4 perguntas para entender a reviravolta no caso das candidatas 'laranjas' do PSLBolsonaro:
O ministro nega irregularidades, e diz que o simples fatoser o presidente do PSLMinas Gerais na época da eleição não significa que ele tenha envolvimento com o caso.
O promotor Fernando Abreu falou sobre o caso a jornalistas na semana passada. Segundo ele, recursos que deveriam financiar candidaturasmulheres do PSL naquele ano acabaram irrigando as campanhas do próprio Marcelo eIrineu Inácio da Silva, o Professor Irineu. Este último foi eleito para o cargodeputado estadualMinas no ano passado.
A investigação também levantou suspeitas sobre outro personagem poderoso do PSL: o presidente da República, Jair Bolsonaro. Segundo o jornal FolhaS.Paulo, um dos investigados disse à PF que "acha que parte dos valores depositados para as campanhas femininas, na verdade, foi usada para pagar materialcampanhaMarcelo Álvaro Antônio eJair Bolsonaro".
Além disso, a PF também apreendeu uma planilha intitulada "MarceloAlvaro.xlsx", na qual há a referência a supostos materiaiscampanha que teriam sido feitos para o então candidato à Presidência do PSL, junto da expressão "out". Para a PF, a palavrainglês indica um pagamento "por fora", isto é, não informado à Justiça Eleitoral.
Tanto o presidente da República quanto integrantes do governo reagiram com indignação à reportagem.
Bolsonaro disse no Twitter que o jornal "avançou todos os limites, transformou-se num panfleto ordinário". "Com mentiras, já habituais, conseguiram descer às profundezas do esgoto". "O que mais me surpreende são os patrocinadores que anunciam nesse nesse jornaleco chamado FolhaSão Paulo", escreveu ele.
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O chefe da SecretariaComunicação (Secom) do governo, Fabio Wajngarten, também criticou o texto e pediu um boicote publicitário a órgãosimprensa que publicam textos "escandalosos". A Secom é o órgão que detém o podercontratar os espaços publicitários para o governo federal.
O ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, também saiudefesa do presidente da República. "Bolsonaro fez a campanha presidencial mais barata da história. Manchete da Folhahoje não reflete a realidade", escreveu ele no Twitter, no domingo.
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Por enquanto, Marcelo Álvaro Antônio vai sobrevivendo à crise.
Na segunda-feira (7/10), o porta-voz da Presidência, Otávio Rêgo Barros, disse que Bolsonaro não pensaafastar o ministro.
"Não há da parte do presidente, nesse momento, qualquer indício ou qualquer formulaçãoideia no sentidosubstituir o ministro. O ministro se mantém no cargo e detém a confiança do presidente Jair Bolsonaro", disse ele.
Já Bolsonaro preferiu não comentar o caso. Perguntado por jornalistas, disse apenas "Tá ok, obrigado" e encerrou a entrevista coletiva.
Em fevereiro deste ano, o ex-ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Gustavo Bebianno, não teve a mesma sorte: o caso das candidaturas laranjas contribuiu para que ele acabasse demitido do cargo. Bebianno atuou como presidente interino do PSL durante as eleições.
Mas afinal, qual é exatamente a acusação contra o ministro do Turismo e o que ele alega neste caso? Bolsonaro pode realmente acabar sendo investigado por causa da eleiçãoMinas? Quais são os próximos passos da investigação? A reportagem da BBC News Brasil responde a estas e a mais duas perguntas sobre o caso.
1 - Quais são as acusações contra Marcelo Álvaro Antônio?
As suspeitas giramtorno da existência do que seriam candidatas "laranjas" no PSL mineiro na campanha2018.
Quatro candidatas do partido receberam ao todo R$ 260 mil do Fundo Eleitoral para a campanha — estavam entre as 20 candidatas que mais ganharam dinheiro do PSL para a eleição no Brasil todo. Mesmo assim, tiveram juntas menos2.000 votos, o que indica que não teriam feito campanha realmente.
A suspeita do Ministério Público éque, na verdade, o dinheiro foi canalizado para outros candidatos — principalmente Marcelo Álvaro Antônio. Dos R$ 260 mil recebidos por elas, maisR$ 190 mil teriam sido repassados para outros candidatos, segundo o promotor do Ministério PúblicoMinas (MPMG).
"A lei Eleitoral prevê o mínimo30%candidatas femininas (...) e a isonomia dos candidatosrelação aos recursos (30% do Fundo Eleitoral para candidatas mulheres). O que é que ocorreu? (Algumas pessoas) receberam propostas para que se candidatassem e, durante a campanha, promovessem o pagamentodespesas para outros candidatos como uma formase burlar o repasse dos recursos do Fundo Eleitoral e se beneficiar outras candidaturas", disse o promotor eleitoral Fernando Abreu.
"Segundo a prova dos autos, as candidatas seriam laranjas. Receberiam os recursos sem promover efetivamente uma campanha eleitoral. E o próprio númerovotoscada uma delas evidencia isso, a proporção dos votos e o volumerecursos recebidos", disse o promotor a jornalistas.
AlémMarcelo, foram indiciadas pela polícia e depois denunciadas outras dez pessoas: o deputado estadual Professor Irineu (PSL-MG); as quatro mulheres que teriam sido usadas como "laranjas"; três pessoas que eram assessoresMarcelo na época da eleição; e dois donosgráficas que teriam sido usadas pela campanha. Um desses assessores, Mateus Von Rondon Martins, continua trabalhando com Marcelo no Ministério do Turismo.
Um ex-assessor, Haissander SouzaPaula, é o responsável pelo depoimento que mencionou o nomeBolsonaro. Ele foi o coordenador da campanhaMarcelo no municípioConselheiro Lafaiete (MG), na região metropolitanaBH.
Marcelo Álvaro Antônio nega ter cometido qualquer irregularidade e diz ter seguido "rigorosamente o que determina a legislação eleitoral". "O que vem me atingindo há cerca3 meses é resultadouma disputa política local, cujos interesses são prejudicados com minha presença no Ministério do Turismo", disse,nota.
Em outro texto, o ministro diz que Haissander foi coagido por um delegado da PF a assinar o depoimento acusando a ele e a Bolsonaro.
"Haissander foi por horas pressionado pelo delegado Marinho a assinar, sem a presença do seu advogado, um termodeclaraçõescuja elaboração não participou, com declarações prontas e falsas, tendo a autoridade policial verbalizado que o Ministro do Turismo seria demitido naquele instante e que, assim, deveria 'falar tudo', prometendo a Haissander asoltura imediata se assinasse o referido documento", diz o texto.
A notaMarcelo diz ainda que a expressão "out" se refere apenas a serviços que ainda não tinham sido prestados, e não a trabalhos feitos "por fora", como interpretou a PF.
2. Quais são os próximos passos da investigação?
ApesarMarcelo Álvaro Antônio ter sido reeleito para o cargodeputado federal2018 eocupar hoje o postoministro, o caso foi para a 1ª Instância da Justiça Eleitoral seguindo o entendimento atual do Supremo Tribunal Federal: o chamado "foro privilegiado" só se aplica a crimes que tenham relação com o mandato, lembra a advogada especializadadireito eleitoral Marilda Silveira.
Assim, o caminho natural do processo, caso a denúncia seja aceita, é seguir para o Tribunal Regional EleitoralMinas (TRE-MG). Eventualmente, pode chegar ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), e, finalmente, embargos podem ser apresentados ao Supremo Tribunal Federal (STF), diz outro advogado também especializadodireito eleitoral, Daniel Falcão.
Na segunda-feira, a PF pediu a aberturauma nova investigação sobre o caso — o novo inquérito teria como foco as contascampanha do atual ministro do Turismo. Cabe agora ao mesmo promotor Fernando Abreu decidir sobre abrir ou não novas investigações. Ele já disse que novas apurações serão necessárias, mas sem dar detalhes.
Nesta terça-feira (08/10), a Folha revelou outro depoimento prestado à Polícia Federal. Neste caso, uma dirigente do PSLMinas diz que gastoscampanhaMarcelo foram pagos por meiodinheiro vivo, entregue a ela dentrouma caixa. O ministro diz que o depoimento "não procede" e nega ter tido despesas pagas pela dirigente.
Há ainda outro casoparalelo: a deputada federal Alê Silva (PSL-MG) acusa Marcelo Álvaro Antônioter enviado pessoas até seu escritório políticoMinas para ameaçarvida, depois que ela levou à Polícia e ao Ministério Público suspeitas sobre o caso das supostas candidatas "laranjas", ainda no começo deste ano.
A representaçãoAlê Silva foi encaminhada à 1ª instância da Justiça. A deputada — que é perita contábil — disse à PF que "terceiros teriam a informado sobre supostas ameaças avida feitas pelo Ministro do Turismo, Marcelo Álvaro, por acreditar que a mesma teria sido a autoracomunicações ao Ministério Público/MG, sobre supostos desviosverbas do Fundo Eleitoral e Partidário ocorridos nas eleições2018, por meio'candidaturas-laranjas'".
À BBC News Brasil, Alê Silva disse que "praticamente" não teve contato com ninguém do PSL durante as eleições, e nem apoio do partido. "Depois que eu ganhei, eles não ligaram para dar os parabéns. Para perguntar se eu precisavaalguma informação", disse. "Me mantiveram à margemtudo."
Ela diz também que Marcelo produziu "um material fake" a atacando, e distribuiu a peçagrupos do PSL nas redes sociais. "O áudio que eu tinha mandado para ele, ele adulterou (...) e colocou nas redes sociais", depois disso, ela relata ter sofrido ataquesapoiadores do ministro.
3. Bolsonaro está sendo investigado?
Não. O presidente da República só pode ser alvoapurações da Polícia Federal, por exemplo, caso haja determinação do atual procurador-geral da República (PGR), Augusto Aras. Até o momento, isto não aconteceu. Bolsonaro não foi indiciado pela Polícia Federal e nem aparece na denúncia feita pelo Ministério Público.
Segundo Daniel Falcão, o entendimento atual do Supremo Tribunal Federal éque o presidente da República pode,tese, ser investigado por fatos ocorridos antes do início do seu mandato.
Mas, caso seja denunciado pelo PGR, o presidente só poderá ser processado com autorização da Câmara dos Deputados. Nessa situação, são necessário os votos favoráveispelo menos 342 deputados a favor das investigações. O presidente é então afastado do cargo por até seis meses (180 dias), até que o caso seja julgado pelo STF.
4 - A cota para mulheres vai ser revista?
A cota30%candidatas mulheres nas eleições é uma exigência antiga — foi aplicada pela primeira vez nas eleições2010. Mas tudo mudou22maio deste ano, quando o TSE passou a exigir que as candidatas mulheres tivessem acesso a uma fatiapelo menos 30% do chamado Fundo EspecialFinanciamentoCampanha (FEFC), o Fundo Eleitoral.
A decisão foi tomadauma consulta formulada ao tribunal por um grupodeputadas e senadoras.
A reclamação entre dirigentes partidários éque, como a mudança aconteceu a poucos meses do pleito, os partidos não tiveram tempose adaptar à nova legislação. E um volume granderecursos acabou indo para as mãoscandidatas pouco competitivas.
"As pessoas têm medofalar, eu também me incluo nessa, porque achamos que vai parecer que somos contra as mulheres. Mas não é isso, precisa explicar: se você perguntar se tem mulher para sair candidatatudo, não tem. A mulher não quer ser candidata. Vai buscar e não vai achar, e vai ter uma situação díspar. O partido vai colocar o que der para obedecer a regra. Por isso, precisamos mudar a cota feminina", disse o presidente nacional do PSL, o deputado federal Luciano Bivar (PE).
No Congresso, há conversas sobre mudar a cota30% já para as eleições municipais do ano que vem (2020). Uma mudança neste momento poderia, entretanto, ser questionada na Justiça Eleitoral: para valer nas eleições do ano que vem, qualquer nova regra deveria ter sido aprovada pelo Congresso pelo menos um ano antes do pleito — o prazo se esgotou na sexta-feira (04).
Nesta segunda-feira (07), o senador Major Olímpio (PSL-SP) disse à BBC News Brasil que não acreditamudançasregras para as próximas eleições.
"Não creio que ocorra a mudança na cota feminina. Poderia parecer retrocessodireitos das mulheres", disse ele.
Ainda segundo Olímpio, a questão não está sendo discutida pelo PSL. "Pode ser uma opinião pessoal dele (Bivar)", disse,mensagemtexto.
Marilda Silveira, que é também professora da EscolaDireito do Brasil (EDB), se diz contra mudanças na regra das cotas.
"Pessoalmente, eu não concordo com a conclusãoque a cota para candidatas mulheres deve acabar. O que eu acho que falta é uma maior disposição dos partidos políticospromover a participação feminina. As mulheres estão hojepraticamente todos os outros espaços da sociedade. Por que é que só os partidos continuam dominados pelos homens?", questiona ela.
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