'Não olhe nos olhos deles': como foi minha visita à megaprisãoBukele, símbolo da guerra contra facçõesEl Salvador:

Três detentos atrás da grade, olhando para direções diferentes

Crédito, Lissette Lemus/BBC

Mas essa é ao mesmo tempo uma das principais razões para a enorme popularidadeBukele numa nação que foi abalada por notórias gangues — Mara Salvatrucha, Barrio 18, Los Revolucionarios e Los Sureños.

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"Aqui estão os psicopatas, os terroristas, os assassinos que enlutaram o nosso país", anuncia o diretor do centro, que não quer ser identificado, mas se deixa filmar.

Ele será nosso guia durante a visita cuidadosamente calculada às celas.

"Não olhe nos olhos deles", ele nos avisa.

Diretor do Cecotmáscara e empunhando fuzil

Crédito, Lissette Lemus/BBC

Legenda da foto, O diretor do Cecot conduziu jornalistas estrangeiros pela prisão

É madrugada, mas não importa: as luzes artificiais nunca se apagam. Uma rajadavento passa através do tetotreliça, proporcionando uma breve pausa no calor. As celas podem atingir 35ºC durante o dia e não possuem outra fonteventilação.

A cadeia é chamadaa "Alcatraz da América Central",referência à prisãosegurança máxima dos EUA que funcionou entre 1934 e 1963uma ilhota.

Mas a prisãoEl Salvador não aparenta nada degradada: tudo é novo e pintado recentemente.

Guardas encapuzados vigiamcima, com grandes armas na mão.

Abaixo, os presos sobem nos belichesquatro andares onde dormem; sem colchão ou lençol, deitam-se sobre o metal e comem com as mãos arroz e feijão, ovos cozidos ou macarrão.

"Qualquer utensílio pode ser uma arma mortal", justifica o diretor.

Guardacostas observa detentos dentrocela

Crédito, Lissette Lemus/BBC

Legenda da foto, Detentos dormemsuperfíciemetal, sem colchão ou lençóis
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Não há mais nada entre as três paredescimento, exceto duas pias para lavar as mãos e dois vasos sanitários para usar à vistatodos.

E não há mais nada a fazer senão ver o tempo passar.

Os reclusos só podem sair das celas durante 30 minutos ao dia, para fazerem exercício — utilizando apenas o peso do próprio corpo — no corredor central do bloco 3, que nós, jornalistas, estamos visitando.

Existem outras sete unidades como esta — prisões independentes dentro do enorme complexo que cobre o equivalente a sete estádiosfutebol, cercado por duas cercas eletrificadas e dois murosconcreto armado, e guardado por 19 torres.

Não está claro se os prisioneirosCecot foram detidos recentemente ou transferidosoutras prisões, ou exatamente por que foram selecionados para esta unidade.

Ou mesmo quantos presos realmente estão ali na prisão que, segundo o governo, pode acomodar até 40 mil pessoas.

Apesarmesespesquisa, a BBC ainda não tem uma resposta para essas perguntas.

Questionamos o diretor, que responde: "Não podemos fornecer essa informação".

"Qual é a capacidade máximacada cela?", nós insistimos.

"Onde cabem 10 pessoas, cabem 20", diz o diretor.

Por trássua máscara anti-covid, vejo um sorriso.

Direitos humanos

Jornalistas e guardas no corredorprisão

Crédito, Lissette Lemus/BBC

Legenda da foto, A BBC e outros veículosimprensa participaramuma visita cuidadosamente calculada à megaprisão

Desde ainauguração,31janeiro2023, a BBC solicitou frequentemente acesso à megaprisão.

O convite chegou finalmente no dia 6fevereiro atravésuma mensagem no WhatsApp do assessorimprensa internacional da presidência: "Iremos esta noite ao Cecot".

O pontoencontro e o horário nos foram informados apenas meia hora antes da hora marcada para a partida.

Dois dias haviam se passado desde que Bukele se declarou reeleito com 85% dos votos, alegando que seu partido havia conquistado quase todas as cadeiras na Assembleia Legislativa antes mesmoos cartórios contarem os votos.

"Esta seria a primeira vez que existiria apenas um partido num país com um sistema totalmente democrático. Toda a oposição foi pulverizada. El Salvador voltou a fazer história neste dia", comemorou Bukele da varanda do Palácio Nacional na tarde do dia das eleições.

No entanto, enquanto escrevo isto — cinco dias após as eleições —, El Salvador ainda não sabe os resultados finais devido a inúmeras falhas no sistemacontagemvotos e a dúvidas sobre como os boletinsvoto foram administrados.

Ninguém questiona a vitória presidencialBukele; a atenção tem se voltado à disputa pelos 60 assentos na Assembleia Legislativa, cujo controle é crucial para o programaBukele.

Nayib Bukele e a esposa acenam a partirvaranda

Crédito, Bloomberg via Getty

Legenda da foto, O presidente Bukele falou a apoiadores na varanda do Palácio Nacional no dia da eleição

Ao proclamar a vitória, Bukele exaltou conquistas do seu primeiro mandato na áreasegurança e atacou os críticos dianteuma multidão entusiasmada na praça centralSan Salvador, a capital.

"Passamospaís mais perigoso do mundo a país mais segurotodo o Hemisfério Ocidental, o país mais segurotodo o continente americano, e o que dizem? É uma violação dos direitos humanos'", disse.

"De quem são os direitos humanos? Não das pessoas honestas. Talvez tenhamos priorizado os direitos das pessoas honestasdetrimento dos direitos dos criminosos, foi tudo o que fizemos", continuou.

A visita que vários repórteresveículos da imprensa internacional realizariam dois dias depois poderia ser considerada uma continuação deste argumento.

Nosso destino foi a prisão que é símbolo da políticasegurançaBukele e do "estadoexceção" — uma medida justificada como emergencial que concede poderes draconianos à polícia e aos militares — que estávigor há dois anos.

Cerca70 mil pessoas foram detidas sob esta medida; El Salvador tem hoje a maior taxaencarceramento do mundo.

Organizações salvadorenhas e internacionaisdireitos humanos afirmam que muitos milharesdetentos não têm qualquer ligação evidente com crimesgangues.

Outros foram forçados a colaborar com as gangues, seja como vigias ou para esconder armas ou drogas para elas, por medoconsequências caso se recusassem a fazer isso.

A Cristosal, a principal organizaçãodireitos humanos no país centro-americano, documentou casostortura e mais150 mortes sob custódia do Estado durante o "estadoexceção".

Num relatório publicadodezembro, a Anistia Internacional criticou a "substituição gradual da violência das gangues pela violência estatal".

Nenhuma instituição externa ou ONG visita a prisão, diz-nos o diretor, que no entanto garante que a cadeia cumpre os padrões internacionais.

Segurança a qualquer custo

Equipamento mostra raio-xhomem, com guardasegundo plano

Crédito, Lissette Lemus/BBC

Legenda da foto, As medidassegurança na prisão incluem uma máquinaraio X para detectar itens escondidos que mostram até órgãos internos

Depoispassarmos pela segurança — revistas, perguntas sobre tatuagens e uma máquinaraio X que expõe até os intestinosuma tela —, somos levados a conhecer alguns prisioneiros.

O diretor queria que ficássemos cara a cara com os "inimigos".

Os guardas tiram cinco indivíduos pré-selecionadossuas celas, mas não antescolocarem algemasseus pulsos e tornozelos. Agachados e subjugados, eles ficamfrente para a parede.

Eles não têm permissão para conversar.

"Venha aqui. Vire-se, por favor. Tire a camisa."

O diretor nos apresenta o primeiro preso: Miguel Antonio Díaz Saravia, vulgo "Castor" e "assassino da [gangue] Mara Salvatrucha", nos dizem.

Em 2022, ele foi condenado a 269 anosprisão por raptar, torturar e assassinar, junto com outros membrosgangues, quatro soldadosoutubro2016.

Costas tatuadaspreso

Crédito, Lissette Lemus/BBC

Legenda da foto, As tatuagens deste preso indicam que ele é membro da gangue Mara Salvatrucha

Marvin Mario Parada, condenado pelo feminicídioAlison Renderos2012, uma estudante16 anos e lutadoraestilo livre, também tem que nos mostrar seu torso tatuado.

"Lembro-mequando encontraram seu corpo desmembradoum canal láSan Vicente", me conta mais tarde um fotógrafo salvadorenho que está sentado ao meu ladonossa volta à capital.

"Tive que cobrir a exumação e vi os legistas colocando os pedaços na mesa", continua a conversa macabra.

A próxima horaestrada torna-se uma revisãohistóriashorror ecrimes terríveis das gangues, como aqueleque 17 passageirosum micro-ônibus foram queimados vivos2010.

Vários detentos dentrocela

Crédito, Lissette Lemus/BBC

Legenda da foto, Detentos do Cecot passam apenas 30 minutos por dia fora das celas

"Também passei anos sem poder visitar o meu tio, que morava no mesmo bairro", continua o fotógrafo, referindo-se às fronteiras invisíveis que durante décadas dividiram o mapa entre gangues rivais.

"Se você fosse lá, não voltaria."

Nos dias que antecederam as eleições4fevereiro, eu ouvi histórias semelhantes nas feirasrua, nos bairros pobres, nos hotéis e nas praias.

Também escutei vários comentáriosapoio ao estadoexceção, o que indicava aquilo todas as sondagens previam: uma vitória iminenteBukele na votação.

Depoisviver por décadas com a extorsão à porta e a violência na próxima esquina, a maioria dos salvadorenhos com quem falei pareciam dispostos a pagar o preçoBukele pela segurança.