O que foi a Noite dos Cristais, que marcou o início da escaladaviolências dos nazistas contra os judeus:

Crédito, US Information Agency Agency/PhotoQuest/Getty Images

Legenda da foto, Policiais do ladoforauma loja pertencente a comerciante judeu que foi destruída no 'Kristallnacht'Viena

“Foi uma noiteviolências diversas direcionadas contra os judeus, entre 9 e 10novembro1938, incentivada pelos nazistas”, explica o historiador Vinícius Liebel, professorHistória Contemporânea, da Universidade Federal do RioJaneiro (UFRJ).

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O primeiro número classificado foi o 12.

O segundo número classificado foi o 23.

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Segundo ele, naquela noite houve uma ondadepredação, saques e espancamentosmotivação antissemita, que seguiu uma certa tradiçãoviolências e expurgos contra judeus, conhecidos como pogroms.

“A origem do nome pelo qual ficou conhecida é o aspecto das ruas das grandes e médias cidades da Alemanha no amanhecer do dia 10, totalmente salpicadasvidro quebrado das janelas e vitrines destruídas”, conta.

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“A impressão que muitos tiveram eraque as ruas estavam cheiascristais.”

De acordo com um artigo do site do United States Holocaust Memorial Museum, os ataques ocorreramtoda a Alemanha, a qual já incluía a Áustria, anexada por Hitler naquele ano1938, e a região dos Sudetos, na antiga Tchecoeslováquia.

“Centenassinagogastodo o Reich alemão foram atacadas, vandalizadas, saqueadas e destruídas”, diz o texto. “Muitas foram incendiadas.”

Aindaacordo com o artigo, os bombeiros receberam instruções para que deixassem as sinagogas serem destruídas, mas que evitassem que as chamas se espalhassem para as construções nas proximidades delas.

“Os vidros das vitrinesmilhareslojaspropriedadejudeus foram destruídas e suas mercadorias saqueadas. Os cemitérios judeus foram profanados. Muitos foram atacados por membros das TropasAssalto (SA). Pelo menos 91 pessoas foram brutalmente assassinadas naquele massacre.”

Crédito, Sean Gallup/Getty Images

Legenda da foto, Em exposiçãoBerlim, visitantes observam fotografia1938 que mostra sinagoga incendiada

Por coincidência, no dia da Noite dos Cristais estavam sendo comemorados 15 anos do “Putsch da Cervejaria”, uma tentativagolpe realizada pelos nazistas na Baviera,1923, uma data importante para eles. Segundo o texto do United States Holocaust Memorial Museum, a liderança do Partido Nazista, reunidaMunique para a comemoração do evento, decidiu usar a ocasião como pretexto para iniciar uma noiteataques contra os judeus.

Segundo o artigo, o ministro da propaganda alemão Joseph Goebbels foi o principal instigador dos massacres da Noite dos Cristais”, “sugerindo aos nazistas veteranos ali reunidos que o ‘judaísmo mundial’ havia conspirado para que o assassinatoVom Rath fosse efetuado.

Ele anunciou que "o Fuhrer decidiu que as manifestações não deveriam ser preparadas ou organizadas pelo Partido, mas na medidaque elas irrompessem espontaneamente, não deveriam ser impedidas’.

As palavrasGoebbels parecem ter sido compreendidas como uma ordem para desencadear a violência.

“O massacre foi organizado para dar uma aparênciaespontaneidade”, reforça Liebel. “Explico: as altas instâncias do regime deram um sinal para os órgãos repressores, polícia e partido, para que eventuais mobilizações e manifestações antissemita não fossem coibidas. Com isso, deram carta branca para a violência. Naturalmente, a notícia se espalhou e as ruas foram tomadas pelos nazistas.”

O também historiador Carlos ZacariasSena Júnior, do DepartamentoHistória da Universidade Federal da Bahia (UFBA), diz igualmente que a violência da Noite dos Cristais foi incentivada por dirigentes do Partido Nazista, mas faz ressalvas.

“Não se pode dizer que ela foi ‘organizada’ no sentido que tomamos por organização”, explica. “Uma característica da violência fascista éaparente espontaneidade, haja vista que estamos falandoum partidomassas com tropaschoque, que funcionavam por dentro do Estado ou arevelia.”

Para Sena Júnior, que é coordenador do Politiza - GrupoPesquisa História Política, dos Partidos e Movimentos ContemporâneosEsquerda e Direita, da UFBA, levandoconta que não se pode controlar massas que são permanentemente mobilizadastornouma causa, ainda mais quando são acionados dispositivosafetos políticos, como o ódio que moviam os partidáriosHitler, “é difícil definir o quantoespontaneidade houve nos acontecimentos e o quantoorganização”.

Crédito, Lauren A. Little/MediaNews Group/Reading Eagle via Getty Images

Legenda da foto, Sinagoga destruída; ataques ocorreramtoda a Alemanha, a qual já incluía a Áustria

O certo é que, seja como for, os estragos foram grandes. O historiador britânico Richard John Evans, relata alguns números das violência da Noite dos Cristaisseu livro Terceiro Reich no Poder.

Segundo seus dados, algo entre 7.500 e 9.000 lojasjudeus e 520 sinagogas foram destruídas – neste último caso, o número pode ter chegado a 1.000, no entanto.

Entre perdas humanas, Evans escreveu que oficialmente, 91 pessoas morreram, mas que esse número poderia checar mil. Outras 30 mil pessoas foram presas e encaminhadas para os camposconcentraçãoDachau, Buchenwald, Sachsenhausen e alguns outros.

Foi a primeira vezque o regime nazista prendeu judeusgrandes números apenas por serem judeus, sem nenhuma acusação criminal. A Noite dos Cristais marcou, assim, o início da escalada da violência do Estado nazista contra os judeus, seu encarceramentocamposconcentração e o consequente extermíniomilhões deles.

Tanto para Liebel como para Sena Júnior o assassinatoErnst vom Rath foi apenas o estopim — a desculpa para trazer à tona algo mais profundo.

“Não há como desvincular a Noite dos Cristaisum processo mais longo e estruturado, que vinha sendo implementado desde a ascensão dos nazistas ao poder,1933, e mais particularmente desde 1935, com a promulgação das LeisNuremberg”, diz o primeiro.

“Esse processo visava isolar os judeus da sociedade, retirar seus direitos ecidadania no Estado alemão, torná-los suscetíveis a violências diversas e, por fim, eliminá-los do espaço territorial da Alemanha.”

Sena Júnior acrescenta que as razões mais profundas da Noite dos Cristais podem ser remetidas ao ódio crescente mobilizado pelas lideranças nazistas, que apontavam os judeus como causadores dos seus sofrimentos.

“Há também questões que devem ser remetidas aos efeitos da Primeira Guerra, como aqueles que impuseram um pesado ônus territorial e financeiro à Alemanha, além da vergonha pela derrota”, explica. “Mas atribuir as motivações do antissemitismo a outros que não sejam os apoiadores das ideologias extremistas representadas pelo nazismo passa por ser uma justificativa inconsistente.”

Liebel lembra ainda que o discurso antissemita e a promoção do ódio racial já eram elementos presentesparte da sociedade europeia, mas os nazistas promoveram não só ainstrumentalização para fins eleitorais e políticos, mas também lograram anormalização.

“Eles alçaram o racismo a uma políticaEstado, condicionaram os direitos e a cidadania à raça e conduziram um processoprogressiva escalada da violência contra aqueles que julgavam não pertencer à‘comunidade do povo’”, explica.

Sena Júnior, porvez, chama a atenção para o fatoque a ascensão da ideologia nazifascistasdiversas partes do mundo não levaram a consensos consistentes entre os historiadores.

“Eles têm se dedicado a entender as razões pelas quais um país e seu povo se levantamódio contra o ‘outro’”, diz.

“Dessa forma, o que podemos dizer é que a ascensão do nazifascismo responde a uma crise da democracia representativa e à incapacidade das organizações socialistas, que fomentaram a revolução,oferecer alternativas imediatas a uma massadesocupados, deserdados e desmobilizados no período entre guerras."