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A teoria do 'útero errante' que deu origem ao ultrapassado conceitosuper sorte bet nethisteria:super sorte bet net
O órgão também acabou vinculado a uma doença que chegou até os divãs do psiquiatra austríaco Sigmund Freud (1856-1939): a "histeria".
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É difícil definir "histeria" sem cairsuper sorte bet netsimplificações. Mas, nas diferentes correntes médicas, o termo foi mantido para definir uma doença dos nervos, do desejo, que rege as emoções e as exacerba.
A histeria era caracterizada por uma grande variedadesuper sorte bet netsintomas que, conforme a época, variavamsuper sorte bet netestadossuper sorte bet netabatimento, respiração ofegante, silêncio e até espasmos. Uma verdadeira colchasuper sorte bet netretalhos – e todos os sintomas seriam provocados pelo útero, seus movimentos e alterações.
Não por acaso, a origem da palavra "histeria" vem do termo grego "ὑστέρα" ("hystéra", que significa "útero").
Do Egito para a Grécia antiga
A ideiasuper sorte bet netque o útero viajaria pelo corpo, afetando outros órgãos, surgiu pela primeira vez no antigo Egito.
Esta referência está incluída nos papirossuper sorte bet netKahun, que são considerados os textos médicos conhecidos mais antigos do Egito (1800 a.C.). Eles são especificamente dedicados à ginecologia.
E também se encontra no papiro Ebers, o maior existente, segundo Mercedes López Pérez, da Universidadesuper sorte bet netMúrcia, na Espanha, nasuper sorte bet netpesquisa La Transmisión a la Edad Mediasuper sorte bet netla Ciencia Médica Clásica ("A transmissão para a Idade Média da Ciência Médica Clássica",super sorte bet nettradução livre).
López Pérez menciona que estes papiros incluem, por exemplo, o casosuper sorte bet netuma mulher que se queixasuper sorte bet netdor nos olhos que se estende até a nuca e que não consegue enxergar.
O diagnóstico é que esses sintomas se devem "às substâncias uterinas que estão nos olhos" — e o "remédio" é uma fumigação com resina e gordura na vagina.
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Mas a expressão "útero errante" ficou mais conhecida na Grécia antiga.
O eminente filósofo grego Platão (428 a.C.-347 a.C.), fundador da Academiasuper sorte bet netAtenas, menciona este conceitosuper sorte bet netum dos seus famosos Diálogos, intitulado Timeu.
Platão escreveu que, nas mulheres, "a matriz e a vulva se parecem com um animal ansioso para procriar".
E, se ficar muito tempo sem produzir frutos, o útero (aqui, chamadosuper sorte bet netmatriz) "se irrita e se encoleriza; fica errante por todo o corpo".
As consequências são terríveis, segundo a descriçãosuper sorte bet netPlatãosuper sorte bet netTimeu.
"[O útero] fecha a passagem do ar, impede a respiração, coloca o corposuper sorte bet netextremos perigos e engendra mil enfermidades; e isso só é remediado quando o homem e a mulher, reunidos pelo desejo e pelo amor, fazem com que nasça um fruto, que é colhido como se colhe das árvores."
Platão não retira esta ideia diretamente dos egípcios, mas dos Tratados Hipocráticos, a compilaçãosuper sorte bet nettextos médicos atribuídos a Hipócrates (460 a.C.-370 a.C.), pai da medicina ocidental, segundo o médico Thomas A. H. MacCullouch no artigo "Theories of Hysteria" ("Teorias da histeria",super sorte bet nettradução livre),super sorte bet net1969, na publicação The Canadian Journal of Psychiatry.
Nos Tratados Hipocráticos, existe uma seção específica sobre as doenças das mulheres — e boa parte dela trata do útero e seu "deslocamento".
Todos os males inexplicáveis
É preciso entender que, embora houvesse dissecaçõessuper sorte bet netcorpos já no antigo Egito, López Pérez indica que este procedimento não era comum no temposuper sorte bet netHipócrates.
Por isso, não se tinha tanta certezasuper sorte bet netcomo era esse órgão ao qual eram associadas partessuper sorte bet netanimais, como ter duas bocas ou olfato. E se acreditava que o seu estado natural fosse úmido.
A médica Carole Reeves, do Centrosuper sorte bet netHistória da Medicina do University Collegesuper sorte bet netLondres, também destaca nasuper sorte bet netpalestra Wandering Wombs and Wicked Water – Women's Complaints and their Treatment ("Úteros errantes e águas malignas – as queixas das mulheres e seu tratamento",super sorte bet nettradução livre) que esses documentos precisam ser analisados levandosuper sorte bet netconta o conhecimento que se tinha na época e não do pontosuper sorte bet netvista contemporâneo.
Segundo os Tratados Hipocráticos, o úterosuper sorte bet netuma mulher que não teve relações sexuais "não tem umidade própria e possui um espaço amplo porque o ventre se esvaziou". Por isso, ele se desloca por todo o corpo por estar "mais seco e leve".
No interior do corpo, o útero seco poderia se mover até o fígado, o coração, as costas ou a garganta. O resultado era o mesmo.
Ele poderia se deslocar para qualquer lugar devido a essa leveza. E ali, fora do lugar, produzia uma sériesuper sorte bet netsintomas.
Se o útero se deslocasse para o fígado, por exemplo, acreditava-se que ele causaria os seguintes sintomas: "Asfixia, a parte branca dos olhos se volta para cima, as mulheres sentem frio e algumas chegam a ficar brancas e a ranger os dentes, a saliva vem à boa e chegam a parecer possuídas pela doençasuper sorte bet netHéracles [epilepsia]. Se a matriz ficar por um tempo ao lado do fígado e dos hipocôndrios, a mulher se asfixia".
O "útero errante" era a resposta aos diversos males inexplicáveissuper sorte bet netque padeciam as mulheres.
"Os antigos gregos também culpavam o órgão femininosuper sorte bet nettudo, desde convulsões até a depressão", afirma Elizabeth Kissling no seu artigo "The Wandering Uterus" ("O útero errante",super sorte bet nettradução livre), publicado pela Sociedadesuper sorte bet netPesquisa do Ciclo Menstrual, sediada nos Estados Unidos.
"O comportamento histérico (emoções forasuper sorte bet netcontrole, medos irracionais, conduta descontrolada e exagerada) foi associado às mulheres e o útero era o epicentro da culpa", segundo Kissling.
E havia vários "remédios" para o útero errante.
Como se achava que o útero teria o sentido do olfato, propunha-se aplicar um odor pestilento onde ele estivesse mal colocado e, ao mesmo tempo, um odor agradável na vulva. A ideia era que, atraído pelo bom aroma, ele regressaria para asuper sorte bet netposição correta.
Outra solução era irrigar a matriz com sêmen, já que se acreditava que o útero se deslocava por estar seco e árido. Por isso, a prescrição para as mulheres viúvas era engravidar e, às solteiras, que se casassem.
A teoria do útero errante chegou ao célebre médico grego Galeno (129-216).
Embora ele acreditasse que o útero não perambula pelo corpo, por parecer anatomicamente impossível, Galeno afirmava que o órgão mudariasuper sorte bet netposição, por exemplo, durante a gravidez.
O médico também manteve o conceitosuper sorte bet nethisteria como a grande causa das patologias femininas e suas variações, como a "asfixia uterina".
Os tratamentossuper sorte bet netGaleno para a histeria consistiamsuper sorte bet netpurgas (preparações com ervas) até que a mulher se casasse ou reprimir os estímulos que pudessem excitar as mulheres jovens, segundo o artigo científico "Women and Hysteria in the History of Mental Health" ("Mulheres e histeria na história da saúde mental",super sorte bet nettradução livre), publicado na Biblioteca Nacionalsuper sorte bet netMedicina dos Estados Unidos.
A mesma história durante séculos
A noçãosuper sorte bet netque a histeria seria um mal causado pelo útero e, consequentemente, uma doença exclusiva das mulheres durou por muito tempo.
Durante a Idade Média, essa doença chegou a ser chamadasuper sorte bet net"furor uterino" ou "malsuper sorte bet netamor", o que irá se repetir ao longo do Renascimento.
O diagnósticosuper sorte bet nethisteria, loucura ou estados emocionais instáveis nas mulheres permaneceu, por exemplo, na Inglaterra vitoriana (1837-1901).
Popularmente, havia a crençasuper sorte bet netque seria possível tratar a histeria com estimulação elétrica na vulva. Mas as teorias médicas do século 19 consideravam que os orgasmos poderiam ser perigosos.
"Acreditava-se que a masturbação nas mulheres causava histeria e não que as curava", segundo a professora e pesquisadora Kate Lister, da Universidadesuper sorte bet netLeeds Trinity, no Reino Unido, no seu livro A Curious Story of Sex ("Uma curiosa história do sexo",super sorte bet nettradução livre).
Havia também tratamentos radicais. Elizabeth Kissling explica que "se pensava que a histerectomia — a extirpação total ou parcial do útero — curava a instabilidade emocional, alémsuper sorte bet netuma sériesuper sorte bet netoutros sintomas não relacionados".
Até que chegou Briquet
O médico e psicólogo francês Paul Briquet (1796-1881) instaurou um novo paradigma: talvez, a histeria não tivesse nada a ver com o útero.
"O desenvolvimento da neurologia fez com que a concepção do paciente 'nervoso' fosse observada com uma base mais respeitável e científica", defende Thomas A. H. MacCullouch, "e houve uma mudançasuper sorte bet netênfase no útero para passar ao sistema nervoso".
No seu livro Traité Clinique et Thérapeutiquesuper sorte bet netl'Hystérie ("Tratado clínico e terapêutico da histeria",super sorte bet nettradução livre), Briquet trata dessa condição como "neurose do encéfalo", não relacionada com a atividade sexual.
O médico também começou a refletir sobre a necessidadesuper sorte bet netalterar o nome da condição, o que só aconteceria um século depois.
A partir dali, a próxima mudança importante foi não só desvincular a histeria do útero, mas eliminar a ideiasuper sorte bet netque seria uma doença essencialmente feminina.
Para isso, foi fundamental a contribuição do neurologista francês e professorsuper sorte bet netanatomia patológica Jean-Martin Charcot (1825-1893).
Charcot não diferenciava as doenças neurológicassuper sorte bet nethomens e mulheres. Para ele, a histeria seriasuper sorte bet netorigem neuronal,super sorte bet netforma que ele se dispôs a estudá-lasuper sorte bet netpacientessuper sorte bet netambos os sexos.
Até o ano dasuper sorte bet netmorte (1893), Charcot publicou maissuper sorte bet net60 casossuper sorte bet nethisteria masculina atendidos por ele. É quando chegamos ao famoso médico e psicólogo Sigmund Freud, que foi discípulosuper sorte bet netCharcot.
Freud dedicou maior importância ao aspecto psicológico da doença e procurou se aprofundarsuper sorte bet netum conceito que já havia sido adotado por Charcot: osuper sorte bet nettrauma.
Com isso, a histeria passou a ser vista como uma doençasuper sorte bet netorigem psicológica, causada por traumas — muito frequentemente,super sorte bet netnatureza sexual.
Segundo a psicanálise, o sintoma histérico é a expressão da impossibilidadesuper sorte bet netrealização do impulso sexual, como mencionam Cecilia Tasca, Mariangela Rapetti, Mauro Giovanni Carta e Bianca Fadda, autores do artigo científico intitulado "Women and Hysteria in the History of Mental Health" ("Mulheres e histeria na história da saúde mental",super sorte bet nettradução livre).
Embora já se houvesse avançado para desvincular a histeria da mulher, Freud centralizou seu estudo principalmentesuper sorte bet netmulheres e registrou apenas um caso masculino — que, por sinal, passou despercebido.
Da histeria para o transtornosuper sorte bet netconversão
A palavra "histeria", presente há dois milênios nos tratadossuper sorte bet netmedicina, só foi excluída do Manualsuper sorte bet netDiagnóstico e Estatístico dos Transtornos Mentais da Associação Americanasuper sorte bet netPsiquiatria (APA, na siglasuper sorte bet netinglês) na metade do século 20.
O artigo "Women and Hysteria in the History of Mental Health" indica que o conceitosuper sorte bet net"neurose histérica" foi eliminadosuper sorte bet net1980 e que "os sintomas histéricos agora são considerados uma manifestaçãosuper sorte bet nettranstornos dissociativos".
O Dicionário da Real Academia Espanhola (RAE) definia a histeria como uma "enfermidade nervosa, crônica, mais frequente na mulher que no homem". A RAE alterou esta definiçãosuper sorte bet net2017.
Vale ressaltar que,super sorte bet netportuguês, o Dicionário Caldas Aulete mencionava, já na décadasuper sorte bet net1970, que a palavra "histeria" vem do grego "hystera" (útero) porque "se supunha que esta doença era somente feminina e tinha asuper sorte bet netsede no útero".
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