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Tim Vickery: A queda da centro-esquerda, Trump e a conta que os pobres não pediram, mas terãopagar:
"O que estamos vendo agora com a ascensão do UKIP (partido da direita populista britânica), porém, é que evitar as questões difíceis é socialmente corrosivo e eleitoralmente perigoso no longo prazo."
Isso foi escritoagosto2014 e já explica a votação a favorBrexit (a saída da Grã-Bretanha da União Europeia) e o triunfoDonald Trump nos Estados Unidos. Então, só ficou surpreso aquele que não quis ver - embora na desigualdade crescente no mundo ocidental se torne mais fácil a elite ficar na ignorânciarelação à vida e às possibilidades dos menos favorecidos.
Cada vez mais, os 30% mais pobres são tratados como casopolícia. E perderam duas vezes.
A primeira, porque sumiram os empregos nas fábricas, que a força global da capital transferiu para praças onde se pode pagar menos.
E a segunda vem das consequências da crise financeira dos últimos anos. A ideia dominante no cenário pós-industrial era que a indústriaserviços financeiros ia salvar geral, gerando recursos suficientes para investir na redeproteção social.
Só que essa indústria implodiu. Nenhuma surpresa. A naturezafinanças é o desejocriar dívida, porque lucra com os juros. E fica emprestando e lucrando até extrapolar. Empresta para quem não tem possibilidadepagar. E a casa cai.
Sem regulamentos suficientes, a indústria financeira vai criar mais dívida particular do que uma sociedade pode aguentar. Aí vem a crise. E, num truquemagia, uma crise dos bancos e da dívida particular foi apresentada como uma coisa que nunca tinha sido - uma crisegastos públicos.
E o remédio foi um regimeausteridade, reduzindo tais gastos para reduzir a dívida. E quem sofre mais com isso? A parte da população que mais precisaserviços públicos. Os mais pobres, que não tinham sido a causa da crise, estão agora pagando o seu preço.
O pior é que estão pagando à toa, porque fica difícil enxergar um resultado positivo da políticaausteridade. E com certeza não tem êxitoreduzir a dívida - por motivos óbvios.
Cortar gastos públicos é tirar uma fatia da economia. O PIB vai encolher. A dívida pública permanece. Então essa dívida cresce como proporção do PIB. E com menos atividade econômica, a possibilidadepagar a dívida fica reduzida.
Nenhum espanto, então, que a austeridade venha gerando uma reação nas urnas.
Na Europa, onde tem sido mais aplicada, os partidoscentro-esquerda estão despencando. Durante anos ofereciam uma redistribuição tímida baseada num crescimento dependente na indústriaserviços financeiros. Desde a crise do setor, parecem perplexos, sem propostas.
E na busca por soluções, ideais mais extremos ganham força. Brexit e Trump são somente as consequências mais evidentes.
E o Brasil nisso? A austeridade chega com a PEC 55 num momentocontração do PIB. Tira a possibilidade da ação contracíclica, e as pessoas mais vulneráveis vão sentir.
Isso deveria gerar uma reação politica. Mas, com todos os partidos agora chafurdando na Lava Jato, quem vai tirar proveito? Quais forças vão emergir para canalizar a raiva? Uma pergunta fascinante para 2017.
*Tim Vickery é colunista da BBC Brasil e formadoHistória e Política pela UniversidadeWarwick.
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