Alessandra Korap: A indígena brasileira que ganhou o 'Nobel' do ambientalismo:j galera
Atualmente, ela é a presidente da Associação Indígena Pariri, que dá suporte às comunidades que vivem nesse local.
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Graças ao trabalho dela ej galeravários grupos, grandes empresasj galeramineração — como a Anglo American e a Vale — desistiramj galeraprojetos para exploração neste território indígena, que ainda não é oficialmente demarcado e reconhecido pelas autoridades brasileiras.
Entre tantas reuniões e protestos, Korap sofreu uma sériej galeraataques e ameaçasj galeramorte. Num dos piores episódios, a casa dela foi invadida e vandalizada.
A atuaçãoj galeraprol do meio ambiente rendeu a ela o Prêmio Goldmanj galera2023, considerado um "Nobel verde", por homenagear e celebrar a históriaj galerapessoas que atuamj galeraprol do meio ambiente e da preservaçãoj galerarecursos naturais.
Oferecido desde 1989 por uma fundação sediadaj galeraSão Francisco, nos Estados Unidos, o reconhecimento só havia sido dado a outros três brasileiros até o momento: Carlos Alberto Ricardo (1992), Marina Silva (1996) e Tarcísio Feitosa da Silva (2006).
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Korap, que trabalhava como professora, diz que a destruiçãoj galerarios e florestas começou a incomodá-la com mais intensidade a partirj galera2014 e 2015.
"O principal impacto aconteceu com a chegadaj galeragrandes empresas na regiãoj galeraque vivemos. Ali começou o loteamentoj galeraterras e o desmatamento", conta.
"Muitas vezes, íamos a um local onde costumávamos caçar ou colher frutas e,j galerarepente, todo o terreno tinha sido limpado pelas máquinas. Daí nos perguntávamos: cadê o lago onde costumávamos pescar e brincar? Ele simplesmente não existia mais."
Korap nasceu no municípioj galeraItaituba, no Estado do Pará. A cidade é um dos principais centros do território indígena Sawré Muybu do povo munduruku, que possui 178 mil hectares ao longo do trecho central do rio Tapajós.
Esse território ainda não foi formalmente reconhecido e demarcado pelo Estado brasileiro — o que aumenta as vulnerabilidades, a possibilidadej galerainvasões ou a açãoj galeramadeireiros e garimpeiros.
"Em 2015 eu decidi que acompanharia os caciques na luta pela nossa terra. Até porque quando o povo munduruku sai do território, ele nunca vai sozinho. As lideranças são acompanhadas por crianças, e grávidas. Com isso, mostramos que há toda uma geração voltada para o futuro que vive aqui", diz Korap.
Primeiras barreiras
A ativista admite que não foi fácil conquistar uma posiçãoj galeraliderança logoj galerainício.
"Eu enfrentei muitas resistências porque sou mulher, tenho marido e filhos", comenta.
"Muitas vezes, quando aconteciam as reuniões, eu sempre ia para a frente. As mulheres me diziam: 'Alessandra, esse é o lugar dos homens'. E eu respondia: 'Só estou aqui para escutar melhor'... Sempre fui muito teimosa", brinca.
Korap alega ter questionado os motivosj galerasó os homens poderem falar ou liderar as atividades.
"O papel da mulher sempre foi oj galerafazer roça, cuidar dos filhos e do marido. Elas não iam para as reuniões", observa.
Com o passar do tempo, porém, a atuação dela foi ganhando a aceitação — e os convites para participarj galeraencontros e coordenar atividades se tornaram mais frequentes.
"E isso é um grande privilégio. Se eu tivesse desistido naquela época, hoje não estaria aqui", raciocina.
"É claro que eu pessoalmente não tenho mais a liberdadej galeraantigamente. Mas a liberdade do meu povo,j galerapoder ver as crianças brincando e as mulheres felizes, é o maior prêmio que eu posso receber", complementa.
Uma advogada entre nós
Korap também percebeu aos poucos que precisava buscar uma formação acadêmica.
"Parecia que nós sempre dependíamos dos brancos. Precisamos aprender as leis, a falar e a escrever bemj galeraportuguês, para que assim possamos dizer às empresas que não aceitamos os projetos que elas tinham dentroj galeranossos territórios", diz.
Foi assim que a ativista começou a cursar Direitoj galera2018 na Universidade Federal do Oeste do Pará, localizada na cidadej galeraSantarém.
A ideia dela era aj galerapoder representar o povo mundurukuj galeraações legais contra garimpeiros e outras empresas interessadasj galeraexplorar os recursos da região.
"Eu fui toda feliz conversar com os caciques, mas eles disseram que eu não deveria estudar, que eles precisavamj galeramim ali", lembra.
"Mas depois eles foram convencidosj galeraque precisávamosj galerauma advogada munduruku", completa.
Os planos acadêmicosj galeraKorap, porém, foram interrompidosj galera2019, com a chegadaj galeraJair Bolsonaro (PL) à Presidência da República.
Durante a campanha, o ex-presidente repetiu diversas vezes que não demarcaria nenhum território indígena enquanto estivesse no cargo — promessa que elej galerafato cumpriu.
"Esse foi o momentoj galeraque eu cursava a faculdade e pensava que não era horaj galeraestar dentroj galerauma salaj galeraaula. Não podia ficar trancadaj galeraquatro paredes, ouvindo os professores falarem coisas que não serviriam para mim", diz a ativista.
Depoisj galerapausar o sonhoj galeravirar advogada, Korap se viu diantej galeraum novo dilema. "Eu tinha saído do território indígena e não sabia mais se podia exercer o papelj galeraliderança ou falar por aquelas pessoas", resume.
"Os caciques me disseram: Alessandra, você saiu para estudar e pode, sim, seguir falando pela gente. Foi aí que eu comecei a organizar todo o movimento."
Garimpoj galerafora
Uma das principais conquistas do grupo do qual Korap faz parte foi aj galeraconseguir barrar a açãoj galeramineradoras no território Sawré Muybu.
Segundo informações compiladas pela organização do Prêmio Goldman, entre 2011 e 2020, 97 pedidosj galeramineração nessa região foram realizados por empresas ao governo.
Só a Anglo American, uma companhiaj galeraorigem britânica, tinha 13 solicitações para avaliar a exploraçãoj galeracobre na terra munduruku — e cinco desses pedidos foram protocolados entre 2017 e 2019.
Em reuniões, Korap alertou sobre esses projetos e o que eles poderiam representar para a comunidade. Ela também organizou as estratégias para transformar o assunto numa pauta prioritária e liderou os esforços para arrecadar fundos.
Em dezembroj galera2020, a ativista também esteve numa assembleia com 45 lideranças e 200 participantes, que assinaram uma declaração oficial contra o garimpo e o desmatamentoj galeratoda a Amazônia.
Após uma intensa campanha,j galeramaioj galera2021 a Anglo American desistiu oficialmentej galerafazer 27 pesquisas exploratórias que já estavam aprovadasj galeraterritórios indígenas da Amazônia. A lista inclui os 13 pedidos que aconteceriamj galeraáreas Sawré Muybu.
Os organizadores do Prêmio Goldman também destacam que, após a decisão da Anglo American, outra gigante do setor tomou uma decisão parecida: a Vale anunciou que retiraria todos os pedidosj galerainvestigação sobre minériosj galeraterras indígenas do Brasil.
No ano passado, um levantamento feito pelo Instituto Brasileiroj galeraMineração (Ibram) revelou que, pela primeira vezj galeradécadas, nenhuma das 130 empresas filiadas tinha protocolado pedidos para explorar minériosj galeraterritórios indígenas do país.
Ameaças constantes
O trabalhoj galeraativismoj galeraKorap veio acompanhadoj galeraalguns episódiosj galeraperseguição e constrangimentos.
"Comecei a ser seguida na rua, vinha gentej galerafora pedir informações sobre mim e até recebi mensagensj galeraáudioj galeraque as pessoas diziam: 'Precisamos dar um jeito naquela índiaj galeraItaituba porque, se ela já está dando trabalho agora, imagina quando virar advogada'", relata.
A ativista disse que esses foram sinais clarosj galeraque o trabalho dela começava a incomodar.
Em novembroj galera2021, Korap participava da Conferência do Clima das Nações Unidas (COP 26)j galeraGlasgow, na Escócia, quando foi abordada por um sujeito não identificado, que disse para ela "deixarj galeramisturar política e meio ambiente".
Naquele mesmo mês, a ativista descobriu quej galeracasa havia sido invadida e vandalizada. Documentos e equipamentos eletrônicos foram roubados.
Certa noite, a eletricidade da residência foi subitamente cortada, o que deixou ela própria e todos os familiares ainda mais alarmados — e todos precisaram passar um tempo na casaj galeraamigos.
Esses eventos levaram até a publicaçãoj galerauma manifestação oficial da ONU sobre o caso. No texto, a entidade mostra-se preocupada com os fatos e pede que o Estado brasileiro tome providências para proteger Korap.
"Quando invadiram o meu terrenoj galeraSantarém, meu filho mais novo me abraçou e disse: 'Mãe, eu não quero que eles te matem'."
"Eu fiqueij galerapânico e fui para a aldeia fazer uma reunião. As mulheres choravam e ficaram preocupadas, achando que eu iria desistir. Mas eu disse que não deixariaj galerafalar, até porque a minha voz vai muito além ao representar a lutaj galeraum povo e a defesaj galeranosso território", diz.
"E é isso o que acontecej galeravários outros lugares da Amazônia. Só que a gente é uma sementinha, que cresce cada vez mais. Nós somos um projetoj galeravida,j galeracaciques ej galeramulheres que querem construir o futuro para seus filhos junto com a floresta e os animais", completa.
O que vem por aí?
Questionada pela BBC News Brasil sobre o que espera do novo governo Lula, Korap adota um tomj galeracautela e cobrança.
"O presidente anterior [Jair Bolsonaro] deixava muito claro o que queria: ele falava diretamentej galeranão demarcar e explorar os territórios indígenas", avalia.
"Mas, com o novo governo, precisamos continuar a nossa luta. Porque sabemos que eles também estão conversando com as empresas [interessadas na exploração da Amazônia]", diferencia.
Para a ativista, os povos indígenas não devem ficar satisfeitos com a concessãoj galeracargosj galeraalto escalão, ou a criaçãoj galeraum ministério próprio, liderado por Sônia Guajajara (PSOL).
"Isso não significa que ficaremos calados e achando que está tudo bem. Não está tudo bem se o nosso território não foi demarcado e está cheioj galerainvasores, se os rios estão contaminados com mercúrio, se há projetos para legalizar o garimpo…", lista.
"Precisamos lembrar que os ataques não acontecem só com as armas. Alguns são feitos com canetas. E as canetas que assinam leisj galeraBrasília podem ser a principal causaj galeramorte do nosso povo", complementa.
"Serão mais quatro anosj galeraque continuaremos a resistir para proteger o nosso território", conclui Korap.