'Quando visto meu jaleco, me torno um sonho possível para as crianças da favela', diz estudante negraestrelabet blogMedicina:estrelabet blog
Filhaestrelabet bloguma telefonista eestrelabet blogum bombeiro, diz se considerar "privilegiada" diante da realidade hostil que a cerca. Mas não se esquece das raízes.
"Quero devolver à minha comunidade o que vou aprender no cursoestrelabet blogMedicina. Quando ponho meu jaleco, prescrevo sonhos", diz ela sobre a perspectivaestrelabet blogfuturo que diz mostrar às crianças da favela.
Recentemente, um post da página Bocaestrelabet blogFavela no Facebook sobre Mirna viralizou. Foram quase 79 mil curtidas e maisestrelabet blog17 mil compartilhamentos.
Em depoimento à BBC Brasil, ela falou sobre pobreza, racismo, negritude e empoderamento feminino. Confira:
" estrelabet blog Nasci e cresci no Complexo do Lins, conjuntoestrelabet blogfavelas na Zona Norte do Rioestrelabet blogJaneiro. Hoje, aos 22 anos, me sinto uma privilegiada. Por esforço dos meus pais ─ ele, bombeiro, ela telefonista ─ consegui ter acesso ao estudo e foi por causa deles que hoje faço Medicina.
É até engraçado falarestrelabet blogprivilégio nas minhas circunstâncias. estrelabet blog Mas não são todas as pessoas daqui que têm um sonho e podem concretizá-lo. Sou uma exceção à regra. Fala-seestrelabet blogmeritocracia, mas ela é inexistente a partir do momento que nem todo mundo tem as mesmas oportunidades.
Com exceção do primário, sempre estudeiestrelabet blogcolégio particular. Ganhava bolsas parciais e meus pais se esforçavam para pagar o resto. Quando fiz curso pré-vestibular, a mensalidade eraestrelabet blogR$ 2 mil. Nunca teria esse dinheiro. Mas conviver com essas duas realidades completamente diferentes me permitiu ter maior senso crítico. estrelabet blog Conto nos dedos das mãos, por exemplo, os amigos que frequentavam minha casa durante a escola.
É desafiador ser negro e morarestrelabet bloguma favela no Brasil. estrelabet blog Vivo um preconceito duplo. Vez ou outra, sou seguida por segurançasestrelabet bloglojas.
Medicina
E quando decidi cursar Medicina, embora sempre tenha tido o apoio dos meus pais, muita gente próxima questionou minha escolha. Me perguntavam: estrelabet blog 'Você quer isso mesmo? Você não tem caraestrelabet blogmédica'.
Entendoestrelabet blogparte esse pensamento. A sociedade diz a nós, negros, que não vamos conseguir. Além disso, continuamos sofrendo com a faltaestrelabet blogrepresentatividade. Você entraestrelabet blogum hospital e vê poucos médicos negros. Atores negros ainda são uma minoria nas novelas. E tudo isso apesarestrelabet blogsermos a maioria da população.
Prestei vestibular por três anos até conseguir passar no cursoestrelabet blogMedicina. Entrei por cotas, mas não estudei menos por isso. Nas vezes que fui reprovada, fiquei muito mal. Sabia que meus pais tinham outras contas para pagar e não poderiam me bancar nessa situação. estrelabet blog Mas eles não desistiram do meu sonho. Nem eu.
Escolhi Medicina pela arteestrelabet blogcuidar do outro. E pretendo ser médicaestrelabet blogfamília. Não se trataestrelabet bloguma especialização muito divulgada e é até desprezada pelos próprios médicos.
Mas acho que meu envolvimento com essa área diz muitoestrelabet blogonde eu venho. estrelabet blog Quero devolver à minha comunidade o que me foi dado e atender a quem realmente precisa.
Racismo
Não vou generalizar, mas estrelabet blog sempre tem alguém que me olha torto na faculdade. Porque sou negra, moradoraestrelabet blogfavela e cotista.
No primeiro período, por exemplo, aconteceu um episódio do qual não me esqueço.
Eu e uma menina branca fomos as únicas a gabaritar a prova teóricaestrelabet blogAnatomia, uma das disciplinas mais temidas pelos alunos. Alguns colegas ficaram surpresos. Disseram que 'escondi o jogo' e me perguntaram como eu tinha tirado uma nota daquelas. Por quê? Se as pessoas mal se conheciam, por que tanta surpresa com o meu desempenho e não com o dela?
Recentemente, também fui alvoestrelabet blogum ataque racista na internet. Uma página moderada pelos alunos da Uerj, sem vínculo com a universidade, decidiu fazer um concursoestrelabet blogbeleza. Cada curso tinha uma representante - e eu fui escolhida para representar o cursoestrelabet blogMedicina.
Minha foto recebeu vários comentários racistas. Li coisas do tipo: estrelabet blog "Como assim essa preta tá fazendo Medicina?" ou "Você vota na negra mas não alimenta macaco no zoológico".
Decidi registrar uma denúncia na polícia. Mas não houve investigação. Se você não é artista, demora bastante.
Negritude
Acho que essa minha iniciativa foi um reflexo da minha maturidade. Me sinto mais consciente sobre meus direitos. estrelabet blog E também resolvi assumirestrelabet blogvez minha negritude, começando pelo meu cabelo.
Desde criança, alisava os fios. Hoje, percebo que fazia isso porque queria me enquadrar. Na escola, minhas amigas eram brancas e tinham cabelo liso.
Mas resolvi parar. Não queria mais ser refémestrelabet blogalgo que não me fazia bem. E foi uma ótima surpresa. Meu cabelo é lindo e amo os meus cachos. Antigamente, me embranquecia. Isso acabou. estrelabet blog Tenho orgulhoestrelabet blogser negra.
E hoje tenho cada vez mais certeza disso. Há alguns meses, participeiestrelabet bloguma ação sobre sexualidade na adolescência para escolas públicas no Morro dos Macacos. Na saídaestrelabet bloguma delas, as meninas negras pediram para tirar fotos comigo e elogiaram meu cabelo crespo. Elas me viram como referência.
Isso porque, estrelabet blog quando entro na favelaestrelabet blogjaleco, não prescrevo apenas remédios, prescrevo sonhos. Mostro para essas meninas que elas podem ter um futuro.
Coincidentemente, porém, no dia dessa ação na escola, voltei no mesmo ônibus que uma aluna. E quando desci no mesmo ponto que ela aqui pertoestrelabet blogcasa, ela perguntou: 'o que você tá fazendo aqui'?
Chorei muito. Mas isso só me fez ter mais consciência da minha função social. Com o perdão do trocadilho, estrelabet blog quero poder dar uma 'injeçãoestrelabet blogânimo' nessas pessoas.
Reconheço que aqui os sonhos são muitas vezes limitados pela faltaestrelabet blogoportunidades. Mas espero que um dia todos nós tenhamos chances iguais.
Não vai ser fácil, mas sei que é possível."