Como ser 'top': Ubers viram youtubers e faturam ensinando segredo do sucesso a motoristas e entregadores:freebet parimatch

Pedro Roseno

Crédito, Felix Lima/BBC News Brasil

Legenda da foto, Pedro Roseno tem um canal com 20 mil inscritos, onde posta vídeos com dicas e conselhos para entregadores

Em um canal com 23 mil inscritos, Pedro Roseno posta vídeos sobrefreebet parimatchrotina como entregadorfreebet parimatchaplicativo, o que faz algumas noites por semana. Nas imagens, mostra seu trajeto, dá dicas sobre o serviço e exibe seus ganhos por hora. Mesmo com algumas críticas às tarifas ou aos riscos sofridos, o tom éfreebet parimatchelogio. A lógicafreebet parimatchsua fala é simples: o trabalho é fácil, a entrada é rápida e, no fim, o sucesso só dependefreebet parimatchvocê.

"Falo que dá pra tirar até R$ 3 mil só com app", ele diz, balançando na cadeira.

"Tem pessoas que eu conheço que ganham isso. Um colega que trabalha na zona lestefreebet parimatchbike tirafreebet parimatchR$ 100 a R$ 120 por dia."

Do sofá, a reportagem pergunta quantas horas seu colega trabalha.

"Ele sai às dez da manhã e volta à meia-noite."

No Brasil, maisfreebet parimatch5,5 milhõesfreebet parimatchpessoas estão cadastradasfreebet parimatchaplicativosfreebet parimatchentrega e transporte, segundo o Institutofreebet parimatchPesquisa Locomotiva. Com 12,6 milhõesfreebet parimatchdesempregados, como apontaram os dados mais recentes do IBGE, e cada vez mais gente nas plataformas, surgiram dezenasfreebet parimatchcanais no YouTube pensados para esse público. Os mais populares têm maisfreebet parimatch400 mil inscritos e dão origem a negócios como cursos e lojas virtuais.

Pedro Roseno

Crédito, Felix Lima/BBC News Brasil

Legenda da foto, Em seu quarto-sala, Pedro edita os vídeos que compartilha com seus milharesfreebet parimatchseguidores

Alémfreebet parimatchum começo parecido - tirar as dúvidasfreebet parimatchquem quer entrar nos apps -, os canais têmfreebet parimatchcomum o discurso motivacional, presentefreebet parimatchcada cena: seja seu próprio chefe, escolha seu horário e ganhe pelo seu esforço. Os princípios são os mesmos anunciados por empresas do setor, como Uber e iFood,freebet parimatchpeças publicitárias.

"Os pontos negativos são poucos, na verdade", diz Pedro, enquanto pega capacete e câmera para sairfreebet parimatchcasa.

"O que as pessoas querem é uma formafreebet parimatchganhar dinheiro. Então quando você lança um vídeo dizendo que entrega dá dinheiro e é fácil, querem ver isso", ele continua, no mesmo tom.

Pedro acopla a GoPro no capacete rosa com estampafreebet parimatchflores e coloca a mochila verde-limão nas costas. Explica que é melhor não ligar o app antesfreebet parimatchtrancar a porta, porque, assim que o pedido tocar, terá seis minutos para chegar ao restaurante ou será bloqueado por meia hora.

"Tem que ir logo."

O portãofreebet parimatchferro é fechado rapidamente e, com a mesma agilidade, o celular se encaixa no suporte e o motor começa a roncar.

Pedro acelera pelas ruasfreebet parimatchSão Paulo. São 21hfreebet parimatchsexta-feira.

Faça seu próprio horário

Três pessoas trabalhamfreebet parimatchuma filafreebet parimatchcomputadores num escritório na zona sulfreebet parimatchSão Paulo. No canto esquerdo, há uma pequena salafreebet parimatchreuniões, e, nas paredes, post-its coloridos dividem as tarefas por fazer,freebet parimatchandamento e concluídas. Ali também estão a repórter da BBC e Marlon Luz, que apresenta partefreebet parimatchsua equipe. O primeiro da fila é o desenvolvedorfreebet parimatchum aplicativo para motoristasfreebet parimatchaplicativo, o segundo cuidafreebet parimatchuma loja virtual com produtos voltados para esse grupo e a terceira é a secretária, que nos oferece um caféfreebet parimatchseguida.

"Açúcar?"

Marlon Luz é o maior youtuberfreebet parimatchUber do Brasil. Criado há quatro anos, seu canal, o Uber do Marlon, tem 532 mil inscritos. Encostado emfreebet parimatchmesa, enquanto os funcionários voltam a digitar - apenas três dos 11freebet parimatchsua empresa -, ele lembra do seu começo na plataforma.

"A grande vantagem foi justamente o horário. Esse tipofreebet parimatchatividade veio bem a calhar."

Marlon Luz

Crédito, Felix Lima/BBC News Brasil

Legenda da foto, Depois do canal, Marlon Luz diversificou seus negócios no mundo dos apps com loja virtual e cursos

Em 2015,freebet parimatchmulher procurava um emprego com flexibilidade para que pudesse pegar as crianças na escola. As vagas que encontrava tinham horário fixo, o que atrapalhava seus planos.

Foi então que ela, uma ex-taxista, e o marido souberamfreebet parimatchuma companhia chegada há pouco ao Brasil no qual os inscritos poderiam trabalhar por quanto tempo quisessem. Marlon comprou um carro para que ela começasse no serviço e decidiu testar também. Fazia corridas à noite, depoisfreebet parimatchsair do emprego como programador, para ganhar um extra.

Ao ser demitido no ano seguinte, passou a depender das corridas. Como tinha dúvidas e não encontrava respostas na internet, decidiu produzir seu próprio conteúdo.

"Tentei criar coisas que pudessem me dar um bom dinheiro e ajudar as outras pessoas, principalmente ajudar as pessoas", ele explica no escritório onde guarda amostras das mercadorias oferecidas aos parceiros - carregadores portáteis, protetoresfreebet parimatchbanco e bolsinhas térmicas para água. Vinte mil unidades das últimas foram vendidas até agora, ele diz. O preçofreebet parimatchcada uma é R$ 59,90.

O principal produto, no entanto, é o curso Motorista TOP, que oferece desde 2016 e já teve maisfreebet parimatchquatro mil participantes. O preço das aulas não foi informado.

A ideia do treinamento, conta, é ensinar o segredo dos 15%freebet parimatchmotoristas que faturam maisfreebet parimatchR$ 25 por hora ou "que ganham bem",freebet parimatchacordo com uma pesquisa feita por ele entre seus seguidores.

"Hoje existe competição. Se você abrir seu aplicativo vai ter, no mínimo, três ou quatro carros a um minutofreebet parimatchdistância."

Quando fala para a câmera da BBC, repete as palavras algumas vezes, para que elas saiam da forma desejada. Ao se atrapalhar, sacode a cabeça, "não está bom assim", e começafreebet parimatchnovo, como se gravasse um dos seus vídeos.

"O que vai fazer alguém ser chamado como prioridade? Foram esses critérios que descobri."

No canal, continua, seu objetivo também é melhorar a performance dos seus seguidores. Alémfreebet parimatchsugerir estratégias, como nos vídeos "Dirigir 12h por DIA fica MUITO MELHOR desse jeito" ou "Passageiro MUITO LONGE... O que FAZER?", busca informá-los sobre elementos que possam interferir no trabalho,freebet parimatchmudanças na fiscalização a novas formasfreebet parimatchtransporte. Há críticas eventuais às empresas, mas no fim tudo volta ao motorista: qual é a sua tática para contornar o problema?

Vídeo do canalfreebet parimatchMarlon Luz

Crédito, Reprodução Youtube

Legenda da foto, Em umfreebet parimatchseus envios mais populares, Marlon Luz compara ser motoristafreebet parimatchapp com outros profissões

Em seu notebook, ele abre o vídeo mais popular, destacado na primeira página do canal: "10 Profissões que ganham MENOS que um motorista Uber", como manobrista e atendentefreebet parimatchtelemarketing. Na conta que faz, um parceiro com veículo alugado ganha entre R$ 2,1 mil e R$ 3 mil por mês.

De dentro do carro, estacionadofreebet parimatchalguma ruafreebet parimatchSão Paulo, o Marlon das imagens olha para cima, onde está a câmera. Ele mexe as mãos para pontuar as frases, que são bem articuladas para serem didáticas.

"Olha que interessante, o manobrista também está acostumado a dirigir o carro, né? (...) Enfim, ele trabalha o dia inteiro no volante e ele ganha,freebet parimatchmédia, R$ 1,3 mil, R$ 1,4 mil por mês. Se eu fosse manobrista, eu trocaria esse trabalho por motoristafreebet parimatchaplicativo", e dá um pequeno sorri.

É horafreebet parimatchdeixar o escritório. Marlon nos levará ao Pontofreebet parimatchApoio Motorista Top, espaço criado por ele perto do aeroportofreebet parimatchCongonhas, para que colaboradoresfreebet parimatchapps possam esperar por corridas e limpar o carro sem custo. Também podem fazer compras, se assim desejarem.

O trajeto dura vinte minutos. Logo o Pontofreebet parimatchApoio revela-se uma garagem cujas paredes estão pintadas num padrãofreebet parimatchcubosfreebet parimatchgelos azuis e onde uma dezenafreebet parimatchcarros aguardafreebet parimatchfila. Caminhamos entre eles enquanto Marlon cumprimenta motoristas e funcionários do lugar, com tapinhas nas costas e abraçosfreebet parimatchlado. Ao fundo, há uma pequena loja.

Ali, vendem-se balas sortidas por peso — para quem quer agradar os clientes com sabores diversos -, salgadinhos e apetrechos como sachês perfumados e as populares bolsas térmicas, expostosfreebet parimatchprateleiras.

"A bolsinha faz com que o passageiro avalie mais fortemente com cinco estrelas e perdoe uma perdida no GPS", ele explica.

Marlon Luz no pontofreebet parimatchapoio Motorista Top

Crédito, Felix Lima/BBC News Brasil

Legenda da foto, Maisfreebet parimatch20 mil bolsinhas térmicas para água já foram vendidas por Marlon emfreebet parimatchloja virtual

A reportagem pergunta se a loja dá lucro, mas Marlon diz que ela apenas se sustenta. O que dá dinheiro, "mais do que ser um motoristafreebet parimatchaplicativo", é o YouTube, quefreebet parimatchrazão da publicidade gera US$ 2 mil (cercafreebet parimatchR$ 8 mil) por mês. No total, informa depois, as empresas das quais é proprietário ou sócio geraram uma receita totalfreebet parimatchR$ 1,3 milhãofreebet parimatch2018. Em 2019, espera que o faturamento cresça 25%.

Ao voltarmos ao pátio, ele é abordado por um homem que se apresenta como Cleber,freebet parimatchcamisa social verde-clara. Com o celularfreebet parimatchmãos, Cleber pede uma selfie.

Nem bem a foto é tirada, o visitante diz que entrou no aplicativo depoisfreebet parimatchassistir a Marlon.

"Seus vídeos são muito top!", ele sorri.

Conta que há oito meses decidiu deixar o emprego como operadorfreebet parimatchempilhadeira para trabalhar apenas com os aplicativos. Com carteira assinada, ganhava R$ 1,8 mil e agora faz R$ 2,8 mil limpos.

"Ótimo! Nada bate o resultado!", Marlon responde, devolvendo o sorriso.

"E tenho horário flexível!", Cleber emenda.

O youtuber pergunta quantas horas seu seguidor dirige por dia

"Ah, 12, 18", ele responde distraído, espiando a tela do smartphone.

"Pelo amorfreebet parimatchDeus, não faça isso não, cara", Marlon se apoia nos ombros do homem, e solta uma risada sem jeito.

Não tem problema, Cleber garante. Ele conhece os limites do seu corpo: come bem e vai para casa quando está com muito sono. As 18 horas se encaixam nafreebet parimatchrotina - até combinou com a namoradafreebet parimatchvê-la a cada duas semanas, quando tira o fimfreebet parimatchsemanafreebet parimatchfolga.

Marlo Luz

Crédito, Felix Lima/BBC News Brasil

Legenda da foto, Marlon diz se considerar responsável pelas pessoas que influencia no YouTube

Antesfreebet parimatchchegar ao pontofreebet parimatchapoio, a reportagem da BBC havia perguntado a opiniãofreebet parimatchMarlon sobre a jornada dos motoristas.

"Cansa bastante", ele disse, num suspiro.

Quando perdeu o emprego, Marlon chegou a passar 80 horas por semana dentro do carro, o que era, sim, muito cansativo. No entanto, ponderoufreebet parimatchseguida, uma jornada diáriafreebet parimatch12 horas é viável. Ele mesmo trabalhafreebet parimatch14 a 15 horas entre todas as suas atividades, da loja virtual aos vídeos, passando pelas obrigações como vice-presidente da Associaçãofreebet parimatchMotoristasfreebet parimatchAplicativofreebet parimatchSão Paulo. Às corridasfreebet parimatchUber, dedica apenas quatro horas, para "manter uma ligação com seu público". Debaixofreebet parimatchseus olhos azuis, veem-se olheiras pretas.

A reportagem perguntou, então, se 12 horas não seria tempo demais.

"Não recomendo nenhum motorista a ficar mais do que isso", disse.

"Alguns países pedem para o aplicativo bloquear a conta do motorista depois desse período. Isso inibe a pessoafreebet parimatchtrabalhar? Não, né. Porque ela vai para outro aplicativo. Não é uma lei muito eficiente", continuou, seu rosto coberto pela sombra do para-sol.

Doze horas lhe parecem um tempo máximo "OK".

"Mas tem pessoas que aguentam mais."

Entregador dá pacote a cliente

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, Maisfreebet parimatch5,5 milhõesfreebet parimatchpessoas estão cadastradasfreebet parimatchaplicativosfreebet parimatchentrega e transporte, segundo Instituto Locomotiva

Seja seu próprio chefe

Em um dos seus vídeos, chamado "FEZ O PEDIDO E NÃO TINHA R$ PRA PAGAR E AGORA?!", o youtuber Wesley Tavares, o Tavares 160, mostra a tensãofreebet parimatchum momento aparentemente simples: um cartãofreebet parimatchcrédito que não passa.

"Senha inválida? Não, mas a senha é essa, moço", uma mulher diz, afinando a voz, os jeans aparecendo no canto inferior da cena, ao lado do tapetefreebet parimatchuma lojafreebet parimatchdepilação. Seu rosto está borrado.

Seguem-se outras tentativas, mas nenhuma dá certo. Se ela não conseguir pagar, o valor do pedido ficará como dívida na contafreebet parimatchWesley, que precisará entrarfreebet parimatchcontato com iFood para explicar a situação.

"É, deu falha", ele diz.

A cliente pede ajuda a uma amiga, que empresta seu cartão. Um momentofreebet parimatchexpectativa antecede a mensagem: pagamento feito com sucesso.

Entregadores e motoristasfreebet parimatchaplicativo não têm chefe. Ou pelo menos esse é um dos argumentos mais comuns na publicidade das empresas do setor e nas falas dos youtubers. Sem uma figura hierárquica, no entanto, perde-se a referênciafreebet parimatchquem procurar quando problemas aparecem. Se o pagamento falhar, quem é o responsável?

No vídeo, ao voltar para a moto, Wesley reclama da situação para seus 407 mil inscritos.

"Tipo assim, não vou saber qual é a senha dela, a maquininha tava aceitando o cartão e tava dando senha inválida. O problema não é meu, dei essa opção para ela, mas o certo é ligar para o suporte, né."

Em uma entrevista por telefone, o entregador, um dos maiores youtubers do nicho, fala mais sobre as dificuldadesfreebet parimatchcomunicação.

"Alguns suportes são rápidos. Mas no iFood, por exemplo, deixa muito a desejar, demora para responder e é mais por mensagem", explica.

"Muitos descontam o valor porque o cliente falou que não recebeu. Aí é tudo por email e tem que esperar eles retornarem. De repente, deu pau no app, constou que não foi entregue, se o cliente falou que não recebeu, não sei como você faz…"

Print da página do Tavares 160

Crédito, Reprodução YouTube

Legenda da foto, Tavares 160, um dos maiores youtubers do nicho, tem 407 mil seguidores

Procurado, o iFood informou que tem dois canaisfreebet parimatchatendimento: "o chat, que tratafreebet parimatchsituações mais urgentes, e o ticket, que permite que eles tratemfreebet parimatchqualquer outro tema que não esteja relacionado ao pedidofreebet parimatchandamento".

Essa discussão não faz muito sentido, pondera Marcio Juvino, do canal Entregadorfreebet parimatchLanches, que tem 17,5 mil inscritos. Os motoboys nunca tiverem chefe, diz, e as empresas só incluíram essa vantagemfreebet parimatchseus anúncios. Foi justamente isso que o atraiu.

"Quem não quer fazerfreebet parimatchrotina? Dá a impressãofreebet parimatchque você tá mais livre."

Afinal, conclui, a escolha éfreebet parimatchcada um. Afreebet parimatchfoi não largar o trabalho com carteira assinada na áreafreebet parimatchlogística e encarar as entregas como um extra. Conta que "não teve coragem"freebet parimatchpedir demissão, porque seria necessária alguma educação financeira para compensar as perdasfreebet parimatchINSS, fundofreebet parimatchgarantia e férias.

"Mas com planejamento, o cara consegue se manter tranquilo."

Ele é a favor que as empresas paguem o INSS dos parceiros, mas como isso não deve acontecer, aconselha que não deixemfreebet parimatchcontribuir para a Previdência. Aos olhosfreebet parimatchMarcio, não dá para confiar nos aplicativos. Um dia você pode acordar e não conseguir mais logar - e o algoritmo não costuma dar explicações.

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"PROMOÇÃO para cidadefreebet parimatchSão Paulo! Hoje, todas as rotas entre 8:00 e 9:59 terão um adicionalfreebet parimatchR$ 4. Aproveite para ganhar mais!"

Enquanto Tavares e outros youtubers gravam seus vídeos, ficamfreebet parimatcholho na tela do celular. Em alguns apps, os parceiros têm um tempo determinado para chegar aos restaurantes antesfreebet parimatcho pedido passar para outros. Eles também recebem mensagens dos apps e perguntas dos clientes ao longo do dia.

"Oi, vai demorar muito?"

As falhasfreebet parimatchcomunicação parecem não valer para o lado das empresas. E não era isso que Mateus esperava.

Bombeiro civil, ele sempre trabalhou com carteira assinada e não gostavafreebet parimatchseguir uma hierarquia ou dar explicações quando chegava atrasado.

Depoisfreebet parimatchperder o emprego, há dois anos, pensoufreebet parimatchcomeçar nos aplicativos. A promessafreebet parimatchganhar mais dinheiro foi o que lhe convenceu. Nafreebet parimatchantiga vaga, o salário erafreebet parimatchR$ 1,5 mil enquanto entregadores diziam fazerfreebet parimatchR$ 3 mil a até R$ 8 mil por mês.

"Me seduziu", conta ao telefone.

Marlon Luz

Crédito, Felix Lima/BBC News Brasil

Legenda da foto, Loja do Pontofreebet parimatchApoio Motorista Top,freebet parimatchpropriedadefreebet parimatchMarlon, vendefreebet parimatchbalas sortidas a fonesfreebet parimatchouvido

Desde então, as coisas mudaram. O chefe está mais presente do que imaginava, mas não como gostaria. Se o cliente não aparecer para receber o produto, Mateus deve levá-lofreebet parimatchvolta à central, sem receber nada pelos quilômetros rodados. Se reclamar, diz, pode ser bloqueado.

"É uma relaçãofreebet parimatchfuncionário e patrão: ou me obedece ou vai sofrer as sanções, que é o desconto ou o bloqueio."

Esta não é uma percepção individual. Professores entrevistados pela BBC News Brasil mencionam a existênciafreebet parimatchum novo tipofreebet parimatchchefe, sem rosto nem escritório, e que ainda exerce seu poder sobre os trabalhadores. Alguns o chamamfreebet parimatchalgoritmo.

As empresas responsáveis pelos aplicativos se apresentam como ferramentas que ligam oferta e demanda e por isso defendem não ter qualquer vínculo empregatício com seus parceiros. Mas como os parceiros disseram a reportagem, mesmo sem a figura formalfreebet parimatchum superior, o trabalho mantém exigências.

Essa contradição será percebida com o passar do tempo, argumenta o professorfreebet parimatchsociologia da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB) e membro do grupo Trabalho, Trabalhadores e Reprodução Social da Universidade Federal da Bahia (UFBA) Bruno Durães.

"Nenhuma formafreebet parimatchtrabalho fica misteriosa durante anos", diz. "Mesmo que estejamos lidando com uma realidade inovadora, vivemos uma lógicafreebet parimatchcontrole nunca antes vista. Com o algoritmo, há um controle sobre todos os detalhes do trabalho."

Protestofreebet parimatchmotoristasfreebet parimatchUberfreebet parimatchNova York

Crédito, Drew Angerer/Getty Images

Legenda da foto, Protestofreebet parimatchmotoristas contra appsfreebet parimatchNYfreebet parimatch2019; neste ano, lei que obriga Uber a contratar trabalhadores foi aprovada na Califórnia

O mistério a que Durães se refere começa a ser desvendadofreebet parimatchoutros países. Em setembro, a Assembleia Legislativa da Califórnia aprovou uma lei que obriga as empresas Uber e Lyft a contratarem seus motoristas como empregados. O texto deve entrarfreebet parimatchvigorfreebet parimatchjaneirofreebet parimatch2020.

No Brasil, a Justiça havia negado a existênciafreebet parimatchvínculo empregatício entre parceiros e aplicativos até que,freebet parimatchagosto do ano passado, a 15ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho,freebet parimatchSão Paulo, a reconheceu no casofreebet parimatchum motorista da Uber. A relatora, desembargadora Beatrizfreebet parimatchOliveira Lima, afirmou que o homem não tinha verdadeira autonomia, porque precisava seguir as regras impostas pela empresa.

No entanto,freebet parimatchsetembro deste ano, o Superior Tribunalfreebet parimatchJustiça voltou a negar a existênciafreebet parimatchum vínculo trabalhista. Apesarfreebet parimatcha decisão corresponder a um processo específico e não ter aplicação automática a outros, ela pode servirfreebet parimatchprecedente.

Enquanto isso, as companhias continuam sabendo tudo sobre seus colaboradores, lembra o professor Durães. O trajeto, o tempo, os desvios, a localização — detalhes a que nenhum superior jamais teve acesso. Basta que o aplicativo esteja ligado.

Ganhe pelo seu esforço

"Peraí que tão tentando ficar na minha vaga aqui, só um minuto", Mateus pede uma pausa na entrevista por telefone. Ao fundo, os barulhos do trânsitofreebet parimatchSão Paulo — buzinas, às vezes uma sirene, o ruído constante dos carros no asfalto.

"Eu já tava aqui, com licença, eu tava aqui antes…", ele diz para alguém.

A ligação é interrompida.

Quando atende o celular, vinte minutos depois, Mateus conta, a voz abafada, que se meteu numa discussão. Um motorista queriafreebet parimatchvaga e o ameaçou dizendo ter uma faca.

"É como eu te falei", ele continua, sem mudar o tom. "No início, a Rappi chegou no Brasil com toda essa proposta: você é seu próprio chefe, faz seu horário, e tinha vários subsídios para encher os olhos dos empregados, mas isso não se sustentou."

Os ganhos já foram bons, conta Mateus. Ele chegou a tirar R$ 3 mil por mês, quando as promoções ajudavam a complementar a taxa das entregas. Nessa época, considerou os valores pagos justos, mas com o tempo eles foram diminuindo. Hoje, consegue entre R$ 1,2 mil e R$ 1,5 mil por dez horas na rua.

Segundo ele, no ano passado, a Rappi pagava uma taxa mínimafreebet parimatchR$ 8,90, valor que teria caído para R$ 4,20.

Questionada sobre as tarifas, a empresa não deu uma resposta objetiva, mas informou que:

"O valor do frete é calculado com basefreebet parimatchdiversas variáveis, como clima, dia da semana, horário, zona da entrega, distância percorrida e complexidade do pedido, a fimfreebet parimatchproporcionar equilíbrio entre oferta e demanda."

Mateus demorou a perceber a queda nas tarifas, mas a certezafreebet parimatchque não poderia contar com os aplicativos veio rápido.

Na segunda semanafreebet parimatchentregas,freebet parimatch2017, sofreu um acidente que lhe custou R$ 2,5 milfreebet parimatchconsertosfreebet parimatchmoto, um susto e uma mensagem automática.

Como havia atendido poucos pedidos na plataforma até então, precisou voltar a trabalhar rápido — e por mais horas — para compensar o ocorrido. Foi um mês difícil.

"Precisei comer biscoito por semanas pra economizar. Mandei um email falando do acidente, mas eles disseram que sou MEI [Microempreendedor Individual] e não tenho vínculo nenhum. Era daquelas mensagensfreebet parimatchrobô. A partir disso fui tomando consciência da relação que ia ter ali. Vi que era só eu."

Mateus não conhecia bem esse tipofreebet parimatchtrabalho. Sempre teve carteira assinada e escreveu para a empresa na expectativafreebet parimatchque receberia algum amparo. Mesmo com a negativa, continuou online. Era a única opção, ele diz.

Grupofreebet parimatchWhatsappfreebet parimatchentregadoresfreebet parimatchapp

Crédito, Reprodução Whatsapp

Legenda da foto, Em gruposfreebet parimatchWhatsApp, entregadores criticam abertamente os aplicativos

Os motoristas e entregadores entrevistados, alémfreebet parimatchmembrosfreebet parimatchtrês gruposfreebet parimatchWhatsApp acompanhados pela reportagem, também falamfreebet parimatchuma diminuição das tarifas e do númerofreebet parimatchpedidos, o que levou a jornadas mais longas para ganhar o mesmo valor do começo.

"Esse negóciofreebet parimatchganhar dinheiro quando eu quisesse -freebet parimatchdia,freebet parimatchnoite,freebet parimatchmadrugada - foi bom no início. Hoje sou obrigado a sair todo dia, porque senão não consigo me sustentar", diz Mateus.

Isaías não recebia um pedido havia cinco dias quando a reportagem lhe telefonou. Todas as manhãs durante as duas primeiras semanas como entregadorfreebet parimatchaplicativo pedalava quatro quilômetrosfreebet parimatchsua casa até um shoppingfreebet parimatchFortaleza, onde esperava por uma chamada, ao ladofreebet parimatchoutros ciclistas. O começo foi bom, mas depois tudo parou.

"Nos primeiros dias recebia uma médiafreebet parimatchseis, sete pedidos. Agora tô rodando e não chega nenhum. Tem outras pessoas que ficam no shopping e tão na mesma situação."

Desempregado há um ano, Isaías,freebet parimatch20 anos, era auxiliarfreebet parimatchcozinhar. Como estava difícil voltar para o mercado, seguiu o conselhofreebet parimatchum primo e foi a uma palestra do iFood. Hoje, levanta hipóteses para entender a faltafreebet parimatchpedidos. Acha que pode ser culpafreebet parimatchuma atualização do celular ou da concorrência.

"É muita gente para pouco serviço. Vejo muito entregador na cidade, principalmentefreebet parimatchmoto."

Procurado, o iFood não respondeu se há um desequilíbrio entre o númerofreebet parimatchpedidos efreebet parimatchparceiros disponíveis:

"A empresa esclarece ainda que o númerofreebet parimatchpedidosfreebet parimatchcada parceirofreebet parimatchentrega é resultado da dinâmica do mercado local."

Com a multiplicação das mochilas verde-limão, rosas e vermelhas pelas cidades brasileiras, não é só Isaías que pensa haver gente demais nos apps. A tese é repetida por outros entrevistados:

Se maisfreebet parimatchcinco milhõesfreebet parimatchbrasileiros estão inscritos nessas plataformas, há lugar para todos?

"É…", Marlon diz do outro lado da linha, na entrevista por telefone que antecedeu a visita a seu escritório. Para ele, as plataformas não paramfreebet parimatchaceitar colaboradores porque qualquer tipofreebet parimatchseleção ajudaria a comprovar um vínculo empregatício entre aplicativo e parceiro.

Segundo o youtuber, a superlotação não é um problema dos apps, mas do desemprego, "o grande vilão".

"O ideal é que tivesse menos motorista, mais gente com emprego."

Entre os milhões inscritosfreebet parimatchaplicativos, é possível distinguir alguns perfis. Há os que recorreram ao serviço por faltafreebet parimatchalternativa, os que têm trabalho, mas desejam reforçar a renda e os que largaram o emprego para tornarem-se apenas motoristas ou entregadores.

De acordo comfreebet parimatchuma pesquisa feita neste ano pela Fundação Institutofreebet parimatchAdministração, escolafreebet parimatchnegócios fundada por professores do Departamentofreebet parimatchAdministração da USP, 53,8% dos 1,5 mil entregadores entrevistados não têm outra atividade profissional fora dos aplicativos. Deles, 44,3% não trabalhava com delivery antes.

Pedro Roseno

Crédito, Reprodução Youtube

Legenda da foto, Em vídeo chamado "Estou perdendo dinheiro?", Pedro diz que poderia ganhar mais se largasse o emprego fixo

"Vc é inspiração pra muita gente, eu tbm to querendo comprar minha moto minha vontade aumentou mais ainda quando vc comprou a sua, parabéns que Deus te dê muito mais coisas nafreebet parimatchvida e obrigado pela inspiração!!!" foi o comentário que o usuário Isaac Blitz deixou no vídeofreebet parimatchque Pedro Roseno anunciafreebet parimatchdecisãofreebet parimatchsair do trabalho com carteira assinada para dedicar-se ao Uber Eats.

Em "Estou perdendo dinheiro", publicado há três meses, ele argumenta que o tempo gasto como funcionáriofreebet parimatchestacionamento é um desperdício, porque poderia ganhar mais se trabalhasse apenas com entregas.

Não é raro que pessoas escrevam para Pedro perguntando se também devem largar seus empregos.

No quarto-sala onde a lâmpada amarela mal ilumina seu rosto, Pedro estáfreebet parimatchsilêncio, os olhos voltados para cima.

"O que você diz a elas?" é a pergunta que a reportagem acaboufreebet parimatchfazer.

"O meu objetivo é…", ele para. "Enquanto tá dando, vou largar o emprego. Por quê? Como o meu currículo é bom, eu posso mais na frente, se não der certo, procurar outro emprego", diz, com pausas nas vírgulas, como se a lógica do pensamento seguisse o ritmo da frase.

"Mas eu não aconselho ninguém a fazer isso. Que procurem outra coisa, estudar, um emprego melhor, porque o negócio é muito incerto."

Pedro Roseno

Crédito, Felix Lima/BBC News Brasil

Legenda da foto, Pessoas querem uma forma fácil e rápidafreebet parimatchfazer dinheiro, diz Pedro sobre seus vídeos

Usar os aplicativos como renda única não é a melhor alternativa, diz o professor do Insper David Kallas, especialistafreebet parimatchGestão Estratégica. Para ele, a conta não fecha. Se alguém que trabalha exclusivamente como motorista ou entregador colocasse seus gastos e ganhos na ponta do lápis, argumenta, dificilmente conseguiria trocarfreebet parimatchcarro.

O professor diz que os apps funcionam quando são usados como complementofreebet parimatchrenda, por duas ou três horas por dia. Essa seria uma opção viável para o modelofreebet parimatchnegócio.

"Mas aqui a grande entradafreebet parimatchpessoas é reflexo do desemprego. Elas usam o plano B como plano A."

No Brasil, continua Kallas, a necessidade une-se à dificuldadefreebet parimatchfazer contas. A maioria dos youtubers menciona gasolina, multas e impostos, mas poucos incluem a perdafreebet parimatchvalor do carro e ninguém menciona o desgastefreebet parimatchquem dirige, o que pode levar a despesas com exames e remédios no futuro.

Cleber, que pediu a selfie com Marlon no pontofreebet parimatchapoio, saiu do empregofreebet parimatchR$ 1,8 mil para ganhar R$ 2,8 mil na Uber. Seu raciocínio é simples: agora tem mais dinheiro no bolso. No entanto, não citou o fundofreebet parimatchgarantia que perdeu, alémfreebet parimatchsuas férias e as contribuições previdenciárias. Fazia oito meses que trabalhava até 18 horas por dia.

"Por enquanto, está tudo certo. Meu corpo é forte", ele disse, confiante.

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Marlon não desenvolve apenas estratégicas para ajudar seus inscritos, como ele mesmo tira seu sustento dessas dicas. Todos os youtubers entrevistados fazem algum dinheiro com a produçãofreebet parimatchconteúdo.

Seus ganhos costumam virfreebet parimatchduas fontes: a monetização dos vídeos na própria plataforma e os códigosfreebet parimatchindicação. Motoristas e entregadoresfreebet parimatchaplicativo recebem um código que podem passar a pessoas interessadasfreebet parimatchse cadastrar nos apps. Se essas pessoas se inscreverem e completarem um determinado númerofreebet parimatchcorridas, o dono do código recebe um valor, que pode chegar a R$ 500, segundo relatos.

Não é estranho que depois do "Oi, motoras! Tudo bem?" do começo dos vídeos venha um recado como este: "e usem meu código aqui embaixo para se cadastrar!"

Print da telafreebet parimatchcelular com o aplicativo Uber ligado

Crédito, Arquivo pessoal

Legenda da foto, Ex-youtuber diz que poderia ter ganhado maisfreebet parimatchR$ 67 mil ao divulgar códigofreebet parimatchindicação da Uber

Um ex-youtuberfreebet parimatchentregas, que deixou os aplicativos ao conseguir um emprego formal, diz que chegou a ter maisfreebet parimatchR$ 70 mil para receber da Uber ao divulgar seu códigofreebet parimatchum vídeo. Gravadasfreebet parimatch2017, as imagens somam hoje 102 mil visualizações. O entregador diz que não recebeu o dinheiro, porque a empresa informou que a divulgação do código feriria suas regras.

Procurada, a Uber respondeu com um link para seu regulamento. Um dos itens diz o código não pode ser anunciado publicamente.

Apesar da proibição, alguns dos maiores nomes do gênero continuam a usar esse recurso. Um deles, que não quis dar entrevista e por isso não será identificado aqui, tem maisfreebet parimatch450 mil inscritos e anuncia seu código a cada postagem. Depois do logofreebet parimatchentrada do canal, escuta-se a mesma gravação: "Trabalhe como entregador no aplicativo Uber Eats. Use meu código para se cadastrar na plataforma, link na descrição".

Short presentational grey line

Quando deixamos o pontofreebet parimatchapoio Motorista Top, já é fimfreebet parimatchtarde. Preso no trânsito lento ao redor do aeroportofreebet parimatchCongonhas, Marlon fala sobre o encontro com Cleber, o rapaz que largou o emprego depoisfreebet parimatchassistir a seus vídeos.

"É muito comum eu ouvir 'virei motorista por tua causa!', esse tipofreebet parimatchcoisa. O YouTube traz essa celebridade, mas para mim é um jeitofreebet parimatchter um reconhecimento do trabalho. Tu viu o olhinho daquele Cleber, né?", ele pergunta, os seus aparecendo no retrovisor, orgulhosos. "Quando a pessoa vem e tá com aquele arfreebet parimatchfelicidade por me conhecer presencialmente é porque eu inspirei elefreebet parimatchalguma forma."

A reportagem questiona se Marlon se sente responsável por pessoas como Cleber.

Ele abaixa o quebra-sol para proteger os olhos da luz alaranjada que invade o carro. O motorista continua encarando a filafreebet parimatchfrente, dezenasfreebet parimatchveículos movendo-sefreebet parimatchcâmera lenta, quando responde que, sim, bastante, e por isso oferece o melhor conteúdo possível, para que alcancem o sucesso.

E se não der certo? a BBC insiste. Passamosfreebet parimatchfrente ao aeroporto, com táxis à espera e um entra e saifreebet parimatchpessoasfreebet parimatchoutros carros.

"Fico triste", ele fala, sem alterar a voz. "Mas sempre tento ajudar. Sou uma pessoa que gostafreebet parimatchajudar."

Liberdade, igualdade e flexibilidade

No banner expostofreebet parimatchum pontofreebet parimatchônibus, um homem negro abraçafreebet parimatchguitarra no que parece um bar vazio. Lê-se: "eu dirijo para me dedicar à música". Embaixo, um endereço: uber.com/dirija.

Liberdade, autonomia e individualidade são os principais conceitos por trás do discurso das empresasfreebet parimatchplataforma. Em peças publicitárias, elas convidam possíveis parceiros a serem chefesfreebet parimatchsi mesmos, donos dos seus próprios horários, livres para escolher o quanto querem trabalhar, deixando tempo para outras partes da vida.

Mas não foi Uber, Rappi, iFood, 99 ou outras empresas do ramo que inventaram essas ideias.

Professoresfreebet parimatchsociologia do trabalho ouvidos pela BBC News Brasil apontam suas origens históricas, que começam na Escola Austríacafreebet parimatchEconomia, escolafreebet parimatchpensamento econômico desenvolvida no final do século 19. Base do pensamento neoliberal, ela introduz a ideia da pessoa como empresafreebet parimatchsi mesmo e, portanto, independente do Estado.

Publicidade da Uberfreebet parimatch2017

Crédito, Reprodução

Legenda da foto, Publicidade da Uberfreebet parimatch2017, anunciando vantagens do trabalho por app

"Para autores do neoliberalismo, o emprego é visto como uma prisão, porque impede que as pessoas desenvolvam suas capacidades e gerem riquezafreebet parimatchcima disso", diz Bruno Cardoso, professor adjunto do Programafreebet parimatchPós-Graduaçãofreebet parimatchSociologia e Antropologia da Universidade Federal do Riofreebet parimatchJaneiro (UFRJ).

Conceitos como esses vêm mudando a forma como trabalhamos há pelos menos 40 anos.

O pontofreebet parimatchmudança, explicam os entrevistados, foi o Toyotismo, um modofreebet parimatchprodução que sucedeu o Fordismo nas fábricas a partirfreebet parimatch1970. Aplicado inicialmente no Japão, o sistema rompeu com a produçãofreebet parimatchmassa e passou a produzirfreebet parimatchacordo com pedidos já feitos. Dessa forma, tanto a matéria-prima quanto a mãofreebet parimatchobra serviam às necessidades do momento.

Para isso, o Toyotismo exigia flexibilidade dos trabalhadores. Ao contrário do Fordismo,freebet parimatchque cada um realizava uma única função, no novo modelo o mesmo funcionário era responsável por várias tarefas. Assim, vieram também mudanças nos direitos dos empregados, com contratosfreebet parimatchmeio período, por exemplo, alémfreebet parimatchum aumentofreebet parimatchterceirizações.

Em paralelo a essas transformações, fortaleceu-se um discurso que ligava flexibilidade à liberdade, ao poder escolher, o que era um desejos dos trabalhadores da época, como explica a professora do Departamentofreebet parimatchPós-Graduação do Institutofreebet parimatchCiências Humanas da Universidade Federalfreebet parimatchJuizfreebet parimatchFora (UFJF) Ana Claudia Moreira Cardoso.

"Era um pedido real por autonomia e não só dos trabalhadores. É só pensarfreebet parimatchmaiofreebet parimatch1968 na França. Toda a sociedade saiu à rua contra o autoritarismo, as relações verticais, contra não ter voz."

Se o Toyotismo começou nos anos 1970, no Brasil as mesmas ideias apareceram a partirfreebet parimatch1980 e com forçafreebet parimatch1990, com uma resposta à queda nas vendas.

Segundo Cardoso, a novidade combinou com o posicionamento do movimento sindical, que reclamava da hierarquia na indústria.

"Foi criando-se essa concepçãofreebet parimatchque ser flexível é ter liberdade, autonomia. Flexibilidade, autonomia e participação acabaram tornando-se sinônimos, o que não era real porque ficou flexível para o empresário, que era mais forte, mas as desvantagens caíram para o lado do funcionário."

Trabalhadorfreebet parimatchfábrica

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, Mudanças nas fábricas inauguraram transformações no mercadofreebet parimatchtrabalhofreebet parimatch1970

Mas como essas tendências chegaram aos aplicativos?

As mudanças nas fábricas e o avanço das máquinas, que substituíam cada vez mais gente, levaram a cortesfreebet parimatchvagas na indústria. Sem seus empregos, ex-operários buscaram trabalho no comércio e nos serviços, num processo que ficou mais intenso a partir dos anos 2000. Nessas áreas, muita mãofreebet parimatchobra humana ainda era necessária, porque a inovação era menor.

De acordo com os entrevistados, o que vemos hoje é uma combinação dessas modificações no mercadofreebet parimatchtrabalho com uma sociedade cada vez mais digital. A internet, como diz a professora Cardoso, passou a mediar todas as relações, da educação à paquera, então usar aplicativos para trabalhar também tornou-se natural. É só mais uma possibilidade no smartphone.

Ao oferecer essa possibilidade, as empresasfreebet parimatchtecnologia se apropriam do discursofreebet parimatchque flexibilidade é igual a liberdade, inclusive para se definir não como empregadoras, mas apenas intermediárias entre alguém que demanda um serviço e outro que o oferece.

A ideiafreebet parimatchligar pessoas com necessidades e ofertas compatíveis não é nova. Mas ela nasceu com intenções nobres, longefreebet parimatchreceitas bilionárias.

Homem mexefreebet parimatchcelular dentrofreebet parimatchcarro

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, Mudanças no mercadofreebet parimatchtrabalho e discursofreebet parimatchliberdade chegaram aos apps

Um artigo publicadofreebet parimatch2016 pelo centrofreebet parimatchpesquisa da Comissão Europeia, órgão que representa os interesses da União Europeia, diz que esquemasfreebet parimatchcompartilhamentofreebet parimatchcarros foram lançados pela primeira vezfreebet parimatchZurique, na Suíça,freebet parimatch1948, pelas mãos dos cidadãos. Ideias como essa tornaram-se mais viáveis com a expansão da internet e popularizaram-se nos Estados Unidos nos anos 2000. Na época, elas ainda eram espontâneas, estabelecendo-sefreebet parimatchpessoa para pessoa.

"Em inglês, começou com o conceito do que é meu é seu. 'Tenho esse cortadorfreebet parimatchgrama, não vou usá-lo, então você pode usá-lo'. Não tinha dinheiro envolvido, era uma relaçãofreebet parimatchvizinhos, amigos, conhecidos", explica Tozi.

Para o professor, as empresas teriam cooptado a noçãofreebet parimatcheconomia solidária e imposto uma ordem vertical a uma relação que era horizontal, entre iguais, e sempre existiu - como um vizinho que leva o outro ao aeroporto por um trocado ou uma ajudafreebet parimatchcasa.

Assim, a "sharing economy" - a economia do compartilhamento - virou "gig economy", também conhecida como economia dos bicos.

A última teria se associado aos ideaisfreebet parimatchigualdade da primeira, mas,freebet parimatchvezfreebet parimatchpromover a troca diretafreebet parimatchbens e serviços pela internet, "acabou se convertendo na oferta generalizadafreebet parimatchtrabalhos mal pagos e sem qualquer segurança previdenciária", como escreveu o economista e professor da Universidade Federalfreebet parimatchSão Paulo (USP) Ricardo Abramovay, no prefácio do livro Uberização - A Nova Onda do Trabalho Precarizado,freebet parimatchTom Slee.

A cultura que nos marcou e ainda nos marca segue a seguinte lógica: estudar, se formar, trabalhar e se aposentar. No entanto, desde os anos 1970, com as transformações do Toyotismo, o modelo que conhecemos estáfreebet parimatchcrise.

Para o professorfreebet parimatchsociologia da Universidade Estadual Paulista (Unesp) Giovanni Alves, o discursofreebet parimatchliberdade ajuda as pessoas a aceitar essa nova realidade.

"O discurso ajuda o sujeito a se adaptar: você não vai mais dependerfreebet parimatchuma organização, agora você pode ser empreendedor, você é o responsável. Isso casa com um anseio verdadeiro das pessoas, que querem ter liberdade."

Ter o poder da escolha, argumenta o professor, tem um grande peso num mundofreebet parimatchque a maioria dos trabalhadores é reprimido pelo chefe. Depois do feudalismo, das monarquias e da escravidão, foi o capitalismo que inaugurou a ideologia da liberdade, ele explica,freebet parimatchpermitir a alguém gerir suas decisões.

"A escolha é real, porque você vai escolher entre estar no aplicativo ou num escritório. Agora, quando a realidade bate a porta? As pessoas têm uma renda, mas para isso precisam se matarfreebet parimatchtrabalhar."

Smartphonefreebet parimatchcarro

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Legenda da foto, Críticas dos cientistas sociais recaem sobre modo como a tecnologia é utilizada nos apps

As críticas dos cientistas sociais não recaem à tecnologia, mas a forma como ela é usada pelas empresas num cenáriofreebet parimatchmilhõesfreebet parimatchdesempregados. É inegável que a relação entre app e parceiros tem seus pontos positivos, porque eles dão oportunidades a trabalhadores não teriam outra maneirafreebet parimatchlevar dinheiro para casa, pondera o antropólogo e sociólogo da Escola Superiorfreebet parimatchPropaganda e Marketing (ESPM) Fred Lucio. Mas ele afirma que é preciso analisá-la com olhar crítico.

Por não arcar com custos trabalhistas, por exemplo, as empresas poderiam dar uma remuneração maior aos seus colaboradores, alémfreebet parimatchoferecer garantias, defende o professor.

"Elas ficam com um percentual grande do valor e ao mesmo tempo não oferecem nenhum tipofreebet parimatchseguridade social. As pessoas estão fazendo duas, três jornadas, para ter uma renda razoavelmente boa."

Mesmo que os apps tragam novidades promissoras — oferecer possibilidadesfreebet parimatchemprego efreebet parimatchdesenvolvimentofreebet parimatchuma nova carreira, no caso dos youtubers —, diz Lucio, não se pode ignorar que as oportunidades se dãofreebet parimatchcondições precárias, pelo menos para a maioria das pessoas. Para cada um que tem sucesso, afirma, há uma multidão "camelando".

"Tem elementos interessantes, como a criaçãofreebet parimatchespaços para as pessoas mostrarem seus dotes, mas os aplicativos usam dessa lógica para ganharfreebet parimatchcimafreebet parimatchuma massa que procura alternativas para sair da crise."

Isso não significa que é preciso demonizar a tecnologia e as empresas. O cenário digital, afirma o antropólogo, chegou para ficar, mas é preciso entender como estabelecer relaçõesfreebet parimatchtrabalho justas dentro dele e fazer pressão — a partir do Estado efreebet parimatchentidades da sociedade civil — para que elas sejam postasfreebet parimatchprática.

Cada um com afreebet parimatchculpa

VOCÊ ESTÁ TRABALHANDO DE FORMA ERRADA NA UBER 99POP

Se você faz isso, pare AGORA, antes que seja tarde demais!

Uber dá certo só dependefreebet parimatchvocê.

Janeiro fraco? Só pros fraco !!! #motorista #uber #manaus

As frases acima são títulosfreebet parimatchvídeos encontradosfreebet parimatchuma busca rápida no YouTube. Além da ideiafreebet parimatchautonomia, explicada acima, elas vendem algo mais: a culpa.

Muito do conteúdo exibido online responsabiliza as pessoas por seu fracasso. Os vídeos listados, por exemplo, culpam os motoristas por não trabalharem mais, por não agradarem todos os clientes, por não conhecerem as plataformas a pontofreebet parimatchevitar tarifas maiores e até por não usarem roupa social, o que atrairia passageiros mais pobres e mal-educados.

"E eu te garanto, se você está cometendo um desses cinco erros que eu vou falar nesse vídeo, você está rasgando dinheiro ao sair pra rua", diz um dos youtubers, apontando para a câmerafreebet parimatchdentro do carrro, enquanto uma melodiafreebet parimatchreggae toca ao fundo.

Outros fatores, como a política das plataformas e a própria situação do país, não são considerados com cuidado. No fim, tudo depende do motorista.

Mãos no volante

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Legenda da foto, Vários vídeos no YouTube culpam motoristas por seu fracasso nas plataformas

"As pessoas não pensam que alguns problemas devem ser resolvidos coletivamente. A própria lógica dos aplicativos coloca os trabalhadores como concorrentes, porque quanto mais entregador tiver, menos corridas cada um vai fazer", diz o professor Bruno Cardoso, do Programafreebet parimatchPós-Graduaçãofreebet parimatchSociologia e Antropologia da Universidade Federal do Riofreebet parimatchJaneiro (UFRJ).

Nessa linhafreebet parimatchraciocínio, tudo seria individual, das possibilidadesfreebet parimatchfracasso às chancesfreebet parimatchsucesso. Seria algo como: "eu nunca vou sofrer um acidente, mas sou eu que vou ficar rico!".

Isso faz partefreebet parimatchuma ideologia contraditória, diz Giovanni Alves. A liberdade do trabalhador, explica, é real, porquefreebet parimatchtese ele pode fazer suas escolhas, mas, dadas as condições — desemprego, faltafreebet parimatchalternativas, um discurso que pode iludir —, ela não existe. Além disso, ela prometeria autonomia e felicidade ao mesmo tempofreebet parimatchque conduziria os trabalhadores para vagas cada vez mais precárias.

Professorfreebet parimatchsociologia do trabalho da Universidade Estadualfreebet parimatchCampinas (Unicamp) e um dos maiores nomes do Brasil na área, Ricardo Antunes descreve o momento atual como a voltafreebet parimatchformas primitivasfreebet parimatchtrabalho.

"O trabalho desregulamentado não é novo, as mulheres trabalhavam 16 horas por dia na revolução industrial, mas agora isso vem com a tecnologia do mundo digital."

O momento que vivemos, Antunes argumenta, tem semelhanças com as primeiras formas do capitalismo, como a exploraçãofreebet parimatchoperários na Inglaterra, mas exibe uma nova roupagem.

Parte desse embrulho moderno estaria no vocabulário. Antunes diz que palavras como "metas", "colaboradores" e "parceiros" seriam rótulos que ocultam seu verdadeiro significado. Um parceiro, afirma, não tem os mesmos direitos e proteçõesfreebet parimatchum funcionário. Mas também não é amigo do dono da empresa, como o nome pode sugerir.

"Esses professores, especialistas entre aspas, não concordo com eles, porque veemfreebet parimatchfora. Analisar o trabalho dos outros é fácil", diz Marcio Juvino, o Entregadorfreebet parimatchLanches, ao telefone.

Ele aceita a visão dos "especialistas'freebet parimatchalguns pontos. Sim, o trabalho não é fácil e há muitos riscos, mas essa é a tendência do mercado daqui para frente, Marcio responde. Seu argumento acabafreebet parimatchum lugar familiar: "ninguém é obrigado a fazer, faz quem quer".

"Não desisti, voltando às entregas" é o título do vídeo que Marcio publicou há três meses no seu canal, que tem 17 mil seguidores.

"Fala aí, rapaziada! Sejam bem-vindos a mais um vídeo no canal. Eu sou o Entregadorfreebet parimatchLanches, manos. Tô voltando depoisfreebet parimatchtanto tempo e vou explicar o que aconteceu."

Em "Não Desisti", ele conta que um episódiofreebet parimatchdepressão o fez dar uma pausa das plataformas, que complementam seu salário.

"Com a obra, o trabalho, eu saturei, sabe? O negócio foi tão pesado que eu sinceramente não sei o que ocasionou. Teve um gatilho, claro, mas...é normal, é o estresse do dia a dia."

Ele fala enquanto desvia dos carros num engarrafamentofreebet parimatchSão Paulo, guidão movendo-sefreebet parimatchum lado para o outro para seguir no corredor estreito entre as luzesfreebet parimatchfreio.

No final, diz que está feliz por voltar. Fez duas entregas naquela noite, cada umafreebet parimatchR$ 10.

"Tem muito nego nos gruposfreebet parimatchFacebook, (falando) que os caras estão desvalorizando a categoria dos motoboys, fazendo entregafreebet parimatchR$ 5, mas, mano, fazendo entregafreebet parimatchR$ 5 foi que consegui chegar ao meu maior objetivo", ele diz, se referindo a construção dafreebet parimatchcasa, enquanto a câmera mostra as ruasfreebet parimatchSão Paulo, luzes e engarrafamento, à noite.

Cleber e Marlon Luz

Crédito, Felix Lima/BBC News Brasil

Legenda da foto, Para complementar a renda, Cleber (esq.) vende perfumes aos passageiros

Um paísfreebet parimatchinformais

Em seu carro, estacionado no Pontofreebet parimatchApoio Motorista Top, Cleber tem uma loja. Ele estica o braço direito, amassando a camisa azul-claro, para alcançar o porta-luvas. Dali, tira pequenos frascosfreebet parimatchvidro. São os perfumes que oferece a seus passageiros, caso perguntem por que ele cheira tão bem, conta, ao mostrar as embalagens. Não há nada no regulamento da Uber que impeça vendafreebet parimatchprodutos.

"Cada um é R$ 36. Mostro para o pessoal com mais dinheiro, da Bela Cintra, do Centro, (em São Paulo)."

O Brasil tem um históricofreebet parimatchinformalidade que faz com que o trabalho por aplicativo não pareça tão estranho, dizem os professores entrevistados pela BBC News Brasil.

Filhos e netosfreebet parimatchempregadas domésticas, vendedores ambulantes, camelôs, feirantes e outras categorias tão comuns no país, o motorista ou entregador, principalmente sefreebet parimatchclasses mais baixas, acharia natural não ter um vínculo formal com a empresa e ganhar pelo seu esforço. Muitas vezes, ponderam os especialistas, eles até preferem assim.

O gosto do brasileiro pelo trabalho informal têm suas origens na escravidão. Os "bicos" foram a primeira amostrafreebet parimatchliberdade para os negros.

O professorfreebet parimatchSociologia da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB) Bruno Durães conta sobre a categoria dos escravosfreebet parimatchganho, que ficavam nas casas dos senhores ou nas cidades, e eram postos para trabalhar na rua. Poupados das atividades pesadas dos engenhos, muitos deles conseguiam, a partirfreebet parimatchpequenas vendas e serviços feitosfreebet parimatchparalelo às ordens dos seus donos, guardar dinheiro para comprarfreebet parimatchliberdade.

"A condição escrava era a destruição do ser humano. Mas, ao mesmo tempofreebet parimatchque era a destruição, o trabalho permitia, na rua, que o escravo alcançasse autonomia por meio do seu esforço."

Assim, diz Durães, na cabeça dos brasileiros, a informalidade e o "seja seu próprio chefe" estão ligados a uma tradiçãofreebet parimatchliberdade e resistência.

Escravos no Brasil no século 19

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, Histórico da (e gosto pela) informalidade no Brasil vem da época da escravidão, diz sociólogo

Em um artigo publicado na Revista Brasileirafreebet parimatchHistória e Ciências Sociais, o pesquisador escreve como a partirfreebet parimatch1870, com a crise do regime escravista, as ruasfreebet parimatchSalvador passaram a ser um lugarfreebet parimatchliberdade para os ex-escravos.

"Em certa medida, passam a trabalhar por si e para si, (a) realizar-se no trabalho. (...) Agora o trabalhador se apropria diretamente do produto do seu trabalho, sem a figurafreebet parimatchum ser estranho para lhe tomar os produtos e comandar seu processo produtivo."

A abolição não significou o fim do trabalho precário por aqui.

Para Vera Lucia Navarro, professora da Faculdadefreebet parimatchFilosofia, Ciências e Letrasfreebet parimatchRibeirão Preto, da USP, apenas a formafreebet parimatchexploração mudou, da chibata para o cronômetro. No começo do processofreebet parimatchindustrialização no Brasil, explica, homens e mulheres chegavam a trabalhar 17 horas seguidas nas fábricas.

"Os industriais carregavam consigo a mentalidade escravocrata,freebet parimatchcasa grande e senzala. E ela ainda não foi extinta, como vimos há pouco tempo, com a dificuldadefreebet parimatchgarantir os mínimos direitos para as domésticas."

Somado aos altos índicesfreebet parimatchdesemprego, esse histórico formaria o cenário ideal para empresas como Uber, Rappi, iFood e 99 crescerem no Brasil hoje, dizem os entrevistados.

As plataformas não costumam divulgar o númerofreebet parimatchentregadores ou motoristas ativos, ou se esse grupo se multiplicou, mas a colombiana Rappi, por exemplo, que começou a operar no paísfreebet parimatchjulhofreebet parimatch2017, informa que suas entregas crescem 30% ao mês.

"No final, as empresas ganham duplamente: na faltafreebet parimatchtradiçãofreebet parimatchdireitos do Brasil - pagam qualquer valor e é isso mesmo -, e no discurso que mexe com o orgulho do povo", diz Durães.

Entregadorfreebet parimatchUber Eatsfreebet parimatchKiev

Crédito, REUTERS/Valentyn Ogirenko

Legenda da foto, Entregadoresfreebet parimatchapp reclamam do cansaço das longas jornadas

Cansaço

Mateus se sente como um fantasma. Ele, que não dá seu nome nesta reportagem, perde a identidade quando faz entregas. Torna-se mais um colaboradorfreebet parimatchjaqueta e mochila colorida nas costas, das dezenas que encontra por dia nas ruasfreebet parimatchSão Paulo.

"Acontece um processofreebet parimatchdespersonificação. Não veem a gente como humano, mas como bichos, escravos, principalmente os restaurantes."

Ele dá exemplos. Mesmo sob chuva forte, precisa esperar do ladofreebet parimatchfora pelos pacotesfreebet parimatchcomida; copos d'água são frequentemente negados e o uso do banheiro, proibido; há um olhar constantefreebet parimatchdesconfiança - "não vai furtar os lanches, viu".

Ser entregador o levou a enxergar as coisas com outros olhos. Nãofreebet parimatchdesconfiança, masfreebet parimatchdesgosto. Lembra-sefreebet parimatchquando era bombeirofreebet parimatchshoppings ou bancos, da "aurafreebet parimatchsalvador" que o uniforme lhe emprestava e do consequente respeito que inspirava nas pessoas. A mochilafreebet parimatchmotoboy não tem o mesmo efeito.

"Estou numa posição subserviente e vi um lado do ser humano que não via antes. Já peguei sobrenome dos (clientes) que me tratam mal, vou pesquisar no Facebook e são pessoas que apoiam causas sociais, esquerdistas, mas que tratam mal o empregado. É um discurso hipócrita."

Mudou a forma como os outros tratam Mateus e também como ele trata a si mesmo, "sem muita dignidade", nas suas palavras. Como trabalhafreebet parimatchdez a doze horas por dia, o pouco tempo que tem fora da cama não é suficiente para preparar almoço, jantar ou fazer qualquer outra coisa.

A faltafreebet parimatchum horário regular para comer - os horários das refeições são osfreebet parimatchmaior demanda no aplicativo - o fez passarfreebet parimatch74 kg para 65 kg nos últimos dois anos. Essas não foram as únicas transformações que notoufreebet parimatchseu corpo.

"Sou outra pessoa. Tinha uma pele mais limpa e agora meu poros são dilatados, sou queimadofreebet parimatchsol e meu cabelo cai por causa do estresse."

Eram 16h quando Mateus atendeu a reportagem e ele ainda não havia almoçado. Na rua desde as 8h, esperava o restaurante do Bom Prato, programafreebet parimatchassistência social do governofreebet parimatchSão Paulo, abrir para jantar. É que lá a comida custa R$ 1, explicou.

Empresas que participam da Associação Brasileirafreebet parimatchOnline to Offline

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Legenda da foto, Associação Brasileirafreebet parimatchOnline to Offline defende interessesfreebet parimatchempresasfreebet parimatchaplicativo

As empresas

Não há uma entidade que represente os interessesfreebet parimatchtodas as empresasfreebet parimatchplataforma, mas parte delas, como Loggi, iFood e 99, está reunida na Associação Brasileirafreebet parimatchOnline to Offline (ABO2O).

A reportagem procurou a associação para entender a visão dessas companhias sobre os assuntos discutidos acima, principalmente sobre o confronto entre o discurso divulgado por elas e a realidadefreebet parimatchtrabalho dos parceiros.

Diretorfreebet parimatchEngajamento da ABO2O, Marcos Carvalho disse que está acontecendo "uma verdadeira revolução" na forma como as pessoas se relacionam com o ambiente, não existindo mais uma diferença tão grande entre os mundos físico e digital.

"É uma quebrafreebet parimatchparadigma. O indivíduo tem uma nova formafreebet parimatchse relacionar e isso se aplica também ao sistemafreebet parimatchprestaçãofreebet parimatchserviço."

Para ele, criada nos anos 1940, a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) é antiquada e precisa ser adaptada para uma formafreebet parimatchcontratação do século 21.

No seu formato atual, mesmo com as modificações feitas pela reforma trabalhistafreebet parimatch2017, ela sobrecarregaria os empresáriosfreebet parimatchregulações e burocracias que travam os negócios.

"É muito retrógrado, emperrando o serviço."

As limitações estariam também do lado do colaborador, que ao ter registro na carteirafreebet parimatchtrabalho não desfruta da mesma liberdade oferecida pelos aplicativos. As plataformas dariam a ele a possibilidadefreebet parimatchse dedicar mais e ganhar mais,freebet parimatchacordo com seus objetivosfreebet parimatchvida. Fazer uma jornada maior por desejofreebet parimatch"escalar a classe social" é algo "normal e comum do ser humano", explica Carvalho.

"Quero trabalhar mais para comprar um imóvel ou menos, porque quero o básico, cada um tem suas ambições."

Ele cita outros dados da pesquisa sobre entregadores feita pela Fundação Institutofreebet parimatchAdministração (FIA) entre fevereiro e março deste ano: 74,6% disseram que não obrigados pelo aplicativo a realizar entregas e 87% aumentaram seus ganhos com os apps.

Outros 72,7% têm neste serviçofreebet parimatchprincipal fontefreebet parimatchrenda. Isso, para Marcos, mostraria a importância das plataformas neste momento do Brasil.

"São 13 milhõesfreebet parimatchdesempregados. Se pegar o contingentefreebet parimatchmotoristas e entregadores, são 5,5 milhões. Olha o benefício que estão trazendo para o país."

Questionamentos a essa linhafreebet parimatchraciocínio, no entanto, são feitas até mesmo por representantes do empresariado. O diretor geral do Instituto Capitalismo Consciente Brasil, Hugo Bethlem, acredita que as empresasfreebet parimatchplataforma deveriam ser mais cuidadosas ao lidar com seus colaboradores.

Ele concorda com Carvalho sobre as possibilidades que a tecnologia trouxe para os desempregados, mas considera que uma gestão mais consciente é necessária.

"Quanto mais horas eu trabalhar, mais dinheiro eu ganho, mas qual é o limite do stress? Esses bônus por entrega só olham para o entregador-empresa, não pessoa física, e põemfreebet parimatchrisco a saúde dessas pessoas."

Bethlem diz considerar os dois lados da moeda: num deles, é "super-apoiador" da economia compartilhada e prega a livre iniciativa sem intervenção do Estado; no outro, acredita que não pode haver uma pressão tão grande da empresa sobre o entregador, o que afetaria a qualidade do serviço.

Sua recomendação para o setor seria: ganhar menos para ganhar sempre.

Tais mudanças devem ser feitas pela iniciativa privada, enfatiza Bethlem, e não passar pelo poder público. Quando iFood e Loggi fecharam um acordo com a Prefeiturafreebet parimatchSão Paulo, por exemplo, para acabar com os bônus por entrega, se submeteram a uma situação desnecessária, que poderiam ter evitado se alterassem suas regras por conta própria.

"Tem que falar 'vem trabalhar comigo, porque você não vai ganhar bônus por velocidade, mas porque foi cordial'. É preciso achar outro sistema."

Homem segura carteirafreebet parimatchtrabalho

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, Perguntadas se consideram alto desemprego do paísfreebet parimatchsuas decisões, apps disseram ser opçãofreebet parimatchmomentofreebet parimatchcrise

A relação entre empresa e prestadorfreebet parimatchserviço deveria ser mais humanizada, ele argumenta.

A BBC News Brasil procurou todas as empresas citadas pelos entrevistados (99, Uber, Uber Eats, Rappi e iFood), questionando, entre outros pontos, se elas levamfreebet parimatchconsideração a realidadefreebet parimatchalto desemprego do Brasil e a busca dos apps como formafreebet parimatchsobrevivênciafreebet parimatchsuas decisões. A pergunta feita foi: num contextofreebet parimatchque milharesfreebet parimatchbrasileiros dependem das entregas para pagar o aluguel podemos falarfreebet parimatch"livre escolha"?

A maioria delas respondeu que oferece uma saída aos desempregados que, sem os aplicativos, não teriam outras opções.

Uber e Uber Eats disseram que "os entregadores parceiros são independentes, escolhem como e quando utilizarão o aplicativo como geraçãofreebet parimatchrenda". Também informaram que "no Brasil, 80% dos entregadores parceiros ativos no Uber Eats passam menosfreebet parimatch20 horas da semana online".

A 99 respondeu quefreebet parimatch"missão é fornecer oportunidadesfreebet parimatchgeraçãofreebet parimatchreceitas para os motoristas e suas famílias. Por isso, maisfreebet parimatch600 mil condutores escolheram o aplicativo como principal formafreebet parimatchganhar a vida ou como complementofreebet parimatchrenda,freebet parimatch1,6 mil cidades do país."

A Rappi informou,freebet parimatchnota, que entende a situaçãofreebet parimatchdesemprego no Brasil é "complexa" e "dependefreebet parimatchinúmeros fatores externos" à companhia.

"Porém, acreditamos que, ao oferecer às pessoas a possibilidadefreebet parimatchfazer entregas por meio da plataforma, contribuímos para que possam ganhar algum tipofreebet parimatchrenda diante desta situação."

O iFood afirmou que gera oportunidade para cercafreebet parimatch120 mil entregadores independentes que já utilizaram a plataforma: "esse número é ainda mais importante se pensarmos no cenário brasileiro do desemprego, que abrange maisfreebet parimatch13 milhõesfreebet parimatchpessoas".

Motoristasfreebet parimatchaplicativos fazem buzinaçofreebet parimatchfrente ao Congresso Nacionalfreebet parimatch2017,freebet parimatchprotesto contra projeto que regulamentaria aplicativosfreebet parimatchtransporte privado

Crédito, Marcelo Camargo/Agência Brasil

Legenda da foto, Protestofreebet parimatchmotoristasfreebet parimatch2017; para professores, trabalhadores do app estão começando a se organizar

Trabalhadores unidos?

Neste momento, há 781 mensagens não lidas nos três gruposfreebet parimatchWhatsAppfreebet parimatchentregadores nos quais a BBC News Brasil entrou. Eles reúnem 523 pessoas, principalmentefreebet parimatchSão Paulo.

Com exceçãofreebet parimatcheventuais vendasfreebet parimatchcapacetes e mochilas, as trocas são basicamente perguntas:

Já aconteceu com vocês? O que fazer? Onde fica? Quanto custa? Do que preciso para…?

De alguma forma, os motoristas e entregadores encontram maneiras para se organizar, dizem os professores entrevistados.

Mesmo que os sindicatos sejam chamados por elesfreebet parimatchcorruptos, antiquados ou atrasados, é inevitável que surjam novos modelosfreebet parimatchorganização, afirmam. Mesmo que esses não sejam muito eficazes.

O professor do Departamentofreebet parimatchGeografia do Institutofreebet parimatchGeociências da Universidade Federalfreebet parimatchMinas Gerais (UFMG) Fábio Tozi cita as organizaçõesfreebet parimatchmotoristasfreebet parimatchUber, que, para ele, apresenta uma pauta pulverizada e costumam defender a empresa. A mais importante delas é a Associaçãofreebet parimatchMotoristasfreebet parimatchAplicativofreebet parimatchSão Paulo (Amasp), que tem Marlon Luz como vice-presidente.

Em posts recentes, a associação cobrou as autoridades pelas mortesfreebet parimatchcinco motoristas na região metropolitana da cidade. As cobranças às empresas, no entanto, foram bem mais discretas.

"Mais um assassinatofreebet parimatchum motoristafreebet parimatchaplicativo...Mais um caso fora dos apps...O nosso presidente Duda já vem alertando inclusive foi o tema dele na Alesp, que não adianta os apps elaborarem métodosfreebet parimatchsegurança sem que o governo também faça a parte dele, continuaremos reféns dos marginais!!!", diz uma postagem feita na páginafreebet parimatchFacebook da Amasp no dia 2freebet parimatchoutubro.

Para Tozi, que estuda como os aplicativosfreebet parimatchtransporte mudam questões sociais e o planejamento das cidades, entidades como essa querem mais segurança para os motoristas, mas sem baterfreebet parimatchfrente com as plataformas.

Procurada, a Amasp respondeu,freebet parimatchnota, que foi a primeira associação a conseguir reuniões com todos os aplicativos pedindo reajustefreebet parimatchtarifas e mais segurança,freebet parimatch2017.

"Todos os apps responderam que iriam analisar e pouco tempo depois a Uber e a 99 reajustaram tarifasfreebet parimatchalgumas cidades do Brasil, lugares pontuais, e também firmaram parcerias para reduzir os custos dos motoristas."

Outra ação teria sido processar as empresas quando motoristas foram excluídosfreebet parimatchforma considerada inválida. No entanto, continuou a associação no comunicado, muitas vezes o "bom relacionamento" com os aplicativos permitiu que um processo não fosse necessário para religar o motorista.

A Amasp também lembrou que "corre atrásfreebet parimatchresultados", ao contrário dos sindicatos, que ficariam "apenas gritando ao vento."

Post da Amasp no Facebook

Crédito, Reprodução Facebook

Legenda da foto, Para professor, Amasp tenta melhorar situação dos motoristas sem baterfreebet parimatchfrente com as empresas

As mesmas críticas feitas às associações, diz Tozi, valem para a maioria dos youtubers deste nicho. Eles teriam uma relaçãofreebet parimatchsubordinação com as empresas, que começaria com a pressão do algoritmo durante as corridas e acabaria na tela do computador, com a repetiçãofreebet parimatchdiscursos divulgados por Uber, 99, iFood e Rappi.

Há algum sinalfreebet parimatchconscientização entre os motoristas, pondera Bruno Cardoso, professor da UFRJ. Em maio, por exemplo, milharesfreebet parimatchparceiros da Uber no Brasil pararam por 24 horasfreebet parimatchadesão a uma greve mundial.

No entanto, ele concorda que os youtubers são obstáculos ao desenvolvimentofreebet parimatchum olhar mais crítico, porque alémfreebet parimatchrepetirem o discurso das empresas, mostram como estão ganhando muito dinheiro ao segui-lo.

"Não é o motorista comum, que dirige doze horas por dia, que tem um canal grande, porque canal exige ediçãofreebet parimatchvídeo, capacidadefreebet parimatchgravar e tudo isso é tempo. Assim, quem tem visibilidade já é bem sucedido."

Como formadoresfreebet parimatchopinião, afirma, eles não oferecem um espaçofreebet parimatchdebate para colegas que tiveram uma experiência ruim com as plataformas. Ao contrário, suas falas reforçariam seu sucesso e culpariam seus inscritos pelo próprio fracasso.

"Aí não é a estrutura que leva as pessoas a enlouquecerem, adoecerem ou ficarem pobres, são elas que são preguiçosas."

Após ouvir a opiniãofreebet parimatchTozi, Marlon Luz diz ao telefone que ele deveria dirigir um pouco para ter uma visão mais realista. O youtuber argumenta que chegou a encontrar,freebet parimatchgruposfreebet parimatchWhatsApp, motoristas que ganham até R$ 400 por dia.

"Reflete a realidade da maioria?", ele pergunta do outro lado da linha. "Não. Mas a gente ensina como chegar lá."

Além disso, continua, há youtubers que trabalham 12 horas e ainda gravam seus vídeos, apesarfreebet parimatchesses não serem os mais conhecidos. Marlon admite que o desemprego é um problema e que nem todo mundo está felizfreebet parimatchser colaboradorfreebet parimatchaplicativo, mas pondera que os ganhos compensam.

"Trabalhando o mesmo tempo, o motorista ganha pelo menos o dobro do salário mínimo."

Nos vídeos, no entanto, ainda há muitas promessas que não se concretizam. Em alguns deles, motoboys mostram extratosfreebet parimatchR$ 5 mil, às vezes não revelando quantos quilômetros rodaram para acumular o valor.

Então há quem chegue com a ilusãofreebet parimatchque vai ganhar muito dinheiro, diz Mateus, o ex-bombeiro. Assim, fica difícil dividir críticas com outros entregadores, porque a mentalidade do "só dependefreebet parimatchvocê" faz a competição entre eles aumentar. Muitos não querem ouvi-lo, acreditando que ele se queixa para desanimar os concorrentes.

Ao fim da entrevista, Mateus diz que a faltafreebet parimatchdiálogo não o incomoda mais. Seu tom tem algofreebet parimatchironia ou indiferença.

"Eles não enxergam que podem ter uma sériefreebet parimatchproblemasfreebet parimatchcoluna,freebet parimatchrespiração, e tudo isso vai ser cobrado. É questãofreebet parimatchtempo."

Os professores entrevistados se dividem sobre as possíveis reações desses motoristas e entregadores no futuro. A maioria faz a mesma ponderação: sim, a realidade é dura e eles irão percebê-la logo, mas parte desses brasileiros depende dos aplicativos para sobreviver. Se não há opções, o que fazer?

Ricardo Antunes

Crédito, Antonio Scarpinetti/Unicamp

Legenda da foto, Tolerância dos motoristas e entregadoresfreebet parimatchapp têm um limite, diz o professor Ricardo Antunes

Há um limite, defende Ricardo Antunes, da Unicamp. Quem está desesperado aceita regimes menos garantidos, mas num dado momento as taxas baixas, as jornadas longas, a desvalorização vinda da empresa e dos clientes será tão forte que não vai segurar uma resposta.

"Que sociedade consegue manter tantos milhõesfreebet parimatchdesempregados? São muitas contradições para você controlar e as tensões normalmente transbordam o espaço do trabalho, se esparramam para as periferias, para os lugares onde os trabalhadores moram."

Isso sem falar nos limites físicos. O ideário das empresas, argumenta o professor, "viram pó", quando o colaborador percebe que só ele está ralando todos os dias.

"É (dar) o tempo das depressões, do acidente, da morte, da infelicidade, da resistência, da organização e da busca por uma alternativa."

Neste momento, há 16 mensagens não lidas nos três gruposfreebet parimatchWhatsApp. Ao entrar nas conversas e buscar por "protesto", encontra-se a seguinte conversa, no dia 26freebet parimatchjulho:

Winchester diz:

"Meu primo foi atropelado tá com a perna quebrada"

"A empresa uber eats diz Q o erro foi dele como não tem provafreebet parimatchfilmagem"

"A uber dis Q ele não prestou atenção"

"Então a cupa não é do motorista mas sim dele"

E Daniel responde:

"E pior que querem a prova na mesa"

(...)

Winchester termina o assunto:

"Tem Q ter um protesto sobre nossos direitos."

Veículo autônomo da Uber expostofreebet parimatchevento da empresafreebet parimatchsetembro, na Califórnia

Crédito, PHILIP PACHECO/AFP/Getty Images

Legenda da foto, Veículo autônomo da Uber expostofreebet parimatchevento da empresafreebet parimatchsetembro, na Califórnia

Futuro

Os que estão esgotados devem sair e outros irão substituí-los. O cenário é desenhado pelo professor Fábio Tozi para os motoristas e entregadoresfreebet parimatchaplicativo, caso o desemprego não caia.

"Os motoristas que a gente acompanha (na nossa pesquisa) pretendem sair assim que possam, porque se torna insuportável."

Os substitutos tendem a ser pessoas mais jovens, saudáveis e entusiasmadas, que acabaramfreebet parimatchcomeçar nesse tipofreebet parimatchatividade, acrescenta Bruno Cardoso, da UFRJ. À medida que fica cada vez mais fácil entrar nesse mercado, especialmente nofreebet parimatchentregadoresfreebet parimatchque nem motos mais são necessárias, explica, forma-se um exércitofreebet parimatchcandidatos aptos a iniciar o serviço a qualquer momento.

Com entregasfreebet parimatchbicicleta e até a pé, a única coisafreebet parimatchque precisam são pernas e um celular com internet.

Para além do esgotamento físico, motoristas e entregadores enfrentarão no futuro o desaparecimentofreebet parimatchsuas vagas.

Emilie Boman, chefefreebet parimatchpolíticas públicas da Uber Eats

Crédito, PHILIP PACHEPHILIP PACHECO/AFP/Getty Images

Legenda da foto, Emilie Boman, chefefreebet parimatchpolíticas públicas da Uber Eats, fala sobre abrangência da empresa

Em junho, a Uber informou que iria começar a testar um sistemafreebet parimatchentregafreebet parimatchcomida com drones e apresentou um protótipofreebet parimatchveículo autônomo, capazfreebet parimatchser completamente independente. Segundo a companhia, por motivos logísticos, os drones não fariam as entregas diretamente aos clientes, mas deixariam o pedidofreebet parimatchum pontofreebet parimatchcoleta para que o entregador completasse o pedido.

"A empresa quefreebet parimatchdez anos tornou-se uma das mais poderosas do mundo explorando o trabalho humano já sonha com um futuro sem trabalho humano. Você imagina?", questiona Ricardo Antunes.

Não é só uma percepção. Um estudo feito pelo Laboratóriofreebet parimatchAprendizadofreebet parimatchMáquinafreebet parimatchFinanças e Organizações da Universidadefreebet parimatchBrasília (UnB) mostrou que as máquinas movidas por tecnologiafreebet parimatchinteligência artificial devem, até 2016, ocupar 54% dos empregos formais do país. A porcentagem representa cercafreebet parimatch30 milhõesfreebet parimatchvagas.

Os youtubers já pensam nesse cenário. Eles não encaram os aplicativos como algo que vá durar "o resto da vida".

"É uma profissão sem futuro", define Marlon.

Há dois principais motivos para esse fim anunciado, ele enumera: não há progressãofreebet parimatchcarreira — um motorista será sempre um motorista — e os carros que se dirigem sozinhos já são uma realidade.

"Não é questãofreebet parimatchse vai existir, masfreebet parimatchquando. Realmente, não tem futuro."

Pedro Roseno

Crédito, Felix Lima/BBC News Brasil

Legenda da foto, Há três meses, Pedro anunciou no YouTube que largaria o trabalho fixo para ficar só nos apps
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Quando Pedro saifreebet parimatchcasa, celular no suporte da moto e mochila nas costas, a reportagem o seguefreebet parimatchcarro. É preciso ficar atento porque mochilas coloridas se juntam a ele nos semáforos, misturando os tons gritantes dos tecidos com o amarelo e vermelho das luzesfreebet parimatchfreio e dos postes.

"Tem muita gente que reclamafreebet parimatchbarriga cheia", foifreebet parimatchconclusão depoisfreebet parimatchquase duas horasfreebet parimatchentrevista. Não dá para criticar as empresas, explicou, porque são elas que dão o dinheiro. Meses depois desta conversa, ele cumpriu o prometido e pediu demissão do emprego.

"Se tem um aplicativo que tá te pagando, e a pessoa fala que não tem onde trabalhar, tá reclamandofreebet parimatchbarriga cheia, assim, no sentido figurado", disse, antesfreebet parimatchfechar a porta.

Quando Pedro saifreebet parimatchcasa, não tem tempofreebet parimatchcomer. Na pia, seguem os restosfreebet parimatcharroz e feijão.

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