cabeça e colocar meu pai dentro dele tornou tudo inaceitável e difícil."
betsul Para os sobreviventes que testemunharam, o paibetsulAnalía era o "Doutor K". Muitos torturadores usavam um pseudônimo para esconderbetsulverdadeira identidade.
"Eu sabia que chamavam elebetsulDoutor K porque ele havia me contado, mas depois negou. Uma vez perguntei por que, e ele me disse que era chamadobetsuldoutor porque sempre foi muito correto e parecia um advogado.
Para meu marido, ele deu outra explicação, disse que era por causabetsulum produtobetsullimpeza que havia na época, a marca Doutor K: era ele quem fazia a limpeza. Terrível. E depois (eu descobri) outro fato não menos importante: ele era o doutor, e a salabetsultortura era chamadabetsulsalabetsulcirurgia.
Em seguida, procurei respostas no único lugar que podia: dentro da minha própria família. E deparei com um pai que queria justificar o injustificável e que, quando o repreendi, dizendo 'como você não fez nada, se há todos esses depoimentos no processo?', ele acabou confirmando o que eu temia.
E admitiubetsulparticipação.
Meu pai, hoje com 67 anos, fazia parte dos grupos que sequestravam e levavam as pessoas aos centrosbetsuldetenção clandestinos. Ele tinha 24 ou 25 anos na ditadura. Não dava ordens, apenas executava.
E, mesmo assim,betsulalguns trechos dos depoimentos, os sobreviventes dizem que era conhecido como alguém muito cruel dentro dos camposbetsulconcentração. Eles temiam mais alguns repressores do que outros. E meu pai era um daqueles que metiam medo."
As vozes das vítimas
Dezenasbetsultestemunhas,betsuldiferentes instâncias judiciais, apontaram Eduardo Kalinec como participantebetsulinterrogatórios e sessõesbetsultortura nos centros clandestinos.
Oito delas durante o julgamento do circuito ABO, que o levou a ser condenado à prisão perpétua. Ele foi descrito como um jovembetsulcabelos escuros, atarracado, com pescoço grosso e voz aguda.
"Muito temido" e "muito cruel" com os presos, segundo os relatos.
Ana María Careaga tinha 16 anos e estava grávidabetsultrês meses quando foi levada. O Doutor K a chutava toda vez que a via no banheiro. Em uma ocasião, ele a repreendeu aos gritos por não dizer que estava grávida. "Você quer que eu abra suas pernas e te faça abortar?"
Miguel D'Agostino o identificou como um dos três homens que o submeteram a cinco diasbetsulinterrogatório com choque elétrico na "salabetsuloperações".
Delia Barrera também foi vítimabetsultortura durante os 92 diasbetsulque ficou detidabetsulEl Atlético. Era 1977, e ela tinha 22 anos.
"Estava encapuzada, havia muitas vozes ao meu redor. Até que uma voz diz 'comecem', e começaram a me bater. Me arrastaram pelo cabelo para o que chamavambetsulsalabetsuloperações. Havia três salas, e se ouvia quando torturavam outras pessoas na sala ao lado", contou Barrera à BBC News Mundo, serviçobetsulespanhol da BBC.
"Eles me obrigaram a me despir. Me amarraram a uma camabetsulmetal, abriram minhas pernas, prenderam um cabo no polegar do meu pé esquerdo e me fizeram ouvir um barulho: 'shhhhh'. E me disseram: 'Você já conhece? Bem, agora vocês vão se conhecer'. E começaram os choques elétricos."
"Me acusarambetsulcolocar bombas no departamentobetsulpolícia, o que eu nunca fiz. Me pediram nomesbetsulcolegasbetsulmilitância. E a tortura não parava... "
Após uma sessãobetsultortura, ela conheceu Kalinec.
"Eles me bateram muito e me levaram para a enfermaria, um repressor a quem chamavambetsulDoutor K me interrogou, então pensei: 'Ah, um médico'."
"Ele disse que eu tinha quebrado as costelas, mas que não iria me enfaixar porque eu podia me enforcar com as ataduras. Consegui dar uma espiada, o capuz estava meio levantado e nunca esqueci o rostobetsulKalinec. No julgamento, estava com gel no cabelo, mas ainda tinha o bigode. Quando os juízes me perguntaram se eu reconhecia alguém, eu disse: 'Aí está o Doutor K, Kalinec'. Eu não poderia esquecer Kalinec."
betsul Delia foi libertada e viveu para contar esta história, com sequelas físicas e mentais. Traumas do choque elétrico, uma costela mal cicatrizada, repetidas tentativasbetsulsuicídio.
betsul Outros não tiveram a mesma sorte. Entre eles, seu marido Hugo Alberto Scutari. Ela não voltou a vê-lo desde que dividiram uma cela por algumas semanas no El Atlético. Hoje, ele é um dos presos políticos do regime desaparecidos: as organizaçõesbetsuldireitos humanos estimam que são cercabetsul30 mil, embora não haja um consenso sobre o número exato.
As cartas
Analía confrontou o pai com as evidências apresentadas no processo judicial.
"Depoisbetsuluma conversa na prisão, onde ele ficou muito desconfortável e nervoso, senti uma espéciebetsullibertação. Voltei para casa e escrevi Carta aberta a um repressor. Na minha família, sempre escrevíamos cartas. E usei o nome 'repressor'. Agora é completamente naturalizado, mas essa palavra precisou ser colocada... E como eu não podia dizer na cara, eu escrevi."
Aquele dia na prisão foi, sem que eu soubesse, a última vez que vi meu pai.
Não imaginava nembetsullonge a dimensão que a rebeldiabetsulme atrever a duvidar dele tomaria. Além disso, havia toda a censura da minha mãe e das minhas irmãs: 'Como você vai dizer isso a ele, justo neste momentobetsulque ele mais precisabetsulnós, temos que estar unidos, e você vem com isso!'.
Minhas irmãs, que também são policiais, sempre ficaram do lado do meu pai. Hoje, não me relaciono com elas.
Naquela época, também comecei, além das cartas, a fazer um registro narrativo pessoal pensando nos meus filhos — ebetsulcomo explicar a eles que,betsulrepente, ficaram sem avós, sem primos, sem tias.
E a coisa começou meio verborrágica, contei a eles toda a verdade. Ao pontobetsulum dia me ligarem da creche: 'Olha, precisamos marcar uma reunião, porque Gino (filho mais velho, então com 4 anos) disse aos colegasbetsulturma que o avô dele estava na prisão porque havia matado muitas pessoas'. E os colegas começaram a perguntar se ele tinha metralhadoras, se tinha tanques... A professora ficou chocada.
É um exercício constante conciliar essa imagem do Doutor K com a do pai amável. No que se refere à vidabetsulfamília, lembro dele fazendo cócegas, nos abraçando...
Em um primeiro momento, a dissociação foi mais forte. Me lembrobetsuldizer 'de um lado está meu pai, e do outro lado, o genocida'. Mas ao trabalhar isso na terapia, acabei reconhecendo que não, que é sempre a mesma pessoa, uma única pessoa com uma parte que mantém oculta, mas que faz parte dela e que não me engana mais."
betsul Kalinec foi condenado à prisão perpétuabetsuldezembrobetsul2010 por homicídio qualificado, tortura e privação ilegítimabetsulliberdade, crimes agravados por terem sido cometidos por um funcionário público. Ele nega as acusações.
betsul Dos quase 3,3 mil investigados por crimes contra a humanidade desde que os julgamentos foram reabertos,betsul2007, 962 pessoas foram condenadasbetsul238 processos, segundo o último relatório da ProcuradoriabetsulCrimes contra a Humanidade. Ainda há maisbetsul350 processosbetsultramitação.
Agente da polícia infiltrado
Mas nem todos os ex-membros das forçasbetsulsegurança chegam ao banco dos réus. O paibetsulPaula* é um deles.
"NascibetsulBuenos Airesbetsul1980, quando a ditadura estavabetsulpleno apogeu.
Desde que me dei contabetsulque o que havia acontecido na ditadura era responsabilidade do meu pai, que ele havia trabalhado para eles, esse sentimentobetsulvergonha e culpa me acompanha, como se eu fosse cúmplice. Porque eu sei tudo isso e não há nada que eu possa fazer. Guardo um segredo que não quero guardar.
Meu pai nunca foi levado à justiça. Como tenho certezabetsulque ele é culpado? Bom, porque ele me disse. Eu sei que ele fez parte da repressão, porque ele me disse. Meu pai trabalhava para os serviçosbetsulinteligência, provavelmente como espião.
Quando eu tinha 14 anos, meu pai levou meu irmão e eu para tomar um café e nos disse que era policial. Não tínhamos ideia. Ele contou que havia participado da "guerra contra a subversão", como ele chamava. E estava orgulhoso, se sentindo um herói. Naquela época, eu não entendi. Demorou um tempo, levei uns dois meses para digerir a informação.
Ele costumava se infiltrarbetsuldiferentes gruposbetsulestudantes,betsulassistentes sociais oubetsulqualquer perfil que os militares não gostassem. E 'marcava' os militantes, passando o nome deles aos seus superiores.
Ele era muito jovem, tinha 20 e poucos anos e, pelas fotos que haviabetsulcasa, não parecia um policial. Ele tinha cabelos compridos e usava camisas largas, como qualquer cara nos anos 1970. O que eu sabia é que ele era advogado.
Não socializávamos com outros policiais,betsulcasa ouvíamos música 'proibida' como (Joan Manuel) Serrat... Se você visse meu pai, não diria 'olha, um policial'. Na minha casa, nunca vimos um uniforme. Nunca.
Quando ele nos contou tudo, eu o confrontei. E disse: 'Não importa se eles fizeram algo ou não. Você não pode sequestrá-los e torturá-los! Não pode matar porque são, segundo você, subversivos! É simples, ninguém pode fazer isso, e muito menos o Estado poderia fazer'.
Eu tive essa conversa com ele muitas vezes. 'Eles eram terroristas', repetia ele. E daí? Digamos que fossem: você precisa agir dentro da lei. 'Você não entende, a ameaça comunista estava chegando', ele me repreendia. 'Não importa, pai. Não é razão para matar, torturar, estuprar e sequestrar crianças. De maneira nenhuma'.
betsul Dez anos depoisbetsuldescobrir o segredo da família, Paula cortou relações com o pai.
"Família é família... Então, eu tivebetsulcontinuar convivendo com ele, depois fiquei sem vê-lo por um tempo porque estava com muita raiva. E era assim, idas e vindas,betsulparte porque minha mãe insistia: 'É seu pai, como você não vai vê-lo?' Mas quando minha mãe morreu, me senti mais livre e decidi dar um ponto final. Cortei relações com ele. E isso foi há 15 anos.
Não havia mais volta. Ele é uma pessoa horrível, e eu não quero alguém assim na minha vida. Ele sempre repetiu para mim que havia feito o que precisava ser feito, que agiu corretamente, que os crimes foram necessários. Ah, e ele não chamavabetsulcrimes, é claro. Ele chamavabetsul'ações'.
Então, a certa altura, já não me importava mais se ele havia sido condenado ou não, eu sabia o que ele tinha feito porque ele se vangloria disso. Ele fez parte deste mecanismobetsulviolência que defende até hoje.
Eu não tenho boas lembranças,betsulqualquer maneira. Faço terapia há 15 anos e voltamos com frequência a esse tema: como é possível que não tenha nenhuma lembrança? Sei que há fotosbetsulque somos uma família feliz, mas não tenho esse registro.
Se eu tiverbetsulpensarbetsuluma recordação boa... Deixa eu pensar... Acho que tenho uma... Poderia dizer que meu pai desenhava muito bem. Uma vez, ele desenhou uma Cinderela muito linda. Ele era um bom desenhista.
De resto, me dava medo. Ele tinha uma aura assustadora, digamos. Ele sabia como botar medo. Há um tempo atrás, me encontrei com amigosbetsulinfância, estávamos lembrando daquela época e um dos meus amigos me confessou: 'Seu pai era muito assustador'. E eu pensei: 'Sim, eu também tinha medo dele'.
Não era violento, no sentidobetsulque não nos submetia à violência física. Mas era um jogo psicológico."
Histórias Desobedientes
Paula e Analía se encontraram não faz muito tempo com a ajuda das redes sociais. Elas decidiram que queriam se manifestar, sair às ruas, enfrentar a família e repudiar o que seus pais haviam feito aos olhosbetsultodos.
betsul Analía: "Começamos a ver que havia outras filhas e filhosbetsulgenocidas que viviam silenciosamentebetsulrejeição. Nos encontramos. Foi algo espontâneo dizer: 'Temos que fazer alguma coisa, isso é intolerável'. E nos perguntamos como nos apresentaríamos...
Decidimos deixar este lugarbetsulparentesbetsulgenocidas, repudiamos os crimes e abraçamos as bandeiras da memória, verdade e justiça. Decidimos nos chamarbetsulHistórias Desobedientes. Fizemos uma bandeira e saímos marchando para a praça. Na primeira vez, éramos quatro, todas mulheres, cheiasbetsulenergia e alegria..."
betsul Paula: "Quando descobri (o grupo), foi um despertar: 'Meu Deus, eu sabia que não poderia ser a única!' Sinto que as pessoas no grupo me entendem como ninguém. Imagina, eu sei quem é meu pai desde os 14 anos e nunca conversei com ninguém.
A primeira pessoa para quem eu contei foi minha psicóloga, mas depois guardei esse segredo por 23 anos até encontrar com elas (há menosbetsuldois anos). É uma loucura... tenho 39 anos e vivi 23 anosbetsulsilêncio."
betsul Analía: "Sim, sim. Temos uma necessidadebetsulexpressão muito forte. Estamos sempre fazendo manifestos, redigimos um livro coletivo, um projetobetsullei que tenta mudar a legislação argentina que hoje impede que um filho testemunhe contra os pais.
Queremos garantir que isso não se apliquebetsulcasosbetsulcrimes contra a humanidade — e possamos falar se soubermosbetsulalgo que pode contribuir com os processos judiciais."
betsul Paula: "Quando você guarda um segredo por tanto tempo, conversar ajuda a lidar com a vergonha, um sentimento que muitosbetsulnós compartilhamos no coletivo. Vergonha porque você sabe o que sabe, porque precisa se calar, porque tem medo do que as pessoas vão pensar.
É por isso que é importante 'sair do armário'. E sair coletivamente é muito mais poderoso. Porque podemos desafiar esses repressoresbetsulum lugar que ninguém pode: o lugarbetsulfilhas ou filhos. Sabemos que eles não se arrependeram, sabemos que guardam segredosbetsulum pacto inabalávelbetsulsilêncio, segundo o qual ninguém conta o que fez na ditadura."
betsul Analía: "Ainda estou esperando meu pai falar. Eu sei que ele tem informações confidenciais. Sobre os desaparecidos, talvez sobre algum bebê que foi sequestrado e entregue a famílias que apoiavam o governo militar.
Ao contráriobetsuloutros agentes da repressão que estão senis, meu pai está lúcido, tem uma memória prodigiosa. E saber o dano que continua provocando com seu silêncio cúmplice e criminoso me machuca muito."
Acabou o amor?
A presença dos "desobedientes" nas manifestações por direitos humanos nas ruasbetsulBuenos Aires ainda surpreende muita gente. Eles são um interlocutor novo — e nem todo mundo conhece o coletivo que os une.
Olham para eles com surpresa, com perplexidade. E os aplaudem quando passam, elogiambetsulcoragem.
Mas a presença deles também incomoda alguns sobreviventes e parentesbetsulvítimas — vários, na verdade, se recusaram a participar desta reportagem.
"Sou uma pessoa muito dura diantebetsulalgumas coisas. Os filhos desobedientes tiveram a oportunidadebetsuldenunciar seus pais e não fizeram. Por que não fizeram isso antes?", critica a sobrevivente Delia Barrera.
"Porque quando você fala 'meu pai é isso' e depois diz que o ama, eu escuto e penso: 'Estamos na direção errada. Você não pode amar um repressor genocida. Me diz que você não o ama, e é outra história'."
É possível deixarbetsulamar o pai que você já amou uma vez?
"Olha, eu me pergunto isso o tempo todo", admite Analía Kalinec.
"Primeiro, porque foi um relacionamentobetsulenorme afeto mútuo durante minha infância, minha adolescência e parte da minha vida adulta. Mas depois comecei a repensar tudo. Que tanto amor poderia haver ali, se quando começo a discordar dele ou a fazer perguntas, ele quer me deserdar?
Me recuso a renunciar ao pai que tanto amei. Eu sei que há uma partebetsulmim que quer conservá-lo e eu não quero ser tão cruel comigo mesma.
No coletivo, muitas vezes pensamos sobre isso, consideramos que não podemos amar nossos pais. Quem pode decidir amar ou não amar? Como se apaga o afeto? Como são apagadas as memórias? Então, por enquanto, vivemos com essas contradições."
(Sem) epílogo
Embora as filhas tenham cortado relações com seus respectivos pais há muitos anos, faz muito pouco tempo que quebraram o silêncio publicamente. A história — pessoal, social — delas ainda está sendo escrita.
Em 2019, Kalinec entrou com um processobetsuldentro da prisão para que Analía seja excluída da herança da mãe, que morreubetsul2015. E fez isso "por razõesbetsulindignidade": ele considera que a filha o difama e não deve se beneficiar do dinheiro da família, conforme registradobetsuluma carta assinada também por suas duas irmãs mais novas.
Em resposta ao processo, Analía indicou que aceitará o que seu pai quer se ele admitirbetsulculpa e fornecer informações sobre o destinobetsulsuas vítimas.
"É cínico o que está acontecendo, mas me parece que o interessante desse julgamento contra mim é que, depoisbetsul12 anos sem nos ver, o diálogo que meu pai me negou agora se transformoubetsuluma conversa por meiobetsulmemorandos e advogados,betsulque ele tembetsuller o que tenho a dizer, ebetsulque sigo exigindo que ele diga o que sabe", aponta a filha.
Paula já não tem mais essa opção. Ela recebeu uma ligação do irmão recentemente. Ele contou que seu pai teve um derrame, chegou a ser operado, mas não recuperou a consciência.
"Não fui vê-lo no hospital. Tampouco fui ao funeral", diz Paula à BBC News Mundo.
"Decidi não ir porque pensei que seria desrespeitoso com aqueles que tinham uma relação com ele. E também porque, honestamente, uma partebetsulmim já estavabetsulluto pelo meu pai."
"Mas vivo ou morto, eu, como filha, ainda me sinto responsável por falar, por dizer que condeno suas ações. Talvez encoraje outros a se manifestarem, para além do vínculobetsulsangue que tenham com o agressor. Nada disso muda com a morte do meu pai."
betsul *Paula pediu que não publicássemos seu sobrenome, para proteger a identidadebetsuloutros membrosbetsulsua família.
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