Chico Mendes, o ativista executado com tiro no peito que inspira luta ambiental até hoje e 'virou passarinho':poker dinheiro

Rodrigues diz que isso se tornou mais claro a partir dos anos 1970, quando começou a ficar evidente ao mundo todos os possíveis riscos para a humanidade que os desequilíbrios ambientais poderiam causar.

"Atualmente, o problema principal continua o mesmo: a harmonia entre o homem e a natureza", diz o analista.

"Acrescia-se àpoker dinheiroépoca a luta pela garantia do território, onde os seringueiros pudessem extrair o látex, plantar e colher, mas também manter o seu modopoker dinheirovida, criar seus filhos e manterpoker dinheirofamília sem que a escória do capitalismo os incomodassem."

A figurapoker dinheiroChico Mendes, porém, está longepoker dinheiroser unanimidade entre os brasileiros e segue provocando discussões mesmo após tanto tempo.

Pesquisador na Universidade Estadual Paulista (Unesp), o historiador Victor Missiato diz que "a disputa pela memória é sempre um espaçopoker dinheiroconfronto" e, no casopoker dinheiroMendes, ele acredita que há um "consenso social" sobrepoker dinheiroluta, mas não há um "consenso político".

"Isto se dá pelas polarizações que vivemos nos últimos tempos", avalia ele, à BBC News Brasil.

Parte da direita o menospreza — ou o despreza. Quando era ministro do Meio Ambiente na gestãopoker dinheiroJair Bolsonaro, Ricardo Salles afirmou que falar sobre Chico Mendes era "irrelevante".

"Ele usava os seringueiros para se beneficiar, fazia uma manipulação da opinião [pública]", afirmou Salles.

Essa polarização parecia estar latente já no períodopoker dinheiroque Mendes era vivo. Ele chegou a afirmar, por exemplo, que "ecologia sem lutapoker dinheiroclasses é jardinagem".

Em 2013, a bancada ruralista rechaçou a propostapoker dinheirodar o nomepoker dinheiroChico Mendes ao plenário onde foi instalada a Comissão da Amazônia, na Câmara.

Os principais críticos do tributo foram os deputados Moreira Mendes e Paulo César Quartiero. Para eles, a história do ativista não passavapoker dinheiro"uma farsa" e homenageá-lo na Câmara seria "infeliz escolha".

Mas Chico Mendes pode hoje ser classificado como "ambientalista", sem cair no anacronismo — ou seja, tentar encaixarpoker dinheiroatuação com basepoker dinheirovalores atuais?

A resposta não é tão simples.

O historiador Sérgio Roberto Gomespoker dinheiroSouza, professor na Universidade Federal do Acre (Ufac), sugere um esforço para "sermos ucrônicos".

O ucronismo é a referência a um período hipotético da história,poker dinheirotempo não claramente definido. Isso é: perceber como as "outras temporalidades convivem".

"Se analisarmos os movimentos liderados por Chico Mendes perceberemos que, mesmo com muitas conquistas, alguns elementospoker dinheiroopressão e exploração que combateram se expressam no tempo presente. Dito isso, talvez seja importante, inicialmente, ressignificarmos os debates sobre preocupações ambientais", diz Souza.

Para o historiador, a chave passa por desconstruir o que ele chamapoker dinheiro"estigmapoker dinheirovazios" da Amazônia.

"Neste caso, não haveria a dicotômica entre humanos e natureza, mas sim a percepçãopoker dinheiroque existem diferentes relações entre eles. Isto implicariapoker dinheiromediações. Teríamos que aprender sobre respeito aos outros saberes e fazeres e que esta pluralidadepoker dinheirovidas poderia nos ensinar como proceder", argumenta.

Chico Mendes defendia a criaçãopoker dinheiroreservas extrativistas, onde seriam permitidas apenas atividades não predatórias e a geraçãopoker dinheirorenda para os seringueiros e extrativistas sem devastar a floresta.

"Mas, talvez, como escreveu o próprio Chico: 'Desculpem, eu estava sonhando quando escrevi sobre estes acontecimentos, que eu mesmo não verei, mas tive o prazerpoker dinheiroter sonhado'", acrescenta Souza.

Juradopoker dinheiromorte

Nascidopoker dinheiroXapuri, cidade perto da fronteira do Acre com a Bolívia, o ativista teve a vida abreviada porque incomodou muita gente — diretamente, grileirospoker dinheiroterra da região.

Em 22poker dinheirodezembropoker dinheiro1988, exatamente uma semana depois do seu aniversáriopoker dinheiro44 anos, foi executado com um tiro no peito. Ele estava nos fundospoker dinheirosua casa.

"No Brasil, quando alguém telefona e diz que você vai morrer, não é somente uma ameaça, mas a afirmaçãopoker dinheiroum fato. Você foi juradopoker dinheiromorte", escreve o jornalista americano Alex Shoumatoff no livro O Mundopoker dinheiroChamas — A Devastação da Amazônia e a Tragédiapoker dinheiroChico Mendes.

Chico Mendes, segundo a obra, foi juradopoker dinheiromortepoker dinheiro24poker dinheiromaiopoker dinheiro1988, quando soube "que estava liquidado".

"Era o líderpoker dinheiroum movimentopoker dinheiroraízes, surgido entre centenaspoker dinheiromilharespoker dinheirotrabalhadores que ganhavam a vida extraindo a seiva das seringueiras espalhadas pela floresta tropical, e seu nome despontava como uma das principais figuras do esforço internacional para salvar a Amazônia", escreveu Shoumatoff.

O jornalista relata que o ativista já havia sobrevivido a cinco atentados, a esta altura, e estava com a vidapoker dinheirorisco desde 1980.

Ele contextualiza lembrando que, na época, não havia "mais do que 130 fazendeirospoker dinheirotodo o Acre" e, "mesmo assim, esses poucos fazendeiros expulsaram da floresta, com seus pistoleiros, dezenaspoker dinheiromilhares, talvez centenaspoker dinheiromilharespoker dinheiroseringueiros". Era uma verdadeira guerra.

"Chico Mendes não ficou surpreso ao receber o chamado anônimo informando que ele não viveria além daquele ano", pontua o jornalista.

"Na noitepoker dinheiro22poker dinheirodezembropoker dinheiro1988, ele foi morto por um tiropoker dinheiroespingarda no peito ao sair para o quintalpoker dinheirosua casa, quando se dirigia para o chuveiro."

Dois anos depois do assassinatopoker dinheiroChico Mendes,poker dinheirodezembropoker dinheiro1990, a Justiça condenou os fazendeiros Darly Alves da Silva e seu filho, Darci Alves Pereira, a 19 anospoker dinheiroprisão. Réu confesso, Darci foi o autor do disparo que matou o ativista.

Ambos fugiram da cadeiapoker dinheiro1993 e foram recapturados três anos mais tarde.

Em 28poker dinheirofevereiro deste ano, Darci Alves Pereira, hoje conhecido como pastor Daniel, assumiu a presidência do Partido Liberal (PL), mesma legenda do ex-presidente Jair Bolsonaro, no municípiopoker dinheiroMedicilândia, no Pará.

Quando a notícia se espalhou, a cúpula do partido resolveu destituí-lo do cargo.

À imprensa, Darci afirmou: "Já paguei pela minha vida do passado".

A tática do 'empate'

Filhopoker dinheiroum migrante cearense, Chico Mendes nasceupoker dinheiroum seringal acreano.

Aprendeu o ofício ainda criança, porque costumava acompanhar o pai nas incursões pela mata.

Foi alfabetizado apenas aos 19 anos — segundo relato dele próprio, aprendeu as letras por meiopoker dinheiroum militante comunista que moravapoker dinheiroXapuri.

O início do ativismo político e ambientalpoker dinheiroMendes coincide com o auge da ditadura militar e o plano políticopoker dinheiroocupar agressivamente a Amazônia.

Com o incentivo à pecuária na região, os seringueiros passaram a sofrer por conta da especulação imobiliária. E, claro, a devastação ambiental, porque era preciso passar a boiada, também passou a afetar diretamente o trabalho extrativista dos seringueiros.

"Com a expansão capitalista para a Amazônia a partirpoker dinheirooutras perspectivas, durante o período do regime da ditadura militar, o Estado brasileiro reproduziu um discurso constituído pela modernidade desde o século 16, ou seja, a caracterização dos espaços das Amazônias enquanto vazios", contextualiza o historiador Sérgio Robertopoker dinheiroSouza, da Ufac.

Na buscapoker dinheirolegitimidade para a exploração dessas regiões, diz o pesquisador, foram ignoradas as populações que já viviam ali há pelo menos a 10 mil anos.

"Assim, com o aval do Estado brasileiro, expropriam terras e eliminam vidas e vivências, levando a processos intensospoker dinheiroresistências e existências", diz Souza.

Em 1975, Mendes se tornou secretário-geral do Sindicato dos Trabalhadores Ruraispoker dinheiroBrasileia, município no sul do Acre.

Já consciente do problema ambiental resultante do desmatamento forapoker dinheirocontrole da floresta, ele passou a integrar e incentivar a luta dos seringueirospoker dinheiroprol do meio ambiente.

Foi quando se intensificaram os eventos da tática conhecida como "empate" —poker dinheiroque os manifestantes, pacificamente, protegiam as árvores com seus próprios corpos, impedindo o prosseguimento das derrubadas.

"Este ato expressa uma profunda concepçãopoker dinheiropertencimento,poker dinheirouma relação efetiva e afetiva com os territórios sociais onde viviam", afirma Souza.

O historiador argumenta que essa atuaçãopoker dinheiroMendes revela um movimento "muito alémpoker dinheiroecológico", que vai lutar por manutençãopoker dinheiromodospoker dinheirovida e luta por existência.

O analista ambiental Erivan Ribeiro Rodrigues elenca essas manifestações pacíficas entre os pontos altos da trajetóriapoker dinheiroMendes.

"No seringal Cachoeira,poker dinheirouma tarde sombria, Chico Mendes e outros seringueiros, juntamente com mulheres e crianças, embrearam na mata rumo ao acampamento dos trabalhadores que iriam iniciar a derrubada", relata.

"Cabe lembrar que ele já estava juradopoker dinheiromorte e ainda assim se fez presente diantepoker dinheirojagunços e policiais para empatar a derrubada."

Este seringal havia sido comprado pelo mandantepoker dinheirosua morte, o fazendeiro Darly Alves, acrescenta Rodrigues.

Para o cineasta Sérgiopoker dinheiroCarvalho, autor do filme Empate, sobre o legado do ativista, que estreou este mês nos cinemas, Chico Mendes ainda fascina por "sua compreensão da urgênciapoker dinheirotrazer a Amazônia para a pauta do mundo"

"O que mais me fascina é a contemporaneidade das ideias e da estratégiapoker dinheiroluta do Chico, como ele continua sendo muito atual e muito importante", diz Carvalho.

"Ele deixou pistas para a gente lidar com essas questões. Epoker dinheirocapacidadepoker dinheirocomunicação,poker dinheiroarticular e trazer as pessoas mais diversas àpoker dinheiroluta, também era impressionante. O Chico era o porta-voz maior."

Principalmente por conta dos tais empates, o sindicalista Wilsonpoker dinheiroSouza Pinheiro (1933-1980), então presidente do sindicatopoker dinheiroBrasileia, foi assassinado. Era um prenúncio do futuropoker dinheiroChico Mendes.

Mendes também organizou açõespoker dinheirodefesa dos povos originários, para que eles tivessem suas terras reconhecidas. Em 1977, fundou um sindicato semelhante aopoker dinheiroBrasileia empoker dinheiroXapuri natal. Em seguida, foi eleito vereador — pelo Movimento Democrático Brasileiro (MDB), que fazia a oposição ao governo ditatorial.

Foi nessa épocapoker dinheiroque começou a receber as primeiras ameaçaspoker dinheiromorte.

Embora o caso nunca tenha sido registrado, há relatos do próprio epoker dinheiroterceirospoker dinheiroque ele tenha sido preso e torturadopoker dinheiro1979.

Chico Mendes foi um dos fundadores do Partido dos Trabalhadores (PT),poker dinheiro1980 — dois anos depois, e tambémpoker dinheiro1986, seria candidato a deputado estadual, mas não conseguiu se eleger.

Em 1985, quando foi criado o Conselho Nacional dos Seringueiros (CNS), o discursopoker dinheiroMendes requerendo a preservação do modopoker dinheirovida desses profissionais extrativistas passou a ecoar mais longamente.

A essa altura, ativistas indígenas, seringueiros, castanheiros, pequenos pescadores e ribeirinhos já estavam juntos, lutando pela criaçãopoker dinheiroreservas extrativistas — que preservariam as terras indígenas, as florestas e ainda promoveriam a reforma agrária.

Para o historiador Souza, este esforçopoker dinheiroconjunto com outros grupos é um dos grandes legadospoker dinheiroMendes, pois possibilitou que indígenas, ribeirinhos, extratores, pequenos produtores rurais — populações que tiveram históricas relaçõespoker dinheiroconflito — se unissempoker dinheirodefesapoker dinheiroseus direitos.

Em 1987, o ativista recebeu empoker dinheirocasa uma comitiva da Organização das Nações Unidas (ONU).

Foi quando botou a boca no trombone: sem pestanejar, denunciou os projetos que, segundo ele, estariam levando ao fim a Amazônia.

A repercussão foi tamanha que organismos como o Senado dos Estados Unidos e o Banco Interamericanopoker dinheiroDesenvolvimento (BID) passaram a olhar atentamente para a questão.

Poucos meses depois ele receberia o prêmio Global 600, oferecido pela ONU por contapoker dinheiroseu ativismo ambiental.

No seu último anopoker dinheirovida, participou da implantação das primeiras reservas extrativistas no Acre e viupoker dinheiroperseguição intensificada enquanto percorria o país dando palestras e participandopoker dinheiroeventos.

Rodrigues afirma que Mendes viveu sob "constante anunciaçãopoker dinheirosua morte". "Imagino que nunca antes na história das investigações policiais houve tantas denúncias e provas vindo da própria vítima indicando quem seria o seu algoz", comenta.

O funcionário do ICMBio avalia como marcante uma frase escrita por Chico Mendes a respeitopoker dinheiroseu trágico fim.

"Se ao menos tivesse certezapoker dinheiroque minha morte serviria para fortalecer a luta pelos meus compatriotas, esta valeria a pena. Mas a experiência me diz o contrário, então quero viver", registrou o ativista ambiental.

Influência sobre Marina Silva

Nascidapoker dinheiroum seringal no Acre, a ambientalista Marina Silva, atual ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, engajou-se na lutapoker dinheiroChico Mendes no início dos anos 1980. No anopoker dinheiroque o ativista foi assassinado ela foi eleita para seu primeiro cargo público: foi a mais votada vereadora do municípiopoker dinheiroRio Branco, capital do estado.

No último dia 15, quando Mendes faria 80 anos, ela lembrou o companheiropoker dinheirosuas redes sociais. "Sua existência, precoce e dolorosamente interrompida, nos marcou e ainda marca", escreveu a ministra.

"Sua vida, semelhante a chamapoker dinheirouma poranga, ajudou a clarear ideias na direçãopoker dinheironovos caminhos e a ampliar a luta socioambiental na defesa da floresta, dos povos indígenas e das comunidades tradicionais que dela dependem para viver", afirmou.

Marina relatou que muitos perguntam a ela o que seriapoker dinheiroChico Mendes hoje. A ministra costuma responder que "ele continuaria na luta por todas as florestas somadas à defesa que sempre fezpoker dinheirosua companheirapoker dinheiroidentidade, vida e luta, a floresta amazônica".

"Mas estaria se sentindo mais amparado, por ver o quantopoker dinheiroluta se ampliou", comentou. "Ele veria muita gente ao seu lado", disse ela, mencionando as múltiplas formas "quepoker dinheirosingular formapoker dinheirodefender a Amazônia e seus povos ganhou, na academia, nas tribunas e púlpitos, nos momentos sociais,poker dinheirogênero, juventudes, nos meiospoker dinheirocomunicação, denunciando os crimes que ainda hoje são cometidos não só contra a floresta, mas também contra os povos indígenas e comunidades tradicionais que vivem na região."