Declaração Balfour, as 67 palavras que há 100 anos mudaram a história do Oriente Médio:
Então ministro britânico das Relações Exteriores, Arthur Balfour assinou2novembro1917 a carta - entendida como o ponto inicial do conflito árabe-israelense.
Nos territórios palestinos eIsrael, a carta é ensinada nas aulasHistória e é vista como um capítulo chavesuas narrativas nacionais, que são bem diferentes.
A declaração do então ministro britânicoRelações Exteriores foi enviada a Walter Rothschild, um dos principais proponentes do Sionismo, movimento que defende a autodeterminação do povo judeu em"terra histórica" - que vai do Mediterrâneo até o lado oriental do Rio Jordão, uma área que passou a ser conhecida como Palestina.
Ela diz que o governo britânico apoia "o estabelecimentoum lar nacional para o povo judeu na Palestina".
Ao mesmo tempo, a carta diz que nada deveria "prejudicar os direitos civis e religiososcomunidades não-judias que já estavam ali".
Os palestinos veem isso como uma grande traição, especialmente levandoconta uma promessa feita separadamente para garantir o apoio político e militar dos árabes - então sob jugo dos turcos otomanos - na Primeira Guerra Mundial.
Essa promessa sugeria que a Grã-Bretanha apoiaria a luta por independência dos árabes na maior parte das terras do Império Otomano - boa parte delas no Oriente Médio. Os árabes consideravam que isso incluía a Palestina, apesarisso não ter sido especificado.
O governo britânico esperava que a DeclaraçãoBalfour ajudaria a colocar os judeus, especialmente os que moravam nos Estados Unidos, a favor dos aliados durante a Primeira Guerra Mundial.
Com a derrota do Império Otomano no conflito, o texto foi respaldado pelos aliados e incluído1922 no Mandato Britânico sobre a Palestina pela Liga das Nações (a organização que antecedeu a ONU), encarregando formalmente o Reino Unido da administração desses territórios.
Em 29novembro1947, a Assembleia Geral da ONU adotou a resolução 181, através da qual aprovou o planodivisão da Palestina, que estipulava a criaçãoum Estado árabe e outro judeu até no máximo 1ºoutubro1948.
Só que os países árabes se negaram a assinar o plano da ONU e a tensão na região escalou, culminando com a Guerra Árabe-Israelense, que obrigou centenasmilharespalestinos a fugir do recém-criado EstadoIsrael.
Aulas muito diferentes
"Você acha que a Grã-Bretanha cometeu um crime contra o povo palestino?", pergunta uma professora durante uma aulauma escola palestina na cidadeRamallah, na Cisjordânia.
Todos levantam a mão.
"Sim", responde uma menina15 anos. "Essa declaração foi ilegítima porque a Palestina ainda era parte do Império Otomano e a Grã-Bretanha não a controlava".
"A Grã-Bretanha considerava os árabes uma minoria enquanto eles eram mais90% da população."
'Enorme esperança'
Inevitavelmente, as crianças israelenses tendem a ver o envolvimento britânicouma maneira mais positiva quando estudam a DeclaraçãoBalfour.
Na cidadeBalfouria, no norteIsrael, Noga Yehezekeli,9 anos, já consegue recitarcor - e com orgulho - a versãohebreu do texto.
"No momentoque foi dada, a declaração deu uma enorme esperança e um grande impulso ao movimento sionista", diz Neve, seu pai.
"As pessoas viram que, se o governo britânico deu essa declaração, havia uma chanceque um dia a nação judia poderia ser estabelecida, o que realmente aconteceu mais tarde,1948" - o anoque o EstadoIsrael foi criado.
Os moradoresBalfouria - incluindo o avôNeve - faziam parteuma comunidade judiaexpansão na Palestina quando Balfour a visitou1925. Eles receberam Balfour como um herói.
Naquele período, a área era governada pelos britânicos. Na época, a Grã-Bretanha havia permitido ondasimigração judia - 100 mil imigrantes judeus chegaram ao local nos primeiros anos após a Declaração Balfour.
No final da década1930, essa migração provocou uma reação negativa por parte da população árabe que já estava lá e se sentiu ameaçada. Os britânicos reagiram interrompendo a imigraçãojudeus justamente quando o líder nazista Adolf Hitler dava início ao Holocausto.
Depois da Segunda Guerra Mundial, um grupo sionista chamado Irgun planejou vários atentados extremistas, inclusive a explosão do hotel King DavidJerusalém22julho1946, matando 91 pessoas. O ataque acelerou o êxodo árabe da Palestina no período antecedente à criaçãoIsrael.
Difícilcumprir
Na Universidade HebraicaJerusalém, inaugurada por Balfour, a professora Ruth Lapidoth estudou o documento67 palavras.
Especialistaleis internacionais, Lapidoth afirma que foi uma declaração legalmente oficial, mas diz que a Grã-Bretanha achou difícil cumprir seu compromisso.
"A situação política era muito ruim quando os nazistas chegaram ao poder e quando a Inglaterra precisava da ajuda, da amizade dos países árabes", diz ela.
"Então eles tiveram que limitar a implementação da declaração, o que é uma pena".
Lapidoth deixou a Alemanha1938, um ano antes do começo da Segunda Guerra Mundial, então teve interesse pessoal no assunto.
"Eu ainda sou muito grata por isso", diz ela. "Realmente foi a origem do nosso direitovoltar à Palestina, inclusive o meu".
'Promessalonga data'
O primeiro-ministroIsrael, Benjamin Netanyahu, descreve a DeclaraçãoBalfour como um "marco central" no processoestabelecimentoseu país.
O governo britânico o convidou para eventosLondres que marcam o centenário do documento nesta quinta-feira.
A decisão,um momentopoucas esperançasum acordopaz israelense-palestino, enfureceu palestinos, que planejaram um diaprotestos.
Eles querem que a Grã-Bretanha peça desculpas pela DeclaraçãoBalfour.
"Eu acho que com o passar do tempo os britânicos estão esquecendo das lições da história", diz o ministro palestinoEducação Sabri Saidam.
Ele diz que os palestinos ainda buscam a criaçãoum Estado para eles - o que ao ladoIsrael formaria a base para a chamada soluçãodois Estados para o fim do conflito, uma fórmula apoiada pela comunidade internacional.
"Chegou a hora da Palestina ser independente e dessa promessa ser cumprida", diz ele.