Os argumentos das católicas brasileiras que há 25 anos defendem o aborto:sem deposito
Naquela época a ativista era integrante do grupo americano Catholics For Choice - que completa 45 anossem deposito2018 - e fazia um périplo pelo continente na tentativasem depositoorganizar um movimento semelhante na região. Além do Brasil, há "Católicas por el Derecho a Decidir"sem depositooutros dez países latinoamericanos.
Depoissem depositoum evento na Igreja do Carmo,sem depositoSão Paulo, o movimento foi lançado no dia 8sem depositomarço daquele ano. Está presente hojesem deposito14 Estados e atuasem depositoduas frentes - a educativa, com a produçãosem depositomaterial didático para o ensino da religião e a realizaçãosem depositoseminários para formaçãosem depositomultiplicadoras, e política, organizando debates, marchas e idas a Brasília.
Em umasem depositosuas campanhas mais recentes, o CDD foi às ruassem depositonovembro para protestar contra a Propostasem depositoEmenda Constitucional (PEC) 181, que pode criminalizar o aborto mesmo nos casossem depositoque ele hoje é permitido, comosem depositogestações resultantessem depositoestupro.
Entre seus membros, leigos e religiosos, está a freira feminista Ivone Gebara, punida pelo Vaticanosem deposito1995 por defender publicamentesem depositouma entrevista a descriminalização e a legalização do aborto.
Na época à frente da Congregação para a Doutrina da Fé, o cardeal Joseph Ratzinger - que anos depois se tornaria o papa Bento 16 - determinou que ela voltasse à Universidade Católicasem depositoLouvain, na Bélgica, onde obteve seu doutorado, para passar dois anos reclusa,sem deposito"reeducação teológica".
Por não estar ligado à estrutura da Igreja, contudo, o movimentosem depositosi está fora dos limitessem depositorepreensão da hierarquia católica. As perseguições também não são frequentes, diz Jurkewicz.
O que há são questões pontuais como asem depositoGebara e a que ela mesmo enfrentou quando publicou seu doutorado. Logo após a apresentação do trabalho, que reunia 21 casossem depositoabuso sexualsem depositomulheres por padres, a assistente social foi demitida da universidadesem depositoque lecionava, ligada à diocesesem depositoSanto André.
O antagonismo mais organizado vemsem depositosetores conservadores da religião,sem depositoinstituições como Arautos do Evangelho e Opus Dei.
As "ameaças", dizem, chegam geralmente por email ou pelas redes sociais. "São mensagens dizendo que a gente vai para o inferno, essas coisas. Nada grave."
O aborto sempre foi considerado pecado?
Para defender o aborto dentro da lógica religiosa, as ativistas argumentam que o início da vida sempre foi um pontosem depositodivergência dentro da fé católica.
Nos primeiros séculos do cristianismo, exemplifica Jurkewicz, houve Santo Agostinho, que condenava o controlesem depositonatalidade e o aborto por romperem a conexão entre ato conjugal e procriação, mas que afirmava que ele não era um atosem depositohomicídio.
Seus escritos a respeito do Êxodo diziam, sobre o feto, que "não existe alma vivasem depositoum corpo que carecesem depositosensações". Ele nunca chegou a uma conclusão sobre o momentosem depositoque a vida começava.
Já o teólogo Tertuliano defendiasem deposito160 que a concepção era o iníciosem depositotudo e, por isso, condenava a prática.
"Não é um dogmasem depositofé, é uma questão disciplinar", diz ela, acrescentando que nos cadernos penitenciais da Igreja na Idade Média o aborto era colocado entre outros pecados sexuais.
Os Cânones Irlandesessem deposito675, por exemplo, previam 14 anos a pão e água para aquele que tivesse relação sexual com a vizinha e três anos e meio para quem destruísse um embrião no ventre.
O tema passou a ser oficialmente condenado pela Igreja apenassem deposito1869, a partirsem depositoum boletim do papa Pio 9.
A posição da Igreja hoje e o papa Francisco
A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), emsem depositonota "Pela vida, contra o aborto",sem depositoabril deste ano, afirma que "a tradição judaico-cristã defende incondicionalmente a vida humana".
O texto defende a "integralidade, inviolabilidade e a dignidade da vida humana desde asem depositoconcepção até a morte natural" e condena "todas e quaisquer iniciativas que pretendam legalizar o aborto no Brasil".
"A posição sempre foi a mesma: defender e cuidar da vida humana desde asem depositoconcepção. A vida humana é preciosa demais para ser eliminada ou descartada", diz o bispo auxiliarsem depositoBrasília e secretário-geral da CNBB, dom Leonardo Steiner,sem depositonota enviada à BBC Brasil.
O papa Francisco manteve o entendimento que herdou dos antecessores, apesarsem depositoter autorizado,sem depositonovembro do ano passado, que padres pudessem perdoar o aborto - prerrogativa que antes era restrita a bispos ou confidentes especiais da Igreja.
"A ideia (por trás da iniciativa do Papa Francisco) é maissem depositocompaixão,sem depositoperdão. A Igreja não trabalha com direitos (para as mulheres)", diferencia Jurkewicz.
As ativistas do CDD são críticassem depositorelação ao papel do feminino na Igreja Católica, que limitaria "os espaçossem depositopoder e saber" aos homens.
"A posição oficial guarda a tradição da mulher como mãe, está carregadasem depositoatributossem depositogênero. Mesmo as freiras são vistas como 'mães espirituais'", ressalta.
São Tomássem depositoAquino
O princípio do "recurso à consciência" é outro argumento usado pelas ativistas para defender suas bandeiras e o primeiro destacado pelo movimento do qual se originou o CDD, o americano Catholics for Choice (CFC).
A ideia é que cada católico tome decisões guiadas pelo pensamento individual, ponderando o efeitosem depositosuas ações sobre si e sobre o próximo, e que respeite o arbítrio do outro.
"São Tomássem depositoAquino afirmava que nossa consciência não é um atributo das instituições", diz Amanda Ussak, diretora do programa internacional do CFC.
A organização surgiu nos Estados Unidossem deposito1973, anosem depositoo aborto foi legalizado no país após decisão da Suprema Corte no emblemático caso Roe v. Wade.
Prevendo uma ondasem depositoreações contráriassem depositoinstituições religiosas, um gruposem depositocatólicas decidiu se reunir e se contrapor às pressões por recuos. Uma década depois, o movimento deu início àsem depositoexpansão internacional.
A iniciativa, afirma Ussak, veio da percepçãosem depositoque criminalização do aborto prejudicava especialmente as mulheres pobres, grupo que ainda hoje registra o maior númerosem depositomortes por complicaçõessem depositoprocedimentos feitossem depositoclínicas clandestinas.
Hoje a organização atua também na Europa e na África, dando treinamento às organizações para comunicar as campanhas e apoio às iniciativas para mudar as leis locais.
Um exemplo recentesem depositoatuação nesse sentido aconteceu no Chile, onde o Congresso aprovou,sem depositoagosto, a descriminalizaçãosem depositocasosem depositoriscosem depositovida da mulher, inviabilidade fetal e estupro. Até então, qualquer tiposem depositoaborto era proibido.
Na Argentina, o Católicas por el Derecho a Decidir (CDD) participou das discussões que culminaram,sem deposito2006, na Leisem depositoEducação Sexual Integral - semelhante à educaçãosem depositogênero hoje debatida no Brasil -, na Lei para Prevenir e Erradicar a Violência contra a Mulher,sem deposito2009, e a Leisem depositoIdentidadesem depositoGênero,sem deposito2012, que permitiu que travestis e transexuais escolhessem o sexo no registro civil.
"Nos falta ainda a legalização do aborto", afirma Victoria Tesoriero, uma das coordenadoras do movimento argentino.
As evangélicas
Hoje há iniciativas semelhantes às ONGs católicas entre mulheres pentecostais e neopentecostais. O Evangélicas pela Igualdadesem depositoGênero (EIG), por exemplo, nasceusem deposito2015 voltado especialmente para a questão da violência contra a mulher.
"Eu nasci nas Assembleiassem depositoDeus, no movimento pentecostal, e durante muito tempo testemunhei todo tiposem depositoviolência, institucional, simbólica, assédio", conta Valéria Vilhena, uma das fundadoras da rede, que hoje soma 3 mil mulheres.
Emsem depositotesesem depositomestrado, feita na Universidade Metodista, onde dá aulas hoje, ela mergulhou no cotidianosem depositouma casasem depositoacolhimento para vítimassem depositoviolência domésticasem depositoSão Paulo e verificou que 40% das atendidas eram evangélicas.
O aborto, para ela, entra na problemática da negaçãosem depositodireitos às mulheres e da violência. A posição pública a favor, contudo, veio apenas neste ano,sem depositoreação à PEC 181.
"Não estamos trabalhando a questão da legalização a partir da Bíblia porque nós queremos desvinculá-la da questão religiosa. É uma questãosem depositosaúde pública", destaca. "A questão é essa: mulheres morrem", emenda.