'Crescimento sem emprego veio para ficar', diz sociólogo italiano Domenico De Masi:login onabet
"Isso induz todos os trabalhadores a um sentimentologin onabetprecariedade", diz o sociólogo.
"Uma vez que o tempo para encontrar trabalho, ou reencontrá-lo, será mais longo, nos interstícios, será necessário que todos tenham a garantialogin onabetuma sobrevivência digna, assegurada atravéslogin onabetuma renda básicalogin onabetcidadania e, posteriormente,login onabetuma renda universal", defende.
Críticologin onabetJair Bolsonaro (PL), amigo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e entusiasmado pelo Brasil, De Masi citava o país como um exemplo para o resto do mundo,login onabetseu livro O futuro chegou, publicadologin onabet2013 — anologin onabetque, à despeito dos grandes protestos nas ruas, o Brasil registrou uma das menores taxaslogin onabetdesempregologin onabetsua história, às vésperas da profunda crise econômica que teria início no ano seguinte no governologin onabetDilma Rousseff.
"Depoislogin onabetter copiado a Europa por 450 anos e os Estados Unidos por maislogin onabet50 anos, agora que ambos os mitos-modelos estãologin onabetprofunda crise, o gigante latino-americano está sozinho consigo mesmo, enfrentando seu futuro", diz De Masi, sobre o Brasil.
"Esta é uma situação inquietante, que pode se dissolverlogin onabetconfusão ou pode gerar o modelo sem precedentes que o mundo precisa. Acredito firmemente nessa segunda hipótese."
Confira os principais trechos da entrevista concedida por Domenico De Masi à BBC News Brasil.
O sociólogo participoulogin onabetnovembro do evento Seminários Cultura e Democracia, organizado pelo Instituto Cultura e Democracia, Fundação Friedrich Ebert Brasil e Fundação Perseu Abramo.
login onabet BBC News Brasil - Quais são, nalogin onabetavaliação, as mudanças mais importantes no mercadologin onabettrabalho causadas pela pandemia?
login onabet Domenico De Masi - Após a pandemia, e por causa dela, o mercadologin onabettrabalho sofrerá mudanças significativas. O lockdown prolongado tornou necessário fechar muitos negócios e, portanto, tem causado uma redução acentuadalogin onabetsuas atividades e a falência das empresas mais frágeis, com a consequente demissãologin onabettoda ou partelogin onabetsua forçalogin onabettrabalho.
Enquanto isso, as empresas que tinham capital para investir adotaram novas tecnologias, substituindo o trabalho humano. Por fim, a disseminação do trabalho remoto, permitindo que milhõeslogin onabetpessoas trabalhassemlogin onabetcasa, possibilitou reduzir o usologin onabetveículos, combustíveis e refeitórioslogin onabetempresa etc., causando desemprego nesses setores.
Enquanto isso, a grande transformação do trabalho que começou há 200 anos continuou.
Os operários, que no início do século 20 representavam a grande maioria da população ativalogin onabettodo o mundo industrializado, agora, substituídos por máquinas eletromecânicas e robôs, foram reduzidos a apenas um terço; outro terço é composto por funcionários, porlogin onabetvez, substituídos por computadores; outro terço, por fim, é representado por trabalhadores criativos: executivos, gerentes, dirigentes, empresários, profissionais, cientistas, artistas.
O que está claro para nós também hoje é que a pandemia ama bilionários.
Em 2020,login onabetacordo com o Índicelogin onabetBilionários da Bloomberg, a fortuna total dos 500 mais ricos do mundo cresceu 31%login onabetrelação ao ano anterior.
login onabet BBC News Brasil - Quais dessas mudanças devem se tornar permanentes?
login onabet De Masi - Nos últimos anos, a ofertalogin onabetmãologin onabetobra cresceu porque a população mundial aumentou, mas a demanda diminuiu devido ao progresso tecnológico.
O trabalho que as máquinas nunca poderão tirar do homem é ologin onabetnatureza cognitiva e criativa.
É fácil prever que, para os responsáveis pelas tarefas executivas, sejam eles trabalhadores manuais ou administrativos, as horaslogin onabettrabalho semanais serão progressivamente reduzidas, enquanto seu tempo livre aumentará.
Graças ao trabalho remoto, o trabalho vai se desconstruindo cada vez mais no tempo e no espaço; para os trabalhadores criativos, o limite entre o trabalho e o não trabalho será cada vez mais tênue, dando vida àquela ociosidade criativalogin onabetque estudo, trabalho e lazer coincidem.
As três mudanças que a pandemia tem evidenciado, e que certamente permanecerão nos próximos anos, são o crescimento sem emprego (jobless growth), ou seja, a capacidadelogin onabetproduzir cada vez mais bens e serviços com cada vez menos trabalho humano; a disseminação do trabalho remoto e a difusão do comércio eletrônico.
O trabalho remoto representa um primeiro passo na revolução histórica que está mudando nossa vida profissional e familiar: uma revolução que continuará mesmo após a pandemia e que ninguém poderá impedir.
Em dezenaslogin onabetorganizações, a experiência do trabalho remoto realizada forçosamente nos últimos meses tem sido acompanhada por pesquisas sociológicas para monitorar seus efeitos.
A maioria dos chefes entrevistados diz que a produtividade gerallogin onabetseus funcionários aumentou, e a maioria dos trabalhadores diz estar disposta a continuar trabalhando remotamente mesmo após a pandemia.
Quanto ao comércio eletrônico, durante a pandemia, ele cresceu exponencialmente.
Antes do início da pandemia, a Amazon valia US$ 916,2 bilhões; após um ano, valia US$ 1,6 trilhão. Em 2020, Jeff Bezos, dono da Amazon e o homem mais rico do mundo, faturou US$ 8,99 bilhões por mês. Sua fortuna pessoal passoulogin onabetUS$ 115 bilhõeslogin onabet2019 para US$ 196 bilhõeslogin onabet2020.
Se distribuísse apenas uma parte desse valor, dando um bônuslogin onabetUS$ 10 mil para cada umlogin onabetseus 840 mil funcionários no mundo, talvez ele nem percebesse.
login onabet BBC News Brasil - O senhor tem falado com entusiasmo sobre o trabalho remoto. Mas, no Brasil, onde o acesso à tecnologia é muito desigual e os empregos informaislogin onabetbaixa remuneração são a maioria, o trabalho remoto durante a pandemia se mostrou um privilégio dos trabalhadoreslogin onabetmaior nível educacional. Não é utópico falar sobre como o trabalho remoto permite o lazer criativologin onabetsociedades tão desiguais?
login onabet De Masi - O trabalho remoto diz respeito ao trabalho intelectual e requer aparatos tecnológicos como o computador e a internet.
Portanto, é necessário criar as condições para que todos os cidadãos possam ter acesso à internet, não apenas para o trabalho remoto, mas também para se informar, conectar e interagir diariamente.
Porém, para todos aqueles que realizam o trabalho no escritório, mas que possuem equipamentos tecnológicos adequados para fazer o mesmo trabalhologin onabetcasa, deveria ser imediatamente permitido o trabalho remoto.
Em muitos casos, não são deficiências tecnológicas, mas deficiências culturais que dificultam a disseminação do trabalho à distância.
Muitos chefes — especialmente chefeslogin onabetpessoal — se opõem ao trabalho remoto por um conceito antiquadologin onabetpoder que eles identificam como um controle constante, físico e obsessivologin onabetseus funcionários.
login onabet BBC News Brasil - Como os países devem responder ao avanço do desemprego e da desigualdadelogin onabetum mercadologin onabettrabalhologin onabettransformação, que expulsa os menos qualificados, ao mesmo tempologin onabetque cria poucas novas posições, altamente especializadas?
login onabet De Masi - Nos últimos 200 anos, quatro grandes ondas tecnológicas se sucederam: a das máquinas mecânicas no início do século 19; a das máquinas eletromecânicas no início do século 20; a da tecnologia da informação nas últimas décadas do século 20; e a da inteligência artificial atualmente.
Cada uma dessas ondas tirou empregos dos homens, substituindo-os por máquinas e causando o desemprego tecnológico. As primeiras máquinas e robôs substituíram operários; computadores substituíram funcionários; a inteligência artificial substituirá gestores e profissionais.
Em outras palavras, estamos aprendendo a produzir cada vez mais bens e serviços com menos trabalho humano. Cem anos atrás, havia 40 milhõeslogin onabetitalianos que,login onabetum ano, trabalhavam 70 bilhõeslogin onabethoras; hoje são 60 milhões e trabalham 40 bilhõeslogin onabethoras.
Ainda assim, eles produzem infinitamente mais. Este é o fenômeno do crescimento sem emprego, que se acentuará com a difusão das biotecnologias, nanotecnologias, novos materiais, impressoras 3D, plataformas, reconhecimentologin onabetvoz e inteligência artificial.
A única maneiralogin onabetevitar que o desemprego aumentelogin onabetforma incontrolável é reduzir as horaslogin onabettrabalho à medida que a tecnologia avança.
Segundo dados da OCDE [Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico], um francês trabalha 34,4 horas por semana e um alemão, 30,8 horas. Não surpreende que o nívellogin onabetemprego sejalogin onabet70% na França e 79% na Alemanha.
Recentemente, a imprensa relatou os resultadoslogin onabetum experimento realizado na Islândia com 2.500 médicos, enfermeiros e policiais, para testar o que acontece quando se trabalha uma hora a menos por dia pelo mesmo salário.
Como os resultados têm sido excelenteslogin onabettodos os aspectos, os empregadores e sindicatos islandeses concordaramlogin onabetreduzir as horaslogin onabettrabalhologin onabet40 para 35 horas semanais para 86%login onabettodos os trabalhadores daquele país, mantendo os salários inalterados.
login onabet BBC News Brasil - Qual será o papel da renda básica universal neste novo mundo?
login onabet De Masi - Durante dois séculos, a sociedade industrial se concentrou na segurança: o jovemlogin onabet18 anos que entrava numa empresa sabia que permaneceria lá até a aposentadoria e sabialogin onabetantemão os anoslogin onabetaumento do seu salário e a progressãologin onabetsua carreira.
Com o triunfo da economia neoliberal, a partir dos anos 1980, sob [o presidente americano Ronald] Reagan e [a primeira-ministra britânica Margareth] Thatcher, o fenômeno da precarização se acentuou e os riscos aumentaram.
Para quem trabalha, aumentou a insegurança, a duração e intensidade do trabalho, a flexibilidade, a multiatividade, a informalidade e a descontinuidade. Para quem não trabalha, aumentou a precariedade e a miséria, a desorientação e a depressão.
Costuma-se dizer que, para erradicar a pobreza, é necessário crescimento econômico.
Primeiro Reagan e depois Bush pai [o presidente americano George H. W. Bush] implementaram as ideias neoliberais dos economistas [Simon] Kuznets e [Arthur] Lafferlogin onabetque os impostos dos ricos deveriam ser reduzidos para incentivá-los a investir e, ao mesmo tempo, desencorajá-loslogin onabetsonegar impostos. Dessa forma, essa riqueza crescente beneficiaria os pobres, aliviandologin onabetcondição.
Em vez disso, a história mostra que o númerologin onabetpobres aumenta, mesmo quando a riqueza cresce, porque sabemos como produzir riqueza, mas não sabemos, ou não queremos, distribuí-la.
Portanto, se queremos evitar que a pobreza se traduzalogin onabetconflito e que o conflito transborde para a violência, devemos recorrer ao Estadologin onabetbem-estar social.
É cada vez mais frequente uma experiêncialogin onabettrabalho composta por múltiplos empregos que se sucedem e se entrelaçam, intercalados com períodoslogin onabetdesemprego; empregos temporários, gig economy [economia dos aplicativos], contratos periódicos, etc.
Isso induz todos os trabalhadores a uma sensaçãologin onabetprecariedade. Como disse o sociólogo francês André Gorz: 'Uma coisa é certa: somos todos, potencialmente, excedentes'.
Uma vez que o tempo para encontrar trabalho, ou reencontrá-lo, será mais longo, nos interstícios, será necessário que todos tenham a garantialogin onabetuma sobrevivência digna, assegurada atravéslogin onabetuma renda básicalogin onabetcidadania e, posteriormente,login onabetuma renda universal.
login onabet BBC News Brasil - Qual o senhor acredita ser o futuro dos empregos da login onabet gig economy login onabet ? Há alguma maneiralogin onabetos trabalhadores recuperarem direitoslogin onabetum mundo onde os consumidores se acostumaram a serviços cada vez mais baratos e rápidos?
login onabet De Masi - O comércio eletrônico torna os consumidores cúmplices dos produtoreslogin onabetdetrimento dos transportadores.
Os empregos da gig economy aumentarão cada vez maislogin onabetnúmero e a exploração desses trabalhadores será cada vez mais cruel, até que eles se sindicalizem radicalmente ou até que sejam completamente substituídos por drones e pela inteligência artificial.
Por enquanto, a vitória do neoliberalismo sobre o socialismo é esmagadora. Isso se deve ao fatologin onabetque os explorados perderam a consciêncialogin onabetclasse, não se sindicalizam, não se organizam para lutar contra aqueles que os exploram e nem mesmo sabem precisamente quem os explora.
login onabet BBC News Brasil - Em 2013,login onabetseu livro login onabet O Futuro Chegou login onabet , o senhor citava o Brasil como um exemplo para o resto do mundo. Agora, o Brasil é considerado um contraexemplo, por suas ações durante a pandemia e na questão ambiental. Onde as coisas deram errado?
login onabet De Masi - Como disse Tom Jobim: "O Brasil não é para amadores". Apenas amadores podem pensar que o regimelogin onabetBolsonaro será duradouro e que o modelo cultural brasileiro pode ser alteradologin onabetquatro anos.
Esse modelo, como observei no livro O Futuro Chegou, e como explicaram os grandes antropólogos brasileiros, é feitologin onabetmestiçagem, sincretismo, alegria, sensualidade, simpatia, hospitalidade, solidariedade, esperança e beleza.
É, portanto, um modelologin onabethumanismo corporal, precioso para toda a humanidade.
É um imenso patrimôniologin onabetlivros, pesquisas, reportagens, monumentos, pinturas, filmes, fotografias, alémlogin onabetlugares e objetos, que cobrem o períodologin onabetmuitos séculos densoslogin onabetobras, descobertas e invenções.
O brasileiro é informal, trabalhalogin onabetmangaslogin onabetcamisa e sabe atuarlogin onabetgrupos, é fluidologin onabetseus processoslogin onabettomadalogin onabetdecisão, não tem preconceitos ideológicos, aprende fazendo, tende a combinar trabalho com diversão, presta serviçoslogin onabetforma atenciosa, afável, afetuosa.
Essa identidade contém uma inteligência grande, muito vital, mas também uma fragilidade juvenil, e é essa fragilidade que tornou possível a conquista do poder por um governo bruto e neoliberal como o atual. Um governo que, com suas veias totalitárias, é particularmente capazlogin onabetacentuar o infantilismo das massas e neutralizar a maturidade das elites.
login onabet BBC News Brasil - Lula é atualmente o primeiro colocado nas pesquisaslogin onabetintençãologin onabetvoto para as eleições presidenciais do Brasillogin onabet2022. Como o senhor vê um possível retorno dele à Presidência?
login onabet De Masi - O papel desempenhado por Lula durante seus dois mandatos presidenciais consistiulogin onabetdar voz à classe mais baixa. Em números absolutos, foram criados 20 milhõeslogin onabetempregos durante suas duas presidências, enquanto 40 milhõeslogin onabetbrasileiros pobres ingressaram na "classe C".
Uma revolução tão radicallogin onabetum país tão desigual, por um lado, levou alguns políticos do PT a cairlogin onabetum delíriologin onabetonipotência, entregando-se à corrupção.
Por outro lado, amedrontou o capitalismo internacional que,login onabetresposta a essa revolução, tirou Lulalogin onabetcena com um duplo golpe, midiático e judiciário.
Lula é hoje uma figura política ainda mais valiosa para a esquerda mundial do que era há vinte anos.
Ele sabe que a doença senil do socialismo estálogin onabetter perdido o contato com os pobres, ter renunciado àlogin onabetfunção pedagógica para com aos explorados, ter negligenciado a formaçãologin onabetvanguardas capazeslogin onabetexercer uma liderança competente nas lutas políticas.
login onabet BBC News Brasil - É possível para o Brasil "reinventar seu futuro"?
login onabet De Masi - Não só é possível, é certo! Pessoalmente, acredito que, assim que esse infeliz parêntese do governo Bolsonaro acabar, o modelologin onabetvida e sociedade historicamente elaborado pelo Brasil retomará todalogin onabetvitalidade.
Seu sucesso no mundo, é claro, dependerá da capacidade dos brasileiroslogin onabetse mobilizar, organizar, agir com mais racionalidade sem perder a simpatia, modernizar sem comprometer a sustentabilidade,login onabetser, talvez, menos improvisadores, sem perder a criatividade.
Depoislogin onabetter copiado a Europa por 450 anos e os Estados Unidos por maislogin onabet50 anos, agora que ambos os mitos-modelos estãologin onabetprofunda crise, o gigante latino-americano está sozinho consigo mesmo, enfrentando seu futuro.
Esta é uma situação inquietante, que pode se dissolverlogin onabetconfusão ou pode gerar o modelo sem precedentes que o mundo precisa.
Acredito firmemente que essa segunda hipótese se realizará e que o Brasil retomarálogin onabetjornadalogin onabetgrande democracia, alimentada pelo humanismo e pela criatividade.
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