Sociedade alimenta cultura do estupro e tem que mudar, diz cineasta violentada aos 18 anos:
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O crime repercutiu e gerou protestos pedindo justiça e direitos iguais para mulheres na Índia – e Leslee decidiu mergulharuma jornada "traumática", como ela descreve, para "amplificar a voz daquelas mulheres"um documentário sobre o caso.
"Meu objetivo sempre foi usar isso como uma ferramenta poderosamudança. Eu queria levantar essa questão dos direitosmeninas e mulheres no mundo. Porque não é uma coisa da Índia", disse. "Todo país do mundo sofre dessa doença que é a desigualdadegênero. Nós precisamos agir, entender nossa responsabilidade nisso."
O filme India's daughter (Filha da Índia,português) estreoumarço internacionalmente e chegou ao Brasil nesta semana, com uma exibição públicaSão Paulo promovida pela ONG Plan International Brasil no lançamento da campanha "Quanto custa a violência sexual contra meninas?"
Para produzi-lo, a cineasta gravou 32 horasentrevista com os estupradores da menina na Índia e outros agressores sexuais. Ela achava que encontraria "monstros" ou psicopatas, mas se surpreendeu ao concluir que todos eles eram "homens normais".
"Eu juro que nem por um segundo das entrevistas eu senti um pingoraiva. Por que não? Pela mesma razão que esses homens não conseguem sentir nenhum remorso", relata.
"Ficou óbvio que esses homens foram programados para pensar o que pensam e agir como agem. Eles não são independentes, eles são conduzidos a pensar dessa maneira desde que nascem."
'Temos o que merecemos'
Leslee Udwin conta que precisou fazer algumas 'entrevistas-teste' (que não entrariam no filme) com outros estupradores para treinar'sanidade' antesenfrentar os agressoresSingh. E foi um deles que a fez identificar, ao mesmo tempo, o problema que gerava tantos casosestupro, e a solução para acabar com eles.
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O homemquestão havia estuprado uma menina5 anos. Ele descreveu tudo o que fez com ela e como "tampouboca para abafar os gritos com o cuidadonão tampar seu nariz para que ela pudesse se manter viva". A garota, como ele apontou, era da altura do seu joelho. Leslee lhe perguntou se ainda pensava nela e no que tinha feito. "Sim. E toda vez que penso, preciso ir ao banheiro", ele respondeu.
A faltaarrependimento demonstrada por ele fez com que a cineasta entendesse a cultura do estupro.
"Se você desvaloriza esse ser humano (mulher), se você aprende que elas não têm nenhum valor comparadas a você (homem), é claro que você vai tratá-las dessa forma. O que você espera?", questiona. "Nós somos responsáveis pelas atitudes deles, nós motivamos as atitudes deles. E nós como sociedade merecemos isso."
Leslee reforça que o caso retratado no filme faz parteuma questão mundial – a desvalorização da mulher -, que precisa ser combatida desde cedo.
"É só uma questão do grauintensidade do problema. Em alguns lugares estamos lidando com a faltarepresentatividade das mulheres no comando das empresas, ou as diferençassalário das mulheres, eoutros nós estamos falando da restrição dos direitos da mulher, como na Arábia Saudita, onde mulheres não podem dirigir um carro".
Solução
Foram tantos "choques" durante a produção do filme que,um determinado momento, Leslee admite que quis abandonar o barco. Em pânico por achar que aquilo era doloroso demais, a cineasta se inspirou na filha13 anos para seguir com o projeto.
"Ela me disse algo que nunca vou esquecer: 'Você não está sozinha. Eu e minha geração inteira estamos com você nessa'."
Não fosse isso, o filme A Filha da Índia não teria saído e, consequentemente, não teria provocado reflexão nas milhõespessoas que o assistiram no mundo todo, segundo ela. Mesmo banido na Índia, o documentário já foi visto por 1,6 milhãopessoas no país horas depois que foi lançado na internet. Mas só isso, Leslee reforça, não é o suficiente.
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Para combater o problema, ela defende uma mudança estrutural e global na educação, valorizando respeito, direitos humanos e igualdadegênero nas escolas.
"Quando crianças chegam a uma certa idade, que seria 6 anos, você não pode mudar os estereótipos que elas já aprenderam", opina.
Para lutar por essas mudanças, Leslee se aliou a ONU com o consultoraDireitos Humanos, e está ajudando na formulaçãoum novo currículo escolar com alteraçõesconceitos básicos da educação.
"Precisamos começar cedo com uma nova geração. Ensinar respeito na escola para que elas possam aprender a valorizar outros seres humanos. Nós não estamos ensinando crianças a pensar, a sentir, a ter empatia, vendo o mundo sob o pontovista do outro", diz.
E ela ainda faz um apelo para as mulheres. "Eu imploro para quem passou por isso (violência sexual) que fale, porque é muito importante. A culpa é deles, a vergonha é toda deles. É um erro e éuma maldade absurda colocar a culpa disso na mulher pelo que ela estava fazendo ou usando. É nojento e absurdo que isso ainda aconteça. E nós, como mulheres, precisamos reagir a isso."