Após 'Cristo desgovernado', imagem do Brasil no exterior sofre nova baixa:a roleta

Capas da The Economist sobre Brasil
Legenda da foto, Brasil ganhou novamente destaque no noticiário internacional, mas sendo retratado como principal ameaça aos esforços globaisa roletacombate ao aquecimento global

Na capa, o Cristo que antes decolava apareciaa roletaqueda desgovernada. O título questionava se o Brasil havia jogado fora a chancea roletaser o "país do futuro".

Nesta sexta (2), o Brasil voltou a estampar a capa da Economist. Dessa vez, como principal ameaça ao meio-ambiente. Uma imagema roletatocoa roletaárvore com o formato do mapa do Brasil ilustra o título dramático "Vigília da morte para a Amazônia".

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O texto diz que o presidente Jair Bolsonaro "deixou claro para os infratores (desmatadores) que eles não têm nada a temer".

A política ambiental do governo brasileiro, que prevê a possibilidadea roletamineraçãoa roletaterras indígenas ea roletaexpansãoa roletaatividades econômicas na Amazônia, também teve destaque - não exatamente positivo -a roletajornais americanos.

Em 28a roletajulho, um dos principais jornais dos Estados Unidos, o The New York Times, publicou artigo com o seguinte título: "Sob lídera roletaextrema-direita brasileiro, proteções à Amazônia são cortadas e florestas caem".

O artigo diz que, se antes o Brasil era visto como liderança na áreaa roletameio-ambiente, agora o governo Bolsonaro coloca essa imagema roletaxeque.

Artigo do The New York Times sobre Brasil

Crédito, Reprodução

Legenda da foto, The New York Times aponta que desmatamento na Amazônia acelerou durante governo Bolsonaro

Empresasa roletamarketing e pesquisa também calculam a evolução (ou involução) da "marca Brasil" no exterior. A consultoriaa roletaimagem e marketing FutureBrand, que tem escritórios nos EUA, na Europa e na América do Sul, faz todo ano um ranking dos países com melhor imagem internacional.

O Brasil caiu quatro posiçõesa roleta2014 a 2019, figurandoa roleta47º na listaa roleta69 países analisados. Segundo o relatório da FutureBrand, embora nosso país ainda se mantenha entre as 10 maiores economias do mundo (é a nona maior), "há previsãoa roletanuvens carregadas no horizonte".

"A nação se dividiu com a eleiçãoa roletaJair Bolsonaro e a turbulência continua a afetar o Brasil, podendo influenciar o desempenho do país nos próximos rankings."

Mas quais foram os momentos-chave que ajudaram a moldar e transformar a imagem do Brasil no exterior? E seriam justas essas avaliações da imprensa estrangeira sobre o nosso país?

A linha do tempo da imagem do Brasil no mundo

Em entrevista à BBC News Brasil, o professora roletaRelações Públicas Internacionais Christopher Sabatini, da Universidade Columbia,a roletaNova York, lembrou alguns episódios e momentos que ajudaram a forjar a forma como o nosso país era visto no exterior.

Segundo ele, antesa roletaFernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva se tornarem presidentes, a visão sobre o Brasil era concentradaa roletaaspectos culturais e na ideiaa roletaum país diplomático e amigável.

Trump e Bolsonaro

Crédito, REUTERS/Kevin Lamarque

Legenda da foto, No governo Bolsonaro, Brasil passa a ser visto como país que não se compromete com o combate ao aquecimento global

"O Brasil era visto como fontea roletariqueza cultural, não só com samba, mas com a MPB, Bossa Nova, Caetano Veloso e outros excelentes músicos", disse.

"E muitos reconheciam o potencial diplomático do Brasil, a boa tradição diplomática do Itamaraty. Quem trabalhava com política e diplomacia sabia da capacidadea roletasoft power ea roletanegociação."

Soft power é um termo que descreve a influênciaa roletaum paísa roletadecisões internacionais por meioa roletasua capacidadea roletapersuasão, sem usoa roletacoerção, poder econômico ou militar.

A diretora do Programaa roletaEstudos Brasileiros da Universidade Oxford, Andrezaa roletaSouza Santos, diz que "o mito"a roletaque o Brasil era uma "democracia racial", ou seja, um país aberto à miscigenação e sem racismo, também contribuiu para que o país fosse percebido como aberto, liberal e tolerante.

"O Brasil nunca encarou profundamente o seu legadoa roletaescravidão e desigualdade, mas a imagem que se tinha no exterior era aa roletaque havia tolerância religiosa e racial."

Brasil com o potenciala roletaser líder regional

Durante o governoa roletaFernando Henrique Cardoso o Brasil passou a ser encarado mais seriamente como país com potenciala roletainfluência internacional e liderança regional, diz o professor americano Sabatini, que também integra a Chatham House, uma das instituiçõesa roletapesquisa mais respeitadas do Reino Unido..

"FHC era um acadêmicoa roletaproeminência internacional que corrigiu os rumos da economia quando estava no poder. Ele não recebe os créditos devidos, mas foi responsável por dar maior importância e peso ao Brasil internacionalmente."

Já o ex-presidente Lula seria a "personificação" das expectativas que o mundo tinhaa roletarelação ao Brasil.

"A históriaa roletaLula representava essa ascensão e modernização do Brasil. Ele é um homem que veio da pobreza num dos países mais desiguais do mundo", diz Sabatini.

"E a nossa percepção é aa roletaque os brasileiros são carismáticos. Lula era muito carismático. Então, ele personalizava o que muitos estrangeiros pensavam sobre o Brasil."

Além disso, nos dois mandatosa roletaLula, o Brasil viveu um momentoa roletaestabilidade financeira e crescimento econômico, impulsionado pelo boom no preço das commodities.

floresta desmatada

Crédito, RAPHAEL ALVES/AFP

Legenda da foto, Há menosa roleta10 anos, o Brasil era visto como líder na proteção ambiental

Nessa época, lembram Christopher Sabatini e Andreza dos Santos, o Brasil se firmou como liderança ambiental, se comprometendo voluntariamente a reduzir a emissãoa roletagases poluentes.

Com a crise econômica no governoa roletaDilma Rousseff, a imprensa estrangeira passou a classificar as conquistas econômicas anteriores do Brasil como "bolhas" ou "vooa roletagalinha".

"Muitos perderam a esperançaa roletaque o país está destinado ao sucesso e concluíram que foi apenas outro vooa roletagalinha", dizia artigoa roleta2013 da Economist.

Já no governo Bolsonaro, o Brasil passou a estampar as capas dos jornais como país que não mais se compromete com o combate às mudanças climáticas e cujo líder colocaa roletaxeque direitosa roletaminorias.

As falasa roletaBolsonaro sobre a comunidade LGBT, mulheres e negros foram amplamente noticiadas no exterior.

Andreza Santos observa que, quando o Cristo apareceu "desgovernado" na capa da Economista roleta2013, o foco das críticas ao Brasil era a gestão econômica.

Agora, o noticiário questiona grande parte dos valores antes associados ao Brasil.

"A críticaa roleta2013 focava no crescimento econômico fraco, na desaceleração, nos problemas orçamentários. Enfim, pintava a imagema roletaum país bagunçado na gestão financeira", ressalta Santos.

"Agora é muito diferente, é como se os alicercesa roletaimagem do Brasil estivessem se rompendo. Na questão diplomática, por exemplo, o Brasil passou a optar por decisõesa roletaconfronto com antigos parceiros, quebrando uma tradição consolidadaa roletaagir com neutralidade."

Mas é justa a imagem que a imprensa estrangeira faz do Brasil?

Para o professor Sabatini, os discursos do presidente Bolsonaro sobre meio-ambiente e direitosa roletaminorias prejudicam a imagem consolidada do Brasil como país tolerante, aberto às diferenças e vanguardista na proteção ambiental.

Mas ele também critica o que chamaa roletaexageros e "bipolaridade" da imprensa internacional ao escrever sobre Brasil. Para Sabatini, a Economist exagerou no otimismo e agora exagera no pessimismo e na "generalização" dos problemas brasileiros.

Ele argumenta que,a roleta2009, a revista britânica subestimou, por exemplo, o fatoa roletaque a economia brasileira ainda se baseava na exportaçãoa roletaprodutos básicos, como alimentos, e negligenciou a existênciaa roletacorrupção no sistema político.

"De certa maneira, aquela capa não foi justa com o Brasil porque não apontou as fragilidades institucionais da economia brasileira e não considerou que muitas daquelas conquistas foram construídas com práticas corruptas", disse.

"Ou seja, a primeira reportagem superestimou as conquistas e ignorou as vulnerabilidades do Brasil. A segunda capa, do Cristoa roletacolapso, é injusta com o Brasil, porque é uma consequência do próprio erro anterior da Economist ao analisar o Brasil."

Para Sabatini, a imprensa estrangeiraa roletageral, ao se propor a fazer reportagens analíticas sobre o Brasil, continua a errar no tom e na "generalização" das responsabilidades.

Assinaturaa roletaacordo

Crédito, EPA/FRANCK ROBICHON

Legenda da foto, União Europeia adverte que acordo com Mercosul dependea roletacumprimentoa roletacompromissos ambientais pelo Brasil

"Claro que o ritmo do desmatamento é preocupante e é um fato que o governo Bolsonaro deu sinal verde, direta ou indiretamente, para que isso acontecesse. Mas essa é parte da história e não reflete a práticaa roletagrande parte da agricultura praticada no Brasil. Esse aspectoa roletaprodução sustentável não é retratado pela imprensa", diz Sabatini.

O professor lembra ainda que alguns anos atrás o Brasil era celebrado pela produçãoa roletaalimentos e visto como nação necessária para garantir a segurança alimentar do mundo.

"Há um comportamento bipolar. Antes, o Brasil era divulgado como o país que ajudará a combater a fome no mundo. Agora, a imprensa estrangeira exclama que o país está destruindo a floresta e culpa a agricultura."

Na reportagem sobre os riscos para a Amazônia no governo Bolsonaro, a Economist faz um apelo para que os países compradoresa roletaprodutos brasileiros condicionem parcerias comerciais a um "bom comportamento por parte do Brasil".

Recentemente, a União Europeia fez um alerta ao Brasil ao dizer que o acordoa roletacomércio entre Mercosul e União Europeia, que ainda precisa ser ratificado, está condicionado ao compromisso com a proteção ambiental e dos povos indígenas.

Que consequências a erosão da imagem do Brasil pode ter?

Andreza Santos, da Universidade Oxford, afirma que a redução do prestígio internacional do Brasil pode influenciar negativamente a capacidadea roletao país atrair investimentos, turistas e parcerias.

Apesara roletanão ter grande poderio militar nem estar entre as cinco maiores economias, o Brasil conseguiu usar o soft power para ter destaquea roletaorganismos internacionais e obter vantagens econômicasa roletanegociações comerciais com grandes potências.

Atualmente, a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) e a Organização Mundial do Comércio (OMC) são presididas por dois brasileiros: José Graziano da Silva e Roberto Azevêdo, respectivamente.

"A imagem do Brasil no exterior afeta parcerias comerciais, cooperação cientifica e tecnológica, e o turismo", lista Santos.

Sabatini compartilha essa opinião.

"Embora eu enxergue equívocos na cobertura da imprensa internacional, é verdade que o nacionalismoa roletaBolsonaro, seus planos sobre demarcação indígena e o discurso sobre minorias geram uma preocupação genuína", diz.

"Os aspectos que tornavam o Brasil atrativo para muita gente, como a imagema roletaprogressista,a roletapotencial líder do hemisfério sul ea roletaser uma liderança na cultura e na proteção ambiental, estão se desfazendo", conclui o professor americano.

raya

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