O deserto na Califórnia onde os EUA abandonam imigrantes que conseguem entrar no país:black jack as
A intenção dela é atravessar para os Estados Unidos, entregar-se às autoridades e pedir asilo.
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E hoje terá que passar a noite a céu aberto e com um vento que corta este trecho do deserto californiano, no meio do caminho entre San Diego e Calexico, a quilômetros da cidade mais próxima – Jacumba – eblack jack asqualquer estrada asfaltada.
Uma médiablack jack as500 migrantes fazem isso todos os dias desde maio, à esperablack jack asserem recolhidos para que os seus casos possam ser julgados.
Não se tratablack jack asum centroblack jack asdetenção oficial, mas simblack jack asuma espécieblack jack assalablack jack asespera informalblack jack asum sistema saturado, segundo explicações da própria Alfândega e Proteçãoblack jack asFronteiras (CBP, porblack jack assiglablack jack asinglês). Mas sair seria considerado um crime federal.
"Deixaram-nos no meio do nada, sem qualquer recurso", lamenta a jovem enfermeira, esfregando as mãos para se livrar do frio. "E quem sabe até quando. Tem gente que passou até cinco dias aqui."
Acampamentos sem infraestrutura
Eles o chamamblack jack asCamp Willow e é um dos três assentamentos na região.
Ainda que, para ser um acampamento, teria que haver uma infraestrutura mínima.
E a única coisa que se encontra entre os arbustos, os terrenos áridos e as rochas metamórficas típicas desta paisagem são dois banheiros químicos fornecidos pelas autoridades americanas e que são esvaziados uma vez por semana.
Também há meia dúziablack jack astendas cor-de-rosa doadas por organizações que defendem os direitos dos migrantes.
Theresa Chang é voluntáriablack jack asuma delas, a Border Kindness.
Médica por profissão e advogada por formação, ela saiublack jack asSão Francisco emblack jack assemanablack jack asfolga para ajudar os voluntários locais que fornecem água e comida duas vezes por dia.
Sua tarefa é avaliar a saúdeblack jack asquem espera aqui e ajudar caso alguém esteja passando por uma crise médica. Chang acabablack jack asver algo que a preocupa.
"Ela tem sintomasblack jack asdanos cerebrais", ela me conta sobre Yenis Leydi Arias, uma jovemblack jack asolhos negros profundos que se expressa com dificuldade.
"Saímosblack jack asCuba com o sonhoblack jack asvir para os Estados Unidos e vejam como chegamos: inválidos", disse-me ela apenas, com frases cortadas e pausas cada vez mais longas.
Enquanto isso, Armando Cárdenas, um homem que carrega nos olhos a inquietação do Caribeblack jack astemposblack jack asfuracão, a ajuda a calçar os sapatos e a cobrir as pernas, que já não respondem, com um cobertor.
Para fazer isso, ele deixoublack jack aslado por um momento o andador que usa para se deslocar.
São as consequências mais visíveisblack jack asum acidenteblack jack astrânsito que eles sofreramblack jack asChiapas, no sul do México, o terceiro país emblack jack asrota para o norte desde que deixaram para trás seu bairroblack jack asHavana,black jack assetembro, para voar para a Nicarágua.
"Passei 25 dias inconscienteblack jack asum hospitalblack jack asHuixtla. Quando acordei, me disseram que eu não conseguiria mais usar o braço", explica. "E quebrei o fêmur e o quadril."
Eu me pergunto como eles conseguiram percorrer os quase 4.000 km que separam as fronteiras sul e norte do país nessas condições, enquanto Chang tenta entrarblack jack ascontato com a Patrulha da Fronteira para que os retirem.
"O trabalho das autoridades"
Os demais voluntários se preparam para distribuir garrafasblack jack aságua, sopablack jack asfeijão, sanduíchesblack jack aspastablack jack asamendoim e geleia e chá quente.
Debaixoblack jack asalguns cobertores presos com cordas ao muro da fronteira como uma tenda, duas crianças correm para fazer fila.
Pelas vozes e sons que vêmblack jack asdentro, pode-se adivinhar que são mais e que estão matando o tempo jogando no celular. Enquanto houver bateria, há uma certa normalidade.
Três mulheres com cinco filhos deixaram o Equador há oito semanas, diz María, mãeblack jack asduas delas. Elas administravam uma pequena mercearia, mas foram forçadas a fechá-la por conta das extorsões.
"As gangues", afirma quando questionada sobre quem as estava extorquindo. "O país ficou muito feio", diz, enquanto grita às crianças que ainda estão abrigadas que, se não se apressarem, ficarão semblack jack ascomida.
A comida trazida pelos voluntários é a única que você verá nos acampamentos durante toda a semana.
Ela é preparada graças a doações e recursos própriosblack jack asorganizações como a já citada Border Kindness ou Al Otro Lado, no que já foi o centroblack jack asjovensblack jack asJacumba.
Nesta pitoresca aldeiablack jack as550 habitantes, estima-se que nos últimos dois meses tenham alimentado 16 mil migrantes.
"Estamos fazendo o trabalho que a Cruz Vermelha costuma fazerblack jack assituações como esta. O trabalho que as autoridades deveriam fazer", diz Samuel Schultz.
Um engenheiro que trabalhou durante anos como empreiteiro para agências internacionaisblack jack asajuda humanitária no Sudeste Asiático sublinha que hoje, já aposentado, enfrenta um "potencial desastre" às portas dablack jack ascasa.
Números recordes
Desde o início do ano, maisblack jack as2 milhõesblack jack asmigrantes foram detidos na fronteira entre o México e os Estados Unidos, um número recorde, segundo dados do Gabineteblack jack asAlfândega e Proteçãoblack jack asFronteiras.
O Título 42, regra que desde marçoblack jack as2020 permitia às autoridades americanas expulsar rapidamente estrangeiros que tentassem entrar irregularmente no país, expiroublack jack asmaioblack jack as2023.
Antes do fim da política, a administração Biden criou mais vias legaisblack jack asentrada para os migrantes, ao mesmo tempo que endureceu as punições para a travessia ilegal.
Com tudo isso,black jack asjunho o númeroblack jack asapreensões na fronteira caiu maisblack jack as40%.
Mas esta tendência não continuou e voltou a aumentarblack jack asforma constante, ao pontoblack jack asterem sido realizadas 300 mil detenções sóblack jack asoutubro.
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"O Departamentoblack jack asSegurança Interna continua cumprindo as leisblack jack asimigração dos EUA, expandindo as vias legais e ao mesmo tempo reforçando as consequências para aqueles que atravessam a nossa fronteira ilegalmente", disse um porta-voz da agência, quando questionado sobre a razão pela qual centenasblack jack aspessoas são mantidas durante horas, até mesmo dias,black jack ascampos como Willow.
Em comunicado enviado à BBC, lembrou que quem entrou irregularmente está sujeito à deportação e será proibidoblack jack asentrar nos EUA por pelo menos cinco anos, alémblack jack asenfrentar possíveis processos criminais caso tente novamente sem autorização, conforme a norma que está agorablack jack asvigor, o Título 8.
"O CBP está aproveitando todos os recursos e parcerias disponíveis para examinar e julgar os migrantesblack jack asforma eficiente eblack jack asacordo com a lei", continua.
"A agência continua enviando pessoas, transporte, processamento e recursos humanitários para as áreas mais movimentadas e difíceisblack jack astoda a região fronteiriçablack jack asSan Diego, onde organizaçõesblack jack astráfico com fins lucrativos abandonam cruelmente os migrantes, muitas vezes sem preparação adequada."
Numa conversa informal, um agente da Patrulhablack jack asFronteira afirma que o objetivo é transportá-los o mais rapidamente possível do terreno para as instalaçõesblack jack asprocessamento onde os casos serão examinados para que os mais vulneráveis sejam priorizados.
As críticas e o escrutínio público sobre o que tem acontecido desde maio estão aumentando.
Nesta mesma semana, sete organizações que defendem os direitos dos migrantes apresentaram uma queixa federal urgente contra o Gabineteblack jack asDireitos Civis e Liberdades Civis (CRCL, siglablack jack asinglês) do Departamentoblack jack asSegurança Interna e o seu Gabineteblack jack asAlfândega e Proteçãoblack jack asFronteiras (CBP,black jack asinglês) por violarem os suas próprias normasblack jack ascustódia para requerentesblack jack asasilo detidos nestes campos.
Isso ocorreublack jack asmaio, quando detectaram a prática pela primeira vez, e garantem que desde então pelo menos uma pessoa morreu no local.
"É indignante que o Departamentoblack jack asSegurança Interna afirme que ablack jack as‘faltablack jack asrecursos’ o obriga a manter refugiados vulneráveis em prisões ao ar livre, sem comida, água, abrigo, instalações sanitárias adequadas ou cuidados médicos", disse a diretora-executiva da Al Otro Lado, Erika Pinheiro.
No Camp Willow, vemos a Patrulhablack jack asação.
Dois agentes uniformizados fazem com que os migrantes formem seis longas filas.
Algumas dezenas entramblack jack asvans. Muitos mais ficaram para trás, migrantesblack jack aspaíses tão diversos como China, Uzbequistão, Camarões, Brasil e Turquia.
Essa diversidadeblack jack asorigem também é evidente nos outros dois acampamentos ao ar livre localizados no deserto ao redorblack jack asJacumba e chamadosblack jack asVale da Lua e Campo 177.
Nesse último, o advogado turco Aygen e ablack jack asesposa Öykü não conseguem acreditar que, depoisblack jack asterem pago 20 mil dólares aos traficantes que contrataram através das redes sociais para saíremblack jack asIstambul e atravessarem um oceano e quase um continente para chegarem onde estão, tenhamblack jack aspassar a noite ao ar livre.
Alguns compatriotas já começaram a se preparar para os 6ºC previstos para a noite, cortando cactos e arbustos e acendendo para fazer uma fogueira.
Isso, e o fatoblack jack as"tudo estar cheioblack jack aslixo", é algo que enfureceu Jerry Schuster, que emigrou da antiga Iugoslávia há anos e possui terras nas proximidades.
"Já basta", disse ele à BBC. "Temos que impedir que essas pessoas continuem vindo para cá."
Em vezblack jack asse preocupar com uma guerra externa na Ucrânia, o presidente deveria ir até a fronteira e enfrentar esta crise, afirma.
Os republicanos no Congresso concordam com ele. Numa votação na semana passada, bloquearam financiamento adicional para a Ucrânia, a menos que a administração Biden concorde com uma reforma imigratória linha-dura.
Do outro lado do muro, as autoridadesblack jack asimigração mexicanas também destacam o aumento das chegadas e a origem dos migrantes.
"Estamos impressionados com os números", confessa David Pérez Tejada, chefe do Instituto Nacionalblack jack asMigração (INM) do México na Baixa Califórnia, Estado que faz fronteira com a Califórnia americana, à BBC Mundo.
"Pessoasblack jack as126 países chegam todos os meses aos aeroportosblack jack asMexicali e Tijuana. Os números estão crescendo. E muitos também chegam por via terrestre, com a decisão finalblack jack asatravessar (a fronteira) e pedir asilo" nos Estados Unidos.
Enquanto isso, Schultz continua coordenando voluntários e servindo refeições no deserto.
"A Patrulha da Fronteira nos disse que a única forma desta situação mudar é pararmosblack jack asfazer o que fazemos e os migrantes começarem a passar fome, adoecerem e talvez morrerem aqui."
E isso, enquanto tenha feijão e água para distribuir, é algo que ele recusa.