'Bombeiro herói' salva mulhercoma usando colchão para boiar na água no RS:
Rudinei é considerado um herói pela populaçãoEldorado do Sul. Em toda a operação das enchentes, ele contabiliza ter resgatado pelo menos 250 pessoas das águas barrentas que alagam a cidade.
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O município foi proporcionalmente o mais afetado pelas inundações no Rio Grande do Sul. Segundo o governo, Eldorado do Sul chegou a ter 98%sua área alagada durante as enchentes - apenas a rodovia não foi afetada.
A área urbana ficou completamente debaixo d’água, inclusive a casaRudinei, que precisou dormir algumas noites no terceiro andar do prédio da prefeitura. A sede da administração municipal se tornou a sede da Defesa Civil e até dos bombeiros depois que o quartel também ficou debaixo d’água.
O prédio abrigou até mesmo uma UnidadeTerapia Intensiva (UTI) após os hospitais e postossaúde serem tomados pela água.
'A enchente começou'
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Rudinei relatou à BBC News Brasil o que passou na tragédia das inundações. Confira a seguir:
"Antestudo acontecer, tínhamos a previsão das autoridadesque iriam subir os níveis do Lago Guaíba e, consequentemente, haveria uma nova enchente aqui no nosso município. Então, dois dias antescomeçar a inundar as primeiras ruas, nós já emitimos alguns alertas e vídeos explicativos para que as pessoas não ficassem esperando.
A enchente começou. No segundo diaremoção das pessoas das áreas alagadas, havia muitos pedidos. A cada minuto, havia três pedidos ou mais.
Às 18h30 chovia bastante e chegou um chamado via telefone. Nossa colega que fez o atendimento telefônico relatou que havia a necessidadefazer um resgateuma pessoa acamada, uma pessoa idosa que necessitavaatendimento especial porque ela não tinha nenhum tipomovimento.
Então isso nos fez pensarcomo chegar até aquele local e como entrar. Quando a gente recebe um chamado, a gente já vai imaginando todas as situações que a gente pode se deparar, qual é o tipoequipamento que a gente pode levar, quais as pessoas que a gente necessita. Quantos bombeiros a gente vai precisar no local, se a embarcação consegue chegar e se vamos precisaruma viatura leve ou pesada.
Na triagem via telefônica com a filha dessa pessoa, que estavaoutra cidade, vimos que ela não sabia exatamente como estava a situação, o que é mais uma questão que a gente tem que levarconsideração. Porque a informação que ela está nos passando por telefone não équem está no local, então isso pode ser uma coisa boa ou pode ser uma surpresa que talvez a gente perca um poucotempo, pois a gente não sabe exatamente qual a magnitude e grandeza desse atendimento.
Mas como a pessoa nos relatou que a mãe dela, no caso, era uma pessoaidadeestado terminal, sem movimentos e dependenteuma cuidadora que também já tem certa idade, ela não conseguiria ir para um local mais seguro sozinha.
Nessas condições, fomos até o local. Lá já estava sem energia elétrica e praticamente toda a cidade já estava às escuras, Chegamos com a nossa ambulância até próximo a esse local. Ali, colocamos nossa embarcação na água. Um barco sem motor. Fomos remando até a casa.
Nos identificamos como bombeiros e entrei primeiro para verificar a situação. A gente faz uma análisetoda a cinemática e aí retornamos para a equipe.
Como a gente verificou que seria possível passar o colchão pela porta onde ela estava, entramos e deixamos o barco ancorado próximo à entrada da casa.
Quando chegamos ao local, a altura da água já estava encostando no colchão e ele já estava flutuando um pouco. A pessoa recebia oxigenoterapia e estava ligada a aparelhos para tomar medicamentos.
A vítima era uma senhora, que tinhatorno70 anos, e se alimentava por sonda, alémnão se movimentar. Pelo tempo acamada, ela tinha os membros muito enrijecidos, o que não facilitava a mobilidade. A gente teve que colocar um cobertor por baixo dela, com muito cuidado, vários bombeiros que estavam submersos a suspenderam.
Colocamos elacima do colchão novamente e fomos puxando o colchão sobre a água, cuidando para que ele não afundasse.
O desafio seguinte foi passar pela porta porque ela era bem estreita. Então apertamos um pouco a lateral do colchão para que ele dobrasse levemente e pudesse passar.
Com todo o cuidado, a gente fez esse movimentolateralização sempre com cuidado com o tubooxigênio dela.
Levá-labarco até o hospital também foi um desafio, um desafio colocá-lacima do barco. Sem dizer que esse não é o meio mais adequado para fazer o transporteuma vítima com essa necessidade. Fizemos o caminho até a ambulância, que nos aguardava numa área seca, muito cuidado, pois estava completamente escuro e com as águas turbulentas.
Levamos ela para o postosaúde e a deixamos aos cuidados dos médicos. A maioria das pessoas que estavam nessas condições foi transferida para Porto Alegre, via terrestre ou por aeronaves.
Com certeza ela foi transferida para Porto Alegre porque o pronto atendimento estava recebendo muita demanda, então não poderia ficar com tantas pessoas nessas condições.
Fizemos tudo isso tendo que proteger uma pessoa que não consegue responder o que está acontecendo com ela. Uma vítima que não pode te dizer onde está doendo. Tivemos apenas os relatos da cuidadora dessa idosa.
Essa ocorrência nos causou um desgaste físico e emocional muito grande, por ser um trabalho noturno, sem praticamente nenhuma iluminação. Foi perigoso e bem complexo. Demandou bastante trabalho da equipe.
Foram cinco bombeiros envolvidos, além da equipe da ambulância.
É difícil quantificar quantos resgates eu fiz nessa operação das enchentes porque foram inúmeras viagensbarco, indo aos bairros e voltando até o localdesembarque. Mas nós temos uma estimativaque toda a equipe dos Bombeiros VoluntáriosEldorado do Sul socorreramtorno4 mil pessoas.
Como eu trabalho como comando na linhafrente, acredito que fiztorno250 atendimentos.
Nós tivemos várias embarcações e motores que se danificaram devido ao grande fluxoresgates e também por conta do grande númeroobstáculos submersos. Havia veículos, madeira, galhos e todo o tipomaterial debaixo d'água e isso acaba dificultando a navegação. Por muitas vezes, tínhamos que parar a operação, tirar o motor e limpar antescontinuar.
Se ele quebrasse, a gente tinha que parar e consertar. Sem dúvida, as enchentes foram a maior ocorrência que a gente já enfrentou. Porque quando tu vai num combate a incêndio, num acidente veicular é uma operação pontual que demanda pouco tempo."