Descriminalização do aborto: quem são os grupos que tentarão influenciar decisão do STF:saque minimo betano
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A audiência foi convocada pela ministra Rosa Weber, relatora da Ação por Descumprimentosaque minimo betanoPreceito Fundamental (ADPF) 442, apresentada pelo PSOL, com assessoria técnica do Institutosaque minimo betanoBioética Anis.
Ainda não há data marcada para o julgamento do caso.
A ação argumenta que os artigos do Código Penal que proíbem o aborto afrontam preceitos fundamentais da Constituição Federal, como o direito das mulheres à vida, à dignidade, à cidadania, à não discriminação, à liberdade, à igualdade, à saúde e ao planejamento familiar, entre outros. O PSOL pede que o aborto feito até a décima segunda semanasaque minimo betanogestação não seja considerado crime.
Atualmente, o aborto só é permitido no Brasilsaque minimo betanocasosaque minimo betanoestupro, riscosaque minimo betanovida para a mãe e feto com anencefalia- neste último caso a autorização foi dada pelo Supremo,saque minimo betanojulgamentosaque minimo betano2012.
O STF recebeu maissaque minimo betano180 pedidos para falar na audiência sobre o pedidosaque minimo betanodescriminalização do aborto e selecionou os palestrantes com base na representatividade, na qualificação técnica e na "pluralidade" das opiniões.
A BBC News Brasil conversou com algumas dessas pessoas para saber que argumentos levarão ao debate.
Os palestrantes pró-descriminalização do aborto
O gruposaque minimo betanopessoas selecionadas para falar a favor da descriminalização do aborto é composto por diferentes setores -saque minimo betanomédicos a ONGs internacionais e grupos religiosos que defendem que as mulheres devem ter autonomia para interromper a gestação.
Cada setor deve se aprofundarsaque minimo betanouma dessas quatro linhassaque minimo betanoargumentação identificadas pela BBC News Brasil:
Morte das mulheres
O primeiro diasaque minimo betanoaudiências abordará o efeito da legislação sobre abortosaque minimo betanodiferentes aspectos da saúde - psicológico e físico, além do impacto social.
Os médicos favoráveis à descriminalização devem expor a experiênciasaque minimo betanotratar mulheres com complicações decorrentessaque minimo betanoabortos inseguros.
A médica ginecologista e obstetra Melania Amorim disse à BBC News Brasil que defenderá que a descriminalização é necessária para reduzir a mortalidade materna e o númerosaque minimo betanoabortos provocados. Segundo ela, interrupções da gestação feitassaque minimo betanoforma insegura são a quarta principal causasaque minimo betanomortesaque minimo betanomaterna no Brasil.
A médica diz que, ao longo dos quase 30 anossaque minimo betanocarreira, atendeu na rede pública dezenassaque minimo betanopacientes com complicações gravessaque minimo betanoabortos clandestinos. Mas a primeira experiência foi a que mais impactou.
"Eu tinha 17 anos, tinha acabadosaque minimo betanoentrar na faculdade e estava estagiando num hospital. Uma meninasaque minimo betano13 anos chegou já desorientada,saque minimo betanoestado grave após um aborto clandestino. Ela entrousaque minimo betanoestadosaque minimo betanochoque séptico e morreu", conta.
"Entrei na maternidade esperando ver partos lindos e bebês saudáveis e me vi sempre à frente da morte. Já me deparei várias vezes com mulheres nessa situação. Hemorragia e septicemia. As mulheres recorrem a instrumentos perfurantes ou soluções tóxicas."
Melania diz que também apresentará dados para sustentar a tesesaque minimo betanoque a descriminalização do aborto poderá, inclusive, diminuir as interrupçõessaque minimo betanogestações, na medidasaque minimo betanoque o tema deixarásaque minimo betanoser "tabu".
"Você evita o abortosaque minimo betanorepetição, que é responsável por maissaque minimo betano40% dos abortos provocados. Com o acolhimento das mulheres durante e após o aborto, você evita um próximo aborto. Você consegue ouvir a mulher e aconselhá-la a usar um método contraceptivo eficiente", afirma.
Um estudo que deve ser mencionado, na audiência, é o da pesquisadora Gilda Sedgh, do Instituto Guttmacher,saque minimo betanoNova York, que aponta que,saque minimo betanopaíses onde o aborto é crime, as taxassaque minimo betanoaborto chegam a ser um pouco mais altas que assaque minimo betanonações onde o procedimento é legalizado.
Conforme o levantamento, a taxa ésaque minimo betano37 abortos a cada mil mulheressaque minimo betanopaíses que vetam o abortosaque minimo betanoqualquer circunstância ou que só o permitemsaque minimo betanocasosaque minimo betanoriscosaque minimo betanovida para a mãe. Em nações onde a interrupção da gravidez é permitida e oferecida mediante pedido da gestante, o númerosaque minimo betanoabortos ésaque minimo betano34 para cada mil mulheres.
Desigualdade social
Antropólogos e sociólogos favoráveis à descriminalização disseram à BBC News Brasil que pretendem demonstrar que a proibição do aborto têm impactos sociais, ao reforçar a desigualdade entre ricos e pobres, já que as mulheres mais pobres acabam recorrendo a métodos inseguros, enquanto as que têm dinheiro podem pagar por um abortosaque minimo betanouma clínica particular ou fazersaque minimo betanopaíses onde isso é permitido.
A pesquisadora Débora Diniz, coordenadora do Institutosaque minimo betanoBioética Anis, apresentará um estudo que mostra que umasaque minimo betanocada 5 mulheressaque minimo betanoaté 40 anos já fizeram aborto no Brasil. Mas as mais pobres, ela destaca, são as mais afetadas pela criminalização.
"Sabemos quesaque minimo betanotodas as classes sociais se faz aborto, mas as mulheres mais precarizadas, negras e indígenas, do Norte, Nordeste e Centro-Oeste do país, estão mais vulneráveis à experiência do aborto e também aos efeitos perversos da lei penal, com riscosaque minimo betanocadeia, graves sequelas ou morte", disse ela à BBC News Brasil.
Tratados internacionais
Já as ONGs internacionais devem focar na comparação das leis brasileiras com assaque minimo betanooutros países, e analisar a criminalização do aborto do pontosaque minimo betanovista do direito internacional.
A pesquisadora Margareth Wurth, do Human Rights Watch, uma das maiores instituiçõessaque minimo betanodefesasaque minimo betanodireitos humanos do mundo, disse à BBC News Brasil que a ONG defenderá que o trecho do Código Penal brasileiro sobre aborto viola tratados internacionais firmados pelo Brasil.
"As punições previstas na legislação penal brasileira para o aborto são incompatíveis com as obrigações do Brasil perante leis internacionais", disse Wruth.
"A criminalização do aborto colocasaque minimo betanorisco direitos fundamentas estabelecidosaque minimo betanotratadossaque minimo betanodireitos humanos firmados pelo Brasil, como o direito à privacidade, igualdade e à informação."
O Human Rights Watch também deve ressaltar que a maioria dos países desenvolvidos, como Estados Unidos, Canadá e membros da União Europeia, tem legislações que permitem a interrupção da gravidez.
"Há uma tendência mundialsaque minimo betanoexpandir os abortos seguros. Irlanda, Argentina e Chile caminham para expandir as hipóteses legaissaque minimo betanoaborto. Essa é uma oportunidade para o Brasil se unir a essa tendência", afirma.
Estado laico
O grupo Mulheres Católicas pelo Direitosaque minimo betanoDecidir - ONGsaque minimo betanoproteção aos direitos das mulheres integrada por católicas - afirmará que, no catolicismo, "há incertezas sobre a questão do aborto", alémsaque minimo betanodefender que, independentemente disso, o Brasil, por ser um Estado laico (com separação entre Igreja e Estado), não deve ser influenciado por "qualquer credo religioso".
"Somente na segunda metade do século 19,saque minimo betano1861, o aborto foi declarado um pecado, sem nunca ter se tornado objetosaque minimo betanodogma. A Igreja muda assim como a sociedade muda. Foi assimsaque minimo betanorelação à escravidão e foi assimsaque minimo betanorelação aos direitos humanos, e pode ser novamente quanto à questão do aborto", diz a ONG, no resumo das argumentações enviado para o STF.
Para as integrantes do grupo, a descriminalização ajudaria a evitar a mortesaque minimo betanomulheressaque minimo betanoabortos inseguros.
"A vida humana é um precioso dom a ser defendido, mas não se pode restringir essa proteção à vida do feto e seguir culpando as mulheres que abortam, condenando-as à morte, especialmente as mulheres pobres e negras, nas clínicas clandestinas,saque minimo betanonomesaque minimo betanouma suposta 'defesa da vida'", completa.
Os palestrantes contrários à descriminalização do aborto
As pessoas selecionadas para falar contra a descriminalização também vêmsaque minimo betanodiferentes setores - são juristas, religiosos e pesquisadores.
O foco deles deverá ser osaque minimo betanoque a vida começa na concepção e que, portanto, o aborto seria uma violação do artigo da Constituição que garante "o direito à vida". Outro ponto que deve ser abordado é o fatosaque minimo betanoa discussão estar sendo feita pelo Judiciário e não o Legislativo.
São três os principais argumentos a serem defendidos:
'Proteger o mais vulnerável'
O bispo da diocesesaque minimo betanoRio Grande, dom Ricardo Hoepers, que falarásaque minimo betanonome da Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), afirmou à BBC News Brasil que defenderá que o aborto é "um ato contra a vida".
"A vida humana tem seu início na concepção e acreditamos na integralidade da vida humana desde o início da vida. O aborto é um ato desproporcional, porque o feto é inocente, indefeso. O ser humano precisa desses nove mesessaque minimo betanoproteção. A descriminalização contraria a nossa legislação que prevê a garantia à vida", disse.
Medidas para ajudar mães que não querem ter filhos
Para dom Ricardo Hoepers, a redução das mortes provocadas por abortos clandestinos não passa pela descriminalização, mas sim por políticas voltadas a "acolher mulheres" que não querem ter filhos.
"Em vezsaque minimo betanodescriminalizar, temos que dar condições para que essas mulheres tenham as crianças, ter políticassaque minimo betanoauxílio. Achamos estranho que o aborto seja uma conquista, uma bandeira, para ser divulgado como uma vitória. É um trauma, um sofrimento. Acreditamos que com a descriminalização estamos aumentando o sofrimento", afirma.
"Descriminalizar não é a solução. É um imediatismo."
Decisão do Congresso
Enquanto grupos religiosos focam na definiçãosaque minimo betanoquando a vida começa, juristas contrários à legalização do aborto pretendem defender que não cabe ao Judiciário decidir sobre o tema.
Essa vai ser, por exemplo, a linhasaque minimo betanoargumentação da advogada Angela Vidal Gandra da Silva Martins, que falará pela União dos Juristas Católicossaque minimo betanoSão Paulo.
"A vida foi considerada inviolável pelos constituintes, foi colocado isso na Constituição. Se quisermos mudar algo, o espaço democrático requer representatividade popular. Se quiséssemos debater a vida, o lugar para esse debate é o Parlamento, o Legislativo", afirmou à BBC News Brasil.
"Não cabe ao Supremo legislar sobre um temasaque minimo betanotanta relevância para a vida pública."
A advogada também afirma que, como mulher, não acha que a autonomia sobre o corpo valha durante a gestação.
"Se eu tivesse que falar como mulher e ser humano sobre o direito ao próprio corpo, acho que a mulher tem direitosaque minimo betanoregular suas relações sexuais. A partir do momento que ela concebeu, aquela vida depende dela, não é dela."
Participação da sociedade
Se as posições dos diferentes atores ouvidos pela BBC News Brasil são divergentes,saque minimo betanoum ponto eles concordam, que as audiências são uma oportunidadesaque minimo betanoincluir a sociedade civil no debate sobre um tema que têm impacto direto na vida das mulheres.
"A participação da igreja faz parte da democracia do país. Queremos contribuir com a discussão, não como um pontosaque minimo betanovista fundamentalista", afirmou dom Ricardo Hoepers.
A expectativa é que grupos favoráveis e contrários à descriminalização se reúnam para acompanhar as audiências. Grupos feministas organizaram um evento chamado "Festival pela Vida das Mulheres", com shows e palestras no Museu da República,saque minimo betanoBrasília. Um telão foi montado lá para projetar as audiências.
"A audiência tem a função saque minimo betanoqualificar o debate público sobre o tema para além das fronteiras da Corte, com efeitos que, acredito, chegarão até o debate das eleições deste ano. A listasaque minimo betanoexpositores convidados mostrou o compromisso do STFsaque minimo betanopromover um debate sério, plural, com participaçãosaque minimo betanodiversas organizações da sociedade civil com experiência no tema e dados confiáveis a apresentar", disse Débora Diniz.
Como o mundo tem decidido essa questão
As decisões sobre aborto têm sido tomadas por diferentes instâncias pelo mundo. Na Europa, grande parte dos países descriminalizou o aborto por decisões dos Parlamentos.
Já nos Estados Unidos, Canadá e alguns países da América Latina o Judiciário teve papelsaque minimo betanodestaque na discussão sobre o tema.
Em 2006, a Corte Constitucional da Colômbia decidiu que o aborto deve ser permitido,saque minimo betanoqualquer estágio da gravidez, se a saúde mental ou física da mulher estiversaque minimo betanorisco - na prática as mulheres passaram a ter o direitosaque minimo betanofazer o procedimentosaque minimo betanocasosaque minimo betanogravidez indesejada.
Nos Estados Unidos, o aborto foi legalizado a partirsaque minimo betanouma decisão histórica da Suprema Corte,saque minimo betano1973, conhecida como"Roe vs Wade". Mais recentemente,saque minimo betano2016, o tribunal derrubou uma lei do Texas que impunha restrições a procedimentossaque minimo betanointerrupção da gravidez feitos no Estado.
No Canadá, uma decisãosaque minimo betano1988 da Suprema Corte confirmou o direito irrestrito das mulheres do país à interrupção da gravidez. O Senado da Argentina deve votar na próxima semana um projetosaque minimo betanolei que descriminaliza o aborto. A Câmara dos Deputados aprovou o texto com uma margem apertada.
O Brasil está entre os países com legislações mais restritiva ao aborto no mundo, juntamente com a maioria das nações da América Latina, Caribe, África e Oriente Médio.