Eleições 2022: a igreja evangélica que manda fiéis votarem nulo: 'Se não aceitarem, procurem outra':

Fachada da Igreja Batista Renovada Moriá

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Legenda da foto, Igreja com 14 templosFortaleza proíbe fiéisvotarem

"Na minha igreja, não podemos votar. O voto precisa ser anulado", diz à BBC News Brasil.

"Mas o pastor tem muita simpatia pelo Bolsonaro. A orientação é a saída da igreja para quem votaBolsonaro e, para quem votaLula, não ir para nenhuma igreja porque, segundo o pastor, essa pessoa não é filhaDeus."

O direito universal ao voto, direto e secreto, é garantido no Brasil pela Constituição e pelo Código Eleitoral.

Glauco Barreira Magalhães Filho, pastor e presidente da igreja, também é advogado, professorDireito na Universidade Federal do Ceará e membro da Academia CearenseLetras Jurídicas.

Pastor Glauco Barreira Magalhães Filho

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Legenda da foto, Pastor Glauco Barreira Magalhães defende Bolsonaro e diz que quem apoiar Lula tem que ser 'liberto das trevas'

A reportagem o procurou insistentemente por e-mail, telefone e redes sociais. Ele não atendeu às ligações, não respondeu às mensagens e bloqueou o repórterseus perfis online.

Em textos autorais, Barreira diz que fiéis não devem "dar voto a nenhum dos candidatos", nem aceitar "qualquer aproximação entre igreja e política partidária".

Mas no Facebook, onde tem 4,9 mil amigos e 1.928 seguidores, ele publica críticas a ministros do Supremo Tribunal Federal e do Tribunal Superior Eleitoral e a favorum golpe militar e,contraste com o veto à liberdadevoto na igreja, mostra simpatia pelo presidente Jair Bolsonaro (PL), enquanto compartilha imagens qualificando Luiz Inácio Lula da Silva (PT) como "rato barbudo".

A BBC News Brasil também procurou a reitoria da Universidade Federal do Ceará (UFC) e a direção da FaculdadeDireito. Ambas não comentaram a conduta religiosa do professor.

Mensagem distribuída pelo pastor a fiéisgrupos fechados no Facebook e no WhatsApp

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Legenda da foto, Mensagem distribuída pelo pastor a fiéisgrupos fechados no Facebook e no WhatsApp

'Coagir alguém a votar ou não'

Em artigo publicadojornal ligado à igreja2011, o pastor e professor afirma que fiéis não podem votar, nem apoiar candidatos ou concorrer a cargos.

"Pelo fatoa política deste mundo estar sob a influênciaSatanás, o príncipe deste mundo (João 14:30) e Deus deste século (II Cor. 4:4), não devem os cristãos se envolver com ela, quer sendo cabo eleitoral, candidato ou eleitor."

Ele completa: "Devemos ir às urnasobediência às autoridades, mas não devemos dar o nosso voto a nenhum dos candidatos, pois o reinoDeus não é deste mundo".

EspecialistasDireito Eleitoral consultados pela BBC News Brasil dizem que violações às normas eleitorais por líderes e associações religiosas e candidatos podem levar à aplicaçãomultas e,casos graves, a sentençasprisão e até cancelamento do registrocandidaturas.

O veto da igrejaFortaleza à liberdadevoto aos fiéis, sob ameaçasaída compulsória da igreja, poderia representar violação do artigo 301 do Código Eleitoral, que proíbe "coagir alguém a votar, ou não votar".

"Vai se examinar se o graucoação é um grau importante. Se aquele fiel pensa que, se for expulso da igreja, irá para o inferno, ou coisa do tipo, isso pode ser uma coação grave. Isso tem que ser examinado caso a caso", explica um ex-ministro do Tribunal Superior Eleitoral à BBC News Brasil.

A pena sugerida no artigo 301 éreclusãoaté quatro anos e pagamento5 a 15 dias-multa.

O magistrado também cita lei 9.840, que define compravotos, entre outros temas.

"É vedado. Você não pode coagir uma pessoa a votaruma forma ou votaroutra forma. É ilícito", ele afirma.

A BBC News Brasil recentemente detalhou os possíveis crimes eleitorais associados a ameaças religiosas.

Reproduçãomensagem

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Legenda da foto, "Esclarecemos aos quenosso meio querem votarBolsonaro qual é a nossa posição sobre o voto. Se não quiserem aceitar, devem procurar uma igreja como pensam. Quem, porém, defender Lula tem que sair sem conversa", diz Pastormensagem reproduzidagruposWhatsApp da igreja

A igreja e seu pastor

A sede da Igreja Batista Renovada MoriáFortaleza fica num casarão amarelo emoldurado com pedras e um mosaico azul, verde, marrom e roxo. Atrás do portão, uma placamadeira traz o nome do pastor e professor universitário: "Rev. Glauco Barreira Magalhães Filho".

A denominação, que completou 30 anosFortaleza2018, teria aproximadamente 500 fiéis, segundo relatoum dos seguidores à BBC News Brasil.

A igreja se autodenomina anabatista, mas não integra grupos históricos deste movimento cristão, como os amish e os menonitas.

Nos 48 tópicos registradosseu credo há regras rígidas:

"Cremos que o homem deve ter cabelo curto e a mulher deve ter cabelo longo", diz o tópico 18.

"Cremos que joias, pinturas e atavios devem ser repudiados", afirma o seguinte.

"Cremos que anticonceptivos artificiais e cirurgias para evitar filhos são pecaminosos", continua o texto.

Glauco Barreira é mestredireito e doutorsociologia pela Universidade Federal do Ceará.

Durante a graduação, era visto como "sério, estudioso, ligadofilosofia", segundo relatoum ex-colegafaculdade à BBC News Brasil. Nas palavras do contemporâneo, com o tempo teria se tornado "uma Damares (Alves) da Academia",referência à senadora bolsonarista eleita pelo Distrito Federal.

Coordenou cursosDireitofaculdades privadas e seu currículo na plataforma Lattes inclui pesquisasFilosofia do Direito, Hermenêutica jurídica, Teoria do Direito, Direitos Fundamentais e Imaginário Jurídico.

Entre suas áreasatuação está o direito Constitucional - área dedicada a estudar a Constituição Federal, onde está estabelecido que todos os cidadãos brasileiros têm direito ao voto livre e secreto.

Barreira ganhou projeção nacional2013, como professor, quando escreveu no site da faculdadeDireito da UFC que o reconhecimento do casamento homoafetivo pelo Conselho NacionalJustiça (CNJ) seria um "golpeestado".

Neste texto, Barreira associou a atuação do CNJ e do Supremo Tribunal Federal (STF), citando o então ministro Joaquim Barbosa, ao comportamentoAdolf Hitler.

Atualmente, publica diariamente opiniões sobre as eleiçõessuas redes sociais.

Recentemente, o professor e pastor divulgou montagem com um retrato do líder da revolução chinesa Mao Tsé-tung junto ao logotipo do TSE, junto aos dizeres: "Mao TSE Tung".

Em outra, a imagemuma boca costurada sob as letras "STF" e o seguinte texto: "Muitobreve, se nada for feito, nosso direito sagrado à liberdadeexpressão será totalmente tolhido pelo STF", diz a legenda.

Em um álbumfotos, incluiu cópia da primeira página do jornal Correio da Manhã3abril1964 - dois dias após o golpe militar.

Reproduçãopostpastor contra o STF

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Legenda da foto, Em suas redes, líder religioso faz diversas críticas ao STF

Um texto adicionado ao facsímile apoiava um novo golpe, convocando pessoas para um ato chamado "clamor pela intervenção" na avenida Paulista,2019: "A história demonstra claramente. Por causa do povomassa nas ruas é que houve intervenção militar".

Entre diversas falas antivacina, o pastor e professor estimulou seguidores que tomaram imunizantes e tiveram covid a processarem suas empresas.

As dezenaspublicações diárias também promovem suas atividades como pastor. Caso do anúncioum culto especial que presidiu sobre "O que a bíblia diz sobre a condenação eterna (inferno)?".

Reproduçãopublicação do pastor

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A reportagem perguntou ao pastor e professorDireito Glauco Barreira Magalhães Filho:

- Por que o senhor veta a seus fiéis - textualmente e durante cultos - a liberdadevoto, sob ameaçasaída compulsória da igreja?

- O Código Eleitoral, como sabe, tipifica como crime "ameaça para coagir alguém a votar, ou não votar". Condicionar a presença na igreja ou não à anulação do voto foi entendido como infração à lei, na avaliaçãouma autoridade entrevistada pela reportagem. Qual é areação?

- O senhor é professor Associado I da escolaDireito da Universidade Federal do Ceará. É membro da Academia CearenseLetras Jurídicas. Vê contradição entreatuação religiosa e o que ensina e como atua profissionalmente?

Nenhuma das perguntas foi respondida, nem os pedidosentrevista por telefone foram atendidos.

O artigo 29 do credo da igreja liderada por Batista diz que "membros não devem envolver-sepolítica (votando ou sendo votado)".

O trecho inclui uma sériepassagens bíblicas como suporte à regra, entre as quais "A nossa cidadania, porém, está nos céus,onde esperamos ansiosamente o Salvador, o Senhor Jesus Cristo" (FL 3:20).

Trecho do credo da Igreja Batista Renovada Moria

Crédito, Igreja Batista Renovada Moria

Legenda da foto, Trecho do credo da Igreja Batista Renovada Moria

O pastor e professor definiu a igreja num artigo publicadonovembro2016. No texto, ele reitera a relação da denominação que preside com a política.

"A Igreja Batista Renovada Moriá é anabatista. Nem todos os batistas são anabatistas (...) Os anabatistas distinguem-se deles por não aceitarem qualquer aproximação entre a igreja (ou os crentes individuais) e a política partidária."

Contradição

À reportagem, um dos fiéis da igreja liderada por Barreira narra um rígido processo seletivo para entrada na agremiação.

"Antesqualquer pessoa ingressar na igreja, ela passa por uma faseestudos. Caso estejaacordo e queira ser membro, é submetido a uma entrevista."

"Se você convencer os pastores e líderes daconvicção, será aceito."

A avaliação pode acontecer por escrito ou por meioentrevistas. Segundo a pessoa entrevistada, caso as regras da igreja sejam descumpridas - a obrigatoriedadevoto nulo nas eleições, inclusive -, o fiel é imediatamente afastado.

Printpublicaçãopastor sobre presençaevento sobre educação considerada conservadora

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Legenda da foto, Publicação do professor inclui apoio a golpe militar e ataque a ministro do STF

"Durante o convívio na comunidade, se o seu comportamento ou atitudes demonstrar o contrário do regulamento interno aceito, o seu nome é expulso do rolmembros."

A pessoa entrevistada se mostra constrangida pelo posicionamento político do pastor e professor da universidade cearense.

"O pastor determina nossa salvaçãorelação à nossa simpatia por A ou B, como está escrito na nota dele", ela diz.

Diz que está "em desacordo com a doutrina" porque vê contradição entre a postura pessoal do pastor e o que ele prega no púlpito.

"Eu acho esquisito o pastor demonstrar tanta simpatia pela direita e ficar sempre debatendopalestras, encontros, e páginas sociais", diz.

"Já começou a ditadura nas igrejas."

Reproduçãoimagem contra a vacina

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Legenda da foto, Pastor compartilhou imagens contra a vacinação

- Este texto foi publicadohttp://vesser.net/brasil-63351457

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