'Vi crianças mortascasade apostasescola': os 'tanques voadores' que acirram a sangrenta guerra civilcasade apostasMianmar:casade apostas

Montagem mostra paiscasade apostascriança atingida e helicóptero
Legenda da foto, Ataques foram lançadoscasade apostasdois helicópteroscasade apostascombate Mi-35casade apostasfabricação russa

Eles começaram a corrercasade apostasbuscacasade apostasabrigo, apavorados e gritando para pedir ajuda, enquanto foguetes e munição atingiam a escola.

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"Nós não sabíamos o que fazer", disse uma professora, que estava dentro da salacasade apostasaula quando o ataque aéreo começou.

"No início, não ouvi o som do helicóptero, ouvi as balas e bombas atingindo o terreno da escola."

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Fim do Que História!

"As crianças que estavam dentro do prédio principal foram atingidas pelas armas e começaram a correr para fora, tentando se esconder", conta outra professora. Ela e seus alunos conseguiram se esconder atráscasade apostasum grande pécasade apostastamarindo.

"Eles atiraram diretamente sobre as paredes da escola, atingindo as crianças", disse uma testemunha. "Pedaços do prédio principal saíram voando e feriram as crianças no prédio ao lado. Grandes buracos surgiram no piso."

Os ataques foram lançadoscasade apostasdois helicópteroscasade apostascombate Mi-35casade apostasfabricação russa, apelidadoscasade apostas"tanques voadores" ou "crocodilos", devido àcasade apostasaparência sinistra e blindagem protetora.

Eles carregam um arsenal pesado, incluindo um poderoso canhãocasade apostastiro rápido e cápsulas que alimentam diversos foguetes. As armas são devastadoras para as pessoas, os veículos e as construções menos resistentes.

Desde o golpe militar que derrubou o governo eleitocasade apostasAung San Suu Kyicasade apostasMianmar, dois anos atrás, ataques aéreos como este foram incorporados às táticas mortais da guerra civil do país.

O conflito vive agora um impasse brutalcasade apostasgrande partecasade apostasMianmar, conduzido por uma força aérea que, nos últimos anos, passou a contar com cercacasade apostas70 aeronaves, a maioriacasade apostasfabricação russa e chinesa.

Duas fotografias mostram meninas; uma sorri e a outra tem o semblante triste
Legenda da foto, Zin Nwe Phyo,casade apostas9 anos (à esquerda) e Su Yati Hlaing,casade apostas7 (à direita) foram mortas no ataque à escola

Crianças vítimas

É difícil estimar quantas pessoas já morreram nesses ataques aéreos. O acesso a grande parte do territóriocasade apostasMianmar agora é impossível, fazendo com que os números reais do conflito fiquem,casade apostasgrande parte, invisíveis para o mundo exterior.

A BBC conversou com testemunhas, moradores locais e famíliascasade apostasuma sériecasade apostasligações telefônicas para descobrir o que aconteceu no ataque à escola.

Segundo testemunhas, os disparos duraram cercacasade apostas30 minutos, arrancando pedaços das paredes e dos tetos.

Os soldados então aterrissaramcasade apostasdois outros helicópteros próximos, marcharam para dentro — alguns ainda atirando — e mandaram que os sobreviventes saíssem e se agachassem no chão. Eles não podiam olhar para cima ou seriam mortos.

Os soldados começaram então a perguntar sobre a presençacasade apostasforçascasade apostasoposição na aldeia.

Dentro do prédio principal da escola, três crianças estavam mortas. Uma delas era Zin Nwe Phyo.

Outra era Su Yati Hlaing,casade apostassete anos. Ela ecasade apostasirmã mais velha haviam sido trazidas pela avó. Os pais, como tantos outros na região, haviam se mudado para a Tailândiacasade apostasbuscacasade apostastrabalho.

Outras crianças sofreram ferimentos terríveis e algumas tiveram membros arrancados. Uma delas era Phone Tay Za, também com sete anoscasade apostasidade, que gritavacasade apostasdor.

Os soldados usaram sacos plásticos para recolher partescasade apostascorpos. Pelo menos 12 crianças e professoras feridas foram levadas para o hospital mais próximo, na cidadecasade apostasYe-U,casade apostasdois caminhões requisitados pelos militares.

Duas crianças morreram mais tarde. Nos camposcasade apostasvolta da aldeia, os soldados mataram a tiros um adolescente e seis adultos.

Material escolar no chãocasade apostasuma salacasade apostasaula após o ataque aéreo à escolacasade apostasLet Yet Kone, na região centralcasade apostasMianmar

Crédito, EPA

Legenda da foto, Material escolar no chãocasade apostasuma salacasade apostasaula após o ataque aéreo à escolacasade apostasLet Yet Kone, na região centralcasade apostasMianmar

A evolução dos conflitos

Mianmar é um paíscasade apostasguerra consigo mesmo há muitos anos.

As forças armadas lutam contra diversos grupos insurgentes desde a independência do país,casade apostas1948. Mas os conflitos envolviam pouca tecnologia.

Os combates eram principalmente travados entre tropas terrestres,casade apostasdisputas intermináveis por território nas regiões contestadascasade apostasfronteira. Muitas vezes, havia pouca diferença entre estes conflitos e as guerrascasade apostastrincheiracasade apostasum século atrás.

Foicasade apostas2012, no Estadocasade apostasKachin, no norte do país — pouco antescasade apostasa força aérea conseguir seu primeiro helicópterocasade apostascombate Mi-35 —, que os militares usaram armas aéreascasade apostasgrande escala contra insurgentes pela primeira vez.

Ataques aéreos também ocorreram nos Estadoscasade apostasShan e Rakhine,casade apostasalguns dos outros conflitos internos que continuaram ocorrendo durante os 10 anoscasade apostasintervalo democrático vividos por Mianmar.

Mas, desde o golpe militarcasade apostasfevereirocasade apostas2021, o exército vem sofrendo pesadas baixascasade apostascentenascasade apostasemboscadas nas estradas, conduzidas pelas chamadas Forçascasade apostasDefesa do Povo — milícias voluntárias formadas depois que a junta do governo esmagou protestos pacíficos contra o golpecasade apostasEstado.

Por isso, o exército tem usado o suporte aéreo, com bombardeios por aeronaves equipadas para ataques terrestres, ou operações móveis aéreas, como a que ocorreucasade apostasLet Yet Kone.

Helicópteros explodem os alvos antes da chegada dos soldados para matar ou debilitar as forçascasade apostasoposição que encontrarem.

Foram pelo menos 600 ataques aéreos dos militares entre fevereirocasade apostas2021 e janeirocasade apostas2023, segundo os dados do Projetocasade apostasDadoscasade apostasEventos e Localizaçãocasade apostasConflitos Armados (Acled, na siglacasade apostasinglês), que foram analisados pela BBC.

É difícil estimar a quantidadecasade apostasmortes resultantes desses ataques. Segundo o Governocasade apostasUnidade Nacional, organização clandestina que lidera a oposição ao regime militar, os ataques aéreos das forças armadas mataram 155 civis entre outubrocasade apostas2021 e setembrocasade apostas2022.

Os gruposcasade apostasresistência dispõemcasade apostaspouco armamento e não têm capacidadecasade apostasreagir aos ataques aéreos.

Eles adaptaram drones comerciais para lançar seus próprios ataques aéreos, lançando pequenos explosivos sobre veículos militares e guaritas, mas seu efeito é limitado.

Fotografia mostra um casal com máscara sentadocasade apostasuma cama e com semblante triste
Legenda da foto, Os paiscasade apostasSu Yati Hlaing trabalham na Tailândia, onde esperavam ganhar o suficiente para oferecer uma vida melhor à filha

O ataque à escola

Não está claro por que Let Yet Kone foi atacada pelo exército.

A aldeia é pobre e tem cercacasade apostas3 mil habitantes. A maior parte deles écasade apostasagricultores que cultivam arroz ou amendoim. Let Yet Kone fica na região árida do centrocasade apostasMianmar,casade apostasmeio a um cenário marromcasade apostasvegetação rasteira. Ali, a água é escassa fora da estação das monções.

A aldeia ficacasade apostasum distrito chamado Depayin, onde é forte a resistência ao golpe. Depayin foi palcocasade apostasmuitos confrontos armados entre o exército e as Forçascasade apostasDefesa do Povo, mas nãocasade apostasLet Yet Kone, segundo os moradores.

Pelo menos 112 dos 268 ataques registrados pelo Governocasade apostasUnião Nacional ocorreram no sul da regiãocasade apostasSagaing, onde fica Depayin.

Um porta-voz do governo militar afirmou, depois do ataque à escola, que os soldados foram até a aldeia para investigar os relatos da presençacasade apostascombatentescasade apostasuma Forçacasade apostasDefesa do Povo e do Exército para a Independênciacasade apostasKachin, quando sofreram ataques vindos da escola.

Este relato contradiz todas as testemunhas que conversaram com a BBC. Os militares não apresentaram nenhuma evidênciacasade apostasque houvesse na escola atividades insurgentes.

A escola havia sido formada apenas três meses antes, no monastério budista localizado no extremo norte da aldeia. Ela tinha cercacasade apostas240 alunos. Moradores contaram à BBC que esta é uma das maiscasade apostas100 escolascasade apostasDepayin que agora são administradas por comunidades que se opõem ao regime militar.

Professores e profissionais da saúde estavam entre os primeiros gruposcasade apostasapoiadores do movimentocasade apostasdesobediência civil.

Em um dos primeiros atoscasade apostasresistência ao golpe, que recebeu amplo apoio, funcionários públicos decidiram suspender toda a cooperação com o novo governo militar. E, como resultado, muitas escolas e centroscasade apostassaúde agora são administrados pelas comunidades e não pelo governo.

A mãecasade apostasPhone Tay Za conta que ouviu os disparos e explosões começarem cercacasade apostas30 minutos depoiscasade apostaslevar seu filho para a escola. Mas, como o tiocasade apostasZin Nwe Phyo, ela imaginou que a escola não poderia ser o alvo dos helicópteroscasade apostascombate.

"Depois que terminou o som dos disparos das armas pesadas, saícasade apostasdireção à escola", ela conta. "Eu vi crianças e adultos agachados no chão, com a cabeça baixa. Os soldados chutavam quem levantasse a cabeça."

Ela implorou aos soldados que a deixassem procurar seu filho. Eles recusaram. "Vocês se preocupam quando os seus levam tiros, mas não quando acontece conosco", disse a ela um soldado.

Ela então ouviu Phone Tay Za gritando por ela e os soldados permitiram que ela fosse até ele, dentro da salacasade apostasaula destruída.

"Eu o encontreicasade apostasuma poçacasade apostassangue, com os olhos piscando lentamente", ela conta. "Ele disse, 'mamãe, por favor, me mate'. Eu disse que ele iria ficar bem. ‘Você não vai morrer'."

"Comecei a chorar do fundo do meu coração e gritei 'como vocês se atrevem a fazer isso com meu filho?' O monastério estavacasade apostascompleto silêncio. Quando gritei, o eco se espalhou pelos prédios."

"Um soldado me mandou não gritar daquele jeito e disse para que eu ficasse parada onde estava. Eu então me sentei na salacasade apostasaula por cercacasade apostas45 minutos com meu filho nos braços."

"Eu vi os corposcasade apostastrês crianças mortas ali. Eu não sabia quem eram aquelas crianças. Eu não conseguia olhar para os seus rostos", relembra ela.

Phone Tay Za morreu pouco tempo depois. Os soldados não permitiram que a mãe ficasse com o corpo e o levaram embora.

Os corposcasade apostasZin Nwe Phyo e Su Yati Hlaing também foram removidos pelos militares antes que as famílias pudessem vê-los. Eles foram cremadoscasade apostassegredo posteriormente.

A mil quilômetroscasade apostasdistância dali, na Tailândia, os paiscasade apostasSu Yati Hlaing estavam trabalhando numa fábricacasade apostascomponentes eletrônicos quando souberam que os militares haviam atacadocasade apostasaldeia.

"Minha esposa e eu ficamos desesperados", disse o pai. "Não conseguíamos mais nos concentrar no trabalho. Era pertocasade apostas14h30 e não podíamos sair. Continuamos trabalhando, com o coração apertado."

"Os colegas nos perguntavam se estávamos bem. Minha esposa não conseguia mais segurar as lágrimas e começou a chorar. Decidimos não fazer as horas extras habituais naquele dia e pedimos ao chefe da nossa equipe para ir para o nosso quarto", ele conta.

Naquela mesma noite, eles receberam uma ligação da avócasade apostasSu Yati Hlaing com a notíciacasade apostasque ela havia sido morta.

Fotografia colorida mostra soldados caminhandocasade apostasuma ruacasade apostasterra

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, As Forçascasade apostasDefesa do Povo são milícias voluntárias que causaram graves prejuízos às forçascasade apostasMianmar

Novos ataques

O ataquecasade apostasLet Yet Kone causou horror e reprovação internacional, mas os ataques aéreos continuaram.

No dia 23casade apostasoutubro, jatos da força aérea bombardearam um show musical no Estadocasade apostasKachin, durante a comemoração do aniversáriocasade apostasinício da insurgência do Exército para a Independência daquele Estado.

Os sobreviventes afirmam que três enormes explosões atingiram a multidão que havia se reunido para o evento, matando 60 pessoas, incluindo comandantes do exército insurgente e uma cantora popularcasade apostasKachin.

Acredita-se que muitos outros tenham morrido nos dias que se seguiram, depois que o exército bloqueou a evacuaçãocasade apostaspessoas que sofreram sérios ferimentos no ataque.

No dia 15casade apostasnovembro, a força aérea bombardeou uma minacasade apostaschumbo no Estadocasade apostasKaren, no sulcasade apostasMianmar, perto da fronteira com a Tailândia. A operação matou três mineiros e feriu mais oito.

O porta-voz da junta justificou o ataque afirmando que a mineração era ilegal e estavacasade apostasuma área controlada pela organização insurgente União Nacionalcasade apostasKaren.

E, somente no último mês, a força aérea bombardeou a principal base da organização insurgente chamada Frente Nacionalcasade apostasChin, perto da fronteira com a Índia, alémcasade apostaslançar ataques aéreos que atingiram duas igrejas no Estadocasade apostasKaren, matando cinco não combatentes.

O aumento da capacidadecasade apostasataques aéreos é sustentado pelo apoio contínuo da Rússia e da China ao golpe, enquanto muitos outros governos relegam o regime militarcasade apostasMianmar ao ostracismo.

A Rússia, especificamente, passou a ser o maior apoiador do regime no exterior. Aeronaves russas, como o Mi-35 e os ágeis caçascasade apostasataque terrestre Yak-130, são fundamentais para a campanha aérea contra os insurgentes.

Já a China forneceu recentemente a Mianmar modernos aviõescasade apostastreinamento FTC-2000G, que também são apropriados para ataques terrestres.

Gráfico mostrando aeronaves no mianmar

O fim dos sonhos

A alta mortalidade dos ataques chamou a atenção dos investigadorescasade apostascrimescasade apostasguerra.

As forças armadascasade apostasMianmar foram acusadas desse tipocasade apostascrime muitas vezes no passado, frequentemente por casoscasade apostasabusos das tropas terrestres, particularmente contra os rohingyascasade apostas2017. Mas o uso da força aérea trouxe novos tiposcasade apostasatrocidades.

Para os sobreviventescasade apostasLet Yet Kone, o pesadelo não terminoucasade apostas16casade apostassetembro. Eles contam que muitas das crianças e alguns adultos ainda estão traumatizados pelo que viram naquele dia.

Os militares continuam a investir contra a aldeia. Houve mais três ataques e muitas casas foram queimadas.

A comunidade é pobre. Os moradores não têm recursos para a reconstrução e,casade apostasqualquer forma, não sabem quando os soldados estarãocasade apostasvolta para queimar as casas novamente.

"As crianças são tudo para os pais", afirma o lídercasade apostasuma milícia local. "Ao matar as crianças, os militares os destruíram mentalmente. E preciso dizer que eles conseguiram. Até no meu caso, vou precisar agoracasade apostasmuita motivação para levar adiante a luta revolucionária."

Os paiscasade apostasSu Yati Hlaing não conseguiram voltar depois da morte da filha e ainda estão na Tailândia. Eles não têm dinheiro para a viagem, nem podem correr o riscocasade apostasperder os empregos na fábrica. Eles sempre esperaram que aquele trabalho pudesse trazer uma vida melhor para a filha.

"Eu havia imaginado tantas coisas", conta a mãe. "Eu pensava que, quando finalmente voltasse, viveria feliz com minhas filhas, iria cozinhar o que elas quisessem."

"Eu tinha tantos sonhos. Eu queria que elas fossem inteligentes e tivessem a educação que nós não tivemos."

"Elas estavam a pontocasade apostascomeçar a jornada", prossegue a mãe. "Minha filha não teve nem o nosso afeto e carinho por perto, já que estávamos tão longe. Agora, ela se foi para sempre."

A BBC analisou os dadoscasade apostasataques do Projetocasade apostasDadoscasade apostasEventos e Localizaçãocasade apostasConflitos Armados (Acled), que coleta relatoscasade apostasincidentes relacionados à violência política e protestoscasade apostastodo o mundo. Ataques aéreos foram definidos como conflitos envolvendo aeronavescasade apostaslocais específicos, sejacasade apostascombates armados oucasade apostasataques independentes. Os dados cobrem o períodocasade apostas1ºcasade apostasfevereirocasade apostas2021 a 20casade apostasjaneirocasade apostas2023.

* Com informações do serviço Birmanês da BBC

Análisecasade apostasdados: Becky Dale

Produção: Lulu Luo, Dominic Bailey

Design: Lilly Huynh

- Este texto foi publicadocasade apostashttp://vesser.net/articles/c51le7n9961o