'A Índia é aqui': Impunidade fez estupro coletivo virar motivoostentação, diz promotora:
"Um deles revela até a autoria, o rosto. Qual é a mensagem que ele está passando? É'eu não acredito na lei, na polícia, na Justiça, eu não tô nem aí'. Essa mensagem não pode ficar para sociedade."
Chakian opina que a maneira como o vídeo foi compartilhado pelos suspeitos do estupro, que mostravam "orgulho" pelo crime praticado, é um sinalcomo a "violência contra a mulher é naturalizada no Brasil".
"O (episódio) mostra que praticar crime dessa natureza é motivovaidade,ser ostentado", diz.
"Não tem 30 monstros juntos. Não tem patologia nisso. É uma questão cultural. São 30 pessoas que participaram do crime e nenhuma delas agiu para evitar que aquele crime acontecesse. Isso revela uma sociedade criminosa e violenta contra a mulher. Que enxerga que o corpo da mulher é feito para o homem usufruir."
O crime foi bastante agravado, segundo a promotora, pela exposição das imagens da garota na web.
"A impunidade andamãos dadas com a violência. Precisa haver uma punição exemplar e essa punição tem que ser divulgada para que a sociedade saiba. Temos que conscientizar essa sociedadeque quem compartilha, quem faz piada, (está agindomodo) tão grave quanto ao do estuprador."
Comoção
O vídeo começou a ser compartilhado nas redes sociais na noite da última quarta-feira e logo despertou uma enxurradacomentários - algunstomcomoção e revolta, e outrostom jocoso.
A exposição do caso na web, porém, também fez com que centenaspessoas se mobilizassem para reportar os autores do vídeo ao Ministério Público do RioJaneiro. Até a manhã desta quinta-feira, o órgão já havia recebido mais800 denúncias relacionadas ao episódio.
"O lado positivo nesse marcrueldade é que foi graças à revolta da internet, dos usuários, que as denúncias chegaramum número muito grande ao Ministério Público", o que pode ajudar a polícia na identificaçãoresponsáveis, disse Chakian. Segundo a TV Globo, a polícia civil do Rio já identificou um suspeito do crime e outros doisterem divulgado as imagens online.
"A internet não pode ser encarada só no aspecto negativo. Ela também é usada como veículoempoderamento das pessoas para denunciar. As pessoas conseguiram denunciar com a mesma velocidade com que o vídeo foi divulgado."
Além da busca pelos suspeitos, a polícia do RioJaneiro está identificando também as pessoas que compartilharam o vídeo e endossaram o crime nas redes sociais. Segundo a promotoraSão Paulo, não existe tipificação específica para o atocompartilhar vídeos íntimos na internet, mas casos assim podem ser encaixados"apologia ao crime" ou "crime contra a honra".
"É bem verdade que a nossa legislação não acompanhou a evolução tecnológica. Mas esse caso pode se encaixarviolação da privacidade, que é crime mais grave no Estatuto da Criança e do Adolescente. É apologia ao crime, é crime contra a honra."
"As pessoas têm que entender que os que compartilharam são tão criminosos e conduta deles foi tão violenta quanto à do estuprosi", opinou Chakian.
'A Índia é aqui'
Além do episódio no RioJaneiro, vieram a público recentemente também outros dois casosestupro coletivo - ambos no Piauí, um no ano passado e outro na última semana. A promotoraSão Paulo explicou que crimes graves contra a mulher como esses tendem a ser mais comunspaíses onde a desigualdadegênero é mais acentuada.
"As pessoas falam da Índia e se chocam a cada casoestupro lá, mas a Índia é aqui. Gerou repercussão o casolá, mas a nossa realidade é similar", disse.
No Brasil, uma mulher é estuprada a cada 11 minutos, segundo os dados divulgados pelo Fórum BrasileiroSegurança Pública no final do ano passado. Em 2015, o país registrou 47.646 casosestupros.
"Por tudo isso, esse caso precisauma punição exemplar. E acimatudo, precisamos fazer um trabalhoeducaçãogênero,respeito ao corpo da mulher e aos direitos dela."