O missionário que virou ateu ao viver com índios brasileiros e fez surpreendente 'descoberta' sobre história da linguagem:blazer com aposta

Legenda do áudio, Em áudio: O missionário que virou ateu ao viver com índios brasileiros

"É a vida sem crenças religiosas e a satisfação que isso traz para seres humanos. Por causa deles hoje sou ateu. Não estou defendendo o ateísmo, estou simplesmente dizendo que isso representa uma alternativablazer com apostavida."

O estudo dessa estrutura linguística curiosa dos pirahã evoluiu para uma proposição que hoje desafia a mais estabelecida teoria da Linguística e que Everett volta a detalharblazer com apostaum livroblazer com apostaportuguês lançadoblazer com aposta2019, Linguagem: A História da Maior Invenção da Humanidade (editora Contexto).

"Sem essa invenção não haveria nenhuma outra", argumenta. "A linguagem foi essencial para todas as civilizações, para todas as outras tecnologias, para tudo o que temos."

Choqueblazer com apostateorias

Everett defendeblazer com apostaseu livro que línguas como a pirahã "não parecem possuir qualquer gramática hierárquica" ou estruturada como os demais idiomas, nem parecem ter a chamada recursão, processo linguístico que consisteblazer com apostainserir uma frase dentro da outra (o recursoblazer com apostaunir, por exemplo, as frases "homem caminha pela rua" e "homem veste chapéu"blazer com aposta"o homem que veste chapéu está caminhando pela rua").

Daniel Everett na Amazônia

Crédito, Arquivo pessoal

Legenda da foto, Daniel Everett na Amazônia; ao conviver com índios pirahã, o então missionário se tornou ateu e criou teoria linguística que desafia a tese predominante

Essa proposição, porém, desafia a teoria predominante da linguística, encampada pelo influente intelectual Noam Chomsky, que defende a ideiablazer com apostauma "gramática universal":blazer com apostaque alguns aspectos estruturais, como a recursão, são comuns a todos os idiomas eblazer com apostaque humanos possuem uma capacidade inata e genética relacionada à aquisição da linguagem. Nesse caso, a linguagem não seria, portanto, uma invenção humana, mas inata aos humanos.

Em resposta à teoriablazer com apostaEverett, Chomsky já chegou a chamá-loblazer com aposta"charlatão" e argumentou que as peculiaridades do idioma pirahã não colocariamblazer com apostaxeque a "gramática universal", uma vez que os falantes da língua teriam, segundo ele, os mesmos componentes genéticos que o restante da humanidade.

Everett diz não descartar o valor da genética na linguagem, mas defende que é preciso considerar o papel da cultura humana no desenvolvimento dos símbolos, que porblazer com apostavez levam às línguas.

"Nosso cérebro maior se deve à genética, então não estou dizendo que a genética seja irrelevante — mas não necessariamente uma genética especificamente designada à linguagem. A inteligência junto com a cultura, a meu ver, é capazblazer com apostaexplicar a origem da linguagem", afirma à BBC News Brasil.

"Durante muitos anos achei (a teoriablazer com apostaChomsky) não somente plausível como a aceitei, mas acho que (...) a explicação é mais simples. Sabemos que todos os seres humanos têm cultura, todo o mundo tem símbolos, e simplesmente não vejo necessidadeblazer com apostapostular algo a mais (como a 'gramática universal'). Acho que a diferença entre o ser humano e os outros animais não é tão grande quanto pensávamos."

Simulação do Homo erectus
Legenda da foto, Simulação do Homo erectus, que, segundo Everett, foi o 'inventor' da linguagem

Do Homo erectus ao emoji

Outra divergência é temporal. Chomsky e colegas escreveramblazer com apostaartigos que "a faculdade da linguagem provavelmente emergiu recentementeblazer com apostatermos evolucionários, cercablazer com aposta70 mil a 100 mil anos atrás".

Everett, porém, defende que ela é muito mais antiga e remete ao extinto hominídeo Homo erectus, 2 milhõesblazer com apostaanos atrás, também sob a influência da cultura e da ânsia exploratória dessa espécie.

Seu argumento éblazer com apostaque o Homo erectus vivenciou a "primeira e maior era da informação" e foi capazblazer com apostaviajar por diversos continentes e mares,blazer com apostaIsrael à China e à Indonésia, graças ablazer com apostacapacidadeblazer com apostaimaginar eblazer com apostase comunicar pela linguagem, embora com sons provavelmente diferentes dos que somos capazesblazer com apostafazer hoje.

"Sempre que você falar sobre algoblazer com aposta2 milhõesblazer com apostaanos atrás, haverá controvérsia", diz. "(Mas) sabemos que o Homo erectus tinha inteligência, cultura e símbolos, que o mar não era barreira para ele. (...) Somos as primeiras criaturas com cultura, então a ideiablazer com apostaque (isso) tenha evoluído para um sistemablazer com apostasímbolos mais avançado, ou seja, para a linguagem, não é tão difícilblazer com apostaimaginar quanto tem sido por causa da influênciablazer com apostaChomsky sobre muitos arqueólogos."

O pesquisador afirma que assistimos a uma espécieblazer com apostarepetição disso atualmente com a proliferação dos emojis — que, embora não tenham sido criados "do nada", como Everett diz ter sido o caso com a linguagem, são uma forma novablazer com apostacomunicação.

"Se você coloca três emojis, faz uma sentença. É,blazer com apostacerta forma, a recriação da história da invenção da linguagem, com o Homo erectus. Estamos criando novos símbolos e encaixando esses símbolosblazer com apostasentenças", diz.

Noam Chomsky

Crédito, AFP

Legenda da foto, Teoriablazer com apostaEverett difere dablazer com apostaNoam Chomsky

Nessa mesma linha, ele opina que nossa fascinação com as redes sociais nada mais é do que a submissão "ao impulso das trocas linguísticas" que carregamos há milhõesblazer com apostaanos.

Influência brasileira

Everett diz que, para construir suas teorias, foi "fundamental" a experiênciablazer com apostamaisblazer com aposta30 anos que teve estudando a "riqueza linguística" das culturas indígenas da Amazônia brasileira.

E ele acha que avanços do desmatamento e das queimadas nas florestas podem ameaçar essa riqueza.

"Temos tantas lições a aprender ainda sobre as culturas e línguas amazônicas que destruir os ambientes necessários para sustentá-las tira do mundo inteiro uma fonteblazer com apostaconhecimento que não teríamosblazer com apostanenhum outro lugar do mundo", diz à reportagem. "Sabemos mais sobre nós quanto sabemos mais sobre eles. Estudar essas línguas e esses povos foi o maior privilégio da minha vida, eles me ensinaram mais sobre a natureza do ser humano do que qualquer coisa que liblazer com apostalivros."

Por fim, Everett diz que gostaria que as pessoas mantivessem a mente aberta para múltiplas possibilidades sobre as origens das línguas.

"As pessoas têm que ser abertas para várias hipóteses diferentes. A minha hipótese sobre a origem a linguagem tem muito apoio, mas não estou dizendo que não é preciso estudar outras. Temos que ler muito e pensar muito, porque (nós humanos) somos apenas gorilas falantes e precisamosblazer com apostatoda a ajuda possível", afirma.

"A natureza do ser humano éblazer com apostaachar que é especialblazer com apostarelação aos outros animais, mas não somos. Fazemos coisas estúpidas e brilhantes,blazer com apostamuita beleza ou muito feias. Mas a linguagem é que nos permite fazer isso tudo."

Línea

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